Este texto não busca tomar partido por um lado politico dos últimos acontecimentos da politica brasileira nem tão pouco avaliar se existe uma eventual ingerência que viole a independência dos poderes, ou se contrapor a expansão das redes sociais nem garantir a impunidade de quem se esconde nos meios virtuais.
O objetivo é tão somente instigar ao leitor, o quanto o poder judiciário precisa cada vez mais ponderar princípios dentro de situações para resolver contendas, zelar pelos princípios e garantias fundamentais consagradas na nossa constituição e buscar o alcance da justiça.
Para ilustrar nossa tese vamos a três casos recentes de ponderação e mitigação de princípios aplicados pelo Poder Judiciário, tomando como ponto de partida o grampo do ex-presidente Lula e outros divulgado pelo Juiz Sérgio Moro da 13º Vara Federal de Curitiba na operação Lava a Jato no dia 17 de março deste ano.
Nos autos do processo nº 5006617-29.2016.4.04.7000 com a alegação de que processo de apuração de possíveis crimes contra a Administração Pública, o interesse público e a previsão constitucional de publicidade dos processos (art. 5º, LX, e art. 93, IX, da Constituição Federal) que impediam a imposição da continuidade de sigilo sobre autos o juiz Moro liberou a divulgação dos áudios do ex presidente Lula conversando com varias pessoas, criticando autoridades, e conversando com a presidenta Dilma sobre uma eventual estratégia para escapar se beneficiar com uma suposta prerrogativa de foro.
Surgiu então a alegação da Advocacia Geral da União que tal divulgação violaria o artigo 102, I, b da Constituição Federal que restringe a competência de investigação e até da divulgação para o Supremo Tribunal Federal, sendo que esta foi à tese foi aceita pelo Ministro do Supremo Tribunal Federal Teori Zavascki, que ainda citou que a interceptação da maneira que ocorreu violou a garantia fundamental de sigilo do artigo 5º, XII da Carta Magna.
O Ministro relator também citou a Lei de Interceptações telefônicas Lei 9.269/1996, vedar expressamente a divulgação de qualquer conversação interceptada (art. 8º), determina a inutilização das gravações que não interessem à investigação criminal (art. 9º).
Nesse momento as paixões partidárias defendem os dois lados mas na pratica podemos observar o embate entre o interesse público e a publicidade dos processos de um lado e do outro o direito ao sigilo e a prerrogativa de função que esta prevista na Constituição Federal.
Acima da difícil missão do Poder Judiciário de mitigar princípios em detrimento de outros vale aprofundar o debate no caso em tela para relembrar antigas perguntas que são feitas nos bancos acadêmicos de uma faculdade de direito.
Os interesses individuais, neste caso o sigilo devem permanecer sobre o interesse público? A prerrogativa de função seria privilégio para se abusar de um poder ou a garantia para a manutenção do Estado Democrático de Direito? Haveria outros meios de configuração da materialidade delitiva e de pressionar a punição politica e jurídica dos supostos acusados?
No segundo caso temos o bloqueio do aplicativo Whatsapp determinado pelo Juiz Marcel Montalvão da Vara Criminal de Lagarto em Sergipe com fundamentação nos artigos 11, 12,13 e 15 caput do Novo Marco Civil da Internet.
A investigação foi iniciada após uma apreensão de drogas na cidade de Lagarto, a 75 km de Aracaju e o mesmo juiz pediu em novembro de 2015 que o Facebook informasse o nome dos usuários de uma conta no WhatsApp em que informações sobre drogas eram trocadas. As informações desse processo correm em segredo de Justiça.
O vice-presidente do Facebook já tinha sido preso no dia 01 de março deste ano e no dia 02 de maio o aplicativo foi bloqueado por nova decisão.
A decisão foi derrubada pelo Desembargador Ricardo Múcio Santana de Abreu Lima, do Tribunal de Justiça de Sergipe no processo de nº 201600110899 TJ-SE.
Apesar do sigilo do processo também fica clara a colisão de princípios onde de um lado estão à segurança pública e do outro o direito a informação e o interesse público.
Com isso novamente emergem questionamentos da ordem de que prejuízos à limitação de um aplicativo desses pode causar a vida cotidiana das pessoas? É possível combater o crime organizado sem o acesso aos dados de tal aplicativo? Cercear 100 milhões de usuários para a obtenção dessas informações é uma medida razoável?
Vidas em jogo na mão de quadrilhas criminosas não justificariam tal bloqueio como maneira de coerção das empresas?
No terceiro caso temos o afastamento do presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha pedido pelo Procurador da Republica Rodrigo Jannot que foi aceito liminarmente pelo Ministro Teori Zavascki e depois confirmado pelo pleno do Supremo Tribunal Federal no dia 05 de maio deste ano.
No pedido o Procurador Geral afirmou que o afastamento era "fundamental" para o garantir o "regular funcionamento das instituições sem embaraços ou condutas espúrias", ante o risco de o deputado praticar "novos ilícitos" e o relator acatou o pedido alegando que Cunha "não tem condições pessoais mínimas" para ser presidente da Câmara, pois "não se qualifica" para eventualmente substituir o presidente da República, já que é réu de ação penal, denunciado e investigado pela Operação Lava Jato.
“Alegou ainda que o exercício do cargo, nas circunstâncias indicadas, compromete a vontade da Constituição, sobretudo a que está manifestada nos princípios de probidade e moralidade que devem governar o comportamento dos agentes políticos”.
Nesse momento alguns parlamentares alegaram que estaria havendo interferência nos poderes por parte do Supremo Tribunal Federal.
Como essa decisão pode interferir numa eventual Vice Presidência da Republica e o Poder Judiciário teve que se posicionar de uma forma inédita e “excepcional” conforme palavras dos próprios Ministros aparecem novos questionamentos a sociedade.
A presunção de inocência consagrada na nossa Constituição e a separação e independência dos poderes poderia proteger o presidente de um eventual afastamento e da retirada de seus direitos como parlamentar? O Judiciário pode interferir no poder legislativo em um ato que seria privativo do plenário da Câmara? O afastamento do Presidente que é réu se justifica pelos princípios da moralidade e da probidade podem justificar tal medida?
Após a alusão dos três casos é possível aferir que o Judiciário brasileiro está em ebulição tendo que se debruçar em casos nunca antes vistos como um grampo do Ex-presidente Lula em diálogo com a presidenta, um bloqueio que afetou mais da metade do Brasil e o afastamento do Presidente da Câmara dos Deputados.
A ponderação e a mitigação de princípios e garantias fundamentais não é novidade para o judiciário brasileiro nem são os primeiros casos de grande repercussão decididos nesses moldes, mas sem duvida os três casos são casos de extrema importância para a manutenção do Estado democrático de Direito e para fomento dos princípios e direitos fundamentais.
REFERENCIAS
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Bacharel em Direito e Pós Graduando em Direito Público pela Faculdade Paraiso do Ceará- FAP. Funcionário Público desde 2001, fui membro da Corregedoria e chefe da divisão de Ronda Escolar da Guarda Municipal de Juazeiro do Norte-CE de 2009 a 2012.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SANTOS, Marcelo Alves Batista dos. O grampo de Lula, o bloqueio do Whatsapp e o afastamento de Cunha. Estudos de caso, ponderação de princípios e ativismo judicial Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 30 jun 2016, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/46938/o-grampo-de-lula-o-bloqueio-do-whatsapp-e-o-afastamento-de-cunha-estudos-de-caso-ponderacao-de-principios-e-ativismo-judicial. Acesso em: 23 dez 2024.
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