Resumo: A crescente demanda por acesso à justiça para a resolução de litígios, seja por parte da sociedade como pelos próprios entes públicos, tem gerado, ano após ano, o incremento do número de processos em tramitação e, consequentemente, o incremento das dificuldades para o Poder Judiciário concretizar sua missão em solucionar esses litígios. Aumentar a acessibilidade, a celeridade e a efetividade processuais passou a ser um dos objetivos a serem buscados pelo Poder Judiciário para exercer sua função primordial de realizar a justiça com o máximo de excelência. Por meio de análises e estudos das legislações que regula o processo judicial eletrônico, principalmente a Lei nº 11.419/06, que trata especificamente da informatização do processo judicial no Brasil, esse trabalho busca, tendo em vista o estágio atual de desenvolvimento das tecnologias de informação e comunicação, identificar os impactos e desafios que precisam ser superados para torná-lo uma realidade que permita ao Poder Judiciário aumentar a acessibilidade, a celeridade e a efetividade processuais.
Palavras-chave: Processo Judicial, Processo Eletrônico, Legislação, Tecnologias de Informação e Comunicação.
Abstract: The increasing demand for access to justice for the settlement of disputes, whether by society or by public entities, has generated, year after year, an increasing number of pending cases and, consequently, raising the difficulties for the judiciary to perform its mission to resolve such disputes. Enlarge the accessibility, speed and procedural effectiveness has become one of the objectives to be pursued by the judiciary to perform its primary function of attaining justice with utmost excellence. Through analysis and studies of the laws regulating the electronic judicial process, especially the law no 11.419/06, which deals specifically with the computerization of the judicial process in Brazil, this work, in view of the current stage of development of information technologies and communication, identify the impacts and challenges that must be overcome to make it a reality, enabling the judiciary increase the accessibility, speed and procedural effectiveness.
Keywords: Judicial Process, Electronic Process, Legislation, Information Technology and Communication.
A crescente demanda por acesso à justiça para a resolução de litígios, seja por parte da sociedade como pelos próprios entes públicos, tem gerado, ano após ano, o incremento do número de processos em tramitação e, consequentemente, das dificuldades para o Poder Judiciário concretizar sua missão em solucionar esses litígios.
Além disso, considerando que cada processo é, em regra, uno e material e não pode estar em “dois ou mais lugares ao mesmo tempo” e para que uma decisão seja elaborada, o processo deve estar fisicamente nas mãos de seu julgador. Caso o processo esteja com uma das partes, deve-se aguardar a sua devolução, para que os autos sejam então encaminhados ao julgador. Grande parte do retardo na resolução dos litígios pode ser então atribuída aos atrasos rotineiros na devolução dos autos pelas partes. Quando não se tem interesse na resolução do litígio, por se temer uma resposta negativa a determinado interesse, por exemplo, retirar os autos e retardar sua devolução é uma forma de atrasar a resposta do Judiciário sobre o caso, com o prejuízo de pelo menos uma das partes. Soma-se a isso o fato de que a própria movimentação física (interna e externa) dos autos demanda por si bastante tempo.
Nesse sentido, a acessibilidade processual pode ficar comprometida em virtude de as partes e advogados estarem em outras localidades aos processos, em razão de fatores como a falta de recursos financeiros e até mesmo tempo para o deslocamento, o que restringe o exercício pleno das garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa.
Algumas soluções para essas questões de acessibilidade e do aumento do acúmulo de processos têm sido propostas em todo o Judiciário, algumas inclusive tendo sido colocadas em prática. Entre essas medidas estão as de contenção do crescimento do número de processos, por meio da criação de leis que tornem seu trâmite mais dinâmico, incentivando os acordos judiciais e extrajudiciais, e as de modernização do processo judicial e dos ritos procedimentais, por meio de reformas legais e constitucionais, atos e programas a eles vinculados, utilizando a implementação constante e crescente da tecnologia da informação e comunicação.
Conforme destaca Luiz Gustavo Monteiro (2011), com a promulgação da Emenda Constitucional 45/04 estabelecia-se o marco inicial para o processo jurídico eletrônico brasileiro. Dentro do rol principal dos direitos e garantias fundamentais no art. 5º da CRFB/88 era positivado, no inciso LXXVIII, o princípio da duração razoável do processo, nos seguintes termos: “a todos no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”.
A justiça brasileira padece de descrença por parte da sociedade em função da morosidade excessiva na execução de seus objetivos. Os problemas encontrados pelos operadores do direito para torná-la eficaz trazem enormes prejuízos sob vários aspectos ao trâmite dos processos, consequentemente, à solução dos conflitos de interesses na via judicial.
Aumentar a acessibilidade, a celeridade e a efetividade processuais passou a ser um dos objetivos a serem buscados pelo Poder Judiciário para exercer sua função primordial de realizar a justiça com o máximo de excelência.
Por outro lado, conforme destaca Monteiro (2011), com o crescente avanço tecnológico da eletrônica observado dos últimos anos, sobretudo na área das telecomunicações com o advento da rede mundial de computadores – a Internet – é crescente seu uso pelas pessoas como instrumento de busca de informações bem como de comunicação, de forma que tem alcançado proporções gigantescas e globais. Essas tecnologias vêm alterando as formas de trabalho e interligando pessoas, garantindo agilidade na execução de tarefas simples, como o compartilhamento de documentos, mas também complexas, antes delas impossibilitadas de serem realizadas em curto espaço de tempo, como a entrega de correspondências em longas distâncias.
Na busca incessante por soluções para seus problemas e vícios, de forma a garantir uma justiça célere e eficaz, surge o inovador processo judicial eletrônico. Apropriando-se das novas tecnologias de informação e comunicação, esse novo modo processual, conectado à rede mundial de computadores, com transmissão simultânea de dados e documentos, pode trazer inúmeros benefícios ao Poder Judiciário.
Desta forma, ensina o Exmo. Juiz do Trabalho, José Eduardo Resende Chaves Junior em sua brilhante obra:
A desmaterialização dos autos, isto é, sua passagem do mundo analógico dos átomos, para o mundo digital dos bits – até do qbits com o iminente surgimento do computador quântico – sem dúvida já é uma revolução, por si só, comparável ao surgimento da imprensa para a cultura. Mas as mudanças decorrentes dessa desmaterialização são expandidas de forma exponencial a partir da percepção de que o processo eletrônico é e pode ser, sobretudo, um processo em rede. (CHAVES JUNIOR, 2010, p.15)
Nesse sentido, cabem-nos algumas perguntas: A informatização do processo judicial poderá de alguma forma solucionar, ou ao menos diminuir os problemas relacionados? Trata-se meramente da transposição para o meio eletrônico de forma desmaterializada das práticas que já existem no modelo tradicional do processo judicial?
Para responder essas e outras perguntas é preciso compreender o que é a informatização do processo judicial e a forma pela qual pode ocorrer. Faz-se necessário analisá-la sob o ponto de vista legal e suas regulamentações, devendo-se identificar o que precisa existir para que ela se torne realidade, além de identificar os desafios a serem superados para que se torne efetiva.
Somente após realizar tal estudo será possível responder a essas perguntas e saber em que medida a informatização do processo judicial poderá contribuir para a acessibilidade, celeridade e efetividade processual.
Este trabalho destina-se à exploração da temática relacionada ao Processo Judicial Eletrônico no Brasil, apoiado pelo uso das tecnologias de informação e comunicação. A metodologia utilizada para sua execução foi baseada em análises e estudos das legislações aplicáveis ao tema, principalmente a Lei nº 11.419/06, que trata especificamente da informatização do processo judicial no Brasil, bem como em pesquisas documentais e bibliográficas realizadas como meio para se verificar o status quo, em termos científicos e legais, sobre a legislação que regula o processo judicial eletrônico no Brasil, tendo como foco a compreensão da informatização do processo judicial e suas consequências.
As investigações conceituais e principiológicas que a questão envolve serão fundamentadas pela doutrina jurídica e o estudo das tecnologias da informação e comunicação estará presente para apoiar a delimitação das possibilidades de uso de ferramentas a viabilizarem a realização do Processo Judicial Eletrônico.
Por fim, pretende-se verificar os impactos e desafios a serem superados, tanto em relação à necessidade de adequações na legislação pertinente ao tema bem como nas tecnologias de informação e comunicação que ainda precisam ser desenvolvidas ou serem melhor exploradas.
Neste capítulo tentaremos definir algumas variáveis que serão estudadas, ou referenciadas mais adiante, diferenciando-as quando necessário e esclarecendo exatamente o significado de cada uma delas conforme serão abordadas dentro do tema.
A expressão Processo Judicial Eletrônico é o nome mais utilizado atualmente e entendido como mais adequado para nomear um sistema processual que apropria-se de recursos computacionais para reproduzir o procedimento judicial em meio eletrônico, substituindo o registro dos atos processuais realizados no papel por armazenamento e manipulação dos autos em meio digital. Para designar esse sistema também já foram usados os termos processo digital, virtual ou telemático.
A expressão processo virtual foi a primeira utilizada para designar o tema relativo à formação do processo, da ação e da lide, como aquele que não existe, senão numa construção hipotética. A conveniência da utilização desse nome remetia ao uso da Internet, porém logo passou a ser revista e aos poucos abandonada, pois mesmo que se utilizando a rede mundial de computadores e tendo seus autos imaterializados, representa sim processos reais.
A expressão processo digital foi outra amplamente utilizada e que também vem caindo em desuso em função da palavra Digital significar uma contraposição ao termo Analógico. Fazendo um paralelo com um relógio, esse pode ser digital - aquele que possui marcações discretas e informa as horas por dígitos - ou analógico - aquele que marca o passar do tempo continuamente indicando as horas por deslocamentos contínuos dos ponteiros. A massificação do uso dos computadores difundiu a "era digital" como a era dos bits e bytes e isso fez com que essa expressão fosse uma das utilizadas como alternativa para o termo processo eletrônico.
De acordo com o artigo 1º da Lei nº 11.419/06 "o uso de meio eletrônico na tramitação de processos judiciais, comunicação de atos e transmissão de peças processuais será admitido nos termos desta Lei". Quando se fala em tramitação, comunicação e transmissão estamos falando de processo ou procedimentos? Surge daí grande discussão e críticas de muitos doutrinadores sobre o uso equivocado do termo processo eletrônico ao invés de procedimento eletrônico, que seria o correto.
De acordo com Cintra, Grinover e Dinamarco podemos distinguir Processo e Procedimento da seguinte forma:
Etimologicamente, processo significa ‘marcha avante’, ‘caminhada’ (do latim procedere = seguir adiante). Por isso, durante muito tempo foi ele confundido com a simples sucessão de atos processuais (procedimento), sendo comuns as definições que o colocavam nesse plano. Contudo, desde 1868, com a obra de Bulow (teoria dos pressupostos processuais e das exceções dilatórias), apercebeu-se a doutrina de que há, no processo uma força que motiva e justifica a prática dos atos do procedimento, interligando os sujeitos processuais. O processo, então, pode ser encarado pelo aspecto dos atos que lhe dão corpo e das relações entre eles e igualmente pelo aspecto das relações entre os seus sujeitos. [...] A noção de procedimento é puramente formal, não passando da coordenação de atos que se sucedem. Conclui-se, portanto, que o procedimento (aspecto formal do processo) é o meio pelo qual a lei estampa os atos e fórmulas da ordem legal do processo. (CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO, 2005, p. 283, grifo meu).
Conclui-se que estamos diante de um procedimento eletrônico, meio pelo qual será instaurado, desenvolvido e decidido o processo, que, por sua vez, compreende a formação da relação jurídica entre um autor, que possui uma pretensão, um réu, que possui uma pretensão resistida e o juiz, que decide a lide.
Dessa forma, pode-se conceituar o processo judicial eletrônico como a relação entre as partes e o juiz que se utiliza de meios eletrônicos para realizar-se.
Passaremos agora a esclarecer a sistemática que envolve a tecnologia de certificação digital que será discutida para o entendimento da autenticação das partes no Processo Judicial Eletrônico a diante.
2.3.1 Infra-Estrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil)
A Medida Provisória 2200-2, 24 de agosto de 2001, instituiu a Infra-Estrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil) com a função de "garantir a autenticidade, a integridade e a validade jurídica de documentos em forma eletrônica, das aplicações de suporte e das aplicações habilitadas que utilizem certificados digitais, bem como a realização de transações eletrônicas seguras" conforme art. 1º da MP 2.200-2/2001 (grifo meu).
Em seu art. 2º, a medida provisória define a ICP-Brasil como sendo composta "por uma autoridade gestora de políticas e pela cadeia de autoridades certificadoras composta pela Autoridade Certificadora Raiz - AC Raiz, pelas Autoridades Certificadoras - AC e pelas Autoridades de Registro - AR", conforme ilustra a Figura 1 a seguir.
Em seus arts. 5º, 6º, a MP 2.200-2/2001 trata de explicar sua competência, que ilustramos a seguir:
Art. 5o À AC Raiz, primeira autoridade da cadeia de certificação, executora das Políticas de Certificados e normas técnicas e operacionais aprovadas pelo Comitê Gestor da ICP-Brasil, compete emitir, expedir, distribuir, revogar e gerenciar os certificados das AC de nível imediatamente subsequente ao seu, gerenciar a lista de certificados emitidos, revogados e vencidos, e executar atividades de fiscalização e auditoria das AC e das AR e dos prestadores de serviço habilitados na ICP, em conformidade com as diretrizes e normas técnicas estabelecidas pelo Comitê Gestor da ICP-Brasil, e exercer outras atribuições que lhe forem cometidas pela autoridade gestora de políticas.
Art. 6o Às AC, entidades credenciadas a emitir certificados digitais vinculando pares de chaves criptográficas ao respectivo titular, compete emitir, expedir, distribuir, revogar e gerenciar os certificados, bem como colocar à disposição dos usuários listas de certificados revogados e outras informações pertinentes e manter registro de suas operações. (MP 2.200-2/2001).
2.3.2 Criptografia
Segundo definição da ITI, "a palavra criptografia tem origem grega e significa a arte de escrever em códigos de forma a esconder a informação na forma de um texto incompreensível. A informação codificada é chamada de texto cifrado." (ITI, 2012, p.2).
A criptografia envolve dois processos, ou algoritmos criptográficos: a crifragem que é o processo de codificação ou ocultação da informação gerando um texto crifrado, e a decifragem que é o processo inverso utilizado para se obter a informação original a partir do texto cifrado.
Para realizar a crifragem e decifragem de uma informação um programa de computador necessita receber uma chave de criptografia. "Sem o conhecimento da chave correta não é possível decifrar um dado texto cifrado. Assim, para manter uma informação secreta, basta cifrar a informação e manter em sigilo a chave." (ITI, 2012, p.2).
Existem dois tipos de criptografia: a com chave simétrica (igual), ilustrada na Figura 2 acima, que utilizada a mesma chave para a crifragem e para a decifragem, e a com chaves assimétricas, que utiliza uma chave para a cifragem, chamada de chave privada, e uma outra chave para a decifragem, chamada de chave pública.
2.3.3 Assinatura Digital
A técnica da Assinatura Digital para atribuição de autoria a um documento é uma forma eficaz de garantir a autoria de documentos eletrônicos. Ela utiliza o mesmo método de autenticação dos algoritmos de criptografia de chave pública, porém restringe-se a um resumo criptográfico do documento, conhecido como função hash.
O resumo criptográfico "pode ser comparado a uma impressão digital, pois cada documento possui um valor único de resumo e até mesmo uma pequena alteração no documento, como a inserção de um espaço em branco, resulta em um resumo completamente diferente." (ITI, 2012, p.6)
Ao ser assinado digitalmente o documento não sofre qualquer alteração, e a assinatura digital (hash cifrado com a chave privada) é anexada ao documento.
O processo de comprovação de uma assinatura digital é bem simples: compara-se o resumo criptográfico do documento original (função hash) com a decifragem da assinatura digital com a chave pública do signatário. Se os hash gerados forem iguais, a assinatura digital é autêntica e significa que o documento está íntegro. Caso os hash gerados forem diferentes podem ter havido alterações no documento ou na assinatura.
2.3.4 Certificado Digital
O Certificado Digital é um documento eletrônico assinado eletronicamente por uma entidade certificadora que tem a função de associar uma pessoa ou entidade a uma chave pública e fornecer algumas informações como, por exemplo, dados da entidade certificadora responsável pela emissão do certificado, para quem foi emitido o certificado, informações de prazo de validade e assinaturas SHA1 e MDS.
2.3.5 Utilizando a chave privada (Certificado Digital)
O uso da chave privada, que o usuário pode chamar simplesmente de "Certificado Digital", autentica uma transação ou um documento, ou seja, confere à operação o atributo de não-repúdio, não podendo posteriormente o usuário negar a realização da transação. Portanto, é muito importante que o usuário mantenha sua chave privada protegida e armazenada de forma adequada.
Existem alguns dispositivos como tokens e cartões Inteligentes (smart cards) que permitem a proteção à chave privada do usuário, pois possuem memória capaz de armazenar e processar diversos tipos de informações.
Eles [smart cards] se assemelham – em formato e tamanho – a um cartão de crédito convencional. [...] Com eles é possível gerar as chaves e mantê-las dentro de um ambiente seguro, uma vez que as operações criptográficas podem ser realizadas dentro do próprio dispositivo. (ITI, 2012, p.13).
As entidades representativas de algumas categorias profissionais, como o Conselho Federal de Medicina (CFM) e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), têm adotado carteiras de identificação profissional baseadas em smart cards, nas quais pode ser armazenada a chave privada dos portadores.
Diferentemente dos documentos utilizados para identificação pessoal, como CPF e RG, o certificado digital possui um período de validade, devendo o usuário revalidá-lo junto à Autoridade Certificadora (AC) quando do seu vencimento. "Só é possível assinar um documento enquanto o certificado é válido. É possível, no entanto, conferir as assinaturas realizadas mesmo após o certificado expirar" (ITI, 2012, p.15).
Os certificados digitais podem perder sua validade também por meio de sua revogação. O pedido deve ser encaminhado à AC que emitiu o certificado contendo uma justificativa, como comprometimento da chave privada, extravio, alterações de dados, etc.
Após a revogação ou expiração do certificado, todas as assinaturas realizadas com este certificado tornam-se inválidas, mas as assinaturas realizadas antes da revogação do certificado continuam válidas se houver uma forma de garantir que esta operação foi realizada durante o período de validade do certificado. (ITI, 2012, p.15).
Essa sugestão foi recebida em Plenário em 04 de dezembro de 2001, como projeto de Lei nº 5.828/01, tendo sido remetido para o Senado Federal em apenas seis meses. Entretanto, sofreu várias alterações até sua conversão na Lei nº 11.419, promulgada em 16 de dezembro de 2006, entrando em vigor em 19 de março de 2007.
Trata-se de uma lei de caráter geral, que dispõe sobre o Processo Judicial Eletrônico e altera alguns artigos do CPC. Ela possui apenas 22 artigos, divididos em quatro capítulos, e procuraremos apresentar os pontos mais importantes e também dos polêmicos a seguir.
3.1.1 Tramitação processual eletrônica
Nesse capítulo introdutório, a Lei n0 11.419/2006 determina logo em seu art. 10 explicitamente que passam a ser admitidas a transmissão de peças processuais por meio eletrônico e a própria tramitação do processo judicial.
A Lei apresenta-se como uma lei de caráter geral, conforme bem observa o professor Carlos Alberto Rohrmann (2010):
Trata-se de uma lei de direito processual e que tem aplicabilidade bastante genérica uma vez que abrange o processo civil, penal e trabalhista em todos os graus de jurisdição. Uma indagação é quanto à aplicabilidade da lei em análise ao processo administrativo que se apresenta como uma tendência natural. Todavia, a Lei em análise é aplicável especificamente ao processo judicial. (ROHRMANN, 2010)
3.1.2 Definição de meio eletrônico
O legislador teve a preocupação em definir de forma abrangente o meio eletrônico tanto para armazenamento dos arquivos digitais quanto para seu tráfego e de acordo com o entendimento de Rohrmann (2010), "a lei privilegia a utilização da rede mundial de computadores, a Internet, como rede a ser preferencialmente usada na transmissão eletrônica".
3.1.3 Assinatura eletrônica
Teve cautela também, o legislador, ao identificar de forma inequívoca o signatário das transmissões eletrônicas nos sistemas judiciais por meio de sua assinatura eletrônica para validá-las. Para tanto foi permissivo quanto ao uso de duas espécies desse gênero:
a) assinatura digital baseada em certificado digital emitido por Autoridade Certificadora credenciada, na forma de lei específica;
b) mediante cadastro de usuário no Poder Judiciário, conforme disciplinado pelos órgãos respectivos.
O primeiro gênero refere-se às assinaturas baseadas em certificado digital emitido por Autoridade Certificadora integrante da ICP-Brasil, conforme já estudamos no capítulo anterior. O segundo refere-se ao fornecimento de login e senha para identificação do usuário mediante cadastro junto no Poder Judiciário. Para Tainy de Araújo Soares (2011), mesmo que similares em seu propósitos, as espécies de assinaturas eletrônicas previstas são bastante diferentes em sua forma de implementação e esclarece que:
As baseadas em certificados digitais, por exemplo, utilizam algoritmos de criptografia que processam a informação no próprio chip que acompanha os cartões, de modo a tornar qualquer violação ao processo de assinatura bastante difícil, sendo essa forma, por isso mesmo, considerada a mais segura. Já as assinaturas obtidas mediante cadastro são, na realidade, senhas fornecidas pelos órgãos do Judiciário que devem ser informadas aos sistemas judiciais no momento da realização dos atos processuais. Por não estarem revestidas das mesmas garantias das primeiras, são tidas como menos seguras. (SOARES, 2011)
3.1.4 Credenciamento prévio junto ao Poder Judiciário
Devemos observar que é explícita no art. 20 a obrigatoriedade de credenciamento prévio junto ao Poder Judiciário, "sob pena de nulidade da prática do ato processual, uma vez que o requisito legal e formal da assinatura válida não terá sido atendido", conforme explica Rohrmann (2010), ponderando também que:
A identificação e a autenticidade são duas propriedades da maior importância para a confiabilidade no processo eletrônico. A assinatura digital certamente garante a identificação e a autenticidade dos documentos eletrônicos, em razão da utilização dos dados do documento digital como um dos parâmetros para a geração do selo digital (da assinatura digital) a ser gerada em cada um dos casos. Neste caso é inegável a responsabilidade da AC emissora do certificado digital. Caso seja utilizada uma forma de assinatura eletrônica distinta da assinatura digital, toda a responsabilidade se desloca para o Poder Judiciário. (ROHRMANN, 2010)
3.1.5 Extensão do horário protocolar
O parágrafo único do art. 3o, por sua vez, explicita que serão tempestivas as petições protocoladas por meio do sistema eletrônico até as 24 (vinte e quatro) horas do último dia do prazo processual, "novidade que muito facilitará a vida do advogado, que não mais terá de preocupar-se com o horário de encerramento do protocolo", conforme observa Magali Cunha Machado e Fernando Silveira Melo Plentz Miranda (2011), destacando que esse dispositivo também "promoveu uma mudança na legislação processual, já que, na prática, o prazo para a realização do ato expirará somente no minuto e segundo exatos da virada do seu último dia".
3.2.1 Diário da Justiça Eletrônico (DJe)
O art. 40 vem regulando a forma de comunicação dos atos processuais. Trata-se de uma faculdade dos órgãos do Poder Judiciário em criar um Diário da Justiça Eletrônico, aliada a uma obrigação de serem assinados digitalmente e disponibilizados em sítio da Internet, "substituindo qualquer outro meio e publicação oficial, à exceção dos casos que, por lei, exigem intimação ou vista pessoal" (SOARES, 2011).
Como é possível que ocorram divergências de horário na disponibilização do Diário da Justiça na Internet, e até mesmo de diferenças de fuso horário ou de adoção de horário de verão, deve ser considerado como data da publicação o primeiro dia útil seguinte ao da disponibilização da informação para consulta pela Internet.
Caso a disponibilização da informação na Internet ocorra na sexta-feira, considera-se a data da publicação na segunda-feira. Porém, há de se ficar atento, porque caso a disponibilização da informação na Internet se dê no sábado, ou em um dia feriado, a data da publicação considerada também será a segunda-feira. (ROHRMANN, 2010).
Soares (2011) completa a explicação afirmando que "na prática, as partes ganharão um pouco mais de tempo, uma vez que o Diário já estará disponível on-line um dia antes de sua publicação".
3.2.2 Intimação Eletrônica
Segundo o art. 5o todos aqueles que se cadastrarem junto ao órgão do Poder Judiciário passarão a ser intimados também por meio eletrônico, diretamente no sistema do processo eletrônico, sendo consideradas intimações pessoais para todos os efeitos legais, inclusive as da Fazenda Pública. Conforme § 3º do mesmo artigo, o intimado tem até 10 (dez) dias corridos para realizar a consulta da intimação. Findo esse prazo ele será considerado automaticamente intimado, ou seja, cabe-lhe o ônus de realizar consultas no sistema de processo eletrônico pelo menos a cada 10 (dez) dias corridos.
Ao que se refere ao momento da intimação, considerar-se-á o dia em que o intimando efetivar a consulta eletrônica ao teor deste ato no portal (ou no dia útil seguinte, caso se dê em dia não útil), devendo isso ocorrer em dez dias contados da data de seu envio, sob pena de considerar-se realizada na data do término desse prazo (§§ 1º, 2º e 3º). [...] Em caráter informativo, poderão ser enviados e-mails, à semelhança do que ocorre nos conhecidos sistemas push, para comunicar o envio da intimação e a abertura automática de prazo processual (§ 4º). (SOARES, 2011)
Em relação à intimação eletrônica, Rohrmann (2010) observa oportunamente que:
Deve-se observar que se dois advogados atuam no mesmo processo e apenas um é cadastrado, obrigatoriamente deverá haver a intimação também fora do portal (em diário da justiça eletrônico ou impresso em papel) sob pena de nulidade da intimação daquele que não é cadastrado. (ROHRMANN, 2010)
Adicionalmente, o § 5º do mesmo artigo prevê que a intimação possa ser realizada por outro modo, conforme determinação do juiz, para que atinja sua finalidade nos casos de urgência ou prejuízo a quaisquer das partes, considerando longo o prazo de 10 (dez) dias.
3.2.3 Citação Eletrônica
O art. 6º traz uma inovação ao campo das citações, permitindo que elas possam ser realizadas também por meio eletrônico, inclusive as da Fazenda Pública, excetuando-se as de Direito Processual Penal. Seus requisitos são a observância das formas e cautelas já apresentadas do art. 5º e da disponibilidade da íntegra dos autos ao citando, ou seja, pode-se concluir que a citação eletrônica só tem lugar no processo eletrônico. Rohrmann (2010) observa que "o dispositivo em tela não revoga a citação por correio, por oficial de justiça e por edital; ele apenas cria um novo meio de citação".
Tanto a citação quanto a intimação ou notificação serão novamente tratados no art. 9º, já no capítulo III que disciplina o Processo Eletrônico, para determinar que na ocorrência de inviabilidade técnica do uso do meio eletrônico sejam praticadas segundo as regras ordinárias, sendo, porém os documentos físicos produzidos nesses atos digitalizados, sua imagem anexada ao processo eletrônico e posteriormente destruídos.
3.2.4 Comunicações Oficiais
O legislador indica no art. 7º sua preferência para que passe a ser adotado o meio eletrônico para o trânsito das "cartas precatórias, rogatórias, de ordem e, de um modo geral, todas as comunicações oficiais que transitem entre órgãos do Poder Judiciário, bem como entre os deste e os dos demais Poderes". Essa indicação reflete a necessidade de celeridade nessas comunicações, como exemplifica Magali Cunha Machado e Fernando Silveira Melo Plentz Miranda (2011):
Hoje, uma carta precatória expedida, por exemplo, pelo juízo de Belém ao de São Paulo demora, em média, dois anos para ser cumprida. No caso do procedimento digital autorizado pela lei (artigo 7º), este lapso de tempo poderá ser reduzido a poucos dias ou até mesmo horas, tendo em vista a comunicação oficial entre os órgãos do Poder Judiciário e deste com o réu realizarem-se virtualmente. (MACHADO; MIRANDA, 2011).
3.3.1 Sistemas Eletrônicos
No art. 8º da lei em análise, o legislador faculta aos órgãos do Poder Judiciário o desenvolvimento de sistemas próprios para o processamento de ações judiciais, seja por meio de autos total ou parcialmente digitais.
O processo eletrônico pode ser totalmente eletrônico, nos casos em que seja possível prescindir por completo do documento em papel (o que inclui os processos que são instruídos com cópias digitais dos documentos originalmente em papel, a chamada “digitalização do documento físico”). Por outro lado, haverá o processo com autos parcialmente digitais, em situações nas quais não seja possível o processo totalmente digital, por problemas, por exemplo, de uma instância não ter os equipamentos computacionais necessários. (ROHRMANN, 2010)
Há uma indicação clara de utilização preferencial da Internet, a rede mundial de computadores, para acesso aos sistemas eletrônicos, bem como a obrigatoriedade do uso da assinatura eletrônica em todos os atos processuais.
3.3.2 Atos e movimentos automatizados
Conforme prevê o art. 10º da Lei 11.419/06, por meio de seu acesso ao sistema eletrônico, o próprio advogado poderá realizar diretamente nos autos de processo eletrônico a distribuição da petição inicial e a juntada da contestação, dos recursos e das petições em geral. Essa situação gera a autuação de forma automática, sem a necessidade de intervenção do cartório ou da secretaria judicial. Por se tratar de documentos em formato digital:
Uma vez que o processo eletrônico é armazenado em pastas de arquivos de computador, o próprio programa de computador que implementa o processo eletrônico permite aos advogados a autuação automática, sem a intervenção da secretaria do juízo. [...] Cabe ao advogado gravar o seu recibo eletrônico do protocolo para poder comprovar o cumprimento do prazo (que ficará também certificado nos autos do processo eletrônico) ou a juntada de determinada peça processual. (ROHRMANN, 2010)
3.3.3 Atendimento aos Prazos Processuais
Os parágrafos do art. 10o da lei em análise preveem que os atos processuais "serão considerados tempestivos os efetivados até as 24 (vinte e quatro) horas do último dia" (§ 1o) e que "o prazo fica automaticamente prorrogado para o primeiro dia útil seguinte à resolução do problema" (§ 2o) quando o sistema se tornar inacessível por motivo técnico. Sobre essa questão cabe uma importante reflexão observada por Wesley Roberto de Paula:
Por se tratarem de prazos processuais, questões eminentemente de ordem pública, com importantes repercussões no direito material pretendido, deveriam ser disponibilizados nesta norma os mecanismos a serem adotados para a comprovação da prorrogação do prazo perdido por inoperância do sistema de tramitação processual eletrônica. ((PAULA, Wesley Roberto de in CHAVES JUNIOR, 2010, p.116)
O texto do § 3o obriga ainda que aos órgãos do Poder Judiciários a "manter equipamentos de digitalização e de acesso à rede mundial de computadores à disposição dos interessados para distribuição de peças processuais". Sobre essa obrigatoriedade Rohrmann faz a seguinte reflexão:
O processo eletrônico não pode ser, em hipótese alguma, obstáculo à plena prestação jurisdicional e ao acesso à Justiça. Uma vez que o Poder Judiciário promove a migração do processo em papel para o processo eletrônico, em meio digital, cabe a ele permitir e promover o pleno acesso do advogado ao meio digital. [...] O não-oferecimento ou o não-funcionamento dos referidos equipamentos nos órgãos do Poder Judiciário pode implicar a impossibilidade da prática de determinado ato processual, o que equivale à hipótese do §2º deste mesmo artigo 10: sistema indisponível. Consequentemente, caso os equipamentos de que trata este §3º não estejam efetivamente em funcionamento no dia do prazo, caberá ao advogado pedir certidão da situação para provar que o Sistema do Poder Judiciário para o processo eletrônico não estava disponível. (ROHRMANN, 2010)
3.3.4 Documentos originais: Eletrônicos e Digitalizados
No art.11 da Lei de Informatização do Processo cuidou o legislador de considerar originais, para todos os efeitos legais, os documentos produzidos eletronicamente e juntados aos processos eletrônicos com garantia da origem e de seu signatário, "ressalvada a alegação motivada e fundamentada de adulteração, quando será possível a arguição de falsidade do documento original, segundo as regras da legislação processual em vigor", conforme observa Soares (2011).
Consideram-se documentos produzidos eletronicamente os documentos digitais e os digitalizados, razão pela qual o §3º da do art. 11 recomenda:
§ 3o Os originais dos documentos digitalizados, mencionados no § 2o deste artigo, deverão ser preservados pelo seu detentor até o trânsito em julgado da sentença ou, quando admitida, até o final do prazo para interposição de ação rescisória.
A respeito dessa determinação Rohrmann pondera no sentido de concordância com a norma:
Documento digitalizado é documento digital correspondente a um documento físico existente anteriormente. Uma vez que a digitalização pode gerar um documento digital de pouca legibilidade, por exemplo, é razoável exigir-se a preservação dos originais até o término do prazo exigido pela lei em comento. (ROHRMANN, 2010)
Como sempre existirão casos em que poderá haver dificuldades técnicas na digitalização de certos documentos, devido ao seu grande volume ou por problemas de legibilidade, o § 5º prevê sua apresentação "ao cartório ou secretaria no prazo de 10 (dez) dias contados do envio de petição eletrônica comunicando o fato, os quais serão devolvidos à parte após o trânsito em julgado".
3.3.5 Acesso aos autos
O § 6o do art.11 apresenta talvez uma das maiores polêmicas introduzidas pela Lei de Informatização do Processo, alvo de muitas críticas quando disciplina que somente as partes processuais e o Ministério Público terão acesso os documentos digitalizados, juntados ao processo eletrônico. Ou seja, apenas informações de caráter estritamente processual estariam acessíveis à sociedade, como as sentenças, acórdãos e termos de audiência, permanecendo inacessíveis ao público os documentos juntados pelas partes e os dados de natureza eminentemente pessoal.
Para Rohrmann essa norma está alicerçada sobre o princípio da segurança dos atos praticados no meio eletrônico:
Este princípio, aliado ao princípio da confiança, é vital para que as partes e seus advogados possam valer-se das vantagens que a utilização do mundo virtual trará para o processo judicial sem que bens maiores como a privacidade e a própria dignidade da pessoa humana sejam violados, dados os enormes riscos de fraudes e de acesso indevido, entre outros, que circundam o mundo virtual ou eletrônico. (ROHRMANN, 2010)
Por outro lado, Soares (2011) entende que "limita o acesso aos autos apenas às partes envolvidas, colidindo frontalmente com o disposto no art. 7° da Lei no 8.906/94 (Estatuto da OAB)" e que tal estatuto traz em seu rol de direitos dos advogados a possibilidade de "examinar, em qualquer órgão dos Poderes Judiciário e Legislativo, ou da Administração Pública em geral, autos de processos findos ou em andamento, mesmo sem procuração, quando não estejam sujeitos a sigilo” e segue esclarecendo seu ponto de vista:
O fato de estarem amplamente acessíveis pela Internet, e não fisicamente no cartório, não pode constituir razão para oposição de óbice à consulta das peças processuais, tanto é assim que o CNJ revogou o Enunciado n.° 11, que, em sintonia com o citado artigo da Lei 11.419, restringia o acesso aos autos de processos eletrônicos "apenas às partes e seus advogados constituídos e ao Ministério Público", no âmbito dos feitos que tramitam naquele Conselho, decidindo, contrariamente, com base no princípio da publicidade e em respeito ao Estatuto da Ordem, que advogados podem ter acesso amplo às peças processuais eletrônicas salvo as que se encontram em segredo de justiça. (SOARES, 2011).
3.3.6 Conservação dos autos
O art. 12 da lei em comento disciplina que a conservação dos autos poderá ser efetuada pelo ao órgão do Poder Judiciário total ou parcialmente por meio eletrônico, sendo dispensada a formação de autos suplementares, uma vez que deverão ser protegidos por meio de sistemas de segurança de acesso e armazenados em meio que garanta a preservação e integridade dos dados (§1º).
O §2º prevê que os autos de processos eletrônicos sejam impressos em papel nos casos em que houver a necessidade de serem remetidos para outro juízo ou a outra instância que não disponham de sistema eletrônico compatível, devendo, nesse caso, serem autuados na forma prevista pelo CPC, ainda que pertinentes a juizado especial ou de natureza criminal ou trabalhista. O §4º completa esclarecendo que o processo cujos autos passarem para o suporte físico, tendo sido impressos, "seguirá tramitação legalmente estabelecida para os processos físicos”.
Por outro lado, disciplina o §5º que vindo a serem digitalizados autos físicos, em tramitação ou já arquivados, deverá ser realizada a publicação de editais de intimações ou a intimação pessoal das partes para que se manifestem sobre o desejo de manterem pessoalmente a guarda de algum dos documentos originais no prazo preclusivo de (30) trinta dias.
3.4.1 Identificação de prevenção, litispendência e coisa julgada
O parágrafo único do art. 14 da lei no 11.419/06 cuida de diligência que não terá implicação processual direta, pois apenas determina que os sistemas eletrônicos devam tentar localizar as ocorrências de prevenção, litispendência e coisa julgada. Mesmo não sendo localizada pelo sistema, a ocorrência ainda poderá ser arguida pelas partes na tramitação processual.
3.4.2 Fornecimento de CPF ou CNPJ
O art. 15 da lei em análise determina que a parte deverá informar na petição inicial o número de seus CPF ou CNPJ perante a Secretaria da Receita Federal, salvo impossibilidade que comprometa o acesso à justiça.
Recorrendo à análise de Magali Cunha Machado e Fernando Silveira Melo Plentz Miranda encontramos um entendimento que destaca que "relativamente à pessoa física, existe um obstáculo, pois a exigência do CPF em vez de garantir o acesso à justiça ao nacional, como promete a Constituição, estaria garantindo acesso apenas ao contribuinte" (ALVIM; CABRAL JÚNIOR apud MACHADO; MIRANDA, 2011). Por outro lado, observam que o fornecimento do CPF pode evitar muitos embaraços que são causados pela Justiça em função da existência de homônimos, uma vez que o CPF é um número único que identificaria sem dúvidas o indivíduo.
3.4.3 Livros cartoriais e demais repositórios
O art. 16 da referida lei disciplina apenas que "os livros cartoriais e demais repositórios dos órgãos do Poder Judiciário poderão ser gerados e armazenados em meio totalmente eletrônico", nesse caso ficam sujeitos às mesmas obrigações de conservação disciplinas para os autos processuais.
3.4.4 Regulamentação da Lei pelos órgãos do Poder Judiciário
O art. 18 determina que os próprios órgãos do Poder Judiciário devam regulamentar a Lei de Informatização do Processo Judiciário no âmbito de suas respectivas competências. Para Soares (2011) "tal medida é salutar, para que o desenvolvimento da informatização do processo não seja engessado pela burocracia que envolve o processo legislativo".
3.4.5 Convalidação de atos processuais eletrônicos anteriores
Tratou o legislador de garantir a segurança jurídica, convalidando por meio do art. 19 da Lei no 11.419/06 os atos processuais praticados por meio eletrônico até a data de sua publicação, observado o atendimento de sua finalidade e não ter havido prejuízo para as partes.
3.4.6 Alterações no Código de Processo Civil
O art. 20 cuida de realizar ajustes no CPC para proporcionar a recepção das inovações trazidas pela Lei no 11.419/06 e, respaldado pelo princípio da instrumentalidade das formas, reconhece o meio eletrônico como meio válido para tramitação processual, privilegiando sua autenticidade por meio da assinatura eletrônica, em grande parte das vezes exigindo a assinatura digital. Detalharemos algumas dessas alterações a seguir:
a) O parágrafo único do art. 8o do CPC passa a informar que o instrumento de procuração poderá ser assinado digitalmente com base em certificado emitido por Autoridade Certificadora credenciada.
b) Vedado o parágrafo único do art. 154, inclui um §2º que informa que "todos os atos e termos do processo podem ser produzidos, transmitidos, armazenados e assinados por meio eletrônico, na forma da lei", uma clara indicação da intenção do legislador em informatizar ao máximo os atos praticados.
c) Inclui o parágrafo único ao art. 164 para explicitar que a assinatura dos juízes, em todos os graus de jurisdição, poderá ser feita eletronicamente, na forma prescrita em lei.
d) Inclui o inciso IV ao art. 221 para permitir a citação por meio eletrônico.
e) Inclui o inciso VI ao art. 365 para tornar válidas, como prova judicial, "as reproduções digitalizadas de qualquer documento, público ou particular, quando juntadas aos autos".
Esse capítulo pretende apontar alguns dos impactos que estão sendo verificados nos órgãos do Poder Judiciário que já iniciaram a implantação do processo judicial eletrônico nos moldes previstos pela Lei no 11.419/06 ou que já são projetados para acontecerem brevemente e que precisarão de alguma forma serem enfrentados.
Os tópicos apresentados a seguir foram originalmente indicados por Fausto Morey (2010).
Em todas as instâncias os ritos processuais necessariamente sofrerão redefinições para sua adequação ao processo eletrônico e ao sistema informatizado a ser implantado. Além disso, muitas atividades realizadas hoje por servidores e magistrados poderão ser realizadas de maneira automatizada e, possivelmente de forma diversa da tramitação dos autos físicos. Nesse sentido Morey (2010) salienta: "Não se trata de informatizar a burocracia e as atuais rotinas de trabalho mas, ao contrário, é a busca por sua mais radical modificação possível."
Se por meio do processo judicial eletrônico o próprio advogado pode realizar, nos autos do processo, a distribuição da petição inicial e a juntada da contestação, dos recursos e das petições em geral, as seções e serviços de distribuição passaram a ser esvaziadas, uma vez que o próprio sistema cuidará execução das regras e critérios de distribuição automaticamente.
Com a automatização de parte das atribuições dos servidores, consequentemente haverá grande redução na carga de trabalho. Esta redução implicará em modificações no dimensionamento e na realocação dos recursos humanos pelas unidades judiciárias.
As mudanças trazidas pela implantação dos sistemas informatizados ocasionarão muitas mudanças no escopo de trabalho dos servidores, na rotina dos órgãos judiciários e até mesmo em suas estruturas organizacionais.
Podemos ilustrar como as atividades dos servidores serão modificadas a começar por atividades que não mais serão desempenhadas: gestão de autos físicos (pastas de processo), livros de registro, fichas e carimbos; eliminação da intervenção de servidores no processamento de petições iniciais, intimações e publicações.
Nesse sentido, Morey (2010) adverte:
Modificações nas atribuições constantes no plano de cargos e carreiras tornam-se necessárias em função da aplicação da Lei e de outras mudanças no funcionamento da Justiça, que se tornarão cada vez mais constantes. As novas contratações de pessoal deverão ser precedidas por estes ajustes. (MOREY, 2010)
Com certeza a adoção do processo judicial eletrônico trará impactos na rotina trabalho dos magistrados, pois representará uma mudança de paradigma na sua atuação profissional. Morey (2010) afirma não ser possível ainda afirmar qual será esse impacto:
Será necessário estudar os efeitos práticos nas atividades desenvolvidas e, num segundo momento, empreender os ajustes necessários que poderão determinar uma eventual mudança relativa entre o número de magistrados e servidores e na celeridade da tramitação do processo, entre outros. (MOREY, 2010).
Como espera-se que, com a implantação do processo judicial eletrônico, gradualmente diminua-se o número de processos em papel, e com isso ocorra também progressiva redução da necessidade de instalações físicas destinadas ao armazenamento dos autos físicos dos processos.
Outra questão que fatalmente poderá representar redução da necessidade de instalações físicas é a diminuição do fluxo de pessoas às unidades judiciárias, uma vez que vários serviços hoje realizados apenas presencialmente poderão ser realizados pelo próprio indivíduo, por meio do sistema informatizado na internet. Morey exemplifica bem com o exemplo vivido pela automatização dos serviços do setor bancário:
À medida que ampliavam sua informatização e ofereciam mais recursos de auto-atendimento em suas instalações ou por meio da Internet, foram modificando as suas instalações para atender às novas demandas de seus usuários. (MOREY, 2010).
Como mencionado anteriormente, com o processo judicial eletrônico espera-se que ocorra mudança na forma de interação com o usuário da justiça que passará a demandar muito mais suporte remoto para operação do sistema, por telefone ou mesmo pela internet, do que atendimento no protocolo da secretaria, o que indica que haverá a necessidade de realizar alterações na forma de atendimento ao público. Além disso, como é imperativo no texto da lei em comento, equipamentos para auto-atendimento deverão ser projetados.
Conforme determinação do CNJ, o Poder Judiciário tem se mobilizado para a padronização da nomenclatura utilizada em seus vários órgãos. Associando essa padronização taxonômica à implantação do processo judicial eletrônico pode-se alcançar a integração do Poder Judiciário e o atendimento ao objetivo de aumentar a eficiência e a eficácia na prestação de serviços jurisdicionais.
Morey (2010) ilustra que atualmente já existe o conhecido convênio BACEN/JUD, que permite a consulta e o bloqueio das contas bancárias pode meio do CPF e CNPJ, e completa:
No futuro, convênios desta natureza poderão ser celebrados visando integrar, por exemplo, a Justiça com os cartórios de registros de imóveis, de registros de patentes e com DETRANs, entre outros. Convênios com as secretarias de administração penitenciária, delegacias e até mesmo com a Empresa de Correios e Telégrafos permitirão a troca de informações digitais certificadas, propiciando substancial mudança na forma da Justiça operar, com ganhos de eficiência e celeridade. (MOREY, 2010)
Morey (2010) explica que atualmente já existe uma rotina de trabalho em especial nas unidades do Poder Judiciário que demanda muito esforço e que poderá ser minimizado: trata-se da obtenção de dados e descritores estatísticos para o atendimento à determinação da Resolução n.º 15 do CNJ. Essas e outras demandas por obtenção de dados estatísticos relativos à tramitação processual poderão ser automatizadas, facilitando a adoção de um modelo de gestão que considere os indicadores de desempenho no processo de tomada de decisão.
Considerando que a forma de atendimento ao público proporcionada pelos órgãos do Poder Judiciário irá mudar, é de se esperar que os serviços realizados por profissionais relacionados com o Poder Judiciário mude também. Um exemplo disso são os trabalhos burocráticos típicos realizados pelos escritórios de advocacia, dos advogados públicos e privados e, até mesmo, das partes e do público em geral.
A tradicional atividade de "fazer o fórum", realizada geralmente por estagiários do direito, será radicalmente mudada ou mesmo extinta. Poderá ocorrer ainda, a necessidade de modificação no currículo dos cursos de direito visando possibilitar a adequada preparação para que os alunos possam atuar no novo padrão tecnológico e rito processual. (MOREY, 2010)
A Emenda Constitucional nº 45 atendeu os anseios da população brasileira e a reclamação da comunidade jurídica por um processo mais célere e eficaz, no sentido de viabilizar o efetivo cumprimento das decisões judiciais e a satisfação dos direitos subjetivos.
O que se buscou nunca foi a criação de um novo processo judicial, apenas a apropriação de recursos de tecnologia da informação e comunicação para desburocratizar o trâmite processual. A promulgação da Lei nº 11.419/06 tem resultado em uma reformulação das rotinas processuais, com vistas à desmaterialização dos atos processuais e à racionalização dos procedimentos, bem como à otimização da prestação jurisdicional e dos serviços judiciários.
Parece-nos inegável que a utilização da internet para a implementação do processo eletrônico já se apresenta como uma realidade no Brasil, que vem ao encontro das expectativas da sociedade de um direito mais moderno, mais rápido e mais eficiente. O processo eletrônico democratiza o acesso à justiça quando permite o acesso ao Judiciário mesmo nos rincões do país, todavia, o acesso à tecnologia, aos computadores e à rede internet de alta velocidade é um imperativo para que tal democratização torne-se efetiva como desejamos. O risco de fraude, inerente ao uso do mundo virtual, deve ser minimizado ao máximo, com o uso de criptografia forte e assinatura digital em todos os atos do processo. Os sistemas desenvolvidos para apoiar o processo judicial eletrônico ainda precisam ser enriquecidos de recursos e aprimorados, mas isso somente vai acontecer com o retorno da experiência dos usuários, que ao invés de se colocar como inimigos da tecnologia devem se posicionar como seus clientes, pois seu desenvolvimento deve ser empregado em seu favor.
A Justiça pode ser efetiva e célere sem perder de vista os princípios que a norteiam. Devemos estar preparados para todas as implicações que a efetiva implantação do processo eletrônico ainda trará e estar abertos para a quebra de paradigmas que se anuncia.
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Servidor do Ministério Público do Estado de Minas Gerais. Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG (2012). Especialista em Gerência de Tecnologia da Informação pela Universidade FUMEC (2004). Bacharel em Ciência da Informação pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais - PUC Minas (2003). Tem experiência na área de Administração Pública e Privada, com ênfase em Tecnologia da Informação, atuando principalmente com os seguintes temas: governança de tecnologia da informação, aquisições, licitações e contratos, gerenciamento de projetos, gerenciamento de documentos eletrônicos, inovação tecnológica, educação a distância, gestão acadêmica, desenvolvimento de sistemas.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: GONTIJO, Iggor Leonardo Costa. Processo judicial eletrônico no Brasil: legislação, impactos e desafios Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 04 nov 2016, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/47744/processo-judicial-eletronico-no-brasil-legislacao-impactos-e-desafios. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: ELISA CARDOSO BATISTA
Por: Fernanda Amaral Occhiucci Gonçalves
Por: MARCOS ANTÔNIO DA SILVA OLIVEIRA
Por: mariana oliveira do espirito santo tavares
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