RESUMO: Este artigo tem o objetivo de analisar a função desempenhada pelo advogado, demonstrar a importância deste profissional jurídico para a aplicação do Direito e da justiça, como também para a sociedade. A partir do estudo de um caso abordado em sala de aula, será possível analisar as normas que regem o desempenho da profissão e uma missão desse profissional em garantir que os direitos humanos e fundamentais do apenado sejam efetivados. Devido a isso o advogado é um profissional que sofre uma rejeição pela sociedade, mas é primordial na luta pelos direitos dos cidadãos, o que evidencia que possui uma função social a cumprir.
PALAVRAS-CHAVE: Advocacia; Características da Profissão; Profissionalismo; Ética Profissional; Função Social do Advogado; Direitos Humanos e Fundamentais do Apenado.
O advogado é um profissional garantidor de que será averiguada mais de uma versão dos fatos e defende os direitos assegurados ao seu cliente. Está preparado para o contraditório, para a discussão e o debate. Desta maneira é aquele que exerce a democracia, por isso, ela é indispensável para o pleno exercício da profissão.
Houve um longo período na história em que os advogados estavam diretamente ligados ao poder, pois auxiliavam os governantes na vivência política por ser um profissional conhecedor das leis e dos direitos e o interesse dos governantes estarem concentrado na vida social. Já foi uma profissão restrita a elite, todavia, com o surgimento e o melhor acesso às faculdades e universidades houve uma inclusão e uma extensão do curso de Direito a pessoas de renda baixa.
A advocacia vem sofrendo modificações ao longo dos anos, principalmente na atuação dos profissionais na vida social. Com o surgimento de novos profissionais que lidam com economia os advogados foram perdendo um pouco a utilidade para os poderosos, então é a partir daí que estes profissionais começam a enxergar aqueles que realmente precisam de assistência, a parcela da sociedade que não tinha voz e possibilidades de lutar pelos seus direitos.
É uma profissão marcada por perseguição e incompreensão. Temida pelos governos arbitrários, pois possuindo saber jurídico tinha mais condições de reivindicar e confrontar com os mesmos. No Brasil, teve grande participação na vida política e na luta pela redemocratização. Nos dias atuais os advogados não estão tão participativos, mas ainda assim não deixam de exercer a sua função perante a sociedade, como verdadeiros defensores.
O advogado foi totalmente reconhecido na Constituição Federal de 1988, precisamente em seu art. 133, quando afirma ser ele um elemento indispensável à administração da Justiça. Portanto, presume-se que os advogados possuem direitos e deveres para com a sua profissão e a sociedade. Devendo exercê-la de forma ética e sábia, dentro dos parâmetros da Justiça.
O caso da luta pela efetividade dos direitos humanos e fundamentais dos apenados é uma das lutas travadas pelos advogados, que não defendem crimes ou criminosos, mas sim os direitos que lhes são assegurados. O objetivo deste trabalho, portanto, é analisar o desempenho da profissão, se atentando para o fato de que, possuindo uma função social, o advogado não pode fugir da defesa e da oportunidade de garantir o contraditório. Em contraponto, deve agir conforme sua consciência e convicção moral e ética.
2 HISTÓRIA DA ADVOCACIA
A advocacia surgiu paralelamente com a civilização, isso porque os homens sempre tiveram necessidade de viver em coletividade, mas começaram a existir, já nos primórdios da civilização, assuntos que as pessoas não conseguiam resolver sozinhas, havendo a necessidade de alguém que interferisse.
Isso ocorria mesmo antes da organização da justiça e do Estado ser responsável por resolver conflitos interpessoais e grupais. No início os advogados não eram remunerados para oferecer ajuda, mas após o século II d.C., remuneração começou a ser algo imprescindível no exercício da advocacia.
No Brasil, a profissão era exercida sem regulamentação, antes da criação das Faculdades de Direito de São Paulo e de Olinda, por bacharéis formados em Coimbra ou em Paris. Contudo, após o país se tornar independente, surgiu à necessidade de criar cursos jurídicos, não somente para resolver problemas relacionados à Justiça como também para auxiliar na vida política.
O instituto da Ordem dos Advogados do Brasil foi fundado em 1843, por inspiração de Francisco Gê Acaiaba de Montezuma. Os seus Estatutos foram aprovados pelo Imperador Pedro II, no entanto, a corporação só foi criada quase um século depois, pelo Decreto 19.408, de 18 de novembro de 1930. Segundo Antonio Claudio Mariz Oliveira, durante o Império e a Primeira República, houve várias tentativas frustradas. O primeiro presidente da Ordem, o advogado Levi Carneiro, segundo o autor, atribuía esta dificuldade às ideias liberais da época, mas, principalmente, ao liberalismo econômico e ao excesso de individualismo que não permitiam que pudesse surgir uma entidade corporativista capaz de servir e ajudar a todos da classe.
A autonomia dos advogados sempre foi um assunto preocupante para os governos arbitrários. Isso porque não era bom para estes ter no seio da sociedade pessoas com entendimento jurídico suficiente para discordar de suas ações e reivindicar os direitos dos cidadãos. Permitir que estes profissionais tivessem independência e autonomia para fazê-lo era algo inviável.
Por ser uma profissão formal e que exigia grande investimento financeiro, era restrita a filhos dos poderosos e grandes proprietários que tinham condições de arcar com os custos de ter um advogado na família. Contudo, sempre foi motivo de muito orgulho e honra ter um profissional jurídico na família, essa é uma característica que ainda predomina na atualidade, pelo status que representa. Possuindo muito saber a respeito de Direito, Justiça, economia e problemas sociais, os advogados eram muito influentes e serviam como consultores em todas estas áreas, tendo assim, importância também na vida política, econômica e social do povo. Ademais, esta situação mudou um pouco com o surgimento de outros profissionais como os economistas, administradores de empresas, dentre outros.
A partir do afastamento da advocacia dos detentores do poder, os profissionais mudaram de foco e começaram a lutar por aqueles que não tinham voz e autonomia para se manifestarem. Passaram, então, a cumprir com o seu verdadeiro dever de defender os que têm seus direitos desrespeitados e a exercer a profissão em busca de justiça, desta maneira, a classe saiu do lado do poder e passou para o oposto, o lado dos oprimidos.
Segundo Ruy Barbosa, “a defesa não quer o panegírico da culpa, ou do culpado. Sua função consiste em ser, ao lado do acusado, inocente, ou criminoso a voz dos seus direitos legais” (BARBOSA, 2010, (p.66). E é nesse ponto que está integrada a função do advogado, na defesa dos direitos, independentemente a quem pertença.
O que a história demonstra é que isso ocasionou consequências como prisões, desaparecidos e até mortes. Mesmo assim, os advogados continuaram na liderança da sociedade. Tiveram destaque no período do Império, assim como nos movimentos que marcaram a proclamação da República. E na ditadura Vargas os advogados e estudantes de Direito formaram opositores importantes e incansáveis na luta pela democracia. A OAB teve uma grande participação na luta pela anistia, na redemocratização do país, assim como também em todos os movimentos libertários. Isso transparece que os advogados assumiram a sua posição de defensor dos interesses da sociedade, rompendo com a bajulação dos poderosos, e participando efetivamente da vida social.
Contudo, parece que a luta pelos direitos humanos no período ditatorial era muito mais forte e presente, principalmente, no que dizia respeito aos presos políticos, considerados inimigos do governo. Após a Constituição Federal de 1988, muitos dos direitos humanos foram reconhecidos e consagrados como direitos fundamentais do Estado Democrático de Direito do nosso país.
Entretanto, há um grande desinteresse social pela luta dos direitos humanos dos criminosos comuns. Isso porque a maioria deles é oriunda da parcela pobre e negra do país. É hipocrisia não considerar que os direitos humanos são muito mais efetivos para os integrantes da elite e muito mitigados e relativizados quando se trata dos mais necessitados. É por isso que o advogado não pode fugir da sua função. Sendo defensor público exerce uma missão muito mais árdua e dificultosa pelo número de casos que é obrigado a abarcar. No entanto, mesmo sendo advogado privado, apresentam-se situações em que há necessidade de pensar muito antes de oferecer defesa.
A participação na luta pelos direitos humanos não é um assunto que interesse muito aos advogados porque meche com a sociedade, que não deseja a recuperação do apenado, mas sim o seu sofrimento. E isso é totalmente contraditório ao sentido dos direitos humanos, que foram reconhecidos como instrumentos de garantir que o ser humano seja considerado em sua condição humana e esteja livre de sofrimento.
Então, a luta pelos direitos humanos dos apenados não se trata de algo criado pelos advogados, mas de forma muito sutil a colocam em prática, quando garantem que eles tenham direito à defesa, devido processo legal e amparo jurídico. Mas, não conseguem evitar que dentro dos presídios sejam vítimas de violência e vivam em condições subumanas porque está além de sua função. Portanto, o mínimo está sendo feito.
3 EXAME DA ORDEM
A advocacia é mais que uma profissão, é um objetivo trabalhoso na vida do estudante de Direito. Antes qualquer bacharel em Direito podia exercer seus conhecimentos e advogar, entretanto, como forma de obter profissionais mais competentes e completos na atuação jurídica, surgiu o exame da ordem, um teste de aptidões e habilidades. A origem do exame da ordem está ligada ao Governo de Juscelino Kubitschek, em 1960. O Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil, a Lei 8.906/94, impossibilitaram a habilitação de advogar por meio de comprovação do estágio, afirmando a exigência de aprovação no exame da ordem como requisito para o exercício da advocacia. Está também formalmente regrado pelo Provimento 81/96, do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, que descreve com detalhes o padrão do exame.
A advocacia tem no mundo jurídico uma estatura constitucional que a coloca igual à Magistratura e a Promotoria, por outro lado, e na mesma medida da atuação e responsabilidade atribuídas, impõe requisitos, ainda que não explícitos, para que possa ser exercida. Estando o advogado tão necessário à organização jurídica é justo que tenha de passar por um teste que demonstre sua capacidade de trabalhar de forma que exerça sua função perante a sociedade.
Sua participação confere à prestação jurisdicional contornos de justa e equânime, haja vista que a sua presença garante correto andamento técnico do processo e viabiliza o pleno exercício do contraditório e ampla defesa, partes do devido processo legal, de forma escorreita. A presença do advogado dá ares de legitimidade ainda maiores ao poder jurisdicional, contribuindo, inclusive, para o aprimoramento das instituições democráticas. (ALMEIDA, 2012, P. 106)
Decorrente dessa importância e essencialidade à Justiça que faz necessário e justificado o exame da ordem. Um profissional bem preparado e capacitado é fundamental para o pleno andamento do Direito. Seja ele advogado, magistrado ou promotor.
Embora o teste de capacitação não seja totalmente aceito pela classe estudantil. Isso porque inúmeras outras profissões que também são de fundamental importância para a vida em sociedade não necessitam de prova de aptidões para serem exercidas, como médico, por exemplo. No entanto, é preciso atentar sobre a real intenção do exame da Ordem. Além da arrecadação de dinheiro que é vantajosa, o mercado de trabalho está repleto de bacharéis em Direito, muitos não conseguem fazer um bom curso, não conseguindo se preparar para a vida profissional devidamente. Sendo assim, a prova de aptidões serve como um impulso para estudantes estarem mais esforçados e preparados para exercer a profissão que é tão delicada quanto qualquer outra, contudo, lida com os direitos das pessoas e muitas vezes um direito vale uma vida e não se pode errar.
4 PROFISSIONALISMO E ÉTICA NA ATUAÇÃO
O compromisso primário do advogado deve ser com a sua consciência. Partindo disso, deve assumir a postura de profissional, agindo com responsabilidade e cuidando para nunca perder a confiança dos seus clientes. Não importa se é um defensor público ou um advogado privado, deve sempre zelar pela confiança dos seus clientes porque estão lidando com problemas e conflitos que envolvem vidas.
A ética profissional é algo que deveria ser universal, contudo, não é respeitada por todos. Por isso, a advocacia vem passando por uma crise de credibilidade, com um crescente desprestigio e desvalorização. Segundo Antonio Claudio Mariz de Oliveira, o que se percebe no campo do Direito é o lucro como objetivo primordial, em detrimento da formação profissional e ética dos bacharéis.
O advogado, como fora explicitado na Carta Maior, em seu art. 133, é parte indispensável na organização jurídica, portanto, deve ser bem preparado não somente na parte técnica, tendo em vista que o objetivo maior é o Bem Comum a ser alcançado. É essencial que esses profissionais tenham ciência de que os honorários não é o único objetivo quando se assume causas, e sim resolver os problemas em questão da melhor forma possível, dentro dos parâmetros da ética e dos princípios que regem a profissão.
É importante observar que a decisão de mérito não depende somente do mesmo, afinal de contas o magistrado é responsável por julgar as situações e os advogados de representar as partes. Sendo assim, não é interessante promessas de resolução rápida dos problemas, assim como sentenças favoráveis.
O dever do advogado é deixar o cliente consciente de que pode ou não ser beneficiado, se colocando como um verdadeiro profissional e não como um super herói. Tudo isso reflete duas características essenciais a um advogado: a responsabilidade, ou seja, a capacidade para escolher o que pode ou não fazer, e o compromisso, com valores sólidos consigo e com os demais.
A busca pelo que é justo também é um dever do advogado e não somente o que é mais vantajoso. Esse é um pensamento voltado para a ética profissional que está se extinguindo. A justiça está perdendo o seu verdadeiro sentido e cada um a define da forma que lhe seja mais proveitosa. Esse é o problema. O advogado sendo representante e defensor de outros acaba sendo pressionado pela parte representada a fazer o que lhe é mais proveitoso e não o que é mais justo no processo.
A amplitude e os tipos de limitações são muito diferentes nas diversas formas. A mais livre é a discussão da Ciência do Direito. No processo se dão as maiores limitações. Aqui os papeis estão desigualmente distribuídos: a participação, por exemplo, do acusado não é voluntária e o dever de veracidade limitado. O processo de argumentação é limitado temporalmente, sendo regulamentado por regras processuais. As partes podem orientar-se segundo seus interesses. Com frequência, talvez como regra, as partes não buscam exatamente a sentença correta ou justa, mas a que lhe é vantajosa. As outras formas podem situar-se, no que diz respeito à extensão das diferentes limitações, entre esses dois extremos. (ALEXY, 2005, p.210)
Entretanto, para exercer a profissão, o indivíduo deve estar dentro dos requisitos comportamentais do Código de Ética e do Estatuto do Advogado. Servindo como instrumentos de imposição de regras de conduta, que obrigam os advogados ter ao menos o bom senso nas relações profissionais e na condução da vida jurídica sem prejudicar aos demais colegas e aos seus clientes. Essa é uma forma de impor a ética, que não deveria ser imposta, mas apenas respeitada e vivenciada com naturalidade, já que vivemos em um Estado Democrático de Direito com garantia de direito a todos. É como se de forma involuntária os advogados cumprissem com o mínimo da ética profissional, porque existem normas legais que garantem isso.
O autor Michael J. Sandel menciona em seu livro “Justiça: o que é fazer a coisa certa”, que as pessoas agem, em algumas situações e parecem estar agindo de forma voluntária, mas não é. De alguma forma o Estado, a situação econômica, religião ou qualquer outra coisa está impondo que seja assim. Então ele cita o exemplo do exército voluntário:
De acordo com essa objeção, o exército voluntário pode não ser tão voluntário quanto possa parecer. Na verdade, pode haver aí uma coerção implícita. Se algumas pessoas em uma sociedade não tiverem outra opção, aquelas que se alistam podem ser, na verdade, forçadas a fazê-lo por necessidade financeira. Nesse caso, a diferença entre convocação e o exército voluntário não significa que uma seja compulsória e o outro livre, mas que cada um envolve uma forma diferente de coerção – a força da lei, no primeiro caso, e as pressões econômicas, no segundo (SANDEL, 2014, p.107).
Desta forma, o mínimo de ética vislumbrado na atuação dos advogados parece ser voluntário, mas está totalmente de acordo às normas preestabelecidas. Ou seja, existe uma coerção implícita.
Contudo, ainda que existam essas normas, a ética é muito mais abrangente. Exige mais do profissional, exige uma conduta condizente com o Direito, credibilidade, senso de justiça, objetivo de lutar pelos direitos e não por interesses. A sociedade espera que a atuação do profissional seja ética. O objetivo maior é o profissionalismo e para isso é necessário competência e conhecimento teórico e prático sobre o que se pretende fazer. Desta forma, não é conveniente para um especialista em determinada área tratar de um assunto que não condiz com sua especialidade, isso poder ser prejudicial ao cliente. Compromisso e comprometimento com as vidas alheias são peças chaves na advocacia, em razão da confiança empregada.
5 FUNÇÃO SOCIAL DO ADVOGADO
Discorrer sobre a função social do advogado é apontar a sua importância na sociedade e na ordem jurídica. Esse profissional está sujeito a encargos coletivos e de ordem social, sendo o seu desempenho prejudicial a alguém, acarretará em sanções processuais e disciplinares. Tem, portanto, a obrigação de defender a Constituição, a ordem jurídica, os direitos humanos, a justiça social e batalhar pela efetiva aplicação das leis, pela rápida administração da Justiça e pelo aperfeiçoamento da cultura e das instituições jurídicas.
Os advogados são agentes transmissores e transformadores da dinâmica social, pois constituem o conduto dos anseios e das aspirações da coletividade junto ao Poder Judiciário. O direito individual do postulante, seus direitos processuais e suas garantias constitucionais são por nós proclamados. Assim, embora a defesa do ordenamento jurídico se efetive no caso concreto, assume ela uma dimensão global, pois a sua violação no particular é certeza de reiteração em qualquer outro caso. (OLIVEIRA, 1999, P.34)
A função social do advogado se resume em proteger os direitos e as garantias fundamentais do cidadão, participando de forma ativa na construção de uma sociedade com mais igualdade e liberdade. Ao menos essa é a função primordial desse profissional. Contudo, indiretamente, a sua atuação combinado às possibilidades que a Lei permite, principalmente dos que são privados, causa uma desigualdade no âmbito da justiça. No Direito Penal, por exemplo, o autor Marcelo Cunha de Araújo afirma que a interpretação exagerada dos princípios de forma a beneficiar o réu acaba por desvalorizar e descumprir outros princípios importantes do Direito, além de causar insegurança e desconfiança na sociedade perante a eficácia da Justiça.
A interpretação absoluta do preceito de preservação do estado de inocência privilegia os ricos e faz com que a aplicabilidade da justiça seja desproporcional. Nesse sentido, os ricos têm situação financeira que lhe permite arcar com os honorários advocatícios garantindo assim recursos e mais recursos, até que se esgotem as possibilidades. Já o pobre, se mantém numa fila de muitos outros processos a serem atendidos pelo defensor público. Neste contexto, pode-se analisar que o defensor público possui uma tarefa mais árdua e trabalhosa para cumprir com a sua função.
Portanto, a efetividade dos direitos processuais garantidos na Constituição Federal ao acusado deve ser interpretada de forma racional e equilibrada para que não haja desproporcionalidade no Direito. É preciso determinar até que ponto os direitos exageradamente valorados atrapalha no andamento da justiça e causa desigualdades nos processos.
Mesmo possuindo uma função social tão explicita perante a sociedade, a advocacia é uma profissão não compreendida e totalmente admirada. Isso porque a sua função específica de defensor dos direitos e garantias do cidadão não é analisada e devidamente valorizada. Essa é uma consequência do pensamento social que confunde o advogado com o cliente. Na área criminal, principalmente, as pessoas entendem que se defende e justifica a prática delituosa. Não é compreensível aos olhos da sociedade que o criminoso, mesmo infringindo a lei, possui direitos constitucionais e processuais a serem defendidos. São esses direitos os discutidos pelo advogado. Desta maneira, calcula-se que qualquer pessoa num momento de necessidade teria seus direitos defendidos, para não ser vitima de arbitrariedades e da prepotência.
A mídia é um aliado muito atuante quando condena os denunciados sem nenhum julgamento e passa para a sociedade a imagem do advogado como alguém que concorda com o crime e que o justifica. Acaba por gerar um julgamento duplo, do criminoso e do advogado que o defende.
Há delitos causadores de muita indignação e comoção na sociedade, cruéis e hediondos. Todavia, a função do advogado é defender os direitos do delituoso, justificado pelo fato da Carta Maior assegurar o direito à defesa e contraditório. Por esta razão, fica a critério dos profissionais analisarem em quais situações desejam atuar. Cabe a sociedade limitar o individualismo e compreender que a defesa é inevitável para o exercício da advocacia e que sem este profissional não haveria contraditório, somente uma voz seria ouvida, consequentemente, somente uma versão dos fatos seria conhecida. Essa afirmação é muito bem defendida pelo autor Ruy Barbosa em sua carta intitulada: O Dever do Advogado, quando diz que:
Recuar ante a objeção de que o acusado é “indigno de defesa”, era o que não poderia fazer o meu douto colega, sem ignorar as leis do seu ofício, ou traí-las. Tratando-se de um acusado em matéria criminal, não há causa em absoluto indigna de defesa. Ainda quando o crime seja de todos o mais nefando, resta verificar a prova: e ainda quando a prova inicial seja decisiva, falta, não só apurá-la no cadinho dos debates judiciais, senão também vigiar pela regularidade estrita do processo nas suas mínimas formas. Cada uma delas constitui uma garantia, maior ou menor, da liquidação da verdade, cujo interesse em todas se devem acatar rigorosamente (BARBOSA, 2010, p.69).
O advogado é um formador de opinião, deve estar atento aos movimentos sociais que lhe cercam e buscar estar presente na luta pela justiça social. Não há exercício de função social apartado da ética, da cidadania e da busca pelo bem comum. O advogado antes de tudo deve estar de acordo aos princípios legais e éticos da profissão, para exercê-los na vivência jurídica. Não ser apenas um instrumento de luta por interesses particulares, mas um instrumento da justiça.
A falta de concentração na justiça interfere no pensamento social, por considerar que o criminoso deve ser considerado um objeto que deve ser descartado ou excluído do meio social somente. O conceito de justiça ainda se confunde muito com o de vingança, no sentido de haver o desejo de retribuição do feito apenas e esquecer a ressocialização. Não é viável apenas prender pessoas num recinto infernal sem levar em consideração que são pessoas, com direitos e que retornarão ao convívio social, já que o Direito Penal Brasileiro veda a prisão perpétua.
É um ciclo de desrespeito aos direitos humanos e fundamentais que nunca acaba. Haja vista que o criminoso desrespeita o direito do cidadão quando comete o crime. O Estado desrespeita os direitos do apenado quando o submete a condições de vida insuportáveis. E assim nunca termina, porque quando o indivíduo consegue a liberdade comete os mesmos atos anteriores.
O desinteresse social em manter essa situação e não lutar pelos direitos dessas pessoas se resume no fato da maioria delas não ter condições financeiras, serem marginalizados e irrecuperáveis aos olhos da sociedade. O desrespeito aos direitos dos apenados não é somente um problema jurídico, se inicia por problemas sociais.
Nada justifica o crime, mas ele é sempre motivado. Tratar pessoas como bichos, os faz acreditar que assim são. Reconhecer e efetivar os direitos fundamentais dos apenados pode ser uma forma de causar neles o impacto de se reconhecerem enquanto cidadãos e perceberem o erro cometido e quem sabe arrepender-se do mesmo. Esse pode ser o inicio para uma mudança transformadora. Reconhecer o erro e envergonhar-se por ele é um ótimo motivo para evitar novos erros e tentar recomeçar.
Contudo, é muito difícil conseguir uma punição severa sem mitigar alguns direitos. Se a família e a vivência em sociedade não conseguem estabelecê-los como cidadãos cumpridores de deveres, não é a vida sem o mínimo de dignidade em casas prisionais que fará. A reeducação é necessária e benéfica a sociedade. Retribuir o ato é plausível, mas a privação de liberdade é suficientemente capaz de fazer, não necessitando mitigar os demais direitos humanos e fundamentais do apenado.
Há formas concretas de recuperar essas pessoas oferecendo capacitação, trabalho, aquisição de conhecimento para participar de um concurso, ou seja, formas de ocupar a mente de tantos brasileiros que passam anos e anos sem fazer nada sendo sustentados pelo Estado e sem probabilidades de melhoria de vida que tornam o ser humano melhor.
Cobrar a efetivação dos direitos humanos e fundamentais dos apenados é também contribuir para a diminuição de reincidência e da criminalidade. Trabalhar para contribuir com o Estado no custeio da estadia na casa prisional, aprender um ofício ou algo parecido são atitudes tomadas por governos de outros países que poderiam dar certo no Brasil e garantir uma perspectiva de futuro fora dos presídios. Mas não é somente modificar a administração dos presídios. Conscientizar a sociedade de que isso é preciso é uma função tão difícil ou até mais do que a primeira.
O intuito do presente trabalho foi pautar nos direitos dos acusados e apenados e o que se percebe é que a falta de conhecimento jurídico da sociedade e os conceitos pautados no senso comum levam as pessoas a acreditar que a profissão foi criada para a defesa somente de criminosos. Esquecem também que o Direito subdivide-se em várias áreas: Civil, Penal, Consumidor, Constitucional, Trabalho, Previdenciário, dentre outros. Sendo assim, esse profissional do Direito trabalha na defesa de direitos, sejam eles de qual esfera for. E, principalmente, na prevalência da justiça e do bem comum.
6 CONCLUSÃO
Constata-se que a função social do advogado evolui com o direito e as transformações sociais. Os advogados não podem se tornar estáticos perante os acontecimentos sociais. Durante a história esses profissionais e a OAB tiveram participação ativa na luta pelos direitos e nos movimentos modificadores da realidade do país, é necessário resgatar essa força, essa presença que se expande à vida política. Mais que profissionais prontos a cumprir com o exercício da profissão, devem estar dispostos a assumir a dimensão social que ela possui. Sair do universo elitista, restrito e individualista e voltar a ter um pensamento concentrado também na busca do bem comum é importante, porque ainda são cidadãos como os outros, alguns bem influentes.
Mediante o que foi exposto, fica contemplada a função social e a participação social do advogado. O que demonstra a importância e a indispensabilidade da advocacia para a sociedade, pois se não existisse estaríamos sujeitos ao arbítrio e ao desrespeito dos direitos e garantias fundamentais, sem acesso a contraditório e ampla defesa.
Contudo, não é porque os direitos humanos estão categoricamente explanados na Carta Maior do nosso país que são efetivados na prática. A Constituição não consegue modificar o pensamento social de estagnação e exclusão. Ainda é necessário conscientização e menos individualismo para pensar nos direitos humanos.
A crescente criminalidade e a influência da mídia são dois fatores que não contribuem para a transformação no pensamento social a respeito dos direitos humanos e fundamentais do acusado e do apenado. Por isso ainda há muita incompreensão do verdadeiro sentido desses direitos. Assim como acerca da evolução e as conquistas adquiridas através deles. Direitos que garantem a igualdade entre os povos, mas que, na prática, são mais valorados para as classes médias e altas e relativizados para as classes populares no Brasil.
A sociedade e o Estado devem entender que o único direito mitigado no cumprimento da pena é o da liberdade. Por conta dessa incompreensão da maior parte da população há quem despreze a profissão do advogado. É complicado até mesmo para os próprios profissionais que se sentem defendendo crimes e criminosos, quando na verdade estão aplicando normas e direitos que são assegurados na Constituição Federal.
O equilíbrio é necessário. A retribuição do ato criminoso deve acontecer, mas na medida em que a lei impõe. A privação de liberdade por si só é uma pena severa. E é importante ressaltar que não há como abarcar tantas pessoas em casas prisionais e serem custeadas pelo Estado. O próprio Estado deve tomar atitude de oferecer possibilidades para que os apenados trabalhem para se manter dentro desses recintos, estudarem e tenham amparo psicológico e religioso. O trabalho dignifica o homem e preenche a mente. Não há política de ressocialização no Brasil e se continuar como está nunca haverá. Não se trata de buscar privilégios, mas efetivar direitos que lhes são assegurados.
Os crimes continuarão acontecendo e as prisões não conseguem mais aglomerar o número de pessoas. Isso só aumenta a impunidade, a desproporcionalidade das penas e as desigualdades nos processos. Enquanto alguns cometem crimes simples passam anos em uma casa prisional, muitos deles, presos cautelares, outros cometem crimes mais graves e ofensivos à população e cumprem penas alternativas.
No Direito não há nada simples e fácil de resolução porque lida com direitos, com vidas e tutela de bens disponíveis e indisponíveis. Quando se trata de bens disponíveis, bens patrimoniais são bem mais viáveis a reposição, recuperação ou compensação. No entanto, quando se trata de bens indisponíveis, quando lida com a vida e a integridade física das pessoas, não há reposição, recuperação ou compensação do mesmos. Em todo o caso, o Direito foi criado para promover a justiça, colocando no Estado o poder de punir, desta forma a vingança social deve ser evitada em busca do que é justo. Não são normas escritas apenas que efetivam direitos, elas necessitam ser aplicadas concretamente para isso. É imprescindível a participação do advogado nessa batalha pela efetividade das normas e direitos, cumprindo sua função social.
REFERÊNCIAS:
ALEXY, Robert. Teoria da Argumentação Jurídica: a teoria do discurso nacional como teoria da fundamentação jurídica. 2ª Ed. São Paulo: Landy, 2005.
ALMEIDA, Dayse Coelho de. Acesso à Justiça e o Jus Postulandi das próprias partes do direito do trabalho: alcance da justiça ou quimera jurídica? – São Paulo: Letras Jurídicas, 2012.
ARAÚJO, Marcelo Cunha de. Só é preso quem quer! – São Paulo: Brasport, 2010.
BARBOSA, Rui (de Oliveira). Oração aos Moços e o Dever do Advogado; 4ª edição, Campinas: Russell Editores, 2010.
NALINI, José Renato. Formação Jurídica. (coordenação José Renato Nalini) – 2ª ed. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1999.
SANDEL, Michael J. Justiça: o que é fazer a coisa certa; (tradução 13ª Ed. De Heloisa Matias e Maria Alice Máximo). – 13ª edição, Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2014.
Bacharelanda em Direito da Faculdade Ages.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FERNANDES, Ysleane Santana. A função social do advogado: Profissionalismo e Ética no desempenho da profissão Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 26 nov 2015, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/45594/a-funcao-social-do-advogado-profissionalismo-e-etica-no-desempenho-da-profissao. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Gudson Barbalho do Nascimento Leão
Por: Maria Vitória de Resende Ladeia
Por: Diogo Esteves Pereira
Por: STEBBIN ATHAIDES ROBERTO DA SILVA
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