RESUMO: Este trabalho insere-se no contexto do estudo dos direitos das minorias, mais especificamente dos das pessoas com deficiência, no âmbito do processo de tomadas de decisões, mormente o político, com o fim de que seus direitos sejam ouvidos e efetivados, em conformidade com o artigo 29, da Convenção sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência, recepcionada com o status de emenda constitucional (artigo 5º, §3º, da Constituição da República) pelo Decreto 6.949/2009 e com o artigo 76, do Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei 13.146/2015).
PALAVRAS-CHAVES: Pessoa com deficiência; Participação política; Direito das minorias; Processo de tomada de decisões; Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.
ABSTRACT: This paper fits into the context of the study of minority rights, specifically the rights of people with disabilities within the decision-making process, especially political, in order that their rights are heard and accomplished, in accordance with the Article 29 of the Convention on the Rights of Persons with Disabilities, approved with the status of constitutional amendment (Article 5, §3 of the Brazilian Constitution) by Decree 6.949/2009 and with the Article 76 of the Person with Disabilities Act (Law 13.146/2015).
KEYWORDS: person with disabilities; political participation; rights of the minorities; decision-making process; Convention on the Rights of Persons with Disabilities.
1. INTRODUÇÃO
No presente século, é crescente a preocupação dos governos em demonstrar a efetivação dos direitos humanos, principalmente quando passam a recepcionar em seu ordenamento interno os tratados sobre o tema.
A República Federativa do Brasil tem demonstrado sensibilidade à temática, o que se pode ver por sua atuação constante junto a organismos internacionais, como a Organização das Nações Unidas (ONU) e suas comissões e conselhos. Nesse contexto, vale destacar a participação da nação brasileira na elaboração e ratificação da primeira convenção internacional de direitos humanos do século XXI: a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, de dezembro de 2006, a partir de agora identificada pelo acrônimo CDPD.
Não se ateve, entretanto, nosso país em apenas ratificar o documento, mas também a recepcioná-lo como equivalente a emenda constitucional, nos termos do artigo 5º, §3º da Constituição da República (CRFB), por meio do Decreto Legislativo n. 186, de 9 de julho de 2008 e do Decreto n. 6.949, de 25 de agosto de 2009. Mais recentemente, foi promulgada a Lei 13.146/2015, que criou o Estatuto da Pessoa com Deficiência (doravante EPD), destinado a “assegurar e a promover, em condições de igualdade, o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais por pessoa com deficiência, visando à sua inclusão social e cidadania” (art. 1º, do EPD). Esse reconhecimento dado aos direitos das pessoas com deficiência é, inegavelmente, um marco na concretização dos direitos humanos, sobretudo os das minorias, como as pessoas com deficiência.
Urge, no entanto, que tal conquista seja plenamente divulgada, para que os Poderes Executivo, Judiciário e Legislativo possam dela ter ciência e também buscar sua efetivação, principalmente agora em que seu descumprimento fere os direitos fundamentais das pessoas com deficiência, e não somente delas, como também de seus parentes e amigos, outras minorias e, por que não dizer, da própria sociedade, visto que fere a matriz da dignidade humana, fundamento de nossa república (artigo 1º, III, da CRFB).
Nesse ínterim, trazemos à discussão a importância da participação política das pessoas com deficiência, apregoada nos artigos 29, da CDPD e 76, do EPD. Quando falamos de participação política, entendemos tanto os meios de acessibilidade para o voto, como a própria influência da pessoa com deficiência no processo de tomada de decisões. Este segundo aspecto é o que será mais abordado em nosso estudo.
2. ASPECTOS CONCEITUAIS
Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2012, p. 31), cerca de um bilhão de pessoas – ou 15% da população do globo - possui algum tipo de deficiência. Já no Brasil, o Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2010 (SECRETARIA DE DIREITOS HUMANOS DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA, 2012, p. 6 e 11) atestou que 23,9% do povo brasileiro possuem deficiência, com índices maiores na região Nordeste (26,63% de sua população total).
Como se vê, as pessoas com deficiência são uma das minorias mais presentes no Brasil. Cumpre, no entanto, entender sob quais perspectivas compreendem-se os termos “minoria” e “pessoa com deficiência”.
O Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos de 1966, em seu artigo 27, trata das minorias em seu aspecto étnico, religioso ou linguístico, presente tipicamente em países europeus e norte-americanos, que possuem altos índices de imigração. Boa parte dos documentos internacionais sobre as minorias tratam de seus direitos, mas não trazem um conceito que possa delimitar o termo.
Muito se tem analisado a terminologia “minoria nacional”. Alerta Šmihula (2009, p. 46), porém, que “criar uma definição oficial aceitável (e legalmente compulsória) de minorias nacionais é uma medida trabalhosa”, podendo ser, inclusive, impossível devido às diferenças culturais. Ele sugere seis quesitos para que elas sejam teoricamente reconhecidas: 1) devem ser numericamente inferiores que o restante da população do estado ou parte do estado; 2) não devem estar em posição dominante; 3) devem possuir cultura, língua, religião, raça etc. distintas do restante da população; 4) seus membros devem ter vontade de preservar sua especificidade; 5) seus membros são cidadãos do estado onde tem o status de minoria; e 6) devem ter uma presença de longo prazo no território em que vivem (ŠMIHULA, 2009, p. 50). Cremos que os itens 4 e 5 são os mais importantes no que concerne a este trabalho, visto que tratam da consciência política e da cidadania do grupo minoritário.
No caso do Brasil, existe também um impasse na delimitação do conceito de minoria, até porque aqui sobressai a ideia de minoria social, composta daqueles que, por apresentarem diferenças físicas ou culturais, sofrem com a exclusão e a discriminação. Saliente-se que se pode, inclusive, considerar as minorias sociais a maioria numérica no país, sendo, não obstante, “amplamente minoritária em relação ao acesso ao poder político, econômico, social, cultural, ou seja, é amplamente minoritária em relação aos seus direitos elementares, no plano dos Direitos Humanos e da Cidadania” (WOITOWICZ, 2006, p. 6).
Há, do mesmo modo, uma multiplicidade terminológica sobre o conceito de pessoa com deficiência, que também é chamada de deficiente, inválida, excepcional, deficitária, pessoa portadora de deficiência, pessoa portadora de necessidades especiais, portadora de defeitos (ASSIS; POZZOLI, 2005, p. 234), além de outras. A Constituição e boa parte da legislação federal utilizam a expressão “pessoa portadora de deficiência”, mas não a definem.
Com lucidez exemplar, quando discutem sobre o problema e a necessidade da unificação terminológica, afirmam Assis e Pozzoli (2005, p. 234) que é importante que se chegue a uma definição, uma vez que ela pode subtrair a problematização do conceito de pessoa com deficiência, possibilitando o controle das incertezas presentes nos textos jurídicos. Para eles, “a insegurança e a incerteza aumentam quando, para apontar o mesmo fenômeno ou a mesma situação, são utilizadas várias palavras diferentes”, como os “sinônimos” citados acima.
Cumpre destacar que há uma classificação, elaborada pela OMS, que distingue deficiência, incapacidade e desvantagem (em inglês, impairment, disability e handicap). Costa (2008, p. 29) explica, segundo essa classificação, que a primeira seria “qualquer” perda ou anormalidade de estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica. A incapacidade define-se como “qualquer redução ou falta (resultante de uma deficiência) de capacidades para exercer uma atividade de forma, ou dentro dos limites considerados normais para o ser humano”. A desvantagem, finalmente, corresponde a um “impedimento sofrido por um dado indivíduo, resultante de uma deficiência ou incapacidade, que lhe limita ou lhe impede o desempenho de uma atividade considerada normal para esse indivíduo, considerando a idade, o sexo e os fatores socioculturais”[1].
Considerando os comentários supracitados, tomamos por melhor abordagem a trazida no Preâmbulo da CDPD (alínea “e”), que entende a deficiência como um “conceito em evolução e que a deficiência resulta da interação entre pessoas com deficiência e as barreiras devidas às atitudes e ao ambiente que impedem a plena e efetiva participação dessas pessoas na sociedade em igualdade de oportunidades com as demais pessoas”.
Note-se o aspecto revolucionário da definição de deficiência feito pela Convenção, pois aborda a constante evolução do conceito, trazendo um caráter mais social e interativo a este, e retirando a imposição da visão de deficiência como doença, como a exposta na Classificação Internacional de Doenças (CID) – daí o caráter preconceituoso de nominar as pessoas com deficiência de inválidas, deficitárias, defeituosas, etc. Aqui, ela se origina não das próprias pessoas com deficiência, mas, sim, da interação delas entre si e com a sociedade: havendo inclusão e participação efetiva, inexiste deficiência[2]! Neste caso, pode-se inclusive trazer à discussão a inserção no rol de pessoas com deficiência descritas no Decreto n. 5.296/04 de outras com alguma disfunção, como as obesas e os cegos monoculares.
Sobre o termo “pessoa portadora de deficiência”, largamente utilizado na legislação brasileira, tanto constitucional como infraconstitucional (mas que vem sendo substituído por “pessoa com deficiência”, a exemplo do EPD), e adotado por muitos doutrinadores, não concordamos com sua utilização. O termo portar, segundo o dicionário Aurélio, significa carregar consigo, levar, conduzir. Como se vê, este verbo indica ações, o que não se coadunam com a ideia de pessoa com deficiência, que geralmente tem, possui uma incapacidade permanente ou de longa duração, de causa congênita ou acidental. O termo portador poderia até ser usado no contexto de algumas pessoas com necessidades especiais, como o portador do vírus HIV, por carregar, trazer consigo o vírus causador da AIDS. Não há lógica, no entanto, dizer que um cego “carrega” sua cegueira, um surdo, a sua surdez, ou um paraplégico, a sua falta de locomoção.
Preferível o termo “pessoa com deficiência”[3], pois além de semanticamente correto, é ainda apregoado por organismos internacionais, tais como a ONU e a OMS. Entendemos, ainda, que, ao utilizar essa terminologia, dá-se primazia à palavra “pessoa” em detrimento de “portador”, muitas vezes mais utilizado, como quando se vê, digamos, uma placa de dizeres “vaga destinada a portador de deficiência”. Quando se refere por meio da expressão “pessoa com deficiência”, remete-se ao valor da dignidade da pessoa humana, o primado dos direitos fundamentais e alicerce do sistema constitucional atual.
3. PARTICIPAÇÃO POLÍTICA DAS MINORIAS
As tensões sociais e políticas envolvendo minorias nacionais e sociais têm motivado amplas discussões entre os Estados soberanos, mormente na Europa e no âmbito de organizações internacionais. O Conselho de Direitos Humanos da ONU, considerando esta problemática, instituiu o Fórum sobre Assuntos das Minorias, por meio da Resolução 6/15, de setembro de 2007. Já em sua segunda sessão, de novembro de 2009, o Fórum passou a discutir sobre “Minorias e Participação Política Efetiva”, dada a imperiosidade em tratar sobre a efetivação do direito de participação desse grupo em processos decisórios.
A avença sobre o tema é recorrente. No campo filosófico, Alves (2009, p. 469-470), baseado em Ortega y Gasset, aborda o embate entre minoria e massa, entendendo que o dinamismo entre esses dois fatores gera a sociedade. O que ocorre, entretanto, é que, por ser maioria, a massa passa a atuar “diretamente sem lei, por meio de pressões materiais, impondo gostos e aspirações”, prejudicando o exercício pleno dos direitos por parte das minorias. Daí a necessidade de se repensar o modelo democrático como democracia da maioria, o que, para nós, é tirania da maioria[4]. Ortega y Gasset (apud ALVES, 2009, p. 470) trata disso quando fala da politização das massas:
[...] quando a massa se sente insatisfeita, ou simplesmente tem algum forte desejo, é para ela uma grande tentação essa possibilidade permanente e segura de conseguir tudo – sem esforço, luta, dúvida ou risco -, sem precisar fazer nada além de apertar a mola e ligar a portentosa máquina. A massa diz para si mesma: “O Estado sou eu”, o que é um erro completo. O Estado só é a massa no sentido que se pode dizer que dois homens são idênticos porque nenhum deles se chama João. O Estado contemporâneo e a massa só coincidem em ser anônimos. Mas acontece que o homem-massa pensa, de fato, que ele é o Estado, e tenderá cada vez mais a fazê-lo funcionar a qualquer pretexto, a esmagar com ele qualquer minoria criadora que o perturbe – o que perturbe em qualquer campo: na política, nas idéias, na indústria. (destacamos)
No momento em que a minoria começa a lutar por sua autoafirmação, a maioria, a “massa”, sente-se ameaçada e, como mencionado por Ortega y Gasset, por pensar ser o próprio Estado, acaba por oprimir ou até suprimir a manifestação da minoria, qualquer que ela seja, em qualquer aspecto.
O Fórum da ONU para Assuntos das Minorias (s/d, p. 28) concluiu pela grande importância da participação política das minorias:
Muitas situações em todo o mundo demonstram que uma adequada representação de pessoas pertencentes a minorias na política e na tomada de decisões pela sociedade civil é fundamental para quebrar o ciclo de discriminação e exclusão sofrido por membros desses grupos, bem como os muitas vezes desproporcionais níveis de pobreza, e outros impedimentos ao pleno gozo dos direitos civis, culturais, econômicos, políticos e sociais. Assegurar uma participação significativa e informada e a gestão pelas minorias de matérias que lhes digam diretamente respeito é um meio de promover estabilidade e integração nas sociedades onde as minorias vivem (tradução livre).
Quais métodos seriam, então, úteis para que esse direito fosse concretizado, contribuindo, desta forma, com práticas de boa governança, que aliviam as tensões, servindo ao propósito de prevenção de conflitos, tais como os que envolvem minorias religiosas, como os católicos da Irlanda do Norte protestante, étnicas, como os chechenos na Rússia, e sociais, como as mulheres em países islâmicos?
Em estudo baseado em relatório encomendado pelo Comitê de Especialistas em questões relacionadas à Proteção de Minorias (DH-MIN), do Conselho da Europa, Frowein e Bank (2008, p. 78) analisam detidamente as maneiras utilizadas pelas nações europeias para assegurar a participação política das minorias nacionais, que têm ocorrido nos âmbitos de: i) representação parlamentar de minorias e o exercício do controle parlamentar; ii) representação das minorias em órgãos governamentais; iii) canais informais de participação; iv) diferentes formas de autonomia; e v) abordagens em sistemas federais.
Quando tratam, particularmente, da primeira forma de representação, Frowein e Bank (2008, p. 79) trazem à baila a questão de que a liberdade de associação é “pré-condição fundamental para a integração de minorias a um Estado”, podendo os segmentos minoritários criar organizações e partidos políticos, almejando à transmissão de seus interesses na esfera política. Este direito humano fundamental é esposado nos artigos 5°, XVIII e 17 da Constituição Brasileira, bem como no artigo 22, do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos[5].
Por suas limitações, sobretudo de ordem numérica, as minorias precisam de ações afirmativas para que possam alcançar maior representatividade no Poder Legislativo. Os autores acima citados asseveram que, conquanto seja interessante um “partido da minoria”, a presença da “minoria no partido” não obsta que seus interesses sejam ouvidos. Essa assertiva, em nossa opinião, seria, inclusive, melhor aplicável no contexto político-partidário brasileiro, em que praticamente inexiste a cultura de criação de partido para representar interesses exclusivos de um segmento minoritário.
Em algumas hipóteses, os membros das minorias podem defender os interesses delas enquanto membros de partidos políticos comuns. Se essa concepção tem êxito e os interesses da minoria são dessa forma respeitados, isso pode ser tido como um sinal positivo de que as preferências políticas não mais seguem limites étnicos ou linguísticos [ou sociais, ousamos dizer, no caso das minorias brasileiras].
[...]
Contudo, a acomodação dos interesses da minoria dentro da estrutura geral do partido somente parece ter real propensão ao sucesso se as minorias formam uma parte da população que é substancial o bastante para atrair a atenção no estabelecimento de programas políticos (FROWEIN; BANK, 2008, p. 79-80).
Mesmo que haja essa inclusão da “minoria no partido”, ainda é preciso que sejam concedidos certos privilégios, a fim de que o direito de igualdade de participação no processo de tomada de decisões seja garantido. Para tanto, alterações nos sistemas eleitorais seriam aconselháveis, tais como (FROWEIN; BANK, 2008, p. 82): 1) diminuição do coeficiente eleitoral a ser obtido para ingresso no parlamento; 2) reserva de assentos; 3) redução das filiações necessárias para registro de um partido; 4) delimitação favorável das circunscrições eleitorais, especialmente, no caso de votação majoritária; e 5) financiamento privilegiado a partidos de minorias.
Todas essas medidas iriam, sobremaneira, facilitar a construção de uma democracia plural, inclusiva e participativa, em que não somente a vontade da maioria prevalece, pois se deve deferir igualdade de participação política às minorias, seja como cidadãos votantes ou votados, de forma que a fraternidade exaltada no ideário da Revolução Francesa realize-se[6].
4 PARTICIPAÇÃO POLÍTICA DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA
4.1. Breve histórico das pessoas com deficiência: da antiguidade à publicação da Convenção da ONU sobre seus direitos
As pessoas com deficiência, como as demais minorias, sempre sofreram com o preconceito. Durante toda a história da humanidade, sua figura foi controversa. Na maioria das vezes, havia um tratamento discriminatório, como o lançamento das crianças espartanas com “má-formação” no abismo do monte Taygetos (MELO, 2004, p. 29). Mais raramente, considerava-se que pessoas com deficiência possuíam algo especial, sendo divinizadas, tratadas como conselheiras, como os cegos e deficientes físicos da tribo Semang, na Malásia (MELO, 2004, p. 27).
Na Grécia Antiga, Platão, durante a decadência da democracia ateniense, buscando a construção de um Estado ideal, adota um discurso eugênico, afirmando que “os melhores homens devem se unir às melhores mulheres, o mais frequentemente possível, e os defeituosos às defeituosas, o mais raro possível” (ASSIS; POZZOLI, 2005, p. 64). Aristóteles, apesar de defender, de certa forma, a eugenia, procurou incluir as pessoas com deficiência, ao apregoar que, em vez de sustentá-los, dever-se-ia dar-lhes um emprego, ensinando-lhes a desempenhar uma tarefa útil (MELO, 2004, p. 31).
A visão preconceituosa quanto às pessoas com deficiência prolongou-se também na Idade Média e Moderna, com raras exceções. Com o surgimento do Estado Moderno, vinculado às teorias contratualistas da soberania e influenciado pelo crescente capitalismo impulsionado pelas grandes navegações, separam-se os trabalhadores dos meios de produção, da propriedade, que são do soberano. Com isso, surge uma grande quantidade de pessoas sem ocupação, por não haver vagas o bastante nas manufaturas, o que é maximizado com a Revolução Industrial.
O aviltamento dos trabalhadores é flagrante, sendo homens, mulheres e crianças, indistintamente, submetidos a longas horas de trabalho pesado em galpões com pouca iluminação e ventilação, com horários exíguos para alimentação e poucas horas de sono. Não é de se admirar, portanto, o grande número de pessoas que tinham seus membros decepados pelas máquinas ou se contaminavam com vírus e bactérias que se proliferavam fartamente nas fábricas. Não havia, por óbvio, nenhuma assistência ou mesmo política estatal de integração das pessoas que não mais se conformavam ao trabalho exigido nas linhas de produção.
Tal situação alterou-se substancialmente com o advento do século XX, mormente após a Segunda Guerra Mundial, com a criação da ONU e a promulgação da Declaração Universal dos Direitos do Homem, em 1948. O problema de reabilitação e reinclusão dos ex-combatentes que foram mutilados durante as guerras foi decisivo para que os direitos das pessoas com deficiência fossem finalmente ouvidos, já que estas “desejavam permanecer ativas, uma vez que haviam ocupado, com bons resultados, os postos vagos na indústria, comércio e serviços deixados por aqueles que haviam sido convocados para a guerra”, (MELO, 2004, p. 37). Neste mote, um dos primeiros documentos internacionais a tratar especificamente sobre direitos das pessoas com deficiência foi a Recomendação n. 99 (sobre Reabilitação Vocacional), da Organização Internacional do Trabalho (OIT), de 1955.
No decorrer dos anos seguintes, outros documentos internacionais trataram sobre os direitos das pessoas com deficiência, tais como a Declaração dos Direitos do Deficiente Mental (1971) e a Declaração dos Direitos das Pessoas Deficientes (1975), ambas das Nações Unidas. A própria ONU instituiu o ano de 1981 como o “Ano Internacional dos Deficientes” e, por meio de sua Assembleia Geral, criou o Programa Mundial de Ação relativo às Pessoas Deficientes (PAM-ONU), a partir do qual o tema de inclusão dessa minoria passou a ser discutido como questão de direitos humanos e não como política estatal de assistencialismo/paternalismo.
No âmbito do sistema interamericano de direitos humanos, a Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos aprovou a Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Pessoas Portadoras de Deficiência, aprovada em 1999 e internalizada no Brasil pelo Decreto 3.956/2001.
O tema, não obstante, acabou tendo suas discussões arrefecidas com o passar do tempo, mesmo em meio aos apelos dos ativistas dos direitos das pessoas com deficiência para que se elaborasse uma convenção específica no sistema onusiano que lhes atendesse, uma vez que as declarações anteriores não conseguiram mudar o pensamento dos Estados e da sociedade, como assevera a ex-Subsecretária Nacional de Promoção dos Direitos das Pessoas com Deficiência, Izabel Maria Madeira de Loureiro Maior (BRASIL, 2010, p. 7).
O presidente mexicano Vicente Fox retomou a discussão ao propor, na Assembleia Geral da ONU de 2001, que se fizesse a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, cuja elaboração, que ficou a cargo da Comissão de Assuntos Econômicos e Sociais das Nações Unidas, foi inovadora, visto que oficializou a participação das pessoas com deficiência durante todo o procedimento.
Essa participação na feitura da CDPD ocorreu graças aos próprios esforços dessa minoria, que criou um “Grupo de Trabalho sobre a Deficiência”, promovendo a definição de estratégias, maximização de seu potencial e união das pessoas com deficiência em uma só voz, com o lema “Nada sobre nós sem nós”. O comitê ad hoc acatou a inclusão desse grupo de trabalho, dando-lhe o poder de escolher as entidades não-governamentais que dele participariam, sendo nomeadas aquelas vinculadas à Aliança Internacional para a Deficiência (International Disability Alliance – IDA), que é a rede organizações globais e regionais de pessoas com deficiência, tais como a União Mundial dos Cegos e a Federação Mundial dos Surdos (CERTEZA, 2006).
Finalmente, em 13 de dezembro de 2006, foi promulgada pela Assembleia Geral das Nações Unidas a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (Convention on the Rights of Persons with Disabilities, em inglês), primeiro tratado internacional de direitos humanos da ONU no século XXI, assinada pelo Brasil em 30 de março de 2007 e recepcionada em nosso ordenamento com status de emenda constitucional pelo Decreto Legislativo 186/2008 e pelo Decreto 6.949/2009, abordando os direitos e garantias das pessoas com deficiência em relação a, dentre outros, acessibilidade, educação, saúde, trabalho, igualdade de oportunidades e, enfim, participação política das pessoas com deficiência. Esta última é aventada nos seguintes termos:
Artigo 29 – Participação na vida política e pública
Os Estados Partes garantirão às pessoas com deficiência direitos políticos e oportunidade de exercê-los em condições de igualdade com as demais pessoas, e deverão:
a) Assegurar que as pessoas com deficiência possam participar efetiva e plenamente na vida política e pública, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, diretamente ou por meio de representantes livremente escolhidos, incluindo o direito e a oportunidade de votarem e serem votadas, mediante, entre outros:
i) Garantia de que os procedimentos, instalações e materiais e equipamentos para votação serão apropriados, acessíveis e de fácil compreensão e uso;
ii) Proteção do direito das pessoas com deficiência ao voto secreto em eleições e plebiscitos, sem intimidação, e a candidatar-se nas eleições, efetivamente ocupar cargos eletivos e desempenhar quaisquer funções públicas em todos os níveis de governo, usando novas tecnologias assistivas, quando apropriado;
iii) Garantia da livre expressão de vontade das pessoas com deficiência como eleitores e, para tanto, sempre que necessário e a seu pedido, permissão para que elas sejam auxiliadas na votação por uma pessoa de sua escolha;
b) Promover ativamente um ambiente em que as pessoas com deficiência possam participar efetiva e plenamente na condução das questões públicas, sem discriminação e em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, e encorajar sua participação nas questões públicas, mediante:
i) Participação em organizações não-governamentais relacionadas com a vida pública e política do país, bem como em atividades e administração de partidos políticos;
ii) Formação de organizações para representar pessoas com deficiência em níveis internacional, regional, nacional e local, bem como a filiação de pessoas com deficiência a tais organizações. (grifos e destaques nossos)
Como visto acima, a CDPD trata dos direitos políticos das pessoas com deficiência sob dois aspectos, expostos nas alíneas “a” e “b”. A primeira aborda a participação na vida pública e política, em igualdade de oportunidades e com a utilização de meios que facilitem sua expressão política, enquanto a segunda discorre sobre a participação na condução de questões públicas, apregoando a importância do direito de liberdade de associação, bem como da ação de organizações não-governamentais e de órgãos e conselhos executivos.
Em comentário a este artigo, o ex-deputado estadual capixaba Cláudio Vereza louva à sua inédita inclusão, pois é prova da consolidação da democracia em nível internacional, obrigando que todos (Estado, sociedade e as próprias pessoas com deficiência) promovam condições para o exercício pleno e digno da cidadania deste segmento social minoritário.
Isto não se traduz apenas na garantia de que as pessoas com deficiência possam votar com facilidade. Requer investimentos na formação e qualificação para que as pessoas tenham condições de participar ativamente da vida da sociedade, seja em entidades ou movimentos, seja em comissões ou conselhos de direitos, ou mesmo para que possam votar com consciência, ou serem elas próprias candidatos e candidatas aos cargos em disputa. É preciso que as informações possam ser acessadas sem nenhum entrave, transformando assim estas pessoas em protagonistas de sua própria trajetória.
Ao participar da vida pública, por exemplo, as pessoas podem ajudar a conduzir as ações que promovem qualidade de vida para todos. Passamos assim de sujeitos passivos para sujeitos ativos na construção da sociedade que sonhamos, para todos e todas, independentemente de suas condições pessoais e sociais (RESENDE; VITAL, 2008, p. 99-100).
A participação política das pessoas com deficiência tem se demonstrado robusta e firme, com a capacidade de trazer à tona a discussão da efetivação de seus direitos humanos no bojo das Nações Unidas, a ponto de não somente influenciarem na discussão da convenção sobre seus direitos, mas, sobretudo, serem seus redatores, o que dá ainda maior respaldo e legitimidade ao documento, quebrando a perspectiva errônea de que são incapazes de manifestar seus desejos e requerer a concretização de suas prerrogativas e mostrando à comunidade internacional a força da construção de uma sociedade democrática e plural.
4.2. O movimento político das pessoas com deficiência no Brasil
Os estudos sobre pessoas com deficiência em nosso país ainda são bastante limitados, havendo maior número de trabalhos abordando essa minoria no âmbito da Educação e de direitos específicos, como ao trabalho, à acessibilidade e à saúde. O movimento político-social das pessoas com deficiência, entretanto, ainda é pouco analisado, carecendo de bibliografia sobre o tema.
Essa problemática é trazida em interessante artigo de Rosa e Borba (2006). Nele, afirmam os autores que este movimento surgiu e foi fortalecido entre as décadas de 1970 e 1980, pela conjugação dos seguintes fatores:
1 – necessidades objetivas possibilitaram a tomada de consciência de uma parcela das próprias pessoas com deficiência no sentido de travarem lutas na defesa dos seus direitos; 2 – a conjuntura nacional favorável, em que movimentos políticos e sociais lutavam contra a Ditadura Militar, na busca da redemocratização, da participação e da garantia de bens materiais; 3 – a mobilização internacional do segmento das pessoas com deficiência forçando uma conjuntura favorável em torno desta problemática social; 4 – um certo estímulo do governo brasileiro que não via nesse movimento nenhuma ameaça política ideológica (ROSA; BORBA, 2006, p. 182).
A seguir, discorrem Rosa e Borba (2006, p. 184) sobre tais causas que impulsionaram o movimento das pessoas com deficiência, partindo da ideia de que a origem do preconceito e da discriminação contra esse segmento social é na falsa crença de que essas pessoas são incapazes de trabalhar, argumento amplamente refutável, tendo em vista os inúmeros estudos sobre o tema. O que ocorre é que, infelizmente, boa parte dos gestores públicos, dos empresários e da própria sociedade ainda não conseguiu superar visões pré-concebidas sobre a capacidade dessa minoria.
No final dos anos 1970 e início da década seguinte, a conjuntura política nacional e internacional motivou o crescimento da participação política das pessoas com deficiência. No Brasil, várias forças políticas, inclusive de fundamentos e interesses divergentes, uniram-se para lutar pela redemocratização e pela liberdade de se expressar, organizar e participar de movimentos políticos, em meio a uma ditadura militar já decadente, sob a gestão do último presidente militar, João Figueiredo. A bandeira levantada pelas pessoas com deficiência era a que reclamava “o fim da tutela e a ‘participação plena’” (ROSA; BORBA, 2006, p. 188).
No mundo, a pressão da comunidade formada pelas pessoas com deficiência sobre a ONU fê-la instituir medidas e programas que divulgassem a exclusão desse grupo do exercício de direitos, a fim de que os Estados e a sociedade voltassem seus olhos para a necessidade de inserção deste segmento social. Com isso, foi promulgada a Declaração dos Direitos de Deficientes (1975), designado o ano de 1981 como o Ano Internacional dos Deficientes e criado, no ano seguinte, o PAM-ONU, como mencionado anteriormente.
Um dos primeiros grandes passos do movimento nacional das pessoas com deficiência foi quando se realizou o primeiro Encontro Nacional de Entidades de Pessoas com Deficiência, com quase de mil participantes, “incluindo cegos, surdos, deficiente físicos e hansenianos de diversas regiões do país. Na pauta principal o lema da Participação plena e o fim da tutela do Estado e das instituições especializadas” (ROSA; BORBA, 2006, p. 193). A ele se seguiu a criação de uma Coalizão Nacional de Pessoas com Deficiência, que promoveu congressos para discussão de direitos e participação política desta minoria.
A partir de 1984, com o fim da Coalizão Nacional, o movimento passou a funcionar por meio de federações nacionais e estaduais representando entidades específicas de pessoas com deficiência, com propostas também de caráter peculiar, de acordo com as necessidades dos grupos específicos. Dentre elas, podemos citar a Federação Nacional de Educação e Integração de Surdos (Feneis), Sociedade Brasileira de Ostomizados (SOB) e Federação Brasileira de Entidade de Cegos (FEBEC).
Quando da elaboração da atual Constituição da República, a força do movimento de pessoas com deficiência mostrou-se mais uma vez eficiente, lutando para que o direito à igualdade material fosse disposto, em suas diversas vertentes, no texto constitucional. No ano seguinte à promulgação de nossa Lei Maior, foi também publicada a Lei 7.853/1989, que dispõe sobre o apoio e integração à causa desta minoria. Seguiram-se a ela outras normas assegurando os direitos das pessoas com deficiência quanto a trabalho, educação, saúde, acessibilidade etc, sem contar com a criação de órgãos de implementação de políticas públicas para essa categoria, bem como de fiscalização das mesmas, quais sejam, respectivamente, a coordenadoria Nacional da Pessoa Portadora de Deficiência (Corde), atual Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência, e Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência (Conade).
Coroando esse processo de efetivação dos direitos de participação política, o Estatuto da Pessoa com Deficiência dispõe, em seu art. 76, o seguinte:
Art. 76. O poder público deve garantir à pessoa com deficiência todos os direitos políticos e a oportunidade de exercê-los em igualdade de condições com as demais pessoas.
§ 1o À pessoa com deficiência será assegurado o direito de votar e de ser votada, inclusive por meio das seguintes ações:
I - garantia de que os procedimentos, as instalações, os materiais e os equipamentos para votação sejam apropriados, acessíveis a todas as pessoas e de fácil compreensão e uso, sendo vedada a instalação de seções eleitorais exclusivas para a pessoa com deficiência;
II - incentivo à pessoa com deficiência a candidatar-se e a desempenhar quaisquer funções públicas em todos os níveis de governo, inclusive por meio do uso de novas tecnologias assistivas, quando apropriado;
III - garantia de que os pronunciamentos oficiais, a propaganda eleitoral obrigatória e os debates transmitidos pelas emissoras de televisão possuam, pelo menos, os recursos elencados no art. 67 desta Lei;
IV - garantia do livre exercício do direito ao voto e, para tanto, sempre que necessário e a seu pedido, permissão para que a pessoa com deficiência seja auxiliada na votação por pessoa de sua escolha.
§ 2o O poder público promoverá a participação da pessoa com deficiência, inclusive quando institucionalizada, na condução das questões públicas, sem discriminação e em igualdade de oportunidades, observado o seguinte:
I - participação em organizações não governamentais relacionadas à vida pública e à política do País e em atividades e administração de partidos políticos;
II - formação de organizações para representar a pessoa com deficiência em todos os níveis;
III - participação da pessoa com deficiência em organizações que a representem.
Constata-se, pela leitura dos trechos grifados acima que, não somente incentiva a participação política dessa minoria no acesso a cargos eletivos, como também na de organizações de e para pessoas com deficiência, aumentando o pluralismo político-social.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Viu-se que os direitos das minorias, mormente os das pessoas com deficiência, têm sido ao longo dos anos massacrados, sendo sua voz muitas vezes arrefecida em meio aos gritos da maioria, que impõe sua ditadura.
As conquistas destes segmentos, entretanto, vêm sendo paulatinamente maiores, na medida em que as organizações internacionais, os Estados e a sociedade civil passam a entender a importância da construção conjunta de uma democracia para todos.
Falando sobre o povo, Müller (2003) entende-o como destinatário de prestações civilizatórias do Estado, conceito ligado à afirmação de Abraham Lincoln – democracia é governo do povo, pelo povo e para o povo – e aos direitos de cidadania e humanos. Define o povo como aquele possuidor da dignidade da pessoa humana, da personalidade jurídica, de direitos constitucionais e infraconstitucionais, como os direitos de ampla defesa e do contraditório. É, enfim, o conceito mais amplo de povo, pois atinge a todos, homens, mulheres, crianças, estrangeiros, votantes ou não. A democracia, destarte, envolve muito mais que os anseios da multidão, mas também das parcelas minoritárias, que possuem demandas particulares, mas que devem ser ouvidas e realizadas, para que a solução dos conflitos e o primado da dignidade humana se realizem.
Sendo a sociedade e o Governo agentes da inclusão das minorias e das pessoas com deficiência, é preciso lembrar que elas não podem tratar estes segmentos com sentimentos de indiferença, caridade ou paternalismo, pois tais comportamentos somente perpetuarão a visão de que estes grupos são coitados, necessitando de outros para manifestar sua vontade política e cidadania.
Uma advertência que se deve fazer, entretanto, às pessoas com deficiência é que aquelas que nunca se envolveram em alguma manifestação política por seus direitos, devem fazê-lo. Aquelas que já fazem precisam unir forças entre si e com outros segmentos específicos de pessoas com deficiência e outras minorias, fortalecendo ainda mais o movimento de emancipação política, desfigurando o paradigma de “coitadinhos” e “necessitados”, de que muitas vezes se apropriam.
É importante também que as pessoas com deficiência busquem, elas mesmas, lutar por seus direitos, elegendo representantes de sua comunidade para falar de seus anseios nas instâncias decisórias, para que a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e o Estatuto da Pessoa com Deficiência possam ser conhecidos e concretizados e seus direitos humanos assegurados.
REFERÊNCIAS
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[1] Lembra ainda o pesquisador norte-americano Heward (2000, p. 4) das pessoas em risco de sofrerem alguma deficiência, que são aquelas que possuem uma chance maior do que a normal de desenvolver uma deficiência. Explica ele que o termo se aplica a crianças que, devido a condições de nascimento ou ao ambiente de suas casas, poderão sofrer posteriormente problemas para se desenvolverem. Outro exemplo é o de bebês cujas mães estão acima ou abaixo da idade fértil usual ou são dependentes de álcool e/ou drogas.
[2] “O conceito de pessoa com deficiência adotado pela Convenção supera as legislações tradicionais que normalmente enfocavam o aspecto clínico da deficiência. As limitações físicas, mentais, intelectuais ou sensoriais passam a ser consideradas atributos das pessoas, atributos esses que podem ou não gerar restrições para o exercício dos direitos, dependendo das barreiras sociais ou culturais que se imponham aos cidadãos com tais limitações, o que possibilita afirmar-se que a deficiência é a combinação de limitações pessoais com impedimentos culturais, econômicos e sociais. Desloca-se a questão do âmbito do individuo com deficiência para as sociedades que passam a assumir a deficiência como problema de todos.” (FONSECA, s/d).
[3] Tome-se nota ao fato de que o termo “pessoa com necessidades especiais”, apesar de ter caráter eufemístico quanto às pessoas com deficiência, refere-se a um grupo maior de pessoas, como as gestantes e as idosas, que também necessitam ter voz política e de assistência especial. Outra terminologia que deve ser aplicada com cuidado é a da palavra “excepcional” à generalidade das pessoas com deficiência, pois mais correntemente utilizada para aquelas com deficiência mental/intelectual. De toda forma, melhor usar a locução “pessoa com deficiência” mais o adjetivo que caracteriza aquele tipo específico de deficiência, como “motora” e “visual”.
[4] Expressão utilizada por Baptista (2003, p. 196), em seu texto sobre participação política das minorias.
[5] Conferir também os artigos 1° a 6° da lei n. 9.096/95 (lei dos Partidos Políticos). Silva (2007, p. 268), vale salientar, explicita que “há duas restrições [no sistema constitucional brasileiro] à liberdade de associar-se: veda-se associação que não seja para fins lícitos ou de caráter paramilitar... No mais, têm as associações o direito de existir, permanecer, desenvolver-se e expandir-se livremente” (grifos do original). Semelhantemente, o Tribunal Europeu de Direitos Humanos é contrário à interferência à liberdade de associação sob a alegativa de que o partido político, por exemplo, assenta-se em bases religiosas, étnicas ou regionais, a não ser que haja incitação ao ódio ou à secessão (FROWEIN; BANK, 2008, p. 79-80).
[6] “É aqui que se pode antever a ‘luz do fim do túnel’ para as facções minoritárias da sociedade. Na medida em que a maioria aceita a existência das minorias, diverge, mas respeita suas vontades e propicia uma abertura política para elas se manifestarem e participarem do poder decisional. Essas minorias saem do ostracismo e passam a influenciar os rumos da nação e a ter defendidos seus interesses” (BAPTISTA, 2003, p. 201-202).
Pós-graduado em Direito Processual Civil pela Universidade Anhanguera-Uniderp (2013). Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Ceará (2011). Advogado.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: NASCIMENTO, Matheus Alves do. Participação política das minorias: o desafio da inclusão de pessoas com deficiência no processo de tomada de decisões Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 07 dez 2016, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/47913/participacao-politica-das-minorias-o-desafio-da-inclusao-de-pessoas-com-deficiencia-no-processo-de-tomada-de-decisoes. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: WALKER GONÇALVES
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