Resumo: O presente trabalho tem por objeto a tendência de “objetivação” (ou “abstrativização”) do controle difuso-incidental de constitucionalidade no Direito brasileiro. Delimitou-se o enfoque da pesquisa (1) nas manifestações jurisprudenciais no âmbito do Supremo Tribunal Federal e (2) nos textos normativos incluídos na Constituição Federal e na lei processual que evidenciam a referida tendência do sistema de controle de constitucionalidade brasileiro. A primeira parte do trabalho faz um panorama dos modelos de controle de constitucionalidade e do desenvolvimento do sistema brasileiro, para, em seguida, analisar quatro manifestações específicas da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal que exemplificam a referida tendência de “objetivação” do controle difuso-incidental de constitucionalidade. A segunda parte, por sua vez, enumera algumas alterações legislativas que serviram à instrumentalização da “objetivação” do controle concreto de constitucionalidade. Foram selecionados e analisados, à luz da doutrina e da jurisprudência do STF, os dispositivos normativos (incluídos na Constituição Federal e nos Códigos de Processo Civil de 1973 e de 2015) que positivaram aspectos ou efeitos abstratos para o controle concreto de constitucionalidade. Ao final, tecemos as conclusões a que chegamos ao final da pesquisa realizada.
Palavras-chave: Controle de constitucionalidade; controle difuso; controle incidental, controle concreto; “objetivação”; “abstrativização”; “eficácia transcendente”, “teoria da transcendência dos motivos”; “transcendência dos motivos determinantes”; súmula vinculante; repercussão geral; julgamento por amostragem; incidente de declaração de inconstitucionalidade nos tribunais.
Objetivos
Traçar um panorama das manifestações jurisprudenciais do Supremo Tribunal Federal e das alterações implementadas na lei processual que evidenciam a tendência de “objetivação” (ou “abstrativização”) pela qual passa o controle difuso-incidental de constitucionalidade no ordenamento jurídico brasileiro.
1. Introdução
Há alguns anos, efervesceu tanto na doutrina quanto na jurisprudência pátrias, especialmente no âmbito do Supremo Tribunal Federal, o tema da “objetivação” (ou “abstrativização”) do controle difuso-incidental de constitucionalidade.
Tal se evidenciou quando o Supremo Tribunal Federal chegou, por vezes, a aplicar ou reconhecer eficácia geral e efeito vinculante a decisões proferidas em sede de controle difuso-incidental de constitucionalidade, em aplicação dos chamados “efeitos transcendentes” da declaração de (in)constitucionalidade. Noutras oportunidades, o Supremo Tribunal aplicou ao controle difuso-incidental institutos próprios do controle concentrado-abstrato, como a modulação temporal dos efeitos da declaração de (in)constitucionalidade.
Além disso, viram-se inovações na Constituição Federal e na legislação ordinária (sobretudo no Código de Processo Civil de 1973) que positivaram a reputada tendência de “objetivação”, ao dotar o controle concreto de sistemática e efeitos próprios do modelo concentrado-abstrato de controle de constitucionalidade.
Passados alguns anos do surgimento da referida tendência, é possível fazer um panorama geral do seu conteúdo. Para tanto, partimos dos seguintes questionamentos: (1) “quais os fatos que evidenciam a reputada tendência de ‘objetivização’ (ou ‘abstrativização’) do controle difuso-incidental de constitucionalidade?”; e (2) “é possível, ante as manifestações encontradas, afirmar que a referida tendência tornou-se realidade?”.
Na busca pelas respostas aos dois questionamentos supra, o presente trabalho analisa, num primeiro momento, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, para, na segunda parte, repousar o enfoque na norma positiva, sem perder de vista a interpretação doutrinária e jurisprudencial (do STF) acerca dos dispositivos constitucionais e legais.
Em respeito à delimitação que conferimos à nossa pesquisa e à extensão que devemos observar no presente artigo, não se verá no presente trabalho um panorama doutrinário acerca do acerto ou não na aplicação pelo STF da “eficácia transcendente” às declarações incidentais de (in)constitucionalidade. Pelo mesmo motivo, selecionamos algumas das principais manifestações jurisprudenciais e legislativas que evidenciam a reputada tendência de “objetivação” do controle difuso-incidental. É certo que existem outros textos normativos e outras posições jurisprudenciais que evidenciam a “abstrativização” do controle concreto de constitucionalidade. Repousamos, entretanto, a nossa análise nas manifestações jurisprudenciais mais significativas e nos dispositivos constitucionais e legais cuja aplicação é mais incontroversa.
2. Do controle difuso-incidental de constitucionalidade à sua “objetivação”: a construção jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal.
2.1. Concepção tradicional do controle difuso de constitucionalidade no ordenamento brasileiro.
É conhecida a classificação do controle judicial de constitucionalidade em difuso e concentrado. Trata-se de classificação que leva em conta o órgão jurisdicional (critério subjetivo ou orgânico) competente para o exame da compatibilidade entre as leis ou atos normativos e a Constituição. O sistema difuso (ou modelo norte-americano) revela que a competência para o controle de constitucionalidade é conferida a todos os órgãos do poder judiciário – observadas as regras de competência, conforme lembra Pedro Lenza[1]. O controle concentrado (sistema austríaco ou europeu), por sua vez, denota a competência de apenas um órgão (que pode não ser um órgão jurisdicional, mas um órgão político) para o exame da constitucionalidade das leis ou atos normativos.
A par desta classificação existe ainda outra, que leva em conta a finalidade do controle de constitucionalidade[2]. Assim, a matéria constitucional pode ser levada ao exame do poder judiciário (ou do órgão político) como questão principal (principaliter tantum), requerendo-se como pedido da ação o reconhecimento da inconstitucionalidade (ou constitucionalidade) de determinada lei ou ato normativo. Neste caso, trata-se do chamado controle abstrato de constitucionalidade (também chamado de “principal”, “por via de ação” ou “por via direta”), manejado em processo constitucional de índole objetiva[3]. Já o controle incidental (chamado também de “concreto”, “por via de defesa” ou “por via de exceção”) veicula o questionamento da constitucionalidade como causa de pedir, para o acolhimento de um pedido principal, relativo a um direito subjetivo do jurisdicionado, examinado em um caso concreto (processo constitucional subjetivo). Como bem sintetiza Marcelo Novelino, “nessa hipótese, a verificação da constitucionalidade será um antecedente lógico, temporal e incidental para a formação do juízo de convicção acerca da controvérsia principal”. [4]
O modelo de controle de constitucionalidade adotado na Constituição brasileira de 1988 é jurisdicional misto, pois tanto é atribuído a todos os órgãos dotados de jurisdição (controle difuso), como a órgãos judiciais específicos (órgãos de cúpula e com competência originária[5]), competentes para a declaração em abstrato (também chamada “em tese”) da (in)constitucionalidade de leis ou atos normativos (controle concentrado-abstrato), quais sejam, o Supremo Tribunal Federal, quando o parâmetro de controle for a Constituição da República e os Tribunais de Justiça, quando o parâmetro for a Constituição do respectivo Estado.[6]
No ordenamento brasileiro, o controle difuso é realizado sempre incidentalmente (incidenter tantum)[7], no contexto de processos judiciais que almejam a defesa de direitos subjetivos, e, em regra, o controle concentrado é abstrato, vez que a competência atribuída reservadamente a um tribunal refere-se, em geral, ao exame da constitucionalidade em tese (abstratamente considerada) das leis e atos normativos[8], pela via das ações diretas de inconstitucionalidade (ADI), ações declaratórias de constitucionalidade (ADC) e a arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF), além da representação de inconstitucionalidade, nome dado pela CF/88, art. 125, § 2°, à ação de controle concentrado-abstrato no âmbito dos Estados.
O sistema de controle de constitucionalidade brasileiro nasceu com a República, sendo o modelo do controle difuso a opção adotada pela Constituição de 1891, por influência do Direito norte-americano. O controle concentrado-abstrato de constitucionalidade só veio a ser implantado por Emenda Constitucional (EC n° 16) à Constituição de 1946, em 26/11/1965. Criava-se a ação direta de inconstitucionalidade, de competência originária do Supremo Tribunal Federal. Contudo, ressalta Gilmar Mendes, “o modelo concreto continuou predominante da sistemática brasileira, até a promulgação da Constituição de 1988”. [9]
O controle difuso, surgido nos Estados Unidos especialmente a partir do caso Marbury v. Madison, de 1803, julgado pela Suprema Corte norte-americana, rompe, segundo Gilmar Mendes, com a tradição inglesa de soberania do parlamento, possibilitando ao juiz não aplicar uma lei por entendê-la incompatível com a constituição (judicial review). Tal mudança de paradigma transferiu a soberania (do parlamento) para a Constituição e a simplicidade do modelo – atribuição de competência para o juiz da causa proceder ao exame de constitucionalidade – possibilitou a sua adoção em diversos outros países. [10]
Tradicionalmente, o controle difuso de constitucionalidade – conforme formulado no Direito brasileiro, cujo ordenamento jurídico em muito mais se aproximava do modelo clássico do civil law, sem o desenvolvimento de um sistema de precedentes judiciais – sempre operava uma eficácia inter partes, dentro do processo judicial em que declarada a (in)constitucionalidade de determinada lei ou ato normativo. Tal declaração não extrapolaria os limites subjetivos da demanda, assim como os normais efeitos de uma sentença judicial, que valem apenas para as partes do processo.
Com o intuito de possibilitar que se conferisse eficácia erga omnes às decisões tomadas em sede de controle difuso-incidental pelo Supremo Tribunal Federal, a Constituição brasileira de 1934 atribuiu competência (art. 91, IV) ao Senado Federal para suspender a execução, no todo ou em parte, de qualquer lei ou ato, deliberação ou regulamento, quando hajam sido declarados inconstitucionais pelo Poder Judiciário – em decisão definitiva, como ressalta Pedro Lenza[11].
Como bem sintetizou Dalton Santos Morais:
É que o controle concreto e difuso de constitucionalidade amolda-se à perfeição ao modelo judicial norte-americano que, típico do sistema jurídico anglo-saxão, baseia-se na regra do stare decisis, segundo a qual os precedentes judiciais incidem com força vinculante aos demais juízes, em todos os demais casos com mesma ratio decidendi, constituindo-se em fonte primária do direito. Mas, no que tange ao sistema jurídico brasileiro, de origem romano-germânica, a sistemática constitucional de controle difuso/concreto revelou-se inicialmente problemática, vez que nossa ordem jurídica calcava-se na preponderância dos atos normativos, sendo a jurisprudência mera fonte secundária do direito, pois possuía caráter eminentemente persuasivo e não vinculativo.[12]
A competência conferida ao Senado Federal tinha o intuito, portanto, de compatibilizar o modelo difuso-incidental de constitucionalidade com a ausência de um sistema de precedentes judiciais vinculantes fundado no stare decisis[13]. Os juízes e tribunais não eram obrigados a seguir o precedente do Supremo Tribunal Federal, mas, uma vez suspensa a execução da lei (ou ato normativo) pelo Senado, esta não poderia ser mais aplicada. Nas palavras de Gilmar Mendes: “a suspensão teria o condão de dar alcance normativo ao julgado da Excelsa Corte”. [14]
Tal fórmula foi repetida em todas as constituições brasileiras posteriores, à exceção da Carta de 1937. Na Constituição de 1988, tal atribuição encontra-se enumerada entre as competências privativas do Senado, no art. 52, em cujo inciso X se lê: suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal.
Referida suspensão é materializada por resolução do Senado e tem eficácia perante todos a partir do momento em que publicada na imprensa oficial. Seus efeitos, portanto, são erga omnes (gerais) e ex nunc (não retroativos).[15]
Ocorre que a utilização de tal competência pelo Senado é discricionária. O órgão tem liberdade para, mediante um juízo de conveniência política, decidir pela suspensão ou não da lei ou ato normativo declarado inconstitucional. Tal deliberação, além de discricionária, não está submetida a prazo. Assim entendem tanto o Supremo Tribunal Federal como o Senado.
Em vista disso, alguns autores argumentam que tal atribuição não estaria sendo exercida a contento pelo Senado. Nesse sentido, Lucas Cavalcanti da Silva:
É bem verdade que o art. 52, X, da Constituição Federal poderia exercer papel importante nesse cenário, na medida em que abre as portas para o Senado Federal suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal. Porém, é fato que o Senado Federal pouco tem exercido essa competência, ainda que o aludido dispositivo frequente as constituições brasileiras desde 1934. Ademais, a competência em apreço é de exercício discricionário, de modo que a Câmara Alta, se não entender conveniente, pode deixar de suspender a execução de lei taxada de inconstitucional pela Suprema Corte. [16]
Tais circunstâncias fizeram nascer na doutrina e na jurisprudência do STF uma tendência de conferir eficácia erga omnes a decisões tomadas pela Corte em sede de controle difuso-incidental de constitucionalidade, mesmo sem a manifestação do Senado por meio resolução, na sistemática da CF/88, art. 52, X.
2.2. A teoria da transcendência dos motivos determinantes nas decisões do Supremo Tribunal Federal.
Em estudo publicado em 2009, quando efervescente no STF a tendência de conferir eficácia geral a decisões tomadas no exercício do controle difuso, Eduardo Appio (após discorrer sobre a concepção tradicional dos sistemas de controle de constitucionalidade) escreveu:
Este cenário mudou radicalmente desde fevereiro de 2008, quando então o Supremo Tribunal Federal passou a considerar que as decisões proferidas em sede de controle difuso (concreto), que até então atingiam apenas as partes (inter partes), também poderiam – a exemplo do controle concentrado – atingir terceiros. Passaram-se, então, quase quarenta e cinco anos, desde a adoção do sistema concentrado no Brasil, para que o Supremo Tribunal Federal pudesse dar os primeiros passos de aproximação entre os dois modelos. [17]
Em outra passagem, o autor complementa:
As decisões mais recentes do Supremo Tribunal Federal – especialmente as proferidas pelo Ministro Gilmar Mendes – têm emprestado efeito vinculante (até então exclusivo do controle concentrado ou abstrato) ao controle difuso (decisões que, em geral, emanam dos recursos extraordinários). O chamado “efeito transcendente” rompe, em princípio, com a tradição que preconiza que somente a parte dispositiva do julgado vincula terceiros estranhos ao processo em concreto. [18]
A teoria da transcendência dos motivos[19] (ou transcendência dos motivos determinantes da sentença[20]) defende que os princípios e motivos (ratio decidendi) de uma decisão do STF sejam vinculantes, mesmo quando tomadas em sede de controle difuso de constitucionalidade.
O juízo sobre a (in)constitucionalidade de lei ou ato normativo, no controle incidental, é formulado na fundamentação (motivação) do julgado, e não no dispositivo, já que o objeto do processo é a defesa de direitos subjetivos (e não a defesa da ordem constitucional objetiva). Com a aplicação da referida teoria, portanto, eventual declaração de inconstitucionalidade, formulada incidentalmente no julgamento de caso concreto, teria eficácia transcendente, vinculando os outros órgãos judiciais.
Como indicado acima por Eduardo Appio, dentre os Ministros do STF, é Gilmar Mendes quem mais reconhece efeitos erga omnes às declarações incidentais de (in)constitucionalidade prolatadas pelo Tribunal. Conforme se discorrerá com mais vagar adiante, o Ministro propõe uma “releitura”[21] do papel do Senado no controle de constitucionalidade, defendendo que o art. 52, X, da Constituição Federal teria passado por uma mutação constitucional[22], tendo agora a suspensão realizada pelo Senado o simples papel de conferir publicidade à decisão do Supremo:
Parece legítimo entender que a fórmula relativa à suspensão de execução da lei pelo Senado Federal há de ter simples efeito de publicidade. Dessa forma, se o Supremo Tribunal Federal, em sede de controle incidental, chegar à conclusão, de modo definitivo, de que a lei é inconstitucional, essa decisão terá efeitos gerais, fazendo-se a comunicação ao Senado Federal para que publique a decisão no Diário do Congresso. Tal como assente, não é (mais) a decisão do Senado que confere eficácia geral ao julgamento do Supremo. A própria decisão da Corte contém essa força normativa. [...] Assim, o Senado não terá a faculdade de publicar ou não a decisão, uma vez que não cuida de decisão substantiva, mas de simples dever de publicação, tal como reconhecido a outros órgãos políticos em alguns sistemas constitucionais (Constituição austríaca, art. 140, 5, publicação a cargo do Chanceler Federal, e Lei Orgânica da Corte Constitucional Alemã, art. 31, 2, publicação a cargo do Ministro da Justiça). A não publicação não terá o condão de impedir que a decisão do Supremo assuma a sua real eficácia. [23]
A análise desse entendimento no âmbito do STF será retomada adiante, quando do exame de dois processos julgados pelo Tribunal, quais sejam o Habeas Corpus HC 82.959-7/SP e a Reclamação Rcl 4.335/AC.
2.3. Manifestações específicas da “objetivação” do controle difuso-incidental de constitucionalidade na jurisprudência do STF.
A tendência de conferir eficácia geral às decisões tomadas pelo STF em casos concretos levou os estudiosos do Direito Constitucional a identificar uma “objetivação”[24] do controle difuso de constitucionalidade, dada a aproximação da declaração incidental de (in)constitucionalidade proferida pelo STF àquela prolatada em sede de controle concentrado-abstrato, tradicionalmente dotada de eficácia erga omnes. Não sem razão, falou-se também em “abstrativização”[25] e até “germanização”[26] do controle difuso.
Ressalte-se que a identificada “objetivação” não guarda relação apenas com a eficácia transcendente, pugnada por Gilmar Mendes e outros Ministros do STF. Há outras manifestações da aproximação entre os dois sistemas de controle de constitucionalidade, como a possibilidade de modulação temporal dos efeitos da decisão, prevista legalmente apenas para o controle concentrado-abstrato (Lei 9.869/99, art. 27), mas que vem sendo admitida, por analogia e de forma excepcional, em sede de controle incidental de constitucionalidade, quando realizado pelo Supremo Tribunal Federal.
Nos subitens a seguir, passaremos a analisar alguns casos (dos mais significativos) em que o STF manifestou entendimentos que denotam a tendência da “objetivação” do controle difuso de constitucionalidade no âmbito de sua jurisprudência.
2.3.1. O caso do Município de Mira Estrela/SP: modulação dos efeitos em controle difuso e eficácia transcendente.
No julgamento do Recurso Extraordinário n° 197.917[27], movido pelo Ministério Público do Estado de São Paulo contra a Câmara Municipal de Mira Estrela/SP, o Supremo Tribunal Federal deu parcial provimento para reduzir o número de vereadores do órgão legislativo, de onze para nove, declarando incidentalmente a inconstitucionalidade da Lei Orgânica Municipal, que fixou quantidade superior à admitida pela Constituição Federal, considerando a população do município.
Entretanto, por razões de segurança jurídica e julgando ser de interesse público, o STF, acompanhando proposta do Ministro Gilmar Mendes, conferiu efeitos pro futuro (prospectivos) à declaração incidental de constitucionalidade, para que a redução do número de vereadores tivesse efeito apenas na legislatura seguinte.
Em seu voto, Gilmar Mendes faz considerações sobre a aplicabilidade da modulação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade (prevista na Lei 9.868/99, art. 27, apenas para as ações de controle concentrado) no controle difuso de constitucionalidade:
“Como se pode ver, se se entende inconstitucional a lei municipal em apreço, impõe-se que se limitem os efeitos dessa declaração (pro futuro).
Embora a Lei 9.868, de 10 de novembro de 1999, tenha autorizado o Supremo Tribunal Federal a declarar a inconstitucionalidade com efeitos limitados, é lícito indagar sobre a admissibilidade do uso dessa técnica de decisão no âmbito do controle difuso.” [28]
Ao final, o Ministro fundamenta a necessidade de modular os efeitos temporais da declaração de inconstitucionalidade:
“No caso em tela, observa-se que eventual declaração de inconstitucionalidade com efeito ex tunc ocasionaria repercussões em todo o sistema vigente, atingindo decisões que foram tomadas em momento anterior ao pleito que resultou na atual composição da Câmara Municipal: fixação do número de vereadores, fixação do número de candidatos, definição do quociente eleitoral. Igualmente, as decisões tomadas posteriormente ao pleito também seriam atingidas, tal como a validade da deliberação da Câmara Municipal nos diversos projetos e leis aprovados.”[29]
De fato, a aplicação ao julgado dos efeitos tradicionais da declaração de inconstitucionalidade no controle difuso, quais sejam, nulidade e eficácia retroativa (efeito ex tunc), provocaria também a nulidade todas as deliberações (incluindo a produção legislativa) da Câmara Municipal tomadas com a composição definida na lei inconstitucional. Tal situação, no entendimento do Supremo Tribunal Federal, afrontaria a segurança jurídica e o interesse público, autorizando que se conferisse, excepcionalmente, efeitos prospectivos (pro futuro) para a declaração de inconstitucionalidade.
Tal julgado foi, segundo Pedro Lenza[30], o leading case em matéria de aplicação de efeito ex nunc ou pro futuro ao controle difuso de constitucionalidade. A aplicação de uma técnica de decisão (modulação dos efeitos) legalmente prevista apenas para o controle concentrado ao controle difuso é, indubitavelmente, uma grande manifestação da tendência de “objetivação” do controle difuso-incidental de constitucionalidade.
Quanto aos efeitos transcendentes, durante o julgamento, asseveraram os Ministros que a situação não era uma peculiaridade de Mira Estrela/SP. Noticiou-se que outros tantos municípios no país também tinham quantidade de vereadores superior à admissível diante do regramento constitucional, o que significava onerar em demasia os orçamentos municipais. Diante de tal quadro, alguns Ministros pugnaram por um tratamento uniforme da questão, especialmente pela proximidade das eleições municipais do ano de 2004, sugerindo que tal uniformização fosse feita a partir do decidido no Recurso Extraordinário em apreço.
Gilmar Mendes entendeu que dava-se naquela oportunidade efeito transcendente à decisão do Tribunal, manifestando-se pela superação da intervenção do Senado (a suspender a lei inconstitucional, na forma da CF/88, art. 52, X), que, ao seu ver, tinha função de emprestar mera publicidade ao julgado. O Ministro Marco Aurélio ressaltou que a lei declarada inconstitucional era uma lei local e eventual suspensão, portanto, não teria eficácia em todo território nacional.
A solução encontrada foi a edição da Resolução 21.702/2004, pelo Tribunal Superior Eleitoral, acolhendo Representação formulada pelo Ministério Público Eleitoral. No art. 1° da referida Resolução se lê:
Art. 1º: Nas eleições municipais deste ano, a fixação do número de vereadores a eleger observará os critérios declarados pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE nº 197.917, conforme as tabelas anexas.
O Ministro Sepúlveda Pertence, presidente, à época, do TSE, assim declarou em seu voto para a edição da resolução:
“A manifestação do Supremo Tribunal Federal – ‘Guarda da Constituição’ - tomada por maioria qualificada de votos, ao cabo de aprofundado debate - traduz a interpretação definitiva do art. 29, IV, da Lei Fundamental.” [31]
É fato que a eficácia geral da decisão fora materializada com a edição de resolução pelo TSE. Contudo, os fundamentos do julgamento do STF (ratio decidendi) operaram efeitos para fora do processo, cuja decisão, ainda que tomada no exercício do controle difuso-incidental pelo Supremo, fora considerada a “interpretação definitiva” do texto constitucional.
Posteriormente, a questão fora resolvida em definitivo com a promulgação da Emenda Constitucional nº 58/2009, que, alterando a redação do inciso IV do caput do art. 29 da CF/88, positivou 24 (vinte e quatro) limites máximos de número de Vereadores a compor as Câmaras Municipais, na proporção do número de habitantes dos municípios, em lugar dos largos 3 (três) limites, estabelecidos em intervalos (com quantidades mínimas e máximas), vistos na redação originária da Constituição Federal.
2.3.2. A adoção da corrente concretista geral no julgamento do mandado de injunção.
O mandado de injunção é uma ação prevista na Constituição Federal (art. 5°, LXXI) para sanar uma omissão inconstitucional, situação em que a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício de direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania. Assim, o titular de um direito dessa espécie assegurado pela Constituição mas que não pode exercê-lo por falta de norma regulamentadora tem a possibilidade de impetrar mandado de injunção para que lhe seja viabilizado o exercício do direito, liberdade ou prerrogativa. Trata-se, portanto, de uma ação em que o controle é realizado de forma incidental, em processo constitucional subjetivo, que visa à defesa de direito do demandante.
Tradicionalmente, o Supremo Tribunal Federal adotava a corrente não concretista no julgamento dos mandados de injunção. Significa dizer que, ao julgar tal ação, o STF se limitava a reconhecer formalmente a omissão legislativa, comunicando-a ao órgão competente para a elaboração da norma regulamentadora. Até o ano de 2007, esse foi o entendimento adotado em quase todas os julgamentos de mandados de injunção pela Corte. [32]
Ao contrário da anterior, as correntes concretistas admitem que o órgão jurisdicional implemente a normatização faltante, possibilitando a fruição do direito constitucional não regulamentado.
A manifestação da “objetivação” do controle difuso de constitucionalidade ocorreu quando da adoção, pelo Supremo Tribunal Federal, da corrente concretista geral. Por esta, no dizer de Pedro Lenza, “o STF legisla no caso concreto, produzindo a decisão efeitos erga omnes até que sobrevenha norma integrativa pelo legislativo”[33].
Tal entendimento foi adotado pelo Tribunal quando do julgamento dos Mandados de Injunção n° 670, 708 e 712, que tinham por objeto o direito de greve dos servidores públicos, previsto na CF/88, art. 37, VII, mas dependente de regulamentação por lei especifica. Além de declarar a omissão legislativa, o STF determinou “a aplicação das Leis 7.701/1988 e 7.783/1989 [a primeira dispõe sobre o processamento de ações coletivas no TST e a segunda regulamenta o direito de greve dos trabalhadores submetidos ao regime trabalhista] aos conflitos e às ações judiciais que envolvam a interpretação do direito de greve dos servidores públicos civis”[34].
Originou-se, portanto, de um processo constitucional subjetivo – em que o controle da omissão inconstitucional, realizado incidentalmente, tinha efeitos, tradicionalmente, não concretos e inter partes – um provimento jurisdicional de caráter geral, com efeito regulamentador da norma constitucional, possibilitando a sua aplicação.
2.3.3. A “manifesta improcedência” de ação direta de inconstitucionalidade (ADI) que questione norma expressamente declarada constitucional pelo plenário do STF no exercício do controle difuso-incidental de constitucionalidade.
Em abril de 2008, foi proposta perante o STF a ADI n° 4071, questionando o art. 56 da Lei nº 9.430/96. O relator, Min. Menezes Direito, indeferiu a petição inicial ao argumento de “manifesta improcedência”, visto que o dispositivo questionado fora declarado constitucional naquele mesmo ano, quando do julgamento de dois recursos extraordinários pelo plenário da Corte.
O Partido da Social Democracia Brasileira – PSDB, autor da ação direta, interpôs agravo regimental, submetendo a questão ao plenário do STF. O Tribunal, por maioria, desproveu o agravo, mantendo a decisão do relator:
Agravo regimental. Ação direta de inconstitucionalidade manifestamente improcedente. Indeferimento da petição inicial pelo Relator. Art. 4º da Lei nº 9.868/99.
1. É manifestamente improcedente a ação direta de inconstitucionalidade que verse sobre norma (art. 56 da Lei nº 9.430/96) cuja constitucionalidade foi expressamente declarada pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, mesmo que em recurso extraordinário.
2. Aplicação do art. 4º da Lei nº 9.868/99, segundo o qual "a petição inicial inepta, não fundamentada e a manifestamente improcedente serão liminarmente indeferidas pelo relator".
3. A alteração da jurisprudência pressupõe a ocorrência de significativas modificações de ordem jurídica, social ou econômica, ou, quando muito, a superveniência de argumentos nitidamente mais relevantes do que aqueles antes prevalecentes, o que não se verifica no caso.
[...]
5. Agravo regimental a que se nega provimento. [35]
Do referido acórdão, retiramos duas conclusões: (1) não cabe, a princípio, ADI contra lei ou ato normativo expressamente declarado constitucional pelo pleno do STF (mesmo em controle incidental); (2) fica ressalvada a possibilidade de alteração da jurisprudência, o que pressupõe “significativas modificações de ordem jurídica social ou econômica” ou “a superveniência de argumentos nitidamente mais relevantes”[36].
Denota-se que as declarações de constitucionalidade prolatadas pelo pleno do Supremo Tribunal Federal em sede de controle incidental podem prejudicar a realização de controle concentrado-abstrato pela via da ação direta de inconstitucionalidade (ADI). É forte sinal da aproximação dos dois sistemas de controle de constitucionalidade e da “objetivação” do controle difuso-incidental.
2.3.4. Julgamento sobre o uso da reclamação contra decisão que contraria declaração de inconstitucionalidade prolatada pelo STF em controle difuso-incidental.
Em 23/02/2006 o plenário do Supremo Tribunal Federal declarou incidentalmente, no julgamento do Habeas Corpus n° 82.959/SP, a inconstitucionalidade do art. 2°, § 1°, da Lei 8.072/90, que determinava o cumprimento de pena em regime integralmente fechado, nos casos de prática de crimes hediondos. A Corte considerou que referido dispositivo contrariava a garantia da individualização da pena, prevista no art. 5°, XLVI, da Constituição Federal.
Ocorre que o Supremo Tribunal Federal, durante o julgamento e, expressamente, no acórdão, teceu considerações acerca da aplicabilidade daquela declaração de inconstitucionalidade a outros casos.
O Ministro Nelson Jobim, à época presidente do Tribunal, ressaltou ao final do Julgamento:
“Se os colegas concordarem, gostaria de explicitar, como já feito pelo Ministro Sepúlveda Pertence, que, na verdade, não estamos decidindo o caso concreto, estamos decidindo o regime de progressão ou não do sistema.” [37]
O Ministro Gilmar Mendes, tendo em vista que a aplicação da declaração de inconstitucionalidade a casos com penas (cumpridas em regime integralmente fechado) já extintas poderia ocasionar a responsabilização civil do Estado, propôs que se conferisse eficácia ex nunc (não retroativa) às penas ainda em cumprimento:
“Eu parti da premissa, foi todo o desenvolvimento de meu voto, no sentido de que declaramos essa lei inicialmente constitucional - não há dúvida em relação a isso -, e muitas penas se extinguiram segundo esse regime. A Constituição cogita de responsabilidade civil do Estado, ou por erro judicial, ou por prisão excessiva, até mesmo. É uma das hipóteses claras de responsabilidade civil do Estado, por conta desse aspecto. Daí eu ter ressaltado que o efeito ex nunc deve ser entendido como aplicável às condenações ainda suscetíveis de serem submetidas ao regime de progressão.” [38]
E assim foi explicitado no acórdão:
ACÓRDÃO
[...]
O Tribunal, por votação unânime, explicitou que a declaração incidental de inconstitucionalidade do preceito legal em questão não gerará conseqüências jurídicas com relação às penas já extintas nesta data, pois esta decisão plenária envolve, unicamente, o afastamento do óbice representado pela norma ora declarada inconstitucional, sem prejuízo da apreciação, caso a caso, pelo magistrado competente, dos demais requisitos pertinentes ao reconhecimento da possibilidade de progressão. [39]
De tudo se vê que, embora prolatada no julgamento de Habeas Corpus, nítido processo constitucional de índole subjetiva, no exercício do controle difuso-incidental, a declaração de inconstitucionalidade fora tratada como se estivesse sendo prolatada num julgamento em controle concentrado-abstrato, procedendo-se, inclusive, à modulação de efeitos (aplicação de eficácia ex nunc), para que a declaração de inconstitucionalidade não atingisse as penas já extintas pelo cumprimento em regime integralmente fechado.
Em razão dessa aparente aplicação de efeitos erga omnes à declaração de inconstitucionalidade, a Defensoria Pública da União ajuizou perante o Supremo Tribunal Federal, no mesmo ano de 2006, a Reclamação n° 4.335/AC, atacando decisões do Juiz de Direito da Vara de Execuções Penais de Rio Branco/AC, que não concedeu a progressão de regime a réus condenados por crimes hediondos, com fundamento na vedação legal imposta pelo art. 2°, § 1°, da Lei 8.072/90. Quanto à declaração de inconstitucionalidade do dispositivo, prolatada meses antes pelo plenário do STF, o magistrado de primeira instância havia decidido:
“[...]conquanto o Plenário do Supremo Tribunal, em maioria apertada (6 votos x 5 votos), tenha declarado incidenter tantum a inconstitucionalidade do art. 2°, § 1° da Lei 8.072/90 (Crimes Hediondos), por via do Habeas Corpus n. 82.959, isto após dezesseis anos dizendo que a norma era constitucional, perfilho-me a melhor doutrina constitucional pátria que entende que no controle difuso de constitucionalidade a decisão produz efeitos inter partes." [40]
Procurava-se, então, por meio da reclamação, garantir a autoridade de decisão do Supremo, que, embora no exercício do controle difuso-incidental de constitucionalidade, declarou a norma inconstitucional.
Na oportunidade, restaria, portanto, ao Supremo decidir acerca do cabimento ou não de reclamação contra decisão que não segue o entendimento do Tribunal quando este declara incidentalmente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo. Tratar-se-ia de definir a eficácia da declaração incidental de inconstitucionalidade pelo STF em hipótese à qual não sobreveio a suspensão da eficácia da lei (na forma do art. 52, X, da Constituição) pelo Senado. [41]
O Ministro Gilmar Mendes, relator do processo, esposando o seu já conhecido entendimento a respeito dos efeitos da declaração de (in)constitucionalidade prolatada incidentalmente pelo STF e do papel da resolução do Senado que suspende a eficácia da lei declarada inconstitucional pelo Tribunal, votou pela procedência da Reclamação:
“Assim, parece legítimo entender que, hodiernamente, a fórmula relativa à suspensão de execução da lei pelo Senado Federal há de ter simples efeito de publicidade. Desta forma, se o Supremo Tribunal Federal, em sede de controle incidental, chegar à conclusão, de modo definitivo, de que a lei é inconstitucional, essa decisão terá efeitos gerais, fazendo-se a comunicação ao Senado Federal para que este publique a decisão no Diário do Congresso. Tal como assente, não é (mais) a decisão do Senado que confere eficácia geral ao julgamento do Supremo. A própria decisão da Corte contém essa força normativa.
[...]
Com efeito, verifica-se que a recusa do Juiz de Direito da Vara de Execuções da Comarca de Rio Branco, no Estado do Acre, em conceder o benefício da progressão de regime, nos casos de crimes hediondos, desrespeita a eficácia erga omnes que deve ser atribuída à decisão deste Supremo Tribunal Federal, no HC 82.959, que declarou a inconstitucionalidade do artigo 2°, § 1°, da Lei n. 8.072/1990.
Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE a presente reclamação, para cassar decisões proferidas pelo Juiz de Direito da Vara de Execuções Penais da Comarca de Rio Branco, no Estado do Acre, que negaram a possibilidade de progressão de regime relativamente a cada um dos interessados acima mencionados.” [42]
O Ministro Eros Grau seguiu o voto do relator. Já os Ministros Sepúlveda Pertence, Joaquim Barbosa e Ricardo Lewandowski votaram pelo não conhecimento da reclamação, mas concediam habeas corpus de ofício. Do voto do último extraem-se trechos exemplificativos do entendimento contrário ao do relator:
“Com efeito, se o dispositivo em questão assinala, com todas as letras, que compete ao Senado Federal a suspensão de norma declarada inconstitucional por esta Corte, assim o é, literalmente. Ainda que se possa, no mérito, discordar do que nele se contém, o preceito em tela constitui o Direito posto, e que não admite, dada a taxatividade com que está vazado, maiores questionamentos.
[...]
Reconheço que, na prática cotidiana dos tribunais, as questões decididas pelo STF, no controle difuso de constitucionalidade, têm considerável impacto tanto nas decisões da própria Corte como naquelas proferidas nas demais instâncias jurisdicionais. Não extraio, porém, desse fato, a força necessária para atribuir novos contornos ao art. 52, X, da Constituição Federal.” [43]
Entenderam, portanto, os Ministros Sepúlveda Pertence, Joaquim Barbosa e Ricardo Lewandowski, que não seria possível suprimir ou mudar a interpretação (ou seja, reconhecer a suposta “mutação constitucional” proposta por Gilmar Mendes) da competência atribuída privativamente ao Senado, pela CF/88, art. 52, X, para suspender a eficácia da lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal.
Após o voto do Ministro Lewandowski, na sessão de 16/05/2013, pediu vista o Ministro Teori Zavascki.
A questão seguia indefinida no plenário do Supremo Tribunal Federal. O Ministro Dias Toffoli, apesar de não votar no processo (dado o seu antecessor, Sepúlveda Pertence, haver votado), manifestou-se, nos debates da sessão de 16/05/2013, em consonância com o entendimento de Gilmar Mendes[44]. Já o Ministro Teori Zavascki, o próximo a votar, ao discorrer sobre o cabimento de ação rescisória contra decisão que contraria precedente do STF tomado no controle difuso, já havia escrito em sua tese de mestrado:
“O STF é o guardião da Constituição. Ele é o órgão autorizado pela própria Constituição a dar a palavra final em temas constitucionais. A Constituição, destarte, é o que o STF diz que ela é. Eventuais controvérsias interpretativas perante outros tribunais perdem, institucionalmente, toda e qualquer relevância frente ao pronunciamento da Corte Suprema. Contrariar o precedente tem o mesmo significado, o mesmo alcance, em termos pragmáticos, que o de violar a Constituição. A existência de pronunciamento do Supremo sobre matéria constitucional acarreta, no âmbito interno dos demais tribunais, a dispensabilidade da instalação do incidente de declaração de inconstitucionalidade (CPC, art. 481, parágrafo único), de modo que os órgãos fracionários ficam, desde logo, submetidos, em suas decisões, à orientação traçada pelo STF. É nessa perspectiva, pois, que se deve aquilatar o peso institucional dos pronunciamentos do Supremo Tribunal Federal, mesmo em controle difuso.” [45]
Não surpreenderia, portanto, que o Ministro votasse em consonância com o relator pelo provimento da Reclamação, empatando, assim, a votação.
Entretanto, o Ministro Teori Zavascki, apesar de reconhecer (1) a eficácia expansiva das decisões do Supremo Tribunal Federal (viabilizada, em grande medida, pelas alterações legislativas analisadas na segunda parte deste trabalho) e (2) a aproximação, no ordenamento pátrio, dos modelos do civil law e do commom law, com a criação e desenvolvimento de uma cultura de valorização dos precedentes judiciais, defendeu uma interpretação restritiva da competência atribuída ao STF pela CF/88, art. 102, I, l, para o conhecimento da Reclamação Constitucional:
“O mesmo sentido restritivo há de ser conferido à norma de competência sobre cabimento de reclamação. É que, considerando o vastíssimo elenco de decisões da Corte Suprema com eficácia expansiva, e a tendência de universalização dessa eficácia, a admissão incondicional de reclamação em caso de descumprimento de qualquer delas, transformará o Supremo Tribunal Federal em verdadeira Corte executiva, suprimindo instâncias locais e atraindo competências próprias das instâncias ordinárias. Em outras palavras, não se pode estabelecer sinonímia entre força expansiva e eficácia vinculante erga omnes a ponto de criar uma necessária relação de mútua dependência entre decisão com força expansiva e cabimento de reclamação. Por outro lado, conforme ficou decidido na Reclamação (AgRg) 16.038 (Min. Celso de Mello, 2ª Turma, j. 22.10.2013, Dje de ) ‘o remédio constitucional da reclamação não pode ser utilizado como um (inadmissível) atalho processual destinado a permitir, por razões de caráter meramente pragmático, a submissão imediata do litígio ao exame direto do Supremo Tribunal Federal’.
Assim, sem negar a força expansiva de uma significativa gama de decisões do Supremo Tribunal Federal, é de ser mantida a sua jurisprudência, segundo a qual, em princípio, a reclamação somente é admitida quando ajuizada por quem tenha sido parte na relação processual em que foi proferida a decisão cuja eficácia se busca preservar.”[46]
Assim, segundo o Ministro, o cabimento da Reclamação ficaria restrito (1) às hipóteses expressamente previstas na Constituição ou em lei e (2) em caso atribuição de eficácia erga omnes às decisões, notadamente nas ações do controle concentrado de constitucionalidade e quando haja súmula vinculante. “Por imposição do sistema e para dar sentido prático ao caráter expansivo das decisões sobre a constitucionalidade das normas tomadas pelo STF no âmbito do controle incidental”[47], o Ministro reconhece, ainda, (3) a possibilidade da autoridade de tais decisões serem controladas por reclamação quando ajuizada pelos legitimados para as ações do controle concentrado, enumerados taxativamente na CF/88, art. 103.
Considerou, portanto, o Ministro Teori Zavascki, que a Reclamação nº 4.335/AC era incabível ao tempo do seu ajuizamento (por ser fundada tão somente em declaração de inconstitucionalidade de lei tomada no controle difuso-incidental). Entretanto, considerando a superveniência da Súmula Vinculante nº 26[48], editada em 16/12/2009, o que autoriza a propositura de reclamação, o Ministro considerou tal fato superveniente (com fundamento no art. 462 do CPC/73[49]) para conhecer da demanda e deferir o pedido.
O voto do Ministro Teori Zavascki foi acompanhado pelos Ministros Luís Roberto Barroso, Rosa Weber e Celso de Mello. O Ministro Marco Aurélio, por sua vez, alinhou-se ao entendimento dos Ministros Sepúlveda Pertence, Joaquim Barbosa e Ricardo Lewandowski, pelo não conhecimento da reclamação mas concedendo o habeas corpus de ofício.
Ao fim, a Reclamação nº 4.335/AC restou conhecida e provida, mas apenas dois votos – do Ministro Gilmar Mendes, relator, e Eros Grau, já aposentado – fundamentaram a decisão na mutação constitucional do art. 52, X, da CF/88, entendimento no qual foram acompanhados, apenas nos debates, pelo Ministro Dias Toffolli, que, apesar de não votar no feito, manifestou a sua concordância com a tese do relator.
Diante do resultado do julgamento houve autores, a exemplo de Pedro Lenza, a afirmar que “o STF não adotou a tese da abstrativização do controle difuso”[50]. Com o devido respeito, não parece a melhor conclusão a ser atingida após acompanhar tão importante julgamento e ler a íntegra de seu acórdão. Uma leitura aprofundada dos votos e dos debates mostra que, a todo tempo, foram reafirmados (1) a aproximação dos modelos de controle de constitucionalidade; (2) a aproximação do ordenamento jurídico brasileiro – originaria e tradicionalmente, um típico exemplo de sistema do modelo romano-germânico (ou civil law) – do common law e do stare decisis; (3) a eficácia expansiva das decisões do Supremo Tribunal Federal e (4) e progressiva implementação de instrumentos (alguns dos quais serão analisados na segunda parte deste trabalho) que viabilizam a concessão de eficácia geral às decisões tomadas, sobretudo pelo STF, em sede de controle difuso-incidental de constitucionalidade.
Ao nosso ver, a tese da “abstrativização” ou “objetivação” do controle difuso-incidental é evidenciada por todos esses aspectos, sendo mais ampla e abrangente do que a tese a respeito da mutação constitucional do art. 52, x, da CF/88. Esta última tese e a teoria da transcendência dos motivos determinantes da sentença, sim, parecem ter sido rechaçadas pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da Reclamação nº 4.335/AC.
Tal julgamento, na prática, declarou tão somente o não cabimento de reclamação constitucional diante da não aplicação, pelas instâncias ordinárias, da declaração de inconstitucionalidade proferida pelo STF em sede de controle difuso-incidental de constitucionalidade. Além do óbice consistente na literalidade do texto do art. 52, x, da CF/88, fica clara a preocupação com volume de reclamações que poderiam chegar ao Supremo, como se vê de manifestação do próprio Ministro Gilmar Mendes durante os debates:
“Agora, o Ministro Teori realmente traz uma abordagem muito interessante em que ele manifesta a preocupação com as consequências da simples afirmação da eficácia erga omnes, ou com o efeito vinculante, porque isso daria ensejo a sucessivas reclamações, o que, obviamente, é algo digno de ser pensado.”[51]
Além disso, foi bem recepcionada por outros Ministros a sugestão de Teori Zavascki no sentido de serem aceitas as reclamações quando propostas pelos legitimados para a propositura da ADI e demais ações do controle concentrado. Veja-se a manifestação do Ministro Gilmar Mendes:
“Sua Excelência inclusive propôs, então, uma alternativa à reclamação geral, que é essa reclamação intermediada pelos legitimados para esses casos em que signifique, que pode ser até uma solução que vimos lidando com o tema da repercussão geral, onde também estamos tateando com esse embate. Veja que nós temos discutido se cabe ou não reclamação nesse tipo de matéria e não temos respondido afirmativamente, não por doxa, não por uma doutrina, mas por razões pragmáticas, por medo de trazer para cá uma avalanche de processos, pode ser, então, também uma solução.”[52]
No mesmo sentido, o Ministro Ricardo Lewandowski:
“Eu, data venia, louvando o voto e prometendo meditar, inclusive, sobre esses aspectos da possibilidade de os legitimados, para ação direta de inconstitucionalidade, ajuizarem reclamações no caso do controle difuso – e acho que nem teríamos, Ministro Celso de Mello, maioria agora para decidirmos sobre essa questão, porque alguns já se aposentaram, a Ministra Cármen está ausente justificadamente, o Ministro Toffoli não vota nessa questão –, de maneira que, talvez, numa outra ocasião, num outro caso, pudéssemos retomar este assunto que me parece ser extremamente importante.”[53]
Acreditamos que, ao invés de negar a teoria da “abstrativização” do controle difuso de constitucionalidade, tal julgamento reafirmou tal tese, havendo os Ministros discorrido sobre vários aspectos que a evidenciam. Definiu-se, em verdade, um limite para a sua aplicação, qual seja, o não cabimento de Reclamação Constitucional em face de decisão que não observe a declaração de inconstitucionalidade emanada do Supremo Tribunal Federal em sede de controle difuso-incidental.
Além disso, vislumbra-se ainda uma ampliação da eficácia de tais decisões se aceita, em julgamentos futuros, a proposta do Ministro Teori Zavascki no sentido de serem aceitas as reclamações quando propostas pelos legitimados previstos no art. 103 da CF/88.
No mais, seguem hígidas e reafirmadas as inúmeras outras evidências da “objetivação” ou “abstrativização” do controle difuso-incidental de constitucionalidade, sobretudo no contexto do crescimento (1) da cultura dos precedentes judiciais no ordenamento jurídico brasileiro e (2) da eficácia expansiva das decisões dos Tribunais Superiores, especialmente do STF. É manifestando este entendimento que o então Presidente da Corte, Ministro Ricardo Lewandowski, encerra o julgamento:
“E o voto do Ministro Teori Zavascki, que foi sufragado por vários outros Ministros, constitui um avanço muito grande na reafirmação da força das decisões desta Suprema Corte.”[54]
3. A “OBJETIVAÇÃO” NO ÂMBITO LEGISLATIVO: A POSITIVAÇÃO DA TENDÊNCIA EM SEDE CONSTITUCIONAL E LEGAL.
Até agora foram relatadas as manifestações da tendência de “objetivação” do controle difuso-incidental oriundas da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Ocorre que tal fenômeno encontra, hoje, formulas previstas na Constituição Federal e na lei processual. Significa dizer que, hodiernamente, há institutos positivados constitucional e legalmente (especialmente nos Códigos de Processo Civil de 1973 e 2015) que viabilizam a geração de efeitos da declaração incidental de (in)constitucionalidade perante outros processos, outros órgãos jurisdicionais e até mesmo para a administração pública. Alguns desses institutos originaram-se da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e foram, posteriormente, positivados. Outros foram construção do constituinte/legislador.
Passemos, então, a analisá-los.
3.1. A “objetivação” na Constituição Federal: as inovações trazidas pela Emenda Constitucional n° 45/2004.
A Emenda Constitucional n° 45/2004 (conhecida por “reforma do judiciário”) trouxe duas inovações que solidificaram a tendência de “abstrativização” do controle difuso/incidental de constitucionalidade: a súmula vinculante (CF/88, art. 103-A) e a repercussão geral no recurso extraordinário (CF/88, art. 102, § 3°).
A respeito da súmula vinculante, a CF/88, no art. 103-A, dispõe que:
CF/88, art. 103-A, caput: O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei.
O parágrafo 1° do mesmo artigo estabelece o objeto do enunciado da súmula vinculante:
CF/88, art. 103-A, § 1º: A súmula terá por objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, acerca das quais haja controvérsia atual entre órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica.
Sobre o advento da súmula vinculante e a tendência de “abstrativização” do controle difuso, discorre Marcelo Novelino:
“[...] é possível constatar no direito brasileiro uma progressiva aproximação entre o controle concreto e o controle abstrato de constitucionalidade. Ao conferir um efeito próprio do controle abstrato a um entendimento adotado em decisões proferidas a partir da análise de um caso concreto, a súmula vinculante se insere neste ambiente reforçando ainda mais a tendência de abstrativização do controle concreto de constitucionalidade.” [55]
Assim, a partir de reiteradas decisões em matéria constitucional, tomadas em sede de controle incidental de constitucionalidade, o STF pode (mediante a aprovação por dois terços dos seus Ministros) criar norma jurídica com efeito vinculante para os demais órgãos jurisdicionais e a administração pública. O desrespeito à sumula vinculante viabiliza, inclusive, a propositura de reclamação constitucional (CF/88, art. 102, I, l) diretamente perante o Supremo Tribunal Federal, que, julgando-a procedente, anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial (CF/88, art. 103-A, § 3°).
Quanto à repercussão geral no recurso extraordinário, tratemos no item a seguir.
3.2. A repercussão geral e o julgamento por amostragem: a “objetivação” do recurso extraordinário.
Fredie Didier Jr. e Leonardo Cunha definem a “objetivação” do recurso extraordinário como “a transformação do recurso extraordinário, que, embora instrumento de controle difuso de constitucionalidade das leis, tem servido, também, ao controle abstrato”. [56]
Com efeito, a EC 45/2004, ao acrescentar o § 3° ao art. 102 da Constituição Federal, criou novo requisito para a admissibilidade do recurso extraordinário, qual seja, a demonstração pelo recorrente da repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso, nos termos da lei. Regulamentando a previsão constitucional, foi adicionado (pela Lei nº 11.418, de 19 de dezembro de 2006) o art. 543-A ao Código de Processo Civil, em cujo § 1° se lê que para efeito da repercussão geral, será considerada a existência, ou não, de questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico, que ultrapassem os interesses subjetivos da causa.
Sobre a relação entre o instituto da repercussão geral e a “objetivação” do recurso extraordinário, discorrem Fredie Didier Jr. e Leonardo Cunha:
“Em razão da tendência de transformação do recurso extraordinário em instrumento do controle difuso e abstrato da constitucionalidade das leis [...], é correta a observação de que o pronunciamento do Plenário do STF sobre a repercussão geral de determinada questão vincula os demais órgãos do tribunal e dispensa, inclusive, que se remeta o tema a um novo exame do Plenário, em recurso extraordinário que verse sobre a questão cuja amplitude da repercussão já tenha sido examinada[...].” [57]
Vê-se que, hodiernamente, o recurso extraordinário, apesar de ser um instrumento para defesa de situações subjetivas, deve, para ser conhecido, veicular matéria relevante, como questões constitucionais que sirvam de fundamento a demandas múltiplas ou questões que, em razão da sua magnitude constitucional, devem ser examinadas pelo STF em controle difuso de constitucionalidade[58]. Nas palavras de Marcelo Novelino:
“[...] a exigência de demonstração da repercussão geral das questões constitucionalmente discutidas no recurso extraordinário, como requisito intrínseco de admissibilidade recursal, demonstra que o recurso extraordinário vem perdendo seu caráter eminentemente subjetivo, para assumir um papel de defesa da ordem constitucional objetiva.” [59]
O STF já manifestou entendimento no sentido de que, além da decisão do plenário que reconhece ou não a repercussão geral de determinada matéria, as decisões de mérito nos julgamentos dos recursos extraordinários com repercussão geral[60] seriam vinculantes para os demais órgãos do poder judiciário:
RECLAMAÇÃO. ALEGAÇÃO DE INOBSERVÂNCIA POR MAGISTRADO DE PRIMEIRA INSTÂNCIA DA DECISÃO PROFERIDA PELO PLENÁRIO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NO JULGAMENTO DO MÉRITO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 583.955-RG/RJ. INSTITUTO DA REPERCUSSÃO GERAL. COMPETÊNCIA DOS TRIBUNAIS DE ORIGEM PARA SOLUCIONAR CASOS CONCRETOS. CORREÇÃO DA EVENTUAL DESOBEDIÊNCIA À ORIENTAÇÃO ESTABELECIDA PELO STF PELA VIA RECURSAL PRÓPRIA, EM JULGADOS DE MÉRITO DE PROCESSOS COM REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. RECLAMAÇÃO NÃO CONHECIDA.
1. As decisões proferidas pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal quando do julgamento de recursos extraordinários com repercussão geral vinculam os demais órgãos do Poder Judiciário na solução, por estes, de outros feitos sobre idêntica controvérsia.
2. Cabe aos juízes e desembargadores respeitar a autoridade da decisão do Supremo Tribunal Federal tomada em sede de repercussão geral, assegurando racionalidade e eficiência ao Sistema Judiciário e concretizando a certeza jurídica sobre o tema.
[...]
6. A competência é dos Tribunais de origem para a solução dos casos concretos, cabendo-lhes, no exercício deste mister, observar a orientação fixada em sede de repercussão geral.
7. A cassação ou revisão das decisões dos Juízes contrárias à orientação firmada em sede de repercussão geral há de ser feita pelo Tribunal a que estiverem vinculados, pela via recursal ordinária.
[...]
9. Nada autoriza ou aconselha que se substituam as vias recursais ordinária e extraordinária pela reclamação.
[...]
11. No caso presente tal medida não se mostra necessária.
12. Não-conhecimento da presente reclamação. [61]
Do julgado, vê-se que, apesar de entender vinculantes as decisões dos recursos extraordinários com repercussão geral, o Supremo Tribunal Federal não admitiu a interposição de reclamação por violação ao precedente. Há, portanto, de se submeter a alegação de desrespeito ao precedente (julgamento de recurso extraordinário com repercussão geral) às vias recursais, cabendo ao STF julgá-la apenas em sede de eventual recurso extraordinário.
O art. 543-B (também acrescentado pela Lei nº 11.418, de 19 de dezembro de 2006) do Código de Processo Civil de 1973 instituiu procedimento para a análise da repercussão geral quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica controvérsia (caput): os tribunais de origem selecionam um ou mais recursos extraordinários representativos da controvérsia e os encaminham ao Supremo Tribunal Federal, enquanto os demais ficam sobrestados até o pronunciamento da Corte (§ 1°). Se o STF não reconhecer a repercussão geral da matéria os recursos sobrestados consideram-se não admitidos (§ 2°). Reconhecida a repercussão geral e julgados pelo STF os recursos extraordinários representativos da controvérsia, os tribunais de origem aplicam o entendimento aos recursos sobrestados, retratando-se (quando a decisão recorrida for em sentido contrário ao decidido pelo STF) ou julgando os recursos prejudicados (quando a decisão recorrida estiver em conformidade com o entendimento adotado pelo STF) (§ 3°). Tem-se, então, o julgamento por amostragem dos recursos extraordinários.
Tendo em vista a generalidade da decisão que examina a existência de repercussão geral, vinculante para os recursos sobrestados e para os futuros recursos acerca da matéria, o art. 543-A, § 6°, do CPC/73, admitiu a intervenção do amicus curiae no procedimento que precede essa decisão (nas palavras do dispositivo, o Relator poderá admitir, na análise da repercussão geral, a manifestação de terceiros, subscrita por procurador habilitado, nos termos do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal).
Sobre o caráter objetivo da análise da repercussão geral, Fredie Didier Jr. e Leonardo Cunha concluem:
“É possível concluir, sem receio, que o incidente para a apuração da repercussão geral por amostragem é um procedimento de caráter objetivo, semelhante ao procedimento da ADIN, ADC e ADPF, e de profundo interesse público, pois se trata de exame de uma questão que diz respeito a um sem-número de pessoas, resultando na criação de uma norma jurídica de caráter geral pelo STF. É mais uma demonstração do fenômeno de ‘objetivação’ do controle difuso de constitucionalidade das leis[...].” [62]
No Código de Processo Civil de 2015 (Lei nº 13.105/2015), a repercussão geral está prevista no art. 1.035. Passa-se, a seguir, a analisar as principais inovações, no que interessa ao objeto do presente trabalho.
O § 3º do referido dispositivo amplia as hipóteses em que a repercussão geral é presumida de modo absoluto. O CPC/73, art. 543-A, § 4º, já estabelecia a existência de repercussão geral sempre que o recurso impugnar decisão contrária a súmula ou jurisprudência dominante do Tribunal (o STF). Agora, além dessa hipótese (prevista no art. 1.035, § 3º, inciso I, do CPC/2015), a lei processual presume de forma absoluta a existência de repercussão geral quando o recurso impugnar acórdão que: tenha sido proferido em julgamento de casos repetitivos (inciso II) e tenha reconhecido a inconstitucionalidade de tratado ou de lei federal, nos termos do art. 97 da Constituição Federal (inciso III).
O § 5º do referido dispositivo, por sua vez, prevê que, reconhecida a repercussão geral, o relator no Supremo Tribunal Federal determinará a suspensão do processamento de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, que versem sobre a questão e tramitem no território nacional. Vê-se, de plano, a ampliação dos efeitos para outros processos, eis que, no regramento do CPC/73, art. 543-B, § 1º, dava-se apenas o sobrestamento dos outros recursos extraordinários, não selecionados para o exame da existência de repercussão geral da matéria, até o pronunciamento definitivo da Corte. Agora, determina-se a suspensão de todos os processos, individuais ou coletivos, que versem sobre a questão. Denota-se a intenção do legislador de viabilizar a imediata aplicação da solução jurídica a todos os feitos, desde a primeira instância.
Referida suspensão, no entanto, tem prazo máximo de um ano, dentro do qual deverá ser julgado o recurso extraordinário paradigma, tendo este, para tanto, preferência sobre os demais feitos, ressalvados os que envolvam réu preso e os pedidos de habeas corpus (CPC/2015, art. 1.035, § 9º). Não ocorrendo o julgamento no referido prazo, cessa, em todo o território nacional, a suspensão dos processos, que retomarão seu curso normal (§ 10º).
Já o julgamento por amostragem, previsto no CPC/73 para o recurso extraordinário no art. 543-B e para o recurso especial no art. 543-C, teve a sua disciplina unificada no CPC/2015, em Subseção própria, entre os arts. 1.036 a 1.041. Tal decisão do legislador, ao minudenciar também o procedimento, demonstra a preocupação da nova codificação processual com a uniformização da jurisprudência a partir dos Tribunais Superiores. Isso fica explicitado no art. 926 do novo código, que estabelece que os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente. De tudo se vê um terreno mais fértil ainda para a afirmação da eficácia expansiva das decisões do Supremo Tribunal Federal.
A intervenção do amicus curiae no procedimento de análise da repercussão geral também foi prevista no CPC/2015, art. 1.035, § 4º. Já a intervenção de tal figura processual no efetivo julgamento da controvérsia, que no CPC/73 só constava expressamente no art. 543-C, § 4º, referente ao recurso especial, aparece agora, com a unificação do procedimento operada pelo CPC/2015, no art. 1.038, I, que dispõe que o Relator poderá solicitar ou admitir manifestação de pessoas, órgãos ou entidades com interesse na controvérsia, considerando a relevância da matéria e consoante dispuser o regimento interno.
Há, portanto, numa concisa sistematização, três espécies de inovações legislativas, positivadas ora na Constituição ora em lei que permitem constatar a “objetivação” do recurso extraordinário: (1) a inclusão da repercussão geral, como requisito de admissibilidade do recurso, a exigir uma amplitude da questão constitucional discutida no processo, que deve extrapolar o mero interesse das partes; (2) o caráter nitidamente objetivo da análise, realizada pelo STF, da existência de repercussão geral, que valerá para todos os outros processos, com a possibilidade de intervenção do amicus curiae nesta fase; e (3) a possibilidade de julgamento por amostragem de recursos extraordinários, aplicando-se aos demais processos a solução encontrada pelo STF nos recursos representativos da controvérsia, sendo também possível, na fase de julgamento, a intervenção do amicus curiae.
3.3. O incidente de declaração de inconstitucionalidade nos tribunais.
O art. 97 da Constituição Federal de 1988 estabelece que somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público. Trata-se da cláusula de reserva de plenário ou regra do full bench.
Os arts. 480 a 482 do Código de Processo Civil de 1973 (cuja redação final fora determinada pelas Leis 9.756, de 17/12/1998 e 9.868, de 10/11/1999) regulamentaram a forma como a questão da inconstitucionalidade seria julgada nos tribunais: arguida a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, seria ouvido o Ministério Público e a questão submetida à turma (ou câmara) competente, pelo regimento do tribunal, para o conhecimento do processo (art. 480). Se a alegação de inconstitucionalidade fosse rejeitada, prosseguiria o julgamento, já que não há reserva de plenário para a declaração de constitucionalidade. Contudo, se acolhida a arguição, seria lavrado o acórdão e a questão da inconstitucionalidade submetida ao julgamento do pleno (ou corte especial) do tribunal (art. 481). Com a afetação do julgamento da inconstitucionalidade da lei ou ato normativo ao pleno ou órgão especial tem-se o incidente de declaração de inconstitucionalidade.
Apesar de a declaração de (in)constitucionalidade pelo pleno ou órgão especial se dar incidenter tantum, no julgamento de um caso concreto, há doutrina que confere um caráter objetivo a este julgamento:
“Embora esse incidente seja um instrumento processual típico do controle difuso, a análise da constitucionalidade da lei é feita em abstrato. Trata-se de incidente processual de natureza objetiva (é exemplo de processo objetivo, semelhante ao processo da ADIN ou ADC). [...]
É por isso que, também à semelhança do que já ocorre na ADIN e ADC, é possível a intervenção de amicus curiae neste incidente (§§ do art. 482).” [63]
De fato, a análise da reputada inconstitucionalidade é feita em tese. Ou seja, o pleno ou órgão especial do tribunal não examinam o caso concreto, mas sim a compatibilidade, em abstrato, entre a lei ou ato normativo e a Constituição, tal como se dá nas ações do controle concentrado. Tanto é assim, que podem se manifestar no incidente (1) o Ministério Público, (2) a pessoa jurídica de direito público responsável pela edição do ato, (3) os titulares do direito de propositura das ações do controle concentrado de constitucionalidade (enumerados na CF/88, art. 103) e (4) outros órgãos ou entidades, na qualidade de amicus curiae (CPC/73, art. 482, §§ 1°, 2° e 3°).
Ademais, a natureza objetiva do julgamento foi ressaltada pelo parágrafo único do art. 481, do CPC, ao dispor que a questão da inconstitucionalidade não seria submetida ao pleno ou órgão especial quando já houvesse pronunciamento destes. Assim, a decisão no incidente declaração de inconstitucionalidade vincula os órgãos do tribunal nos julgamentos seguintes.[64]
Outra nota de aproximação entre os modelos concreto e abstrato de controle de constitucionalidade quanto a este julgamento no âmbito dos tribunais proveio do mesmo art. 481, parágrafo único do CPC/73 (incluído pela Lei nº 9.756, de 17/12/1998), ao dispor que a questão da inconstitucionalidade também não seria submetida ao pleno ou órgão especial quando já houvesse pronunciamento do plenário do Supremo Tribunal Federal sobre a questão. O STF entende que o pronunciamento do seu plenário, a obstar a instauração do incidente, pode ter se dado mesmo em controle difuso:
[...] DECISÃO ATACADA BASEADA EM PRECEDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL RESERVA DE PLENÁRIO. VIOLAÇÃO NÃO VERIFICADA. Não há como prosperar extraordinário interposto contra acórdão embasado em precedente do Plenário do Supremo Tribunal Federal (HC 90.900). Negativa de seguimento conforme o art. 557 do Código de Processo Civil e o art. 21, §1º, do Regimento Interno/STF. Inocorrente violação do art. 97 da Constituição Federal diante da existência de pronunciamento de inconstitucionalidade da Lei nº 11.819/2005 do Estado de São Paulo pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal (art. 481, parágrafo único, do Código de Processo Civil). Agravo regimental não provido. [65]
Tal interpretação do art. 481, parágrafo único, do CPC/73, conforme realizada pelo STF, é mais uma evidência da aproximação entre os sistemas concreto e abstrato de controle de constitucionalidade, vez que reconhece eficácia vinculante (aos órgãos judiciais de segunda instância) de precedentes do pleno da Corte Suprema, prolatados no exercício de controle incidental. Desta feita, existindo pronunciamento do plenário do Supremo Tribunal Federal sobre a (in)constitucionalidade de determinada lei ou ato normativo, ainda que prolatada incidentalmente, em sede de controle difuso, não se submeterá ao pleno ou órgão especial do tribunal local a alegação de inconstitucionalidade. Forçoso concluir que caberá ao órgão fracionário (turma ou câmara) aplicar de imediato o entendimento do pleno do STF acerca da (in)constitucionalidade da norma.
O regramento estabelecido pelos arts. 480 a 482 do CPC/73 (com redação dada pela Lei nº 9.756, de 17/12/1998) restou mantido pelo CPC de 2015, com meras mudanças na redação, entre os arts. 948 a 950.
4. CONCLUSÃO
Após a pesquisa e a realização do panorama em que consiste o presente trabalho, concluímos que a identificada “objetivação” do controle difuso-incidental de constitucionalidade afigura-se hoje em uma realidade. Mais do que isso, a “abstrativização”, aptidão para geração de efeitos gerais e abstratos, é a atual vocação do controle difuso-incidental de constitucionalidade (notadamente aquele exercido pelo STF) no Direito pátrio.
É bem verdade que algumas questões ainda são muito controvertidas na doutrina e mesmo na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Além disso, como bem aponta Marcelo Novelino, a teoria da eficácia transcendente dos motivos determinantes teve a sua aplicação rejeitada em julgados mais recentes do STF. [66]
Contudo, se parece ter passado no âmbito da Corte Suprema a efervescência da atribuição e reconhecimento de efeitos transcendentes a decisões tomadas no controle difuso, por outro lado, a tendência de “objetivação” ganhou a marca da definitividade ao receber a chancela do legislador, ante a positivação dos vários institutos (súmula vinculante, repercussão geral, julgamento por amostragem, incidente de declaração de inconstitucionalidade, entre outros), na Constituição e na lei processual cível, que instrumentalizam a produção de efeitos gerais e até vinculantes por decisões tomadas em sede de controle difuso-incidental de constitucionalidade.
Há também, nos dias atuais, uma constante busca pelo “desafogamento” do Poder Judiciário. A explosão do consumo, a intensificação das relações econômicas e sociais, a democratização do acesso à justiça e a constitucionalização do direito privado provocaram um aumento na litigiosidade no Brasil, com o crescimento no número de processos judiciais em trâmite, inclusive no Supremo Tribunal Federal, última instância a exercer a jurisdição constitucional. Alterações legislativas como as analisadas na segunda parte do presente trabalho já se inserem no contexto das tentativas de “enxugar” o judiciário, ao restringir o acesso às últimas instâncias recursais e aplicar decisões uniformes a demandas repetitivas.
Diante dessa situação, não faltam vozes[67] na doutrina a identificar a produção de efeitos transcendentes por julgamentos prolatados em controle difuso-incidental como uma alternativa viável para a solução dessa problemática, mediante a criação de um sistema de precedentes judiciais no ordenamento pátrio, fundado no stare decisis norte-americano. E foi justamente essa a inspiração no legislador para a elaboração do Código de Processo Civil de 2015, no qual se dedica um capítulo (Capítulo 1 do Título I do Livro III) com regras direcionadas aos juízes e tribunais, com vistas à promoção da uniformização e estabilização e vinculação da jurisprudência.[68]
REFERÊNCIAS
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[1] LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 285.
[2] NOVELINO, Marcelo. Manual de direito constitucional. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2013, p. 238-239.
[3] Idem.
[4] Idem. No mesmo sentido, Gilmar Mendes, em definição mais analítica: “No controle incidental a inconstitucionalidade é arguida no contexto de um processo ou ação judicial, em que a questão da inconstitucionalidade configura um incidente, uma questão prejudicial que deve ser decidida pelo Judiciário. Cogita-se também de inconstitucionalidade pela via da exceção, uma vez que o objeto da ação não é o exame de constitucionalidade da lei.” (MENDES, Gilmar Ferreira. O Sistema Brasileiro de Controle de Constitucionalidade. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva; MENDES, Gilmar Ferreira; NASCIMENTO, Carlos Valder (Coord.). Tratado de direito constitucional, vol. 1. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 530-531).
[5] LENZA, Pedro. Ob. cit. p. 286.
[6] Sobre tal modelo, discorre Gilmar Mendes: “o controle misto de constitucionalidade congrega os dois sistemas de controle, o de perfil difuso e o de perfil concentrado. Em geral, nos modelos mistos defere-se aos órgãos ordinários do Poder Judiciário a prerrogativa de afastar a aplicação da lei nas ações e processos judiciais, mas se reconhece a determinado órgão de cúpula – Tribunal Supremo ou Corte Constitucional – a competência para proferir decisões em determinadas ações de perfil abstrato ou concentrado” (MENDES, Gilmar Ferreira. Ob. Cit. p. 533).
[7] DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Curso de Direito Processual Civil, v. 3: Meios de impugnação às decisões judiciais e processo nos tribunais. 9. ed. Salvador: JusPODIVM, 2011, p. 345.
[8] Como exceção à regra geral e exemplo de controle concentrado-concreto (ou concentrado-incidental) de constitucionalidade, Marcelo Novelino cita a representação interventiva, vista na CF/88, art. 36, III (NOVELINO, Marcelo. Ob. cit. p. 242). Pedro Lenza, por sua vez, traz como exemplos de tal controle excepcional, a competência originária do STF para julgar habeas corpus em favor e habeas data contra Presidente da República e outras autoridades federais (CF/88, art. 102, I, “d”) e “o controle prévio ou preventivo exercido pelo parlamentar, mediante impetração de mandado de segurança [perante o STF] para ver respeitado o devido processo legislativo” (LENZA, Pedro. Ob. cit. p. 286).
[9] MENDES, Gilmar Ferreira. Ob. Cit. p. 496.
[10] MENDES, Gilmar Ferreira. Ob. Cit. p. 533.
[11] LENZA, Pedro. Ob. cit. p. 265.
[12] MORAIS, Dalton Santos. Crítica à caracterização da atuação senatorial no controle concreto de constitucionalidade brasileiro como função de publicidade: a importância da jurisdição constitucional ordinária e os limites da mutação constitucional. Revista de Processo, vol. 179, Out/2009, DTR/2009/260. p. 50 e ss.
[13] Idem.
[14] MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 1302 (Grifo nosso).
[15] LENZA, Pedro. Ob. cit. p. 296. O autor destaca, entretanto, o art. 1°, § 2° do Decreto n. 2.346/97, que estabelece a produção de efeitos retroativos para a resolução do Senado Federal em relação (exclusivamente) à administração pública federal, direta e indireta.
[16] SILVA, Lucas Cavalcanti da. Controle difuso de constitucionalidade e o respeito aos precedentes do Supremo Tribunal Federal. In: MARINONI, Luiz Guilherme (Coord.). A Força dos Precedentes: Estudo dos Cursos de Mestrado e Doutorado em Direito Processual Civil da UFPR. Salvador: JusPODIVM, 2010, p. 152 (Grifos nossos).
[17] APPIO, Eduardo. Controle difuso de constitucionalidade: modulação dos efeitos, uniformização da jurisprudência e coisa julgada. Curitiba: Juruá, 2009, p. 17.
[18] Ibidem, p. 39 (Grifos no original).
[19] NOVELINO, Marcelo. Ob. cit. p. 251.
[20] LENZA, Pedro. Ob. cit. p. 297.
[21] MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Ob. cit. p. 1307.
[22] Ibidem, p. 1313.
[23] Idem.
[24] DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Ob. cit. p. 344.
[25] LENZA, Pedro. Ob. cit. p. 297; NOVELINO, Marcelo. Ob. cit. p. 249.
[26] MORAIS, Dalton Santos. Ob. cit. p. 50.
[27] BRASIL. Supremo Tribunal Federal, Tribunal Pleno. RE n° 197.917. Relator: Min. Maurício Corrêa. Julgado em 24/03/2004. Publicado em 31/03/2004.
[28] Idem. Íntegra do Acórdão disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=235847>. Acesso em 25/01/2014.
[29] Idem.
[30] LENZA, Pedro. Ob. cit. p. 293.
[31] BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Resolução 21.702/2004. Inteiro teor disponível em: < http://www.tse.gov.br/sadJudLegislacao/pesquisa/actionBRSSearch.do?configName=legislacaoEleitoral&pageForm=formSimples.jsp&toc=false&docIndex=0&numero=21702§ionNameString=completo>. Acesso em 25/01/2014.
[32] NOVELINO, Marcelo. Ob. cit. p. 604.
[33] LENZA, Pedro. Ob. cit. p. 1128.
[34] BRASIL. Supremo Tribunal Federal, Tribunal Pleno. MI n° 708. Relator: Min. Gilmar Mendes. Julgado em 25/10/2007. Publicado em 31/10/2008. Grifos nossos.
[35] BRASIL. Supremo Tribunal Federal, Tribunal Pleno. ADI n° 4.071-AgR. Relator: Min. Menezes Direito. Julgado em 22/04/2009. Publicado em 16/10/2009. Grifos nossos.
[36] Idem.
[37] BRASIL. Supremo Tribunal Federal, Tribunal Pleno. HC 82.959/SP. Relator: Min. Nelson Jobim. Julgado em 23/02/2006. Publicado em 13/03/2006. Integra do acórdão disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=79206>. Acesso em 28/01/2014.
[38] Idem (Grifos no original).
[39] Idem (Grifos nossos).
[40] Trecho da decisão do reclamado, citada na decisão monocrática do Relator em: BRASIL. Supremo Tribunal Federal, decisão monocrática do Relator Min. Gilmar Mendes. Rcl n° 4.335. Decisão de 21/08/2006. Publicada em 25/08/2006. Integra da decisão disponível em <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28Rcl%24%2ESCLA%2E+E+4335%2ENUME%2E%29&base=baseMonocraticas&url=http://tinyurl.com/c4z34zg>. Acesso em 28/01/2014.
[41] Como bem ressaltou o Ministro Ricardo Lewandowski em seu voto: “Trata-se de saber se a decisão proferida no HC 82.959, quanto ao art. 2º, § 1º, da Lei 8.072/1990, em sua redação primitiva, é dotada de eficácia erga omnes, independente ou não do cumprimento do disposto no art. 52, X, da Constituição da República, que confere ao Senado a competência privativa para ‘suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal’.” (BRASIL. Supremo Tribunal Federal, voto do Min. Ricardo Lewandowski. Rcl n° 4.335. Integra do voto disponível em < http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=630101 >. Acesso em 16/02/2016.
[42] BRASIL. Supremo Tribunal Federal, voto do Relator Min. Gilmar Mendes. Rcl n° 4.335. Integra do voto disponível em < http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=630101 >. Acesso em 16/02/2016.
[43] BRASIL. Supremo Tribunal Federal, voto do Min. Ricardo Lewandowski. Rcl n° 4.335. Integra do voto disponível em < http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=630101 >. Acesso em 16/02/2016.
[44] O vídeo do julgamento deste processo na sessão de 16/05/2013 encontra-se disponível em: <http://www.youtube.com/watch?v=mRpFaL4jKag&feature=youtu.be>. Acesso em: 28/01/2014.
[45] ZAVASCKI, Teori Albino. Eficácia das sentenças na jurisdição constitucional. 2000. 187 f. Dissertação (Mestrado em Direito. Orientador: Carlos Alberto Alvaro de Oliveira) Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre. p. 153-154. Disponível em: <http://hdl.handle.net/10183/2521>. Acesso em: 28/01/2014.
[46] BRASIL. Supremo Tribunal Federal, voto do Min. Teori Zavascki. Rcl n° 4.335. Integra do voto disponível em < http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=630101 >. Acesso em 16/02/2016.
[47] Idem.
[48] Súmula Vinculante nº 26: Para efeito de progressão de regime no cumprimento de pena por crime hediondo ou equiparado, o juízo de execução observará a inconstitucionalidade do art. 2º da Lei n. 8.072, de 25 de julho de 1990, sem prejuízo de avaliar se o condenado preenche ou não, os requisitos objetivos e subjetivos do benefício, podendo determinar, para tal fim, de modo fundamentado, a realização de exame criminológico.
[49] CPC/73, art. 462: Se, depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito influir no julgamento da lide, caberá ao juiz tomá-lo em consideração, de ofício ou a requerimento da parte, no momento de proferir a sentença.
[50] LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 422 e 424.
[51] BRASIL. Supremo Tribunal Federal, manifestação verbal do Ministro Gilmar Mendes durante os debates. Rcl n° 4.335. Integra do acordão, incluindo as transcrições dos debates, disponível em <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=630101>. Acesso em 16/02/2016.
[52] Idem.
[53] BRASIL. Supremo Tribunal Federal, manifestação verbal do Ministro Ricardo Lewandowski durante os debates. Rcl n° 4.335. Integra do acordão, incluindo as transcrições dos debates, disponível em <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=630101>. Acesso em 16/02/2016.
[54] Idem.
[55] NOVELINO, Marcelo. Ob. cit. p. 911 (Grifos nossos).
[56] DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Ob. cit. p. 344.
[57] Ibidem, p. 334-335.
[58] Ibidem, p. 333-334
[59] NOVELINO, Marcelo. Ob. cit. p. 249.
[60] Ressalte-se que a inclusão do requisito da repercussão geral se deu mediante alterações na Constituição, no Código de Processo Civil e no Regimento Interno do STF, entendendo o Tribunal que aquele passou a ser exigível apenas em 03/05/2007, data da publicação da emenda regimental n° 21/2007, a mais recente dentre as mencionadas normas regulamentadoras.
[61] BRASIL. Supremo Tribunal Federal, Tribunal Pleno. Rcl 10.793/SP. Relator: Min. Ellen Gracie. Julgado em 13/04/2011. Publicado em 06/06/2011.
[62] DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Ob. cit. p. 340.
[63] Ibidem, p. 577.
[64] Idem.
[65] BRASIL. Supremo Tribunal Federal, Primeira Turma. RE 636647 AgR/SP. Relatora: Min. Rosa Weber. Julgado em 30/10/2012. Publicado em 07-12-2012.
[66] NOVELINO, Marcelo. Ob. cit. p. 290.
[67] Apenas a título de exemplificação: MARINONI, Luiz Guilherme. Aproximação crítica entre as jurisdições de civil law e de common law e a necessidade de respeito aos precedentes no Brasil. Revista da Faculdade de Direito - UFPR, Curitiba, n.47, p.29-64, 2008; APPIO, Eduardo. Ob. cit. e MORAIS, Dalton Santos. Ob. cit.
[68] MACHADO JÚNIOR, Dario Ribeiro. Novo código de processo civil: anotado e comparado: lei n. 13.105, de 16 de março de 2015. Dario Ribeiro Machado Junior e outros; coordenação Paulo Cezar Pinheiro Carneiro, Humberto Dalla Bernardina de Pinho. Rio de Janeiro: Forense, 2015. p. 542.
Bacharel em Direito pela UFPE/ Faculdade de Direito do Recife, pós-graduado em Direito Constitucional pela Universidade Anhanguera-UNIDERP, Técnico Judiciário e Assessor de Magistrado no Tribunal de Justiça de Pernambuco.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MARCIO WINICIUS VIEIRA DE MORAES MARANHãO, . A "Objetivação" do Controle Difuso-Incidental de Constitucionalidade no Brasil: as evidências jurisprudenciais e legislativas Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 26 fev 2016, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/46065/a-quot-objetivacao-quot-do-controle-difuso-incidental-de-constitucionalidade-no-brasil-as-evidencias-jurisprudenciais-e-legislativas. Acesso em: 23 dez 2024.
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