RESUMO: O presente trabalho tem por objetivo relatar a relação família e alienação parental e as implicações sociais e jurídicas nas crianças e adolescentes. A Alienação Parental (AP), constitui um problema no contexto familiar, por trata-se de um processo de interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos familiares que tenham o menor sob sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor, ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este. Deste modo, tal problema tem gerado efeito no âmbito social e jurídico cujos maiores prejudicados são as crianças e adolescentes vítimas da AP, devendo a família e o sistema jurídico centralizar as decisões e entender esses menores como sujeitos de direitos que merecem e precisam de atenção especial por se encontrarem em um processo de constituição e desenvolvimento de sua personalidade e dignidade.
Palavras-chave: Alienação Parental. Família. Criança e adolescente.
INTRODUÇÃO
A família constitui uma instituição social que é influenciada e influenciam outras pessoas, grupos e instituições, sendo responsável pelas ações de cuidado, proteção e incentivo ao desenvolvimento dos membros que a compõe, ao transmitir os seus valores, os aspectos físicos, afetivos e sociais. Desta forma, a família é “(...) o mais fundante e o mais importante grupo social de toda a pessoa, bem como o seu quadro de referência, estabelecido através das relações e identificações que a criança criou durante o desenvolvimento” (SAMARA, 1998, p. 8).
Porém, existem situações em que a família é a causa da desproteção dos seus membros, especialmente as crianças e adolescentes, e um desses casos é o da Alienação Parental (AP), que atualmente tornou-se um grande problema no contexto familiar e das crianças e dos adolescentes. O processe da Alienação Parental é entendido como a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, ou familiares que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este.
Assim, o presente trabalho tem por objetivo relatar a relação família e alienação parental e suas implicações sociais e jurídicas nas crianças e adolescentes. Para tanto se utilizou, no desenvolvimento desse trabalho, o método dedutivo, onde se partiu de concepções gerais para as especificas, bem como o método bibliográfico e o monográfico. O trabalho é composto no primeiro momento de uma abordagem conceitual e legal da família. No segundo momento, é feita considerações e conceituações, legais e doutrinárias sobre a AP, e por fim, aborda as implicações sociais e jurídicas desse problema sobre as crianças e os adolescentes.
1 DA FAMÍLIA: aspectos gerais
1.1 Conceito de Família
Criado na Roma Antiga para designar um novo grupo social que surgiu entre as tribos latinas, a origem etimológica do termo “família” é derivado do latim “famulus”, cujo significado é servo ou escravo doméstico, que primitivamente, a família era considerada um conjunto de escravos ou criados de uma mesma pessoa (MARKY, 1995).
[...] a expressão foi inventada pelos romanos para designar um novo organismo social, cujo chefe mantinha sob seu poder a mulher, os filhos e certo número de escravos, com o pátrio poder romano e o direito de vida e morte sobre todos eles (ENGELS, 2002, p. 58).
Entretanto, o vocábulo “Família”, em Roma, tinha outros sentidos, pois o mesmo vocábulo poderia significar conjunto de pessoas colocadas sob o poder de um chefe (paterfamilias)[1] e outro sentido é o referente ao patrimônio do parterfamilias (CRETELLA JR., 1985).
Ferreira (2000), define família como o agrupamento de pessoas com que vivem, na mesma casa, particularmente o pai, a mãe e os filhos, também consistindo pessoas do mesmo sangue, o mesmo subdivide antropologicamente em duas especificações a família elementar (família nuclear), a que é constituída pelo casal e seus filhos e a família extensa aquela constituida pela associação de duas ou mais famílias elementares. No entanto, o conceito de família é polissêmico, com várias acepções, e a concepção moderna de família é bem mais ampla que a definição supra, haja vista ser a família:
[...] um sistema aberto em permanente interação com seu meio ambiente interno e/ou externo, organizado de maneira estável, não rígida, em função de suas necessidades básicas e de um modus perculiar e compartilhado de ler e ordenar a realidade, construindo uma história e tecendo um conjunto de códigos (normas de convivências, regras ou acordos relacionais, crenças ou mitos familiares) que lhe dão singularidade. (NOBRE, 1987, p.118-119).
Portanto, além da estrutura familiar tradicional (elementar e extensa), a evolução e transformação sociais e culturais, proporcionaram a existências de diferentes tipos de famílias (monoparental, homoafetiva, comunitária, informal, etc.). De tal modo, a família é considerada a instituição social mais importante, pois é por meio dela que os indivíduos se constituem como pessoas, já que esta é responsável por promover a educação de seus membros, que consequentemente influencia o comportamento desses no meio social. Assim, o ambiente familiar é o local propício para o desenvolvimento, devendo existir harmonia, afetos, proteção, conforto, segurança e proporcionar bem-estar aos membros da unidade familiar.
1.2 Composição da família no Brasil: Formas de entidades familiares e o papel da família na legislação brasileira
A cada momento histórico vivenciado pela humanidade, a estrutura e composição da família se apresenta de diferente natureza, assim como seu papel na transformação das relações sociais e antropológicas, em razão da importância atribuída a esta instituição para a formação da sociedade e dos próprios integrantes que a compõe.
No Brasil, a estrutura familiar na era colonial tinha influência nos costumes de Portugal, porém essa instituição se transformou através dos tempos, acompanhando as mudanças ocorridas no contexto histórico, político-jurídico, econômico, religioso, social e cultural na qual estão inseridos os indivíduos.
Entre todas as mudanças que estão se dando no mundo, nenhuma é mais importante do que aquelas que acontecem em nossas vidas pessoais – na sexualidade, nos relacionamentos, no casamento e na família. É uma revolução que avança de maneira desigual em diferentes regiões e culturas, encontrando muitas resistências. Como ocorre com outros aspectos no mundo em descontrole, não sabemos ao certo qual virá a ser a relação entre vantagens e problemas. Sob certos aspectos estas são as transformações mais difíceis e perturbadoras de todas (GIDDENS, 2000, p. 61).
Portanto, essa revolução que vem ocorrendo no novo modelo de constituição de família tem sido objeto de estudo de diferentes áreas, no âmbito social, educacional e jurídico faz-se necessário que as instituições (tal como escola, clubes, órgãos jurídicos, repartições públicas, etc..) tenham conhecimentos de quais modelos familiares estão presentes no seu contexto, para que possa agir de forma satisfatória no processo de relação família e instituições, porém antes de tudo, é necessário as instituições saberem as concepções atuais de famílias e o papel da família na legislação brasileira.
Sobre as formas de entidades familiares, no Brasil, além da tradicional estrutura familiar denominada nuclear ou elementar, as transformações sociais e culturais vêm proporcionando a existência de diferentes estruturas familiares como a matrimonial, informal, monoparental, anaparental, eudemonista e homoafetiva.
Dias (2011) descreve algumas concepções ou formas de família, quais sejam: a) família matrimonial, surgida no Concílio de Trento (1563), são as decorrentes do casamento como ato formal, litúrgico promovido por instituição religiosa, sendo esse tipo de família o único vínculo familiar reconhecido no Brasil até o ano de 1988; b) família informal se caracteriza pela União que não está formalizada na lei brasileira; c) família homoafetiva são a formadas pela união de pessoas do mesmos sexo; d) família monoparental formada por qualquer dos pais e seus descendentes, tendo como motivação causas circunstanciais (morte, abandono ou divórcio) ou ainda, a decisão (na maior parte dos casos, uma decisão da mulher) de ter um filho de forma independente; e) família anaparental é compreendida como sendo a entidade familiar composta de pessoas com vínculos consanguíneos que moram juntas sem um descendente (por exemplo dois irmãos, dois primos que moram juntos); f) família eudemonista[2] é a que tem em sua essência a busca pela felicidade, pela realização de seus membros, que todos sejam felizes de maneira plena, não importando parentesco civil, consanguíneo, orientação sexual ou quaisquer outras características.
Quanto ao papel da família na legislação brasileira, a Constituição Federal do Brasil de 1988 (CF/88), em seu artigo 226, diz que a família é a base da sociedade e tem especial proteção do Estado, na qual a referida instituição passa a ter direito e deveres com os seus membros, o Estado e a sociedade de modo geral. Sendo esse instituto responsável por prover o desenvolvimento dos seus membros (filhos), elencado no artigo 227, da CF/88:
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
O dever de responsabilidade de conferir à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, todos os direitos fundamentais para um desenvolvimento físico, intelectual e emocional saudável, é rateado entre o Estado, a família e a sociedade, sem esquecer do estabelecimento da igualdade absoluta de direitos entre os filhos, naturais ou adotivos, decorrentes ou não do casamento, proibindo qualquer discriminação em relação à filiação.
Nesse sentido, a família tem papel crucial na legislação, quanto à proteção, afetividade e promoção do desenvolvimento dos indivíduos que a compõe, conforme é publicamente reconhecido na legislação nacional em diplomas legais como: CF/88, Código Civil, Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA (Lei n.º 8.069/90) e a Lei nº 12.318/2010 (que dispõe sobre alienação parental). Portanto, a família não é somente o berço da cultura e a base da sociedade futura, mas é também o centro da vida social (GOKHALE, 1980), e para tanto deve ser a instituição que deve contribuir e auxiliar no desenvolvimento biopsicossocial das crianças e dos adolescentes.
2 ALIENAÇÃO PARENTAL (AP)
Inicialmente deve-se entender o que seria a Alienação Parental, mencionar que o termo e os estudos surgiram com a pesquisa de um psicólogo americano, Richard Gardner, que propôs o termo Síndrome da Alienação Parental (SAP), na qual definiu como:
[...] um distúrbio da infância que aparece quase exclusivamente no contexto de disputas de custódia de crianças. Sua manifestação preliminar é a campanha denegritória contra um dos genitores, uma campanha feita pela própria criança e que não tenha nenhuma justificação. Resulta da combinação das instruções de um genitor (o que faz a "lavagem cerebral, programação, doutrinação") e contribuições da própria criança para caluniar o genitor-alvo. Quando o abuso e/ou negligencia parentais verdadeiros estão presentes, a animosidade da criança pode ser justificada, e assim a explicação de Síndrome de Alienação Parental para a hostilidade da criança não é aplicável (GARDNER, 1985, p. 2).
Deste modo, Alienação Parental é um grande problema no contexto familiar e das crianças e dos adolescentes, e incide em um processo desencadeado pelo genitor, denominado de alienador, que tem por objetivo a alienação da criança ou adolescente (filho), fazendo campanhas de desmoralização, desconstrução, injúria e outras ações contra o outro genitor, ao seu filho, privando-o da convivência e induzindo a afastamento destes.
Esse processo sempre existiu na humanidade, entretanto, a pouco tempo é que foi dado a devida importância pela sociedade a tal problema, tanto é que o legislador atento para tal problemática regulamentou por meio da Lei nº 12.318/2010, dispondo sobre a alienação parental e alterando o art. 236 do ECA, sobre o entendimento legal do que venha a ser AP, a referida lei dispõe:
Art. 2o Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este (Lei n.º 12.318/2010).
Desta maneira, a família é o principal agente determinante da AP, na qual os maiores prejudicados são as crianças e os adolescentes que sofrem, ou sofreram AP, visto ser “[...] uma ‘lavagem cerebral’ feita pelo guardião, de modo a comprometer a imagem do outro genitor, narrando maliciosamente fatos que não ocorreram ou que não aconteceram conforme a descrição dada pelo alienador” (DIAS, 2011, p. 455).
A alienação parental adentra na seara social e jurídica, e sendo detectada pelos profissionais que atuam e aplicam a própria Lei de Alienação Parental, no artigo 2º, parágrafo único, dá um rol exemplificativo do que seria casos de AP, tais como:
Art. 2o (...)
Parágrafo único. São formas exemplificativas de alienação parental, além dos atos assim declarados pelo juiz ou constatados por perícia, praticados diretamente ou com auxílio de terceiros:
I - realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor no exercício da paternidade ou maternidade;
II - dificultar o exercício da autoridade parental;
III - dificultar contato de criança ou adolescente com genitor;
IV - dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência familiar;
V - omitir deliberadamente a genitor informações pessoais relevantes sobre a criança ou adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações de endereço;
VI - apresentar falsa denúncia contra genitor, contra familiares deste ou contra avós, para obstar ou dificultar a convivência deles com a criança ou adolescente;
VII - mudar o domicílio para local distante, sem justificativa, visando a dificultar a convivência da criança ou adolescente com o outro genitor, com familiares deste ou com avós (Lei n.º 12.318/2010).
Portanto, pode-se observar que são múltiplos as causas de ocorrência da AP, e vários são os atores que podem exercê-la, ou seja, todas as pessoas que fazem parte do ciclo familiar e social das crianças e adolescentes podem ser sujeitos ativos dessa prática. Observa-se que, de acordo com o contexto conferido pela lei, também pode ser imputada aos avós, tios, curador, tutor, ou qualquer pessoa que tenha autoridade, guarda ou vigilância da criança e adolescente.
O sentido do rol exemplificativo, que traz à tona condutas práticas que, regra geral, tendem a frustrar a convivência saudável da criança ou adolescente, também é o de imprimir caráter educativo à norma, na medida em que devolve claramente à sociedade legítima sinalização de limites éticos para o litígio entre ex-casal. Por exemplo, dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência familiar ou omitir deliberadamente a genitor informações pessoais relevantes sobre a criança ou adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações de endereço, por si só, inviabiliza ou dificulta o efetivo exercício da autoridade parental (CC/2002 1.634 e ECA 21) e o direito à convivência familiar saudável (CF 227 e ECA 19). A lei, além de contextualizar tais violações em eventual processo de alienação parental, viabiliza maior efetividade na implementação da garantia constitucional (PEREZ, 2010, p. 72)
A ampliação do rol de pessoas que podem ser sujeitos ativos na prática e a exemplificação dos possíveis casos foram adotada pelo legislador para permitir o afastamento de possíveis interpretações equivocadas, e permitir maior garantia aos juristas, psicólogos, assistentes sociais, professores e diversos profissionais (que atuam com crianças e adolescentes) na eventual caracterização do fenômeno, contribuindo ao máximo para a prévia identificação da ocorrência dessa situação num caso concreto, pois em casos de maior simplicidade o juiz já poderá identificar o problema e interferir, através da aplicação de medidas emergenciais, os efeitos jurídicos com segurança e celeridade.
3 IMPLICAÇÕES SOCIAIS E JURÍDICAS DA ALIENAÇÃO PARENTAL NAS CRIANÇAS E ADOLESCENTES
No Brasil considera-se criança, para os efeitos do ECA (Lei n.º 8.069, de 13 de julho de 1990), a pessoa até 12 (doze) anos de idade incompletos, e adolescentes aquelas entre 12 (doze) e 18 (dezoito) anos de idade. As crianças e os adolescentes são seres em desenvolvimento biopsicossocial, e, portanto, merecem proteção do Estado, da família e da sociedade, haja vista serem esses hipossuficientes os mais propícios de violações de direitos, considerando o elevado número de crianças e adolescentes em situação de risco (e consequentemente terem seu futuro comprometido) por não terem acesso aos direitos e as garantias fundamentais que devam lhe proporcionar uma vida digna.
O ECA determina que esse hipossuficientes gozem de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, e, portanto têm direito à liberdade, ao respeito e à dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos humanos. Sendo dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, e conforme o referido Estatuto:
Art. 5º Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais.
Porém, diariamente milhares de crianças e adolescentes no país sofrem violações dos seus direitos, seja por parte da exploração ou da própria omissão do Estado, da família e da sociedade (SOARES, 1996). Dentre os inúmeros tipos de violações que algumas crianças e adolescentes sofrem é a Alienação Parental, uma forma de violações de direitos humanos das crianças e adolescentes, em que o agressor é a própria família, o que agrava ainda mais esse tipo de violência, pois essa instituição que tem o dever de proteção e promoção constitucionalmente designado, tornam-se os agressores, em que muitas vezes deixam de percebe essas agressões (SILVA, 2002), assim, conforme a Lei nº 12.318/2010:
Art. 3o A prática de ato de alienação parental fere direito fundamental da criança ou do adolescente de convivência familiar saudável, prejudica a realização de afeto nas relações com genitor e com o grupo familiar, constitui abuso moral contra a criança ou o adolescente e descumprimento dos deveres inerentes à autoridade parental ou decorrentes de tutela ou guarda.
Toda a situação é preocupante, especialmente para a criança e o adolescente, que estão em fase de desenvolvimento e formação biopsicossocial, e não tem suporte para entender que foi abandonada por alguém que tanto ama e não sabe ao menos quais motivos foram determinantes para essa calamitosa situação. É indescritível entender as motivações que provocam a quebra dessa ligação que une os genitores e seus filhos e a família (SILVA, 2002).
Desta maneira, de um lado cresce um filho que sempre foi levado a acreditar ter sido abandonado pelo genitor; e de outro, tem-se um pai, ou uma mãe, que se viu de mãos atadas frente à situação que lhe foi imposta pelo alienador, que quando não obstaculizava as visitas, fazia afirmações de que a criança havia expressamente manifestado interesse de não o encontrar. É esse tipo de situação que pais e filhos, vítimas do alienador, enfrentam diariamente.
A repercussão social da alienação parental passa do ciclo familiar e adentra nas relações sociais mantidas pelas pessoas que são vitimadas ou agressores, no que tange as crianças e adolescentes estas podem se mostrar com problemas de amizade, emocionais, de desempenho escolar, propicia a desenvolver doenças de ordem físicas e mental, dentre outros problemas, todavia:
O direito da criança e do adolescente à convivência familiar é indisponível, nos termos do art. 227 da Constituição Federal, não cabendo sua apreciação por mecanismos extrajudiciais de solução de conflitos. Ademais, o dispositivo contraria a Lei nº 8.069, de 13 de julho 1990, que prevê a aplicação do princípio da intervenção mínima, segundo o qual eventual medida para proteção da criança e do adolescente deve ser exercida exclusivamente pelas autoridades e instituição cuja ação seja indispensável (BRASIL, Mensagem n.º 513, de 26 de agosto de 2010).
Assim, a alienação parental não reflete apenas na seara social e familiar, mas na judicial, visto ser os direitos das crianças e dos adolescentes indisponível e de absoluta proteção, é o que cuidou em tratar a Lei nº 12.318/10, determinando que quando o processo tiver iniciado o magistrado deverá tomar as “medidas provisórias necessárias” para garantir a integridade psicológica da criança ou do adolescente e manter, quando possível, a convivência familiar com ambos os genitores, levando sempre em consideração o melhor para os infantes. Devendo ser assegurada ao filho e genitor a garantia mínima de visitação assistida quando não houver iminente risco à integridade física ou psicológica do filho, fato que deverá ser atestado por profissional designado pelo juiz para acompanhamento das visitas.
Todas essas medidas tem em vista a proteção do menor, devendo o judiciário ao tomar conhecimento de possível caso de AP, deverá apurar as informações/denúncias contidas nos autos e saber se o caso discutido trata-se verdadeiramente de Alienação Parental, o juiz poderá utilizar perícia psicológica ou biopsicossocial, cujos laudos serão confeccionados por pessoas capacitadas na área, ou seja, Psicólogos e Assistentes Sociais, os quais poderão analisar até mesmo a vida conjugal do casal antes da separação, de modo a colher todas as informações necessárias para formação de sua convicção a respeito do caso (Artigo 5º, Lei nº 12.318/10).
Portanto a repercussão jurídica da AP nas crianças e nos adolescentes se inicia com o processo de separação dos genitores, depois com a guarda do menor, o sujeitando a ficar no meio de uma briga, onde geralmente a arma principal são esses hipossuficientes, que em sua maioria não entendem o que se passam e as motivações para mudanças drásticas de comportamento dos genitores, e cabe ao poder judiciário, manter esses hipossuficientes seguros, pois:
É preciso se ter presente que esta também é uma forma de abuso que põe em risco a saúde emocional e compromete o sadio desenvolvimento de uma criança. Ela acaba passando por uma crise de lealdade, o que gera um sentimento de culpa quando, na fase adulta, constatar que foi cúmplice de uma grande injustiça (DIAS, 2013, p. 2)
Desta maneira, as crianças e os adolescentes e a família vítimas e vitimizadas pela AP, tem como principal impacto o abandono emocional dos filhos pelos pais, gerando enfraquecimento das relações familiares e sociais. Conduzindo uma frustração do ideal de fraternidade, humanidade, complacência que deve haver entre os membros de todo e qualquer grupamento social, e principalmente, ferindo os direitos fundamentais das crianças e dos adolescentes em terem uma convivência familiar, uma vida diga e saudável, não podendo ser objeto de disputa judicial, ou de artificio de punição para outrem.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
É indiscutível a importância da família como instituto de proteção e desenvolvimento da criança e do adolescente, no entanto, quando essa deixa de proteger os direitos dos menores, e passar a violar esses direitos é que se tem um problema de ordem social e jurídica.
Nesse sentido, a convivência familiar conturbada pode ocasionar vários conflitos. Nesse panorama surge a Alienação Parental. A responsabilidade que os pais têm na formação psicológica dos filhos é um reflexo da forma como aqueles vão superar suas diferenças na relação de conjugalidade para atingir um satisfatório exercício da relação de familiar, baseado, sobretudo, no atendimento do melhor interesse destes.
Quando o judiciário toma conhecimento de casos de AP, deve-se prezar pelo resguardo dos direitos das crianças e dos adolescentes, haja vista que as consequências do tal problema na vida desses hipossuficientes são graves e provocam uma total anormalidade no desenvolvimento psíquico, tais como: ansiedade, depressão crônica, nervosismo, agressão, transtorno de identidade e incapacidade de adaptação à ambiente normal. Na fase adulta, a criança que foi vítima dessa violência emocional apresentará um sentimento incontrolável de culpa por constatar que foi cúmplice de uma grande injustiça com o não guardião (VELLY, 2013).
Assim, deve-se ser (re)pensado em políticas de sensibilização das famílias, dos membros do judiciário, das escolas, creches, grupos sociais e de equipes que lidam com crianças e adolescentes e a família, para centralizar os menores como sujeitos de direitos, que merecem e precisam de atenção especial por estarem se constituindo como seres em desenvolvimento. Haja vista, ser a criança detentora do direito a convivência familiar, mesmo que não seja nos ditames do que presa os “modelos” socialmente aceitáveis.
NOTAS
[1] Pater, nesta expressão, não quer dizer pai, mas chefe, efetivo ou em potencial. (CRETELLA JR. 1985).
[2] O termo eudemonista, é de origem grega, liga-se ao adjetivo feliz e admite ser a felicidade individual ou coletiva o fundamento da conduta humana moral, isto é, que são moralmente boas as condutas que levam à felicidade (HOLANDA, 1988, p.592).
REFERÊNCIAS
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Advogado. Mestre em Ambiente, Tecnologia e Sociedade (UFERSA). Especialista em Direito Administrativo e Gestão Pública (FIP). Especialista em Educação em Direitos Humanos (UFPB). Bacharel em Direito (UFCG). Bacharel em Administração Pública (UFRN). Professor Substituto na Universidade Estadual da Paraíba (UEPB).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MORAIS, Lucas Andrade de. Família e alienação parental: Implicações sociais e jurídicas nas crianças e adolescentes Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 15 set 2015, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/45167/familia-e-alienacao-parental-implicacoes-sociais-e-juridicas-nas-criancas-e-adolescentes. Acesso em: 23 dez 2024.
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