No Brasil, o garantismo penal é visto, em termos gerais, como a linha de pensamento que consiste em conferir aos cidadãos uma série de imunidades frente ao Estado, mormente no âmbito da aplicação da lei penal. A partir daí, tem-se o cidadão não mais como um objeto, mas um sujeito de direitos no âmbito processual penal[1]. Apesar de não estar errado, esse conceito é deveras incompleto.
Vem na pátria se criando uma cultura de apoio ao modelo garantista sem que nem ao menos seja feita uma leitura do que realmente é. Consiste, grosso modo, na efetivação dos direitos fundamentais, com vistas ao fortalecimento do Estado democrático de direito, fornecendo proteção ao particular contra a atividade do Estado, de um lado, e obrigando-o às mais diversas prestações em favor daquele, do outro.
A teoria de Ferrajoli vem, pois, ganhando contornos no Brasil que não os delineados originalmente pelo jurista italiano. Nos dizeres de Douglas Fischer, adquire a teoria garantista um viés hiperbólico-monocular, no que explicita:
[...] se tem difundido um garantismo penal unicamente monocular e hiperbólico: evidencia-se desproporcionalmente (hiperbólico) e de forma isolada (monocular) a necessidade de proteção apenas dos direitos fundamentais individuais dos cidadãos que se vêem investigados, processados ou condenados.[2]
O pensamento propagado por Ferrajoli não é percebido em sua completude, dando vazão a interpretações e formas de conduzir o processo que, não raro, descambam na impunidade e na descrença e inefetividade das leis e do Poder Judiciário.
Cria-se, ainda, como bem retrata Eugênio Pacelli de Oliveira, a idéia reducionista de que ou se é a favor do garantismo (num sentido hiperbólico-monocular, como já dito) ou se é a favor da aplicação da lei de modo estrito e formal (num sentido pejorativo). Nas suas argutas palavras:
Infelizmente, no Brasil, a questão garantista vem sendo posta ao nível de um patrulhamento ideológico, do qual emerge sempre a pergunta, tida como definitiva e soberana, repetida à exaustão: você é ou não garantista? Se a resposta for tão singela quanto a indagação, o alinhamento será automático: vanguarda do bem ou a retaguarda do mal. Sem meio termo, sem meia verdade, sem dúvida alguma.[3]
Assim, surge o questionamento: o que é ser garantista no Brasil?
A falácia garantista nas, discussões jurídicas no Brasil, de alta significância na prática forense, forma-se da seguinte maneira: quem é definido como garantista é iluminado e vanguardista, enquanto quem não é pertence à já citada retaguarda do mal, obscura e emperrada.
O erro consiste justamente em atribuir falsamente o título de garantista a modelos ideológicos que não pertencem a tal vertente, não porque contrários a esta, mas porque suas origens remetem a outros sistemas, dos quais o garantismo apenas toma emprestado as premissas, surgindo a equívoca percepção, ao menos no Brasil, de que advêm do garantismo.
O cunho e a tutela aos direitos fundamentais remetem a tempos em muito anteriores ao que mais tarde passou a ser o garantismo. Desde a Revolução Francesa de 1789, com a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, que se propaga a idéia de defesa do homem contra a atuação estatal, a exemplo do contido nos seguintes artigos:
Art. 5º. A lei não proíbe senão as ações nocivas à sociedade. Tudo que não é vedado pela lei não pode ser obstado e ninguém pode ser constrangido a fazer o que ela não ordene. [...] Art. 7.º Ninguém pode ser acusado, preso ou detido senão nos casos determinados pela lei e de acordo com as formas por esta prescritas. [...]. Art. 8.º A lei apenas deve estabelecer penas estrita e evidentemente necessárias e ninguém pode ser punido senão por força de uma lei estabelecida e promulgada antes do delito e legalmente aplicada. Art. 9.º Todo acusado é considerado inocente até ser declarado culpado [...].[4]
Vê-se, portanto, que idéias definidas por Ferrajoli como axiomas do garantismo penal são, na realidade, modelos já pensados e que se encontram solidificados em muitas constituições, sem a necessidade do advento do garantismo para que nelas já fizessem constar.
Não há que se falar, pois, que quem defenda tais postulados é garantista. Isso seria adjetivar erroneamente um modelo ideológico há muito tempo existente, atribuindo seu pensamento a outro modelo (o garantista). Melhor seria perguntar se se concorda ou não com as disposições iluministas-liberais do século XVIII, ou melhor, se se defende o exposto atualmente na Constituição da República. Não há a necessidade de subterfúrgios como o garantismo para tanto.
Se, pois, tais disposições já se encontram há muito solidificadas, tanto ideologicamente (como no mencionado diploma) como juridicamente (já que são reproduzidos na Constituição da República), por que atribuir ao garantismo quaisquer desses feitos?
Olvida-se ainda de que a proposta garantista, coadunando com as disposições constitucionais da grande maioria dos países em que o modelo Democrático de Estado é o vigente, também pugna pelo ação estatal com vistas à melhoria da vida dos cidadãos. Não basta o Estado se abster de punir indevidamente ou violar garantias como a ampla defesa, o in dubio pro reo, etc., deve este também prezar por bens como a segurança pública e a efetiva tutela estatal[5], afinal ser “garantista” significa prezar também pelos deveres públicos positivos[6]
Até aí não haveriam consequências de ordem prática, embora persistindo o erro em atribuir os apontados pensamentos ao garantismo (nem ao menos é o que pretende Ferrajoli em sua obra). O problema, no entanto, é o modo em como tal modelo vem sendo implementado no Brasil, com distorções que criam o que aqui chamaremos supergarantismo[7].
Em que consiste, então, o supergarantismo? Podemos defini-lo como o conjunto de práticas que, desvirtuando-se do projeto inicial do modelo garantista, visa a absolvição/extinção da punibilidade a todo custo, manuseando-se o processo penal de forma desleal, abusando-se do direito de defesa, tornando-se os atos judiciais, quando dele impregnados, de baixa qualidade hermenêutica e perfazendo-se, na maioria das vezes, em instrumento retórico para a não imposição da pena.
Analizaremos, em seguida, os instrumentos da prática supergarantista, camuflados sob o manto de importantíssimos conceitos, como “Direitos Fundamentais”, “Estado Democrático de Direito”, e “Constituição cidadã”, que em suas mãos não são mais que lugares-comum, desprovidos do seu real conteúdo.
Um dos meios em que se observa a perpetuação do supergarantismo é como método interpretativo e meio de resolução de questões acerca do melhor entendimento ou melhor aplicação do texto de lei. Ocorre muitas vezes que se de determinado caso concreto surge a dúvida de qual o melhor entendimento a ser aplicado, o que mais favorece o réu é o escolhido, inobstante ser ou não tal entendimento o mais racional ou adequaldo. Imagine-se que determinada interpretação puramente literal, desconsiderando os demais aspectos da lei bem como os fins que busca produzir conduz a medida que prejudique o réu, e o uso de métodos como a interpretação sistemática e teleológica o beneficiem. Qual será a escolha adotada? Sem dúvida é mais sensata a segunda opção. Agora imagine-se que fosse justamente o contrário. Que opção seria escolhida? Para os adeptos do supergarantismo, a que beneficiasse o réu, independentemente de sua coerência ou plausibilidade. Surge daí um verdadeiro in dubio pro reo supergarantista que se pretende como critério hermenêutico, o que de fato não é.
A tendência do alargamento do conceito de in dubio pro reo, originariamente aplicado no sopesamento dos elementos de convicção apresentados para eventual condenação, cada vez mais invade o âmbito hermenêutico, como se o mencionado princípio fosse critério de interpretação/integração do texto legal. Tal aberração não pode se sedimentar no ordenamento jurídico, como se no confronto de interpretações devesse prevalecer a melhor ao acusado. Não é disso que se trata o processo penal nem o garantismo penal. No entanto, a doutrina processualista penal começa a abarcar tal fazer como se um princípio fosse, sob o termo favor rei.
Nas palavras de Paulo Rangel, trata-se de:
Expressão máxima dentro de um Estado Constitucionalmente Democrático, pois o operador do direito, deparando-se com uma norma que traga interpretações antagônicas, deve optar pela que atenda ao jus libertatis do acusado.[8]
Também em relação ao mencionado princípio, para Guilherme de Souza Nucci:
[...] quando dispositivos processuais penais forem interpretados, apresentando dúvida razoável quanto ao seu real alcance e sentido, deve-se optar pela versão mais favorável ao acusado, que, como já se frisou, é presumido inocente até que demonstre o contrário.[9]
Tal assunção é insustentável à luz do ordenamento jurídico brasileiro. A nosso ver, trata-se de uma tentativa forçosa de mitigar a investigação hermenêutica em prol do réu, dando a esta prática a classificação de princípio.
Estes, pois, são o conjunto de orientações que surgem através da busca do sentido geral das diferentes disposições normativas a respeito de algum assunto. Não são anteriores à lei, mas resultam da interpretação e assunção dos propósitos do texto legal. Ao contrário da definição usual de princípio, sinônimo de “início”, “começo”, em Direito o princípio não é o que dá surgimento às disposições legais. Nas palavras de Miguel Reale apud Silvio de Salvo Venosa, tratam-se de
[...] enunciações normativas de valor genérico que condicionam e orientam a compreensão do ordenamento jurídico, quer para sua aplicação e integração, quer para a elaboração de novas normas, Cobrem, desse modo, tanto o campo da pesquisa pura do Direito quanto o de sua atualização prática.[10]
Ao referir-se à elaboração de novas normas, deve-se entender que servem como norte caso a opção política do legislador seja a de manter coerência daquela com as já positivadas, não criando disposições cuja essência seja-lhes contrária. Não se deve pensar num princípio como algo extra, fora do ordenamento, que submete as normas positivas a ele. Pelo contrário, é o reflexo do ordenamento jurídico em caráter geral, abstrato. Como poderia ser o princípio anterior à norma posta, se decorre justamente desta? Como se sabe, no ordenamento jurídico tudo que é posto (positivado) imprescinde da atividade legislativa, criadora da norma. Sendo os princípios, em geral, não positivados[11], donde surgiriam?
Assim, por exemplo, temos os princípios do contraditório e da ampla defesa, decorrentes dos comandos constitucionais que os insculpem e das demais normas infraconstitucionais que os efetivam, ou o in dubio pro reo, decorrente das determinações legais que impedem a condenação do réu quando não haja provas suficientes, bem como da disposição de que ninguém é considerado culpado senão por sentença condenatória irrecorrível. Em que se baseia o favor rei? Qual a disposição legal que o permite?
Não encontramos resposta para as questões senão, respectivamente, “nada” e “nenhuma”. No máximo, há a disposição do CTN, que em seu art. 112 permite que a lei tributária seja interpretada de maneira mais favorável ao acusado, em caso de dúvida. Essa, no entanto, é uma disposição isolada, fora da problemática processual penal e que não encontra demais normas convergentes no mesmo sentido. Sequer os autores que escrevem sobre o tema trazem-no como princípio de Direito Tributário.
Não achamos nada que pressuponha ou que suporte o favor rei como é apresentado. Prerrogativas como o in dubio pro reo, a non reformatio in pejus, ampla defesa, etc., devem ser garantidas, porque decorrentes do ordenamento jurídico e do Estado Democrático de Direito. Aplicar o favor rei ou mesmo tratá-lo como um princípio é algo que deve ser refutado e devidamente combatido.
Ressalte-se que a dúvida é um estado humano, e não algo inerente ao texto de lei. Interpretações diversas surgem, e isso é mais do que necessário para a investigação hermenêutica. Enfraquecer o debate jurídico e a busca pelos topoi, como quis Viehweg, é uma das principais mazelas do supergarantismo, pois a multiplicidade de caminhos (topoi) está sempre presente. Isso, contudo, não é sinônimo de dúvida. Esta pode ser gerada, por exemplo, por uma fraca investigação ou por insuficiência de conhecimento das demais disposições legais – isso deve servir ao réu como um benefício?
Perceber o garantismo penal como sinônimo de proteção apenas às garantias liberais individuais acaba por influenciar a percepeção do próprio Direito Penal. Se aquele visa proteger somente prerrogativas inerentes aos direitos fundamentais de primeira geração, consequentemente o Direito Penal começará a ser voltar para a tutela de condutas que prejudiquem apenas esses tipos de direito.
Tal acepção não coaduna com a guarida conferida pela Carta Magna a direitos que não os decorrentes do paradigma liberal-individual, caso contrário estariam tutelados a segurança, o trabalho e a assistência aos desamparados na Constituição da República (art. 6º), tampouco seriam consideradas crime condutas que prejudiquem bens jurídicos atribuídos à sociedade, deles vítima.
Em suma, seria admitir que o particular vale mais que a coletividade. Num país em que um dos objetivos fundamentais é a construção de uma sociedade livre, justa e solidária – art. 3º, I, da CF – não faria o menor sentido. Vislumbrar o garantismo penal e o Direito Penal como voltados apenas a aquele grupo de direitos é fazer pouco dos crimes econômicos, que prejudicam muito mais do que o furto de um bem qualquer.
Aí, então, reside a mais nefasta das consequências do supergarantismo: a legitimação da delinquência econômico-empresarial. A esse respeito, lúcida a lição de Daniel de Resende Salgado:
[...] A percepção de a ação interventiva do direito penal só se voltar praticamente à proteção de bens jurídicos de cunho liberal-iluminista e, consequentemente, tentar neutralizar, de forma paliativa e seletiva, a conduta criminosa das massas, soma-se à generalização de um discurso de resistência ao reconhecimento em todas as esferas (legislativa, doutrinária e jurisprudencial) da integral tutela penal de bens jurídicos de relevância social, que carregam consigo a nota da supraindividualidade, atingidos, em sua maioria, por condutas do representantes de uma delinquência economicamente graduada [...]. Entretanto, não é isso que se vê. Com efeito, em que pese ser incompatível a complexidade da realidade fática atual com os clássicos paradigmas liberais-iluministas trazidos pelo direito penal tradicional, parte significativa da produção normativa/doutrinária e jurisprudencial continua com suas luzes voltadas à tutela de conflitos de índole eminentemente individual [...].[12]
Infelizmente, esse é o panorama atual brasileiro. Além da brandura com a qual a legislação atual trata os crimes econômicos que atingem toda a coletividade, as pessoas que o perpetram se beneficiam do supergarantismo, impetrando infinitos habeas corpus, alegando as mais diversas nulidades, tumultuando o processo com a instauração de vários incidentes e juntada de documentos, buscam a todo custo “trancar” a ação penal, utilizando-se, enfim, de todo o arsenal que dispõem através do supergarantismo para que não cumpram pena. E conseguem, o que leva a duas respostas possíveis: ou os tribunais brasileiros estão infestados de ilegalidades (e nesse caso, curiosamente as pessoas que não fazem parte da casta dominante tem seus processos conduzidos de forma regular), ou estão sendo infestados por essa forma de ludibriar a aplicação da lei penal, tudo em nome do “garantismo”!
Gecivaldo Vasconcelos Ferreira retrata bem a situação, ao pontuar que:
O supergarantismo vai além. Somente os intocáveis conseguem lançar mão dele. Aglutina o conjunto de práticas temerárias, interna e faticamente legitimadas sob a forma de exercício das amplas prerrogativas de defesa permitidas dentro do Estado Democrático de Direito. [...] Este supergarantismo, invenção exclusivamente brasileira, com o qual Ferrajoli nunca sequer sonhou, nossos medianos aspiram um dia ter acesso, enquanto que os desafortunados não conseguem nem perceber que o mesmo existe, sendo-lhe negado o direito de pelo menos sonhar com o mesmo. É ele que está na raiz da proteção (atualmente considerada legítima), e impunidade dos poderosos.[13]
Outra consequência preocupante é deslealdade processual, praticamente com a chancela do próprio Judiciário. O réu e seu causídico procuram, por todos os meios possíveis, atrapalhar a marcha processual, utilizando-se muitas vezes de má-fé nas suas ações e sempre visando a não condenação a todo custo. E o pior: o Judiciário observa tais condutas extremamente anti-éticas e as trata como se fosse direito do réu praticá-las, chancelando tais atos. Nas palavras de Américo Bedê Júnior e Gustavo Senna:
Garantismo penal não é sinônimo de impunidade. Não pode significar deslealdade processual nem absolvição a qualquer custo. Combate-se com veemência o abuso do poder de punir do Estado e repete-se o erro com o abuso do direito de defesa, tentando-se criar nulidades inconsistentes, utilizando-se de manobras claramente procrastinatórias ou alegando-se prejuízo para a defesa sem comprovação efetiva alguma.[14]
O primeiro passo é desmascarar esse falso garantismo que se lança silenciosamente sobre a justiça brasileira. Em tom quase profético, Alexandre da Maia alertou sobre o perigo da manipulação da teoria garantista, há mais de dez anos:
Em virtude de tal vazio ontológico, cremos que uma teoria comprometida com os ideais democráticos, com bem nos colocam Cláudio Souto e João Maurício Adeodato, pode ser manipulada por ideologias totalmente distintas do ideal do autor [...]. Seria muito desagradável ver uma teoria gerada a partir de ideais não democráticos ser manipulada por ideologias distintas, que se utilizam de uma forma peculiar de inserção do seu discurso no meio social.[15]
Não se pode, pois, permitir a proliferação de tais práticas, que se disseminam por todo o Judiciário. O receio do retorno a épocas onde práticas tirânicas e antidemocráticas vigoravam não podem ser utilizados como subterfúgio para que se pratique tais abusos, que, diga-se de passagem, também ferem a democracia. Garantir os direitos e exigir os deveres constitucionais não é o mesmo que garantir o abuso de direitos e a escusa aos deveres, e, como nos lembra Douglas Fischer, não se deve confundir imunidade com impunidade.
5. Conclusões
Por todo o exposto, notamos que a teoria garantista, visando a efetivação dos direitos fundamentais, inova em poucos aspectos, eis que, atualmente, já se encontram tais dispositivos nas Magnas Cartas dos Estados democráticos de direito, servindo apenas como um reforço à efetivação e garantia dos mesmos, mas sem chegar a ser uma teoria com bases epistemológicas, uma teoria do direito em qualquer sentido. Ainda, alguns axiomas do garantismo penal não são efetiváveis sem a existência de uma interpretação que os dê concretude, havendo que se valer de atos de vontade que criem o direito no caso concreto.
Inobstante isso, no Brasil, a aplicação da teoria de Ferrajoli se dá de maneira completamente deturpada, resultando na depreciação da análise hermenêutica e na formatação de decisões vazias, que se apoiam num conceito estérel de garantismo que só se vê no nosso país. O supergarantismo, aberração decorrente do garantismo original, vem como instrumento legitimador da impunidade dos detentores de poder e que legitima principalmente o cometimento de crimes de colarinho branco. A tendência de extremar os direitos fundamentais liberais, praticamente elevando-os à categoria de absolutos, é acompanhada da desvalorização de bens jurídicos cujos crimes correlatos têm por vítima a sociedade.
Ironicamente, o que acaba ocorrendo é que o supergarantismo perpetua suas práticas disfarçando-se de democracia e de direito processual penal à luz da constituição, sendo que não passa de um modelo que promove apenas a fuga da justa persecução penal, mostrando o Estado como o terrível Leviatã hobbesiano e o réu como o bon sauvage (que de selvagem não tem nada, pois reina nele a astúcia) retratado por Rousseau, o que não passa de uma visão romântica criada para alimentar e dar forças à essa prática repudiável, tendo assim mais uma razão para se justificar. A perpetuação de tal modelo deve ser a todo custo evitada, se se quer ter realmente um Estado democrático de direito em sentido substancial, como delineou Ferrajoli na proposta inicial (e original) do garantismo penal.
REFERÊNCIAS
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VENOSA, Silvio de Salvo. Introdução ao estudo do direito. São Paulo: Atlas, 2004.
[1] FISCHER, Douglas. O que é garantismo penal (integral)? in Garantismo penal integral: questões penais e processuais penais, criminalidade moderna e a aplicação do modelo garantista no Brasil. org. Bruno Calabrich, Douglas Fischer e Eduardo Pelella. Salvador: Editora JusPodivm, 2010, p. 36.
[2] FISCHER, Douglas. O que é garantismo penal (integral)? in Garantismo penal integral: questões penais e processuais penais, criminalidade moderna e a aplicação do modelo garantista no Brasil. org. Bruno Calabrich, Douglas Fischer e Eduardo Pelella. Salvador: Editora JusPodivm, 2010, p. 34.
[3] 59 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Prefácio in Garantismo penal integral: questões penais e processuais penais, criminalidade moderna e a aplicação do modelo garantista no Brasil. Org. Bruno Calabrich, Douglas Fischer e Eduardo Pelella. Salvador: Editora JusPodivm, 2010, p. 19
[4] _______. Declaração dos direitos do homem e do cidadão. Disponível em <http://pfdc.pgr.mpf.gov.br/atuacao-e-conteudos-de-apoio/legislacao/direitos-humanos/declar_dir_homem_cidadao.pdf>. Acesso: 15 Ago 2011.
[5] Neste sentido: FISCHER, Douglas. O que é garantismo penal (integral)? in Garantismo penal integral: questões penais e processuais penais, criminalidade moderna e a aplicação do modelo garantista no Brasil. org. Bruno Calabrich, Douglas Fischer e Eduardo Pelella. Salvador: Editora JusPodivm, 2010, p. 36.
[6] FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. 2ª. ed. rev. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, pp. 794-795.
[7] Usamos o mesmo termo empregado por FERREIRA, Gecivaldo Vasconcelos. Garantismo penal e impunidade no Brasil. Jus Navigandi, Teresina, ano 14, n. 2262, 10 set. 2009. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/13470>. Acesso em: 16 ago. 2011.
[8] RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 15ª ed., rev., amp. e at. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 34.
[9] NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 3ª ed., rev., at. e amp. Sâo Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 80.
[10] REALE apud VENOSA, Silvio de Salvo. Introdução ao estudo do direito. São Paulo: Atlas, 2004, pp. 163-164.
[11] Há no ordenamento jurídico alguns princípios positivados, tais como os princípios da administração pública, constantes no art. 37 da Constituição Federal.
[12] SARMENTO, Daniel de Resende. A elite do crime: discurso de resistência e laxismo penal in Garantismo penal integral: questões penais e processuais penais, criminalidade moderna e a aplicação do modelo garantista no Brasil. org. Bruno Calabrich, Douglas Fischer e Eduardo Pelella. Salvador: Editora JusPodivm, 2010, p. 53.
[13] FERREIRA, Gecivaldo Vasconcelos. Garantismo penal e impunidade no Brasil. Jus Navigandi, Teresina, ano 14, n. 2262, 10 set. 2009. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/13470>. Acesso em: 16 ago. 2011.
[14] GRANDIS, Rodrigo de. Garantismo e (des)lealdade processual in Garantismo penal integral: questões penais e processuais penais, criminalidade moderna e a aplicação do modelo garantista no Brasil. Org. Bruno Calabrich, Douglas Fischer e Eduardo Pelella. Salvador: Editora JusPodivm, 2010, p. 74.
[15] MAIA, Alexandre da. Ontologia Jurídica: O Problema de sua Fixação Teórica (com relação ao garantismo jurídico). Porto Alegre: Livraria do advogado, 2000, p. 95.
Advogado - OAB/PE nº 35.114. Formado em Direito pela Faculdade ASCES em junho de 2012; advogado criminal desde setembro de 2013; aprovado em julho de 2016 no concurso público para provimento de vagas no cargo de Delegado de Polícia do Estado de Pernambuco (32º lugar).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FILHO, Walkis Pacheco Sobreira. Supergarantismo brasileiro: instrumento retórico da impunidade Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 21 fev 2017, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/49554/supergarantismo-brasileiro-instrumento-retorico-da-impunidade. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: LUIZ ANTONIO DE SOUZA SARAIVA
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