RESUMO: Este estudo tem como objetivo a sistematização da técnica de redação de ementas de pareceres e decisões judiciais. Como metodologia, adotou-se a revisão da literatura e a reunião e análise de exemplos de ementas. Os resultados do estudo possibilitam a correta elaboração de ementas por meio dos operadores do Direito.
Palavras-chave: Ementa. Parecer Jurídico. Decisão Judicial. Acórdão. Sentença. Jurisprudência. Informação jurídica. Redação jurídica. Linguagem técnica. Tratamento da informação.
INTRODUÇÃO
Em tempos em que os processos de produção e disseminação da informação estão cada vez mais acelerados, encontrar precisamente os dados e documentos de que precisamos às vezes é como achar uma agulha num palheiro. Não menos desafiador, para quem produz a informação, é fazer-se encontrar.
Assim também é no âmbito jurídico.
A informação jurídica vai sendo devidamente valorizada à medida que os operadores do Direito se dão conta de que ela é o objeto do seu trabalho, produto de suas peças processuais ou consultivas.
É também preciosa ferramenta de trabalho, especialmente levando em consideração as mudanças que ao longo dos últimos anos vêm sendo implementadas no Direito Processual brasileiro, com crescente adoção do sistema de precedentes.
A informação jurídica caracteriza-se, ainda, como patrimônio da instituição da qual fazem parte os membros que a produzem, formando um banco de dados que traduz o seu pensamento.
O domínio da informação jurídica por parte do operador do Direito garante não só ganho de tempo em suas atividades diárias, evitando-se o retrabalho, como uniformidade e atualidade na atuação.
De acordo com o art. 943, § 1º, do CPC, a adoção de ementa é obrigatória nos acórdãos. Apesar de não ser obrigatória, é desejável nos pareceres e também nas sentenças e decisões monocráticas.
EMENTA
O termo vem do latim ementum, que quer dizer ideia, pensamento. Pode ser entendido como apontamento, lista, rol, resumo, síntese, sumário.
No âmbito legislativo, refere-se à epígrafe do texto legal.
No âmbito jurisprudencial e administrativo – o que interessa no presente estudo –, é o resumo daquilo que está na decisão ou no parecer.
Nesse contexto, a ementa apresenta duas finalidades: resumo e resgate. Resumo do conteúdo jurídico da peça; resgate da informação ali constante.
Uma boa ementa substitui, em um primeiro momento, a leitura do inteiro teor da decisão ou do parecer, propiciando ao leitor a seleção daquela peça como útil ou não à sua pesquisa.
A ementa contém duas partes: verbetação e dispositivo.
No exemplo abaixo, a verbetação é a primeira parte da ementa; o dispositivo, a segunda:
“RECURSO DE REVISTA. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. TRABALHO A CÉU ABERTO.
- Em face da ausência de previsão legal, indevido o adicional de insalubridade ao trabalhador em atividade a céu aberto. Recurso de revista conhecido e provido.”
VERBETAÇÃO
A verbetação é uma sequência de palavras-chave ou expressões que delimitam o objeto da ementa.
Tem como funções a categorização/classificação da decisão ou do parecer e a facilitação do resgate da informação.
Deve ser construída levando em consideração uma relação de gênero para espécie, partindo do ramo do Direito, depois tratando do assunto e, por fim, trazendo os temas abordados.
Exemplos:
Administrativo. Processo Administrativo Disciplinar. Comissão Processante. Composição.
Processual Civil. Mandado de Segurança. Competência. Licitação. Ato praticado por dirigente de empresa pública.
Em geral, as palavras-chave vêm grafadas em caixa alta ou em letras maiúsculas, e negritadas, com a finalidade de se destacar da parte dispositiva da ementa. O destaque é interessante, mas não há essa exigência, e, em se tratando de verbetação muito longa, essa apresentação pode ficar cansativa para o leitor.
A inserção do termo “ementa” na verbetação é desnecessária e até redundante. Também o é a inclusão do resultado da decisão ou da conclusão do parecer, pois acarretará a poluição do campo com informação repetida.
O que é de fato relevante é a utilização de termos técnicos, os quais, observando a necessária padronização da linguagem, asseguram o atendimento das finalidades da verbetação.
De grande auxílio na escolha dos termos a serem usados na verbetação é a consulta a um vocabulário jurídico controlado (Tesauro Jurídico), que é uma lista organizada de termos jurídicos, os quais passam por um controle de precisão e uniformidade, evitando sinonímia atécnica.
Indicamos a consulta ao Vocabulário Jurídico constante da página de pesquisa de jurisprudência do sítio do Superior Tribunal de Justiça: http://www.stj.jus.br/SCON/thesaurus/.
DISPOSITIVO
O dispositivo é um enunciado que resume o entendimento sobre determinada questão que foi objeto da decisão ou do parecer ou regra deles resultante.
Deve ser uma proposição com um sentido completo, trazendo em si o conteúdo da tese ou questão jurídica abordada.
Assim, deve conter em sua estrutura: o entendimento adotado, dentro de determinado contexto, com a sua fundamentação.
Exemplos:
“Não cabe habeas corpus [entendimento] contra decisão condenatória a pena de multa [contexto], pois tal condenação não acarreta ameaça ou violação do direito de locomoção [fundamentação].”
“Os juros moratórios são acumuláveis com os compensatórios [entendimento] nos processos relativos à desapropriação [contexto], haja vista que possuem fundamentos diferentes, pois, enquanto os moratórios são decorrentes do atraso no pagamento na indenização, os compensatórios se destinam a reparar o prejuízo advindo da ocupação antecipada do imóvel pelo Poder Público [fundamentação].”
“Compete ao Tribunal Regional Federal solucionar conflito de competência [entendimento] verificado, na respectiva região, entre juízo federal e juízo estadual, quando este último estiver investido de jurisdição federal [contexto], pois as decisões judiciais proferidas em qualquer destes juízos estão submetidas à apreciação daquele Tribunal em eventual recurso [fundamentação].”
Consideramos que o local apropriado para a inclusão do resultado da decisão ou da conclusão do parecer é o dispositivo da ementa. A informação é útil e evita que o leitor tenha que consultar o inteiro teor da peça para poder acessá-la.
MAIS DE UM TEMA NA EMENTA
Que estrutura adotar quando a ementa aborda mais de um tema ou questão?
Vejamos exemplos das duas hipóteses possíveis:
“AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. INSCRIÇÃO INDEVIDA EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. ATO ILÍCITO. DEVER DE INDENIZAR. REEXAME DE PROVAS. DANO MORAL 'IN RE IPSA'. OCORRÊNCIA. VALOR. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. FIXAÇÃO COM BASE NO CRITÉRIO DA RAZOABILIDADE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. REVISÃO. DESCABIMENTO. SUMULA 07/STJ. INCIDÊNCIA.
1. A modificação das conclusões a que chegaram as instâncias ordinárias, relativas à presença dos requisitos ensejadores do dever de indenizar da instituição financeira, nos moldes em que pretendido, encontra óbice no enunciado sumular nº 7 desta Corte, por demandar o vedado revolvimento de matéria fático-probatória.
2. Nos casos de protesto indevido de título ou inscrição irregular em cadastros de inadimplentes, o dano moral configura-se 'in re ipsa', prescindindo de prova.
3. O valor da indenização por danos morais deve ser fixado com moderação, considerando a realidade de cada caso, sendo cabível a intervenção da Corte quando exagerado ou ínfimo, fugindo de qualquer parâmetro razoável, o que não ocorre neste feito.
4. O valor fixado pelas instâncias ordinárias, a título de honorários advocatícios, somente pode ser alterado se for excessivo ou irrisório, sob pena de incidência da Súmula 7/STJ.
5. Decisão agravada mantida pelos seus próprios fundamentos.
6. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.”
“RECURSO DE REVISTA. DANOS MORAIS. ACIDENTE DE TRABALHO. PRAZO PRESCRICIONAL. DANO ANTERIOR À EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 45/2004. REGRA DE TRANSIÇÃO. -ACTIO NATA-. PRESCRIÇÃO TRIENAL PREVISTA NO ARTIGO 206, § 3º, V, DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. O entendimento desta Corte é no sentido de que, nos casos em que o fato que gerou a suposta lesão ao empregado tenha ocorrido menos de 10 anos antes da entrada em vigor do Código Civil de 2002 (11/01/2003), a prescrição aplicável é a trienal, estabelecida no artigo 206, § 3º, V, do Código Civil de 2002, contada a partir da entrada em vigor do novo Código, ou seja, a parte teria até 11/01/2006 para propor a ação de indenização. Na hipótese, o TRT consignou que o acidente de trabalho ocorreu em 14/10/99 e que a presente ação foi proposta em 09/09/2004, na Justiça Comum. Portanto, em vista da propositura da presente ação em 09/09/2004, dentro do triênio previsto no artigo 206, § 3º, V, do Código Civil, não há prescrição a ser declarada.
DANOS MORAIS. PROVA EFETIVA DO DANO. PRESCINDIBILIDADE. O dano moral surge do fato em si, tão somente, sendo despicienda a comprovação de prejuízo em decorrência das lesões sofridas. A conduta do reclamado basta para violar direito decorrente da personalidade, do que resulta ser prescindível a demonstração de humilhação, aflição, abalo à honra, à psique ou à intimidade do agente passivo, por se tratar de um dano -in re ipsa-. Precedentes do TST.
INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CRITÉRIO DE QUANTIFICAÇÃO. O Tribunal Regional fixou o valor da indenização por danos morais (R$30.000,00), equivalente a 40 vezes a última remuneração do autor, com base em elementos como o grau de culpa do reclamado, a redução da capacidade laborativa do reclamante, a gravidade do dano e a condição econômica do réu. Nesse contexto, não prospera a alegação de violação do artigo 944 do Código Civil, pois não ficou evidenciada a alegada desproporcionalidade entre o dano e a reparação.
Recurso de revista de que não se conhece.”
Na primeira ementa, a verbetação agrupa todos os temas abordados na decisão. O dispositivo vem depois da verbetação, apresentando os enunciados respectivos, seguindo a ordem adotada das palavras-chave.
Na segunda ementa, há um agrupamento por tema de cada verbetação e dispositivo respectivo, com estruturação em partes autônomas.
A leitura dos dois exemplos evidencia que a estrutura adotada na segunda ementa torna mais agradável a leitura, facilitando a identificação dos temas e a sua citação em trechos.
Por isso, recomendamos que essa estrutura em partes autônomas seja a adotada.
O QUE EVITAR NA EMENTA
Levando em consideração as finalidades da ementa, de resumo e resgate da informação, algumas práticas não são recomendadas.
Não obstante o dispositivo deva trazer o contexto da tese ou questão abordada, o relatório da decisão ou do parecer não deve ser incorporado à ementa, como no exemplo abaixo:
“Cuida-se de recurso ordinário interposto contra acórdão que denegou a segurança em pleito de anulação da designação de comissão permanente de sindicância e processo administrativo, já que composta unicamente por magistrados; argumenta o recorrente que há violação do art. 149, da Lei n. 8.119/90 e ao princípio do juiz natural e da separação de poderes.”
A ementa não deve ser lacônica, a ponto de não se identificar aquilo que consta no parecer ou na decisão, nada significando para o leitor. Por exemplo, uma ementa que contenha apenas o seguinte dispositivo:
Não deve ser conhecido o recurso especial quando inexistentes os seus pressupostos de admissibilidade.
Mas também não deve ser a reprodução de toda a decisão ou parecer, afastando-se da ideia de resumo. Vemos diuturnamente ementas excessivamente extensas, repetitivas ou prolixas, que desestimulam a sua leitura e citação.
Assim, deve-se procurar não fazer transcrições longas demais de textos legais, doutrinários ou jurisprudenciais no corpo da ementa.
LINGUAGEM TÉCNICA
É comum observarmos em boa parte das peças jurídicas a predileção por uma linguagem rebuscada, recheada de arcaísmos, de vocabulário estrangeiro ou de palavras não usuais.
Entretanto, pareceres e decisões judiciais não são textos literários, e sim peças técnicas.
Por isso, recomendamos, especialmente nas ementas, a utilização da linguagem técnica, a qual tem as seguintes características:
a) clareza, possibilitando a fácil compreensão de ideias;
b) precisão, com a adoção da terminologia própria, evitando o uso de sinônimos não técnicos, que dificultam a padronização;
c) concisão, em contraposição à prolixidade;
d) objetividade, livre de expressões que denotem opinião pessoal exagerada;
e) coerência, demonstrando conexão, congruência entre as ideias.
Nesse contexto, podemos enumerar algumas dicas para uma boa redação:
a) usar a ordem direta (sujeito antecede predicado), a não ser quando a ordem direta prejudicar a clareza do texto. Um exemplo em que a ordem direta prejudicou a clareza é a redação da Súmula Vinculante 13. O ideal seria que o predicado, por ser mais curto no caso, tivesse antecedido o sujeito:
“A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada na administração pública direta e indireta em qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição Federal.”
b) entre duas palavras com o mesmo sentido, preferir a mais simples, a mais usual (ex.: ao invés de “alienígena”, usar “estrangeiro”).
c) usar a terminologia, ou seja, os termos técnicos do Direito:
- roubo, ao invés de assalto;
- recurso extraordinário, ao invés de apelo extremo;
- embargos de declaração, ao invés de aclaratórios;
- petição inicial, ao invés de peça vestibular, exordial.
d) evitar clichês, formas arcaicas, coloquialismo, termos em sentido figurado:
- sodalício (sociedade de pessoas que vivem juntas)
- acórdão recorrido:
· verrumado (furado com verruma – broca);
· vergastado (batido com vergasta – chicote, açoite);
· objurgado (repreendido com aspereza);
· profligado (lançado por terra, abater, destruir);
· hostilizado (tratado hostilmente, tratado como a um inimigo).
- “Na alcatifa da ADI...” (tapete que reveste o chão)
e) evitar o uso de palavras estrangeiras, à exceção de casos de uso consagrado, em que falta uma tradução exata (ex.: bis in idem).
f) observar a pontuação:
- Todos foram até o Ministro.
- Todos foram, até o Ministro.
g) evitar imprimir caráter excessivamente pessoal ao texto:
- “...voracidade arrecadatória do Fisco”;
- “... sanha recursal do agravante”.
CONCLUSÃO
A ementa de uma decisão judicial ou de um parecer jurídico tem por finalidade o resumo e resgate da informação, e substitui, em um primeiro momento, a leitura do inteiro teor da decisão ou do parecer, propiciando ao leitor a seleção daquela peça como útil ou não à sua pesquisa.
A ementa é composta por duas partes: verbetação e dispositivo.
A verbetação é uma sequência de palavras-chave ou expressões que delimitam o objeto da ementa. Tem como funções a categorização/classificação da decisão ou do parecer e a facilitação do resgate da informação.
O dispositivo é um enunciado que resume o entendimento sobre determinada questão que foi objeto da decisão ou do parecer ou regra deles resultante. Deve conter em sua estrutura: o entendimento adotado, dentro de determinado contexto, com a sua fundamentação.
Na hipótese de haver mais de um tema na ementa, recomendamos, a cada tema, o agrupamento da verbetação e dispositivo respectivos, com uma estruturação em partes autônomas.
A redação da ementa não deve ser lacônica, nem extensa demais, evitando-se a reprodução integral da decisão ou do parecer, a transcrição de relatório ou de longos trechos de textos legais, doutrinários ou de precedentes jurisprudenciais.
Na redação da ementa deve ser utilizada a linguagem técnica, com suas características de clareza, precisão, concisão, objetividade e coerência.
Advogada da União. Especialista em Direito do Trabalho. Foi Analista Judiciária do STJ.<br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: TORRES, Caroline de Melo e. Técnica de redação de ementas de pareceres jurídicos e decisões judiciais Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 14 jun 2016, 04:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/46839/tecnica-de-redacao-de-ementas-de-pareceres-juridicos-e-decisoes-judiciais. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: ELISA CARDOSO BATISTA
Por: Fernanda Amaral Occhiucci Gonçalves
Por: MARCOS ANTÔNIO DA SILVA OLIVEIRA
Por: mariana oliveira do espirito santo tavares
Precisa estar logado para fazer comentários.