RESUMO: Este artigo aborda a evolução das negociações coletivas de trabalho, bem como a sua importância em face das diversas relações de trabalho oriundas do efeito da globalização. A negociação coletiva como forma de solução de conflito no âmbito empresarial.
PALAVRAS CHAVES: negociação coletiva – formas de solução de conflitos – arbitragem - mediação.
SUMÁRIO: 1 – INTRODUÇÃO. 2 – EVOLUÇÃO HISTÓRICA. 3 – DEFINIÇÃO. 4 - OBJETIVOS DA NEGOCIAÇÃO COLETIVA. 5 - CLASSIFICAÇÃO DAS NEGOCIAÇÕES COLETIVAS. 6 – PRINCÍPIOS. 7 – CARACTERÍSTICAS. 8 - INSTITUTOS DA NEGOCIAÇÃO COLETIVA. 9 - NATUREZA JURÍDICA DA NEGOCIAÇÃO COLETIVA. 10 - CONCILIAÇÃO, MEDIAÇÃO E ARBITRAGEM. 11 - ARBITRAGEM NO DIREITO COLETIVO DO TRABALHO. 12 - FÓRMULAS PARAETERÔNOMAS DE SOLUÇÕES DO CONFLITO. 13 – CONCILIAÇÃO. 14 - MEDIAÇÃO NO DIREITO COLETIVO DO TRABALHO. 15 – CONCLUSÃO. 16 – REFERÊNCIAS.
1 - INTRODUÇÃO
A negociação coletiva, é um dos principais instrumentos, tanto para empregador, quanto para o empregado, sendo certo que em diversas situações se trata de uma exigência legal como pré-requisito para dar sequência a um próximo passo processual.
Os benefícios decorrentes da negociação coletiva são inúmeros, eis que proporciona às partes a possibilidade do debate das questões controvertidas, evitando desgastes ou a necessidade de submeter determinados casos ao Poder Judiciário, além de gastos, tempo e o desgaste da relação.
Conforme nossa legislação trabalhista, o objetivo do legislador é fornecer instrumentos para que as partes, esgotem os meios administrativos e extrajudiciais, antes de submeter eventual situação ao Poder Judiciário, e desta forma aperfeiçoar a relação entre as elas.
2 -EVOLUÇÃO HISTÓRICA
As primeiras manifestações referentes a negociação coletiva, ocorreram na Grã-Bretanha, sendo uma espécie de convenção coletiva, ajustada entre empregados e empregadores, conforme as palavras de Arnaldo Sussekind, que assim leciona:
"A convenção coletiva de trabalho nasceu na Grã-Bretanha quando, a partir de 1824, com a revogação da lei sobre delito de coalizão, as trade unions, então organizadas pelos trabalhadores, passaram a ajustar com empregadores condições de trabalho a serem respeitadas na relação de emprego".
Posteriormente, a Holanda em 1909 e França em 1919, segundo Süssekind, foram os primeiros países a legislar sobre o tema, sendo a lei francesa modelo ao Decreto Legislativo nº. 21.761, assinado por Getúlio Vargas em 23/08/1932.
A hierarquia constitucional das convenções coletivas somente foi consagrada pelas Constituição do México em 1917 e Pela Constituição Alemanha em 1919, sendo, hoje, comuns, tanto no continente europeu como no Brasil.
Um dos pilares do Direito do Trabalho brasileiro é a aplicação do princípio da proteção do empregado, o qual contempla o trabalho como forma de dignidade e valorização do homem, ao contrário do que ocorria na Grécia na antiguidade, onde o conceito de dignidade era restrita a participação dos negócios na população local, enquanto que o trabalho compreendia apenas as atividade braçais.
Conforme leciona Amauri Mascaro Nascimento:
“O Direito do Trabalho na sociedade pré-industrial iniciou-se com a escravidão, passando pelas corporações de ofício e locação, para então chegar na sociedade industrial onde se verifica o trabalho assalariado, dando o ponta pé inicial para a criação das leis trabalhistas evoluindo até a sociedade pós-industrial.”
Continuando a análise da evolução histórica, os dois marcos que evidenciaram a importância do trabalho e sua garantia legal, foram a Revolução Francesa e a Revolução Industrial, sendo que primeira constituição que tratou do Direito do Trabalho, foi a Mexicana em 1917.
No Brasil, a primeira constituição a fazer menção ao Direito do Trabalho foi a de 1934.
Conforme Amauri Mascaro Nascimento:
“O direito do trabalho consolidou-se com uma necessidade dos ordenamentos jurídicos em função das suas finalidades sociais”.
Atualmente, em nossa Carta Magna, temos um capítulo integral, que delimita as regras e os preceitos gerais aplicáveis ao Direito do Trabalho.
3 - DEFINIÇÃO
Inicialmente, podemos definir a negociação coletiva, tal como consta na Convenção 154 da Organização Internacional do Trabalho, em seu artigo 2º, que assim define:
Artigo 2.º
Para os efeitos desta Convenção, o termo "negociação coletiva" compreende todas as negociações que se realizam entre um empregador, um grupo de empregadores ou uma ou mais organizações de empregadores, de um lado, e uma ou mais organizações de trabalhadores, de outro, para:
a) definir condições de trabalho e termos de emprego; e/ou
b) regular as relações entre empregadores e trabalhadores; e/ou
c) regular as relações entre empregadores ou suas organizações e uma organização de trabalhadores ou organizações de trabalhadores.
Em outras palavras, se trata de uma forma de composição de conflitos coletivos trabalhistas, onde os representantes dos empregados e dos empregadores buscam superar conflitos de interesses, com o objetivo de regular a relação entre eles, bem como celebrar contratos coletivos, convenções coletivas ou acordos coletivo, onde serão fixadas condições de trabalho.
Ou ainda, é o conjunto de procedimentos adotados pelos representantes dos trabalhadores, de um lado, e do(s) empregador(es), de outro lado, que tem por objetivo pactuar a autorregulamentação das condições de trabalho, observadas as garantias legais.
Conforme Neto e Cavalcante:
“A negociação coletiva é o instrumento pelo qual os atores sociais trabalhistas normalizam as suas relações de trabalho. É um instrumento de natureza complexa, apresentando, simultaneamente, aspectos políticos, sociais, econômicos etc.”
Já José Augusto Rodrigues Pinto, conceitua negociação coletiva da seguinte forma:
“entendida como o complexo de entendimentos entre representações de trabalhadores e empresas, ou suas representações, para estabelecer condições gerais de trabalho destinadas a regular as relações individuais entre seus integrantes ou solucionar outras questões que estejam perturbando a execução normal dos contratos.” (PINTO, José Augusto Rodrigues. Direito Sindical e Coletivo do Trabalho. São Paulo; LTr, 1998, pág. 68.).
A professora Alice Monteiro de Barros conceitua negociação coletiva como
"modalidade de autocomposição de conflitos advinda do entendimento entre os interlocutores sociais".
Para Alfredo Ruprecht, a negociação coletiva é a que se celebra entre empregadores e trabalhadores ou seus respectivos representantes, de forma individual ou coletiva, com ou sem a intervenção do Estado, com o objetivo de se estabelecer condições de trabalho ou regulamentar as relações laborais entre as partes, ou seja, negociação coletiva consiste nos entendimentos para se chegar ao acordo, sendo totalmente irrelevante que se chegue ou não a um acordo.
Pelo exposto, temos que Negociação Coletiva é o procedimento que envolve um empregador ou um grupo de empregadores ou organização de empregadores e uma ou várias organizações de trabalhadores, com o objetivo de fixar condições de trabalho e disciplinar as relações entre empregadores e trabalhadores.
Em suma, se trata de um processo que almeja a formalização da Convenção ou do Acordo Coletivo de trabalho.
4 - OBJETIVOS DA NEGOCIAÇÃO COLETIVA
Os objetivos das Negociações Coletivas são:
a) Fixar as Condições de Trabalho e Emprego;
b) Regular as Relações entre Empregados e Empregadores;
c) Disciplinar as Relações entre Empregadores e suas Organizações e uma ou várias Organizações de Trabalhadores;
Dessa forma, por negociação coletiva pressupõe a participação de todos os entes titulares do interesse em conflito, ou seja, para se falar em negociação coletiva se faz necessária a participação do sindicato, tal como preceitua a Constituição Federal.
Importante observar, que uma empresa isoladamente, ou ainda um conjunto de empresas, são tidos como um ente coletivo, de tal forma que é possível a elaboração dos acordos coletivos de trabalho, ou seja, há uma negociação coletiva em que necessariamente a classe dos empregados deve estar representada pelo respectivo sindicato profissional, sendo dispensada a presença do sindicato econômico, podendo a própria empresa ou um conjunto de empresas entabular a negociação coletiva que vise à formulação do acordo coletivo de trabalho, conforme do § 1º, do art. 611 da Consolidação das Leis do Trabalho, deixando clara a aplicação do princípio protetivo ao empregado.
5 - CLASSIFICAÇÃO DAS NEGOCIAÇÕES COLETIVAS
As negociações coletivas são classificadas da seguinte forma:
- De criação - quando dá origem, a uma convenção coletiva que não existia, solucionando o conflito;
- De modificação – aquela que altera as cláusulas de uma convenção já em vigência;
- De substituição - quando há a substituição de uma convenção coletiva vigente por outra nova,
- De esclarecimentos – é a celebração de outra convenção coletiva para esclarecer conceitos ou situações confusas ou ambíguas que se registraram em convenção coletiva anterior.
6 - PRINCÍPIOS
Vejamos como alguns juristas classificam os princípios aplicáveis as negociações coletivas:
Mozart Victor Russomano, classifica à negociação coletiva, pelos seguintes princípios: a) da livre negociação; b) da lealdade; c) da ampliação progressiva do elenco das unidades de negociação coletiva; d) da boa-fé; e) do efeito erga omnes dos convênios coletivos; f) da sobrevivência dos direitos concedidos por convenções ou acordos coletivos após a extinção dos mesmos; g) da interpretação dos convênios coletivos, segundo o critério de aplicação da cláusula mais favorável ao trabalhador.
João de Lima Teixeira Filho esclarece que a negociação coletiva é regida pelos princípios gerais do Direito, onde, a partir desses princípios, encontraremos princípios mais restritos.
Assim classifica o referido jurista:
“Trata-se, em suas palavras, de postulados éticos ou normas de conduta das partes que permeiam, de fato, um processo negocial não regrado e a ele imprimem, a cada exercício, valores e conteúdo pedagógico que progressivamente o aperfeiçoam".
Para o referido jurista, a negociação coletiva é regida pelos seguintes princípios: a) inescusabilidade negocial; b) boa-fé; c) acesso à informação; d) razoabilidade; e) paz social.
Para Hugo Gueiros Bernardes, os princípios são classificados em: a) boa-fé e lealdade; b) procedimento; c) direito de greve; d) responsabilidade das partes.
Porém, quem detalhou em um extenso rol, os princípios que envolvem a negociação coletiva, foi Arnaldo Sussekind, tendo em vista que se utilizou de princípios éticos e normas de conduta, no que tange as partes envolvidas na negociação coletiva. Vejamos:
a) Princípios da boa-fé - princípio presente nos atos jurídicos em geral.
A boa-fé na negociação coletiva deve estar presente não só na fase de confecção do assenso, pela concentração de esforços para a conclusão com êxito da negociação, mas também na fase de fiel execução do que pactuado. Uma conduta claramente de má-fé na negociação coletiva é a do empregador que assume concessões mais onerosas por poder repassá-las a terceiros, que pagam a conta sem ter participado das discussões. Isso desvirtua a negociação coletiva, como processo de amadurecimento social e de realização de justiça entre o empregador e seus empregados. Quem assim negocia não preza o princípio da boa-fé.
O princípio da boa-fé revela-se na disposição da parte para negociar, analisar propostas adequadamente formuladas e também, com muita frequência, no modo pelo qual o acordo ou a convenção coletiva de trabalho é redigido. O instrumento normativo que recolhe e enuncia as condições de trabalho negociadas não pode se transformar em fonte de dissidência, devido a uma redação premeditadamente ambígua ou contraditória. Estes instrumentos de autocomposição servem para encerrar o conflito, nunca para instigá-lo.
b) Direito de informação
Para que o sindicato dos trabalhadores possa formular a pauta de reivindicações, a fim de iniciar a negociação, é necessário conhecer as reais condições da empresa e a capacidade desta de assumir determinados pleitos que a categoria julga cabíveis. Não é crível o empregador adotar atitude de recusa às reivindicações escudando-se em informações pretensamente secretas. Também não é possível que informações estratégicas da empresa possam ser colocadas em risco a pretexto de terem a ver com o processo negocial. A questão é, sem dúvida delicada.
Por isso, todos os cuidados devem ser tomados para que o direito de informação não sirva de instrumento que, de alguma maneira, frustre o entendimento direto.
De qualquer modo, o certo é que a informação deve guardar pertinência com as matérias postas em negociação.
c) Princípio da razoabilidade
Corolário do direito de informação é o princípio da razoabilidade das reivindicações a serem negociadas. Compromete a eficácia do processo negocial a formulação de pleitos que não têm a mínima condição de serem atendidos, assim como a apresentação de contraproposta pela empresa muito aquém das suas reais possibilidades de dar a justa recompensa aos trabalhadores na negociação coletiva. Não podem as partes construir um fosso intransponível, fruto de posições extremadas, e querer transformar a negociação coletiva em panacéia.
d) Princípio da paz social
. Consiste na trégua implicitamente assumida pelas partes ao assinarem o instrumento normativo que compõe os interesses transacionados na negociação coletiva concluída com sucesso. A obrigação de manter a paz persiste enquanto concluída com sucesso normativo. Néstor de Buen remarca : “O contrato coletivo de trabalho é instrumento de equilíbrio e, no fundo, de paz social. É conquistado com a guerra, na qual desempenha importante papel o exercício possível do direito de greve. Contudo, esta regra não é inflexível. Ela não prevalece quando o cenário econômico sofre modificação superveniente, imprevisível e substancial, geradora do desequilíbrio das prestações pactuadas. Nesse caso, compromete-se a paz social caso a negociação coletiva não seja reaberta para restabelecer o equilíbrio da equação anteriormente ajustada pelos interlocutores sociais.
Outros princípios aplicáveis:
Princípio da igualdade
Esse princípio significa que não existe hierarquia entre os negociadores, uma vez que se tratam de dois polos distintos e no momento da negociação as partes tomam assento em mesa-redonda e gozam de plena liberdade para aprovar ou rejeitar quaisquer propostas, sem qualquer hierarquia ou subordinação.
Sendo assim, a igualdade dos negociadores é possivelmente o aspecto mais delicado na fixação dos preceitos fundamentais da negociação coletiva, na medida em que a negociação coletiva, à primeira vista, se desenvolve entre dois polos separados pela hierarquia da empresa e pela subordinação jurídica da relação individual de emprego.
Dessa maneira, exige-se de fundamental importância que para uma concretização eficaz do diálogo entre as partes negociadoras, que a hierarquia e a subordinação jurídica existentes no âmbito da relação individual de emprego sejam efetivamente revogadas por total incompatibilidade no âmbito de uma negociação coletiva, uma vez que, por figurar em seus polos sujeitos coletivos dotados das mesmas condições de igualdade para apresentação livre de suas propostas e contrapropostas.
Destarte, pelo princípio da igualdade, o que se almeja é a possibilidade real e concreta de a negociação se desenvolver em um clima de liberdade de apresentação das propostas e respectivas contrapropostas, que nos assentos de uma mesa-redonda, as discussões sejam realizadas de maneira equânime tanto pelo sindicato profissional, principalmente este, quanto pelo sindicato econômico, buscando sempre a realização de uma negociação coletiva justa, nas mesmas condições de igualdade.
Princípio da cooperação
Esse princípio possui íntima relação com o princípio constitucional do contraditório, na medida em que uma matéria contraditória ou controvertida, para que possa ser resolvida, faz-se necessário e mesmo imprescindível que haja vontade de cooperação entre as partes envolvidas no conflito, sem a qual a negociação não chegará a bom termo, tornando-se, dessa forma, prejudicada.
Com efeito, os fatores sociais da relação coletiva de trabalho, sindicato profissional, sindicato econômico, empresa ou grupo de empresas, estão todos entrelaçados no mesmo tecido social, de maneira que prejudicar um significa prejudicar todos, sendo o contrário também verdade, isto é, auxiliar um significa auxiliar a todos.
Verifica-se, em verdade, que o princípio da cooperação consubstancia-se em um dever jurídico anexo decorrente da aplicação do princípio da boa-fé objetiva, insculpido no art. 422 do Código Civil, ao estipular que “os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé”.
Portanto, o princípio da colaboração tem papel fundamental na harmonização dos conflitos coletivos de trabalho, incutindo nos negociadores postura no sentido de mútuo auxílio quando da negociação coletiva de trabalho, na busca da formalização de um instrumento coletivo de trabalho eficaz, que realmente apresente melhores condições de trabalho e não apenas disposições formais, com pouca ou quase nenhuma alteração substancial das condições de trabalho.
Princípio da adequação setorial negociada
Segundo Mauricio Godinho Delgado, o princípio em destaque significa que as normas coletivas podem prevalecer sobre normas de origem estatal desde que respeitados alguns critérios objetivamente fixados, quais sejam quando as normas coletivas atribuam um padrão setorial de direitos superior ao padrão geral oriundo da legislação estatal e quando as normas coletivas transacionam de forma setorial parcelas trabalhistas de indisponibilidade apenas relativa.
No primeiro caso, as normas autônomas elevam o patamar setorial de direitos trabalhistas, em comparação com o padrão geral imperativo existente, de forma a prevalecer o negociado sobre o legislado, ao passo que no segundo caso há compatibilidade com a teoria da flexibilização, na medida em que o princípio da indisponibilidade dos direitos é afrontado, porém de modo a atingir apenas as parcelas de indisponibilidade relativa e não as de indisponibilidade absoluta, em razão da existência de permissivo legal, ou seja, normas heterônomas, a seu respeito.
Nesse sentido Edilton Meireles, para quem a negociação coletiva deve ser pautada no princípio da adequação setorial negociada, segundo a qual aquela não pode ir além dos direitos de disponibilidade relativa, que decorre da natureza da parcela ou da expressa permissão da norma estatal que os previu.
Todos os princípios elencados, devem ser utilizados como um pilar norteador, cabendo aos operadores do direito interpretar a norma com base nesses princípios.
7 - CARACTERÍSTICAS
A principal característica da negociação coletiva é fixar direitos e obrigações, onde as partes se obrigam a cumprir os seus termos durante o prazo de vigência, sob pena de ser aplicada alguma sanção.
Quando essa negociação resulta em uma convenção ou acordo coletivo, suas cláusulas não podem suprimir direitos previstos na legislação, sob pena de nulidade.
Outra característica da negociação coletiva é a adoção de regras e decisões entre sujeitos representativos de grupos ou categorias com interesses distintos, procedimento esse que se distingue pelo seu caráter autônomo, bilateral ou, em determinadas situações, multilateral.
Podemos identificar sua característica autônoma, ao observarmos que as regras ou decisões alcançadas são adotadas pelas partes negociadoras e não por uma instância alheia.
Há ainda, o caráter bilateral, eis que as regras, decisões e procedimentos, são aprovados de comum acordo entre as partes negociadoras.
Alguns juristas a classificam como um procedimento transacional porque há um acordo de concessões mútuas e não a imposição de uma decisão unilateral.
8 - INSTITUTOS DA NEGOCIAÇÃO COLETIVA
Autonomia Privada Coletiva
8.1 Evolução:
O primeiro conceito de autonomia privada surgiu no Iluminismo, no século XVIII, na primeira Revolução Industrial.
Após a Revolução Francesa, o contrato, que é uma forma de exteriorização da autonomia privada, se transformou no mais importante instrumento de regulamentador das relações jurídicas entre os particulares.
No citado período, o sindicato não detinha poderes para editar normas para seus membros.
Outro ponto que merece destaque, é que nessa época havia uma subordinação do sindicato ao Estado.
Nos regimes em que prevalece a liberdade sindical, o sindicato tem liberdade para ser criado e editar normas, nos limites do ordenamento jurídico. Essa autonomia do sindicato é chamada de Autonomia Privada Coletiva.
8.2Conceito
Conceitua-se a autonomia privada coletiva como o poder derivado do Estado, e assegurado aos particulares para regularem suas relações mútuas dentro de certos limites por meio de negócios jurídicos, em especial, os contratos.
A autonomia privada coletiva é calcada no interesse coletivo, devendo os sindicatos atuarem como intermediadores, para se atingir o interesse comum.
Na autonomia privada coletiva, o sindicato tem como objetivo editar normas oriundas de sua autonomia, que tem como objetivo respeitar as condições de trabalho para empregados e empregadores.
Outro ponto que merece destaque, é distinguirmos autonomia privada coletiva e negociação coletiva de trabalho. Teixeira Filho assim diferencia os dois institutos:
“A negociação coletiva de trabalho (...) é efeito decorrencial daquela (autonomia privada) e sua manifestação concreta. A autonomia privada coletiva é o poder social dos grupos representados autoregularem seus interesses gerais e abstratos, reconhecendo o Estado a eficácia plena dessa avença em relação a cada integrante dessa coletividade, a par ou apesar do regramento estatal – desde que não afronte norma típica de ordem pública”, (TEIXEIRA FILHO, 2005, p. 1189).
9 - NATUREZA JURÍDICA DA NEGOCIAÇÃO COLETIVA
Ao analisar a natureza jurídica da Negociação Coletiva, temos a definição de Maria Cristina Haddad de Sá:
“A negociação coletiva pode ser entendida como um instituto de natureza jurídica e obrigatória. Jurídica porque seu fundamento é de ordem constitucional e infraconstitucional e; obrigatória, uma vez que em atenção a imperativo legal (mormente o art. 616, § 4º, da CLT) que trata da obrigatoriedade da negociação coletiva para se chegar à formalização da Convenção ou mesmo Acordo coletivo de trabalho.”
Já Francisco Lima Filho, temos a seguinte definição:
“A negociação coletiva de trabalho possui apenas natureza jurídica, não havendo que se falar em natureza obrigatória, uma vez que além de constituir fonte de direito, configura-se, igualmente, como uma forma de desenvolvimento do poder normativo dos grupos sociais, segundo uma concepção pluralista que não reduz a formação do direito positivo à elaboração do Estado.
Além disso, a negociação coletiva destina-se à formação consensual de normas e condições de trabalho que serão aplicadas a um grupo de trabalhadores e empregadores, estando, pois, na base da formação do direito do trabalho.”
Pelas definições citadas, temos que a negociação coletiva é um meio de composição dos conflitos trabalhistas e possuir como objetivo a celebração de normas coletivas, consubstanciadas nas Convenções e Acordos coletivos de trabalho.
Desta forma, temos a natureza de negócio jurídico celebrado entre duas ou mais partes contratantes, ou seja, temos aspectos obrigacionais, o que pode ser concluído ao observarmos que os instrumentos coletivos decorrentes da negociação coletiva possuem cláusulas obrigacionais.
10 - CONCILIAÇÃO, MEDIAÇÃO E ARBITRAGEM
10.1 - MEIOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS: AUTOTUTELA, AUTOCOMPOSIÇÃO E HETEROCOMPOSIÇÃO
A diferença entre esses grupos encontra-se nos sujeitos envolvidos e no meio de operação da solução do conflito.
Na autotutela e na autocomposição, apenas os sujeitos originais em confronto é que tendem a se relacionar na busca da extinção do conflito, dando origem a um processo de solução gerido pelas próprias partes (na autotutela gerida por apenas uma das partes).
Na heterocomposição, há a intervenção de um agente exterior na solução do conflito.
10.2 - AUTOTUTELA
Conforme Maurício Godinho Delgado, ocorre quando o próprio sujeito busca afirmar, unilateralmente, seu interesse, impondo-o à parte contestante e à própria comunidade que o cerca. Permite, de certo modo, o exercício de coerção de um particular, em defesa de seus interesses.
A legislação vigente tem restringido ao máximo as formas de exercício da autotutela, transferindo para o Estado os instrumentos de coerção.
Exemplo clássico de autotutela: greve (porém ela não completa o seu ciclo, funcionando como instrumento de pressão).
10.3 - AUTOCOMPOSIÇÃO
Temos a autocomposição ocorre quando a solução do conflito é realizada pelas próprias partes, sem intervenção de outros agentes nos meios utilizados para se buscar a pacificação do conflito.
Ainda segundo Maurício Godinho Delgado:
Verifica-se pelo despojamento unilateral em favor de outrem da vantagem por este almejada, seja pela aceitação ou resignação de uma das partes ao interesse da outra, ou pela concessão recíproca por elas efetuada.
Por se tratar de um meio pacífico de solução do conflito, não se vislumbra o exercício de coerção pelos sujeitos envolvidos.
Modalidade de autocomposição: renúncia, aceitação e a transação.
A negociação coletiva é uma autocomposição.
10.4 - HETEROCOMPOSIÇÃO
Ocorre quando o conflito é solucionado através da intervenção de um agente exterior à relação conflituosa.
As partes não ajustam a solução de sua controvérsia, submetendo a terceiro o conflito.
Não há exercício de coerção pelos envolvidos, mas pode haver pelo agente exterior.
Modalidades de heterocomposição:
- Jurisdição – poder-dever conferido ao Estado de revelar o Direito incidente sobre determinada situação concreta trazida a seu exame, efetivando a solução jurídica encontrada a respeito. Através da jurisdição, o Estado declara o Direito aplicável e o concretiza, dando solução ao conflito posto a seu exame.
Ela é exercida através de segmento específico do poder institucionalizado do Estado, que é o Judiciário. Os juízes e Tribunais são os agentes especializados para o exercício da jurisdição, que se faz em um estuário formal próprio, o processo judicial.
O resultado do conflito se dá através da sentença.
- arbitragem – ocorre quando a fixação da solução de certo conflito entre as partes é entregue a um terceiro, denominado árbitro, em geral, escolhido pelas partes (pode haver a arbitragem obrigatória, não aplicável à legislação brasileira), só podendo versar sobre direitos patrimoniais disponíveis.
O resultado do conflito pela arbitragem resulta em um laudo arbitral, que é o ato pelo qual o árbitro decide o litígio trazido a seu exame.
- conciliação – método de solução de conflitos em que as partes agem na composição, mas dirigidas por um terceiro, destituído do poder decisório final.
Muitas vezes, na condução da negociação, esse terceiro consegue um resultado, originalmente não pretendido pelas partes.
Conciliação judicial trabalhista – onde as partes, através da interveniência da autoridade jurisdicional, ajustam solução transacionada sobre matéria objeto de processo judicial.
- mediação (relativamente, pois o árbitro, mesmo sendo terceiro, é escolhido pelas partes, o aproximando da autocomposição) É a conduta pela qual, um terceiro aproxima as partes conflituosas, auxiliando e até mesmo instigando sua composição, que há de ser decidida, porém, pelas próprias partes.
10.5FÓRMULAS HETERÔNOMAS DE SOLUÇÕES DO CONFLITO
Figura de um terceiro imparcial que insere na contenda para decidir no lugar dos litigantes.
11 - ARBITRAGEM NO DIREITO COLETIVO DO TRABALHO
É um tipo de procedimento de solução de conflitos, onde a decisão é lançada em um laudo arbitral, efetivada por um terceiro (árbitro) estranho à relação entre os sujeitos em controvérsia e, em geral, por eles escolhido. Via de regra é um expert no tema que gerou a controvérsia.
Arbitragem não se confunde com:
Arbitramento – pois esse é modalidade de liquidação de sentença (juiz nomeia perito);
Perícia técnica – é simples modalidade de prova;
Mediação – é técnica de auxílio à resolução de conflitos
Transação – ocorre exclusivamente entre as partes, sem interferência de agente exterior;
Jurisdição – é intervenção do Estado;
Tipos de arbitragem:
Nacional ou internacional – nacional quando entre sujeitos de um mesmo Estado e sociedade e internacional quando envolve sujeitos de distintos Estados e sociedades.
Obrigatória – é a que se impõe as partes, independentemente de sua vontade. Pode resultar de imposição legal ou de prévia imposição convencional, estipulada entre as partes (cláusulas compromissórias).
Facultativa (ou voluntária) – é a aplicável no Direito Coletivo brasileiro - é decidida pelas partes no contexto do surgimento do conflito. A convenção que elege a arbitragem como fórmula de resolução do conflito denomina-se compromisso arbitral. O compromisso arbitral pode ocorrer não só extrajudicialmente, mas também no interior de determinado processo judicial (art. 9º, caput e parágrafo 1º da Lei de arbitragem).
Trabalho portuário – lei 8630/93 – tem dispositivo que menciona o caminho arbitral obrigatório. Diz a lei que, inviabilizada a solução de litígios relativos a certo preceitos que menciona, pela Comissão Paritária criada pelo mesmo diploma legal, “as partes devem recorrer à arbitragem de ofertas finais” (art. 23, caput e par. 1º da Lei 8630).
Legal – decorre de norma estatal, bem como pode ser facultativa – cf art. 114, parágrafo1º:
- § 1º Frustrada a negociação coletiva, as partes poderão eleger árbitros.
Convencional – resulta de ajuste de vontade das partes mediante convenção de arbitragem, prevista no art. 3º lei de arbitragem
Arbitragem de direito – tem por objeto conflito interpretativo de regra ou princípios jurídicos ou de cláusula contratual. Se assemelha ao dissídio coletivo de natureza jurídica.
Arbitragem de equidade – tem por objeto conflito de interesses materiais, e cunho econômico, assemelhando-se a um dissídio coletivo de natureza econômica.
Na arbitragem a decisão tem eficácia de sentença judicial.
12 - FÓRMULAS PARAETERÔNOMAS DE SOLUÇÕES DO CONFLITO
Caracterizam-se pela intervenção de um terceiro imparcial que, por força de sua assistência, insere no conflito apenas para acelerar a concórdia dos litigantes, entre os quais temos a mediação e a conciliação, sendo que a doutrina tem dificuldade em distinguir a figura do mediador e do conciliador.
Luciano Martinez diferencia da seguinte forma:
Conciliação – é o método de solução de conflitos por via paraeterônoma por meio da qual o terceiro imparcial, mediante inserção superficial, tenta aproximar os litigantes envolvidos em conflitos mais restritos, ou seja, unidimensionais ou de vínculo único, por exemplo nas relações individuais de emprego tanto nos locais de trabalho quanto no processo judicial.
Assim, justifica-se a figura do magistrado como conciliador, considerando que em audiência não foi realizada a inserção profunda no processo.
Já mediação, é o método de solução de conflitos por via paraeterônoma por meio da qual o terceiro imparcial, mediante inserção profunda, tenta aproximar os litigantes envolvidos em conflitos mais amplos, ou seja, multidimensionais ou e múltiplos vínculos, como por exemplo, nas relações coletivas de trabalho.
13 - CONCILIAÇÃO
É uma forma consensual de solução dos conflitos, sendo uma forma de autocomposição.
Amauri Mascaro defende que a conciliação pode ser função jurisdicional pré-processual ou prática extra-judicial, dependendo da organização e do sistema jurídico. No Brasil, sempre foi judicial.
Ele defende também que a aplicação da conciliação se dá em conflitos individuais.
Citar a experiência da CCP.
14 - MEDIAÇÃO NO DIREITO COLETIVO DO TRABALHO
Conduta pela qual determinado agente (terceiro imparcial) busca auxiliar as partes e instiga-las a composição, porém o teor será decidido pela próprias partes.
Ao contrário do árbitro, o mediador não tem poderes decisórios. As partes preservam a autonomia quanto à fixação da solução final para o litígio.
O mediador apenas contribui para o diálogo entre as partes, fornecendo-lhes subsídios e argumentos.
Ruprecht define como um meio de solução dos conflitos coletivos de trabalho, pelo qual as partes comparecem perante um órgão ou uma pessoa designados por elas ou instituído oficialmente, o qual propõe uma solução, que pode ou não ser por elas acolhida.
A mediação está em um plano entre a conciliação e a arbitragem.
Tipos de mediação:
Facultativas ou obrigatórias – não são obrigadas a aceitar o resultado.
Unipessoais ou colegiadas – por equipe ou por uma pessoa.
Públicas ou privadas – quando realizada por um órgão da Administração Pública ou serviço especial do Ministério do Trabalho/ ou quando mediado é escolhido pelas partes.
Antes da CF/88 tínhamos a mediação compulsória nos conflitos laborais coletivos, que eram realizadas por autoridades do Ministério do Trabalho, conforme se observa o artigo 616 da CLT:
Art. 616 - Os Sindicatos representativos de categorias econômicas ou profissionais e as empresas, inclusive as que não tenham representação sindical, quando provocados, não podem recusar-se à negociação coletiva.
§ 1º Verificando-se recusa à negociação coletiva, cabe aos Sindicatos ou empresas interessadas dar ciência do fato, conforme o caso, ao Departamento Nacional do Trabalho ou aos órgãos regionais do Ministério do Trabalho e Previdência Social, para convocação compulsória dos Sindicatos ou empresas recalcitrantes.
§ 2º No caso de persistir a recusa à negociação coletiva, pelo desatendimento às convocações feitas pelo Departamento Nacional do Trabalho ou órgãos regionais do Ministério de Trabalho e Previdência Social, ou se malograr a negociação entabulada, é facultada aos Sindicatos ou empresas interessadas a instauração de dissídio coletivo.
Entretanto, o próprio texto já remetia ao dissídio coletivo.
A compulsoriedade da mediação pelos órgãos internos do Ministério do Trabalho não foi recebida pela CF, porém permanece a possibilidade da mediação voluntária.
15 - CONCLUSÃO
A negociação coletiva se apresenta como o retrato da evolução do Direito Coletivo, tendo em vista sua preocupação em levar para a relação empregado x empregador os avanços da sociedade.
No cenário atual, onde as leis trabalhistas não acompanham a evolução do mercado de trabalho e as novas profissões que surgem constantemente, a negociação coletiva se apresenta como um método eficaz de solução de conflitos e manutenção da segurança jurídica.
Em outras palavras, a evolução do Direito do Trabalho não pode depender exclusivamente do processo legislativo, sendo necessária outras formas de regulamentar as relações trabalho.
Neste cenário, destaco a importância dos sindicatos, os quais devem zelar pela sua representatividade, pois nesse novo cenário, terão o importante papel de intermediar e chancelar essas negociações.
Cada vez mais, as convenções e acordos coletivos, terão um papel não só regulamentador, mas sim uma função social. Servirão como instrumentos de distribuição de justiça.
Uma categoria sem representatividade, está condenando os seus representados a serem regidos exclusivamente pelas normas emanadas do Poder Legislativo, resultando em desigualdade social e retrocesso.
Por fim, temos que as negociações coletivas representam o futuro e o progresso das relações de trabalho, tendo em vista a possibilidade do empregado pleitear melhores condições de trabalho, sem a necessidade de aguardar novas leis trabalhistas.
16 - REFERÊNCIAS
ANGHER, Anne Joyce. Vademecum Ridell, 12ª Edição, Editora Ridell, 2011.
BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de direito Constitucional. 22ª ed., São Paulo: Saraiva, 2002.
BRASIL, Vademecum Saraiva. 11ª ed., Saraiva, 2011.
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 7 ª Ed, LTR, 2008.
DELGADO, Maurício Godinho. Direito Coletivo do Trabalho. 4 ª Ed, LTR, 2011.
LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 14ª ed., São Paulo: Saraiva, 2010.
MARTINEZ, Luciano. Curso de Direito do Trabalho. 4ª ed., São Paulo – Saraiva, 2013;
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Compêndio de direito sindical. 4ª ed., São Paulo – LTr, 2005;
SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo, 33ª ed.,São Paulo: Malheiros, 2010
SUSSEKIND, Arnaldo. Instituições de Direito do Trabalho. 22 ed., São Paulo – LTr, 2005;
Advogado. Graduado em Direito pela Universidade Ibirapuera. Especialista em Direito Público pela Escola Superior de Advocacia. Especialista em Direito e Processo do Trabalho pela COGEAE - PUC/SP. Mestrando em Direito do Trabalho pela PUC/SP.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: COELHO, Nicolau Rafael Guimarães. Da negociação coletiva como forma de solução de conflitos Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 19 mar 2016, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/46236/da-negociacao-coletiva-como-forma-de-solucao-de-conflitos. Acesso em: 23 dez 2024.
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