Karine Alves Gonçalves Mota
(orientadora)[1]
RESUMO: Pretende-se por meio deste estudo, abordar a temática da responsabilidade civil nos danos causados pelo formol em procedimentos estético-capilares. Que são comumente conhecidos como escovas alisantes, selagens e botox, tendo, no mercado, diversas variações de nomenclaturas. Para tanto, parte-se da análise das leis e determinações dos órgãos que regulam a liberação de substâncias presentes nos produtos cosméticos, como a ANVISA; bem como a pesquisa sobre as formas de responsabilidade, dano estético e a forma de indenização, nas legislações disponíveis, Código Civil, Código de Defesa do Consumidor e em doutrinas que tratam sobre estes temas. Utiliza-se um método de abordagem dedutivo, baseado em leitura e pesquisa legal e doutrinária, para a formação e compilação do conhecimento, afim de estabelecer a formação de uma conclusão satisfatória quanto á responsabilidade dos salões para com os clientes.
ABSTRACT: The aim of this study is to address the issue of civil liability in the damages caused by formaldehyde in esthetic-capillary procedures. They are commonly known as straightening brushes, seals and botox, having on the market several variations of nomenclatures. To do so, it starts with the analysis of the laws and determinations of the bodies that regulate the release of substances present in cosmetic products, such as ANVISA; As well as the research on the forms of liability, aesthetic damage and the form of indemnification, in the available legislations, Civil Code, Code of Consumer Protection and in doctrines that deal with these subjects. A method of deductive approach, based on reading and legal and doctrinal research, is used for the formation and compilation of knowledge, in order to establish a satisfactory conclusion regarding the responsibility of the salons to the clients.
SUMÁRIO: 1.INTRODUÇÃO 2.ALISANTES:PROIBIÇÕES E PERMISSÕES 3.ASPECTOS GERAIS DA RESPONSABILIDADE CIVIL POR DANO ADVINDO DO USO INDEVIDO DO FORMOL 4.ABORDAGEM SOBRE O DANO ESTÉTICO 5ABORDAGEM DO DANO NA ÓTICA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR 5.1.Direito De Informação 5.2.Publicidade 6.RESPONSABILIDADE CIVIL DO FABRICANTE 7.RESPONSABILIDADE CIVIL DOS SALÕES DE BELEZA (TJ-SP - Apelação APL 00066474120118260417 SP 0006647-41.2011.8.26.0417 (TJ-SP).Data de publicação: 17/06/2015) Encontrado em: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. FATO DO PRODUTO. TRATAMENTO CAPILAR. QUEDA DE CABELO (TJ-PE - Apelação APL 4072277 PE (TJ-PE) Data de publicação: 17/03/2016) (TJ-RS - Apelação Cível AC 70054512199 RS (TJ-RS) Data de publicação: 27/09/2013) Considerações Finais 1.REFERÊNCIAS
Diante de um cenário com evolução presente em todos os campos de atuação, e uma preocupação cada vez maior com a longevidade, saúde, estética e bem-estar populacional, em todas as partes do mundo, o comércio da beleza se reinventa a cada dia buscando atender a um público com um nível de exigência cada vez mais elevado.
A relação de consumo vem se ampliando, principalmente na sociedade moderna, com uma preocupação crescente acerca da estética, nas suas mais variadas facetas. Aí entra a necessidade da garantia de segurança nos polos da relação de consumo, diante de uma prestação de serviço por salões de beleza.
A proposta deste artigo é elucidar os consumidores sobre seus direitos frente a prestações de serviços de beleza, que são parte do cotidiano das mulheres de todas as classes sociais e de todas as localidades ao redor de sua comunidade.
É importante frisar a segurança inerente ao processo de transformação da imagem aliada a prestação de serviço por estabelecimentos, bem como reforçar a necessidade de segurança na utilização de produtos que podem lesar não só a aparência daqueles que se submetem a um tratamento estético, mas também à saúde, que está diretamente relacionada com a utilização do formaldeído por salões de beleza.
Hodiernamente, mesmo com as regulamentações expressas quanto á fabricação de produtos cosméticos, sua colocação no mercado e a forma de utilização pelos centros de estética, existe a presença indevida do formol em proporções diversas das autorizadas; fator de risco tanto para a relação de consumo, pois pode gerar alteração no resultado contratado, quanto à saúde, visto que pode gerar danos mais ou menos gravosos ao consumidor.
Tudo aquilo que cerca a vida prática é de relevância par estudos que transformem a forma de enxergar determinadas situações, e norteiam decisões e entendimentos do nosso ordenamento jurídico, o qual traz relação direta com a forma comportamental da sociedade ao longo dos tempos.
Para iniciar, nada melhor do que definir o que seria um tratamento estético-capilar. Trata-se de qualquer procedimento feito nos cabelos, com o intuito de tratar os fios, melhorar sua aparência, mudar o estilo, ou combater algum fator, como a queda por exemplo. O objeto do estudo em questão é o tratamento estético, ou seja, com função de transformação ou melhoramento da aparência, com a aplicação do formaldeído, que é comumente conhecido como formol.
Os produtos que contém essa substância no mercado são os alisantes. Possuem estes diversos nomes: escova de chocolate, escova marroquina, escova de argan, escova de ouro, blindagem, selagem capilar, dentre outros.
Existem ainda os que se denominam como, botox, realinhamento capilar, preenchimento capilar, blindagem capilar, etc.; estes por vezes não contém propriamente o formol, mas possuem uma substância, denominada ácido Glioxílico, que, quando aquecido, libera formol; sendo, portanto, também proibida a sua utilização.
Como o objeto deste estudo é o formol em sua forma pura, e a abordagem de informações sobre seu uso e restrições possíveis danos e normas pertinentes. É interessante discorrer sobre as bases normativas de fabricação, autorização e comercialização dos produtos com formaldeído. Em primeiro lugar, conhecer quem produz as normas e legislações sobre o tema, estando nesse patamar a ANVISA e o Ministério da Saúde. Trazido na forma de várias resoluções e guias publicados por esses órgãos, as resoluções destes institutos de fiscalização e liberação trazem o fator responsabilidade para os fabricantes dos produtos de ordem cosmética em geral, em que os mesmos atestam, ao assinar a documentação de inserção no mercado a segurança destes. Neste sentido:
A avaliação da segurança deve preceder a colocação do produto cosmético no mercado. A empresa é responsável pela segurança do produto cosmético, conforme assegurado pelo Termo de Responsabilidade apresentado, onde a mesma declara possuir dados comprobatórios que atestam a eficácia e segurança de seus produtos (Resolução 79/00, Anexo XXI e suas atualizações). (Guia de Orientação para Avaliação de Segurança de Produtos Cosméticos, p. 07)
O guia da produção de cosméticos publicado no ano de 2013 pela ANVISA traz a orientação de que não existe a possibilidade do afastamento integral do risco, porém traz algumas regras que amenizam o potencial acontecimento do mesmo.
Algumas delas seriam a formulação dos produtos com ingredientes referenciados e seguros, quais seriam os aprovados pela ANVISA, deixar uma margem de segurança entre o nível de risco e o nível de uso do produto, assim a chance de ocorrência do dano, seria reduzida, informar o consumidor, de maneira clara, a fim de evitar que este utilize mal o produto e ainda seguir as boas práticas de fabricação e controle expressamente trazidas no Guia de Orientação para Avaliação de Segurança de Produtos Cosméticos, publicado pelo já referido órgão.
Sobre a questão das possibilidades de riscos que o guia traz, existem subdivisões características, que para o trabalho de caracterização como dano estético têm de real importância. São estas:
• Irritação: intolerância local podendo corresponder a reações de desconfortos menores, mas também a reações mais ou menos agudas, variando sua intensidade, desde ardor, coceira e pinicação podendo chegar até a corrosão e destruição do tecido. Todas estas reações se restringem à área em contato direto com o produto;
• Sensibilização: corresponde a uma alergia, que é uma reação de efeito imediato (de contato ou, urticária) ou tardio (hipersensibilidade). Ela envolve mecanismos imunológicos e pode aparecer em outra área, diferente da área de aplicação. Portanto, é importante insistir que no campo da imunologia deve-se, não apenas, verificar se um produto pode desencadear uma resposta alérgica em pessoas pré- sensibilizadas, mas também, verificar se o próprio produto não é capaz de induzir uma reação alérgica ao consumidor;
• Efeito sistêmico: resultante da passagem de quaisquer ingredientes do produto para a circulação geral, diretamente por via oral, inalatória, transcutânea ou transmucosa, metabolizados ou não. Vê-se aqui a necessidade de avaliar o risco dos ingredientes que constituem a fórmula. (Guia de Orientação para Avaliação de Segurança de Produtos Cosméticos, p. 10, 11 )
A relação de interligação entre eles dá-se pelo motivo de que o formol pode causar reações de todas as espécies supracitadas ao consumidor que recebe sua aplicação. Portanto, é importante a observação e diferenciação de todas as supracitadas, mesmo todas elas caracterizando por si só a vertente do dano estético.
Pode-se então observar pelas transcrições do guia de produtos estéticos, que são muitas as recomendações, análises, testes e requisitos exigidos para a inserção de um produto no mercado. Então sobre a questão do formol analisada neste artigo, fica um questionamento de como poderia gerar danos se para um produto circular nos comércios e salões são exigidas tantas certificações.
É simples, o formol não é autorizado pela ANVISA como produto químico de composição para formulação de produtos estético-capilares. A forma e porcentagem como o órgão libera a presença dessa substância nos produtos para cabelo é baixíssima e apenas a título de conservação do próprio produto, não para que este seja parte de ativos que façam algum tipo de reação com os cabelos onde serão aplicados.
Pode-se aferir isto com base no que a ANVISA traz como explicação acerca do formol e sua aplicação no seguinte trecho:
Formol/ Formaldeído:
• O formol é uma solução de formaldeído, matéria-prima com uso permitido em cosméticos nas funções de conservante (limite máximo de uso permitido 0,2% - Resolução 162/01) e como agente endurecedor de unhas (limite máximo de uso permitido 5%). [...]
•[...] O uso do formol com função diferente das citadas e em limites acima dos permitidos pode causar danos à saúde, não podendo ser usado em produtos cosméticos. (Resolução 79/00 Anexo V, ANVISA,2005)
Seguindo ainda dentro da linha das especificações dadas pela ANVISA, existem descrições de riscos de lesões que o formol pode trazer à saúde de forma geral, não só na parte externa, mas também interna do organismo. O fato de existirem determinadas advertências de risco, na tese desenvolvida por este artigo, por si só, já gera a responsabilidade daquele que descumpre as normas a respeito da proporção deste ingrediente dos produtos que fabrica. Existe uma lista disponibilizada pelo referido órgão com alguns dos problemas e riscos que o formaldeído pode gerar em contado com o organismo.
Se em contato com a pele, possui efeito tóxico, e pode causar irritação, vermelhidão, dor e até queimaduras. Em contato com os olhos, causa irritação, vermelhidão, dor, lacrimação e visão embaçada. Em altas concentrações, pode gerar danos irreversíveis. Sendo o produto inalado, mesmo que apenas através da fumaça que o procedimento libera, pode gerar câncer no aparelho respiratório. Pode causar também, dor de garganta, irritação no nariz, tosse, diminuição da frequência respiratória; ferimentos nas vias respiratórias levando a formação de edema pulmonar e pneumonia.
A exposição de forma crônica à esta substância, de forma frequente ou prolongada, pode gerar hipersensibilidade, que causam dermatites, reações alérgicas, debilitação da visão e o aumento do fígado. Nos casos das escovas disponíveis no mercado com a concentração de formol acima da permitida, a aplicação desta pode gerar queda capilar em menor ou maior grau. Vale ainda ressaltar que, os danos mencionados, não atingem apenas as pessoas que se submetem ao procedimento capilar, mas também ao profissional que os realiza, visto que está, também, em contato direto com o produto e os gases que este emite.
O formaldeído é considerado pela OMS (Organização Mundial de Saúde) como substância cancerígena, baseado em pesquisas de quatro institutos ligados ao órgão e seguindo a lista publicada no próprio site da OMS, e pode, além dos problemas já citados, causar, quando absorvido pelo organismo, câncer na boca, nas narinas, no pulmão, na cabeça e no sangue.
Posto isso, o risco que o formol apresenta, não se restringe unicamente ao consumidor que se submete ao tratamento capilar nos salões, mas também ao profissional que trabalha diariamente com a aplicação da substância. Porém, neste artigo, o foco estará apenas na responsabilidade do salão que faz uso desta substância nos clientes que procuram tratamentos para os cabelos.
Vale ainda ressaltar que, o desvio de finalidade deste produto, sendo ele acrescentado em dose maior que a permitida na legislação, em produto pronto para uso, divergindo da finalidade de conservação da dosagem autorizada, caracteriza crime hediondo, tipificado no código penal brasileiro em seu artigo 273, dizendo em seu caput, que, falsificar, corromper, adulterar ou alterar produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais é crime punido com reclusão de dez a quinze anos e multa. Comete o mesmo crime a pessoa que venda, importe, exponha à venda, tenha em depósito ou distribua e entregue para consumo, produto que esteja falsificado, corrompido, adulterado ou alterado. Este seria o caso de quem coloca na composição, depois de aprovado pelo órgão fiscalizador, quantidade extra de formol para potencializar o efeito do alisamento.
O parágrafo 1º-A deste mesmo artigo, trata mais especificamente dos produtos de beleza quando diz que, incluem-se entre os produtos a que se refere o artigo, os medicamentos, as matérias primas, os insumos farmacêuticos, os cosméticos, os saneantes e os de uso em diagnósticos.
Responderão pela mesma pena já citada, as pessoas que praticarem as referidas condutas em qualquer das condições listadas no artigo 273, sendo exemplos: estar sem registro, quando exigível para o produto, no órgão da vigilância sanitária competente, ou possuir fórmula incompatível com as autorizações deste órgão.
Ao fim do exposto, uma dúvida é se existiria alguma forma segura de alisar os cabelos. A resposta é sim. Existe uma lista disponibilizada, também pela ANVISA, com substâncias que são de destinação própria para o alisamento capilar e que, de acordo com os estudos já realizados, são seguras e, de modo geral, não causam danos ao cliente nem ao profissional que entram em contato com elas; observando-se claro, as devidas precauções de uso e recomendações expostas nas embalagens pelos fabricantes.
Existem substâncias ativas específicas com propriedades alisantes permitidas pela legislação,como: o ácido tioglicólico, hidróxido de sódio, hidróxido de potássio, hidróxido de cálcio, hidróxido de lítio, hidróxido de guanidina. (ANVISA, 2005).
Para um melhor entendimento da matéria discutida, se faz necessária uma elucidação sobre pontos base, como o que seria, de fato, a responsabilidade civil, da forma como é aplicada hodiernamente pelo ordenamento jurídico.
Cavalieri Filho (2010, p. 2) traz um importante apontamento sobre a diferenciação entre obrigação e responsabilidade, que por vezes podem ser confundidas entre si, mas de fato, uma deriva da outra. Segundo o autor, a responsabilidade é o dever jurídico que deriva do principal, a obrigação.
É trazida essa diferenciação também pelo nosso Código Civil vigente, em seu artigo 389 estabelecendo que não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado.
Fica então nítida a diferenciação entre os dois institutos jurídicos. A partir daí, pode-se trabalhar separadamente com a conceituação de responsabilidade civil, que deriva do ato jurídico, posto que só pode esta, existir, se houver a prática de um fato que gere efeitos, de alguma forma, no mundo jurídico.
A já referida responsabilidade surge de um ilícito. Diferentemente da esfera penal, esse ato infringe regras de direito privado, consequentemente, os efeitos que geram são de natureza diversa. O descumprimento de algo pré-estabelecido, ou a prática de ato previamente proibido, faz com que surja a necessidade de se responsabilizar o autor da ação, a fim de reparar os danos causados a outrem. Segundo o posicionamento doutrinário do referido autor:
Esse dever, passível de violação, pode ter como fonte uma relação jurídica obrigacional preexistente, isto é, um dever oriundo de contrato, ou, por outro lado, pode ter causa geradora uma obrigação imposta por preceito geral de Direito, ou pela própria lei. (CAVALIERI FILHO,2010, p.15)
A responsabilidade civil tem como elementos formadores da mesma a conduta ou ato do indivíduo, o nexo de causalidade e por fim o dano ou prejuízo. Em relação a culpa, temos que esta não se enquadra como um elemento geral da responsabilidade civil, sendo por sua vez um elemento acidental.
O elemento inicial da responsabilidade civil (conduta ou ato do indivíduo) tem como essência a voluntariedade, podendo esta ser dada de forma positiva, ou seja, através de uma ação, ou de forma negativa, que por sua fez será dada mediante uma omissão, sendo ambas as formas adotadas de maneira consciente pelo agente.
O nexo de causalidade, como o próprio nome já sugere, é o vínculo existente entre o ato ou conduta do indivíduo e o dano causado.
O último dos três elementos gerais que fundamentam a responsabilidade civil, o dano trata-se de uma lesão à um bem ou interesse que possua proteção jurídica, sendo o mesmo patrimonial, que nos remete ao dano material, ou também extrapatrimonial, sendo este então denominado de dano moral
O Professor Álvaro Villaça de Azevedo define dano da seguinte maneira:
(...) a palavra dano tem extensão ilimitada de sentido, representando o resultado de qualquer espécie de lesão (moral, religiosa, econômica, política etc.); entretanto, no prisma jurídico, o dano circunscreve-se a detrimência econômica ou moral. (VILLAÇA,1998, p. 238)
Na mesma linha do raciocínio apresentado, é de grande valia apresentar a definição utilizada pela ilustre Professora Maria Helena Diniz,
O dano é um dos pressupostos da responsabilidade civil, contratual ou extracontratual, visto que não poderá haver ação de indenização sem a existência de um prejuízo. Só haverá responsabilidade civil se houver um dano a reparar, sendo imprescindível a prova real e concreta dessa lesão. Para que haja pagamento da indenização pleiteada é necessário comprovar a ocorrência de um dano patrimonial ou moral, fundados não na índole dos direitos subjetivos afetados, mas nos efeitos da lesão jurídica. (DINIZ, 2007, p. 59)
Assim como apontado anteriormente, a natureza do bem juridicamente tutelado é que vai definir o tipo do dano, sendo ele então, em uma definição mais simples e limitada, material ou moral. O desenvolvimento do presente trabalho passa também pela análise do dano moral, tendo em vista a relação íntima existente entre o mesmo e o dano estético, objeto deste.
O dano moral tem seus fundamentos baseados numa interpretação conjunta tanto do Código Civil, em específico o artigo 186, quanto na Constituição Federal, em seu artigo 5º inciso X, dispositivos legais os quais deixam claro a amplitude e expansibilidade do direito do cidadão, não estando o mesmo necessariamente restrito ao plano material e concreto.
O doutrinador Carlos Roberto Gonçalves, ao conceituar o dano moral leciona que:
Dano moral é o que atinge o ofendido como pessoa, não lesando seu patrimônio. É lesão de bem que integra os direitos da personalidade, como a honra, a dignidade, intimidade, a imagem, o bom nome, etc., como se infere dos art. 1º, III, e 5º, V e X, da Constituição Federal, e que acarreta ao lesado dor, sofrimento, tristeza, vexame e humilhação. (GONCALVES, 2013, p.359)
Outra corrente conceitua dano moral como o efeito da lesão, e não a lesão em si, como é o caso do festejado doutrinador Yussef Said Cahali que assim o conceitua:
Dano moral é a privação ou diminuição daqueles bens que têm um valor precípuo na vida do homem e que são a paz, a tranqüilidade de espírito, a liberdade individual, a integridade individual, a integridade física, a honra e os demais sagrados afetos, classificando-se desse modo, em dano que afeta a parte social do patrimônio moral(honra, reputação, etc.) e dano que molesta a parte afetiva do patrimônio moral (dor, tristeza, saudade, etc.), dano moral que provoca direta ou indiretamente dano patrimonial (cicatriz deformante, etc.) e dano moral puro (dor, tristeza, etc.). (CAHALI, 1998, p.20)
Isto posto, a priori, é possível considerar que o dano moral está vinculado à dor, angustia, sofrimento e tristeza. Entretanto, atualmente restringir o dano moral a estes elementos não é adequado, uma vez que ele se estende a todos os bens personalíssimos e extrapatrimoniais.
A distinção entre o dano moral e o dano material é de fato nítida. Entretanto, ao contrário do que talvez se imagine, o principal fator que distingue ambos, não é a natureza da lesão, que gerou a o ofensa, mas sim os efeitos da lesão, e a repercussão que a mesma teve sobre o ofendido e sobre seus bens tutelados.
Enquanto no dano material há uma diminuição patrimonial e, comprovados os danos, há que se ressarcir a perda, recompondo o status quo patrimonial do ofendido, no dano moral, essencialmente extrapatrimonial, imaterial, a grande questão é a determinação do quantum indenizatório, haja vista ser indeterminável no âmbito financeiro.
No diapasão dos danos que atingem bens imateriais do ser humano, tem-se o objeto do trabalho em comento, qual seja o dano estético. A palavra estética deriva do grego aisthésis e tem como uns dos diversos significados percepção, sensação, sensibilidade, sendo a mesma também um ramo da filosofia que tem por fim o estudo da natureza da beleza e dos fundamentos da arte. A estética seria aquilo que ao olhar julgamos bonito, agradável aos olhos, o que é considerado, beleza. O que decorre da estética tem influência direta nas emoções, e na forma de se comportar dos indivíduos diante das situações; mesmo o padrão de beleza e estética, sendo diferente ao redor do mundo.
Sobre o dano estético, para a doutrinadora Maria Helena Diniz, ele seria uma forma de alteração morfológica do indivíduo, podendo abranger desde pequenas até grandes deformidades, advindas de forma natural, ou não, que causem qualquer tipo de enfeiamento daquela pessoa. O dano estético não necessariamente traz alguma incapacidade para a vítima, mas sim desconforto visual, exposição ao ridículo e as vezes um sentimento de inferioridade.
A presença do dano estético não é configurada apenas quando este ocorre em grande proporção, mas também quando é mínimo; bastando que exista diferença entre a forma anterior e a forma ou estado atual do indivíduo. De acordo com Diniz:
Quando falamos em dano estético, estamos falando da ofensa à beleza externa de alguém, ou seja, da integração das formas físicas de alguém. Ele surge a partir de um sentimento de constrangimento ou de humilhação e desgosto que o lesado tem ao ver que não existe mais a harmonia de seus traços, e que no lugar destes existirá uma marca, mesmo que pequena, que lhe desperte a sensação de inferioridade. (DINIZ, 2007, p. 80)
Tendo como base os ensinamentos apresentados pela professora Maria Helena Diniz, resta claro que a configuração de um dano estético exige que a transformação sofrida pela vítima a deixe com uma imagem verdadeiramente pior do que a que possuía até então.
Para a doutrinadora Teresa Ancona Lopez, dano estético é:
(...) é a lesão a um direito da personalidade - o direito à integridade física, especialmente na sua aparência externa, na imagem que se apresenta. Como todo direito da personalidade, qualquer dano que o seu titular possa sofrer vai ter consequências materiais e, principalmente, morais. Portanto, não podemos conceber prejuízos estético que não seja também prejuízo moral, pois a pessoa, a partir do momento da lesão, está menos feliz do que era antes. (LOPEZ, 2004, p.64)
Assim, o dano estético possui uma relação bastante estreita com o dano moral, uma vez que o mesmo acaba por causar na vítima uma série de sentimentos negativos, como tristeza, humilhação, vergonha, frustração, antes não inerentes a sua pessoa, no momento em que esta percebe que sua imagem não é mais a mesma, e essa nova aparência lhe causa, mesmo que minimamente, sensação de desgosto pessoal com seu reflexo diário.
A aceitação, tanto da doutrina quanto do ordenamento jurídico pátrio, da coexistência entre as duas essas modalidades de dano fica clara a partir do momento em que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) edita a Súmula 387 estabelecendo que “é lícita a cumulação das indenizações de dano estético e moral”.
Entretanto, além da abordagem a respeito da responsabilidade civil e o entendimento do que vem a ser o dano estético, para o completo desfecho do trabalho faz-se necessária a análise da natureza jurídica da relação então estabelecida e consequentemente dos resultados provenientes da mesma.
Partindo do princípio de que, quando o indivíduo busca uma transformação da sua imagem, sempre há uma referência esperada, ou prometida pelo profissional, conseguimos então fazer relação com uma obrigação de fim.
Ao procurar o serviço, o cliente não espera que o profissional faça o possível para alcançar uma imagem previamente acordada entre ambos, mas sim que projete no resultado final, a expectativa vendida no momento do início do procedimento; e o mais importante, que os elementos saúde e integridade visual e interna sejam mantidos após o tratamento.
Será feita aqui breve explicação sobre o entendimento do que seria o instituto obrigacional supramencionado, nas palavras de Carlos Roberto Gonçalves:
Quando a obrigação é de resultado, o devedor dela se exonera somente quando o fim prometido é alcançado. Não o sendo, é considerado inadimplente, devendo responder pelos prejuízos decorrentes do insucesso. (GONÇALVES, 2013, p. 192)
Tem-se então o esclarecimento sobre qual a característica de uma obrigação de resultado e, deste ponto em diante, será tratado o tópico da responsabilidade civil nos procedimentos estético capilares com aplicação de formol que resultam em dano, de forma analógica a cirurgia plástica.
Isso porque, ambas, possuem finalidade estética, e exceto em casos de deformidade física proveniente de fatores externos que requerem cirurgia plástica para reparação, como no caso de queimaduras; a cirurgia plástica, assim como tratamentos capilares, possuem o único intuito de aprimorar a aparência daquele indivíduo que busca o serviço e promover um maior bem-estar diante da imagem pessoal.
Trazida mais uma vez a lição do doutrinador, com a seguinte elucidação acerca das obrigações de resultado com finalidades estéticas:
Na de resultado, em que o objetivo final é da essência do ajuste, somente mediante prova de algum fato inevitável capaz de romper o nexo de causalidade, equiparado à força maior, ou de culpa exclusiva da vítima, pode o devedor exonerar-se caso não tenha atingido o fim a que se propôs. (GONÇALVES, 2013, p. 192)
A questão agravante, trazida é a de que, além de não atingir o objetivo específico determinado no início, ou seja, a falha no serviço e no resultado obtido, trabalhar-se-á aqui com a hipótese da ocorrência do dano em relação ao cliente. Fator que obriga indenização, não só pelo inadimplemento da obrigação pré-estabelecida, mas também por dar causa a sofrimento interno e deterioração da percepção de imagem pessoal.
Sendo o cliente, a figura do consumidor segundo a definição do código de defesa do consumidor “Art. 2º- Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final” (Art. 2º, CDC), seu direito se encontra resguardado não só na responsabilidade civil de indenizar trazida pelo código civil e pelas teorias doutrinárias, existe também um princípio relacionado ao Código de Defesa Do Consumidor, denominado reparação integral, que se trata do princípio relativo á reparação de danos causados, onde se um consumidor sofre um dano, a reparação que lhe é devida deve ser a mais ampla possível e abranger efetivamente todos os danos que foram causados.
Expor-se-á o ensinamento da ilustríssima Teresa Ancona Lopez na relação de analogia entre o cirurgião plástico e o profissional qualificado da área da beleza:
(...) na verdade, quando alguém, que está muito bem de saúde, procura um médico somente para melhorar algum aspecto seu, que considera desagradável, quer exatamente esse resultado, não apenas que aquele profissional desempenhe seu trabalho com diligência e conhecimento científico. Caso contrário, não adiantaria arriscar-se a gastar dinheiro por nada. (...) a melhoria de uma situação que pode ser, até aquele momento, motivo de tristezas. (O DANO ESTÉTICO, 2004, p. 91)
Portanto, depois de todo o exposto, entende-se que realmente existe embasamento para a discussão da aplicação do princípio da responsabilização cível em relação ao dano causado, tanto amparada pelo código de defesa do consumidor, pela natureza jurídica da relação entre as partes quanto pelo código civil.
Um dos maiores problemas enfrentados pelo consumidor quando se submete ao tratamento capilar, é que, na maioria das vezes, não sabe de fato qual a composição do produto, ou, pela variação de nomes e propagandas existentes no mercado, propagandas, acredita estar recebendo aplicação de produto que não contém formol acima das proporções devidas. Na realidade, na linguagem popular, o consumidor imagina estar usando um produto sem formol.
Diante disto, é de suma importância o uso do direito que o CDC garante quanto á informação. Além de evitar dúvidas e inseguranças, é possível prevenir possíveis problemas em relação a mistura de composições químicas incompatíveis nos cabelos e a utilização de produtos em desacordo com as quantidades permitidas pelas normas.
Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem;
O direito à informação trazido, está diretamente relacionado com o princípio da transparência de que trata o artigo 4º do CDC, garantindo além da transparência a harmonia nas relações de consumo. O indivíduo deve ter o direito de submeter-se ou não a determinado procedimento estético, mediante conhecimento de todos os benefícios e possíveis riscos.
De fato, pode-se entender então que a junção destes dois princípios são elementos caracterizadores da vinculação do produto ou serviço que está sendo oferecido. O risco, as características, qualidades, dentre outras características, devem ser informados em momento anterior à contratação e realização de qualquer procedimento. Já que, se informados posteriormente diante de uma lesão já sofrida, não exerceria mais a sua função originária.
É inegável que a publicidade é o meio pelo qual as indústrias e o comércio ganham os consumidores. Enchem seus olhos com garantias de resultados, melhores serviços, facilidades, etc., mas qual é a limitação e a responsabilidade atribuídas à publicidade?
Trazida aqui uma breve definição do que seria a mesma nas palavras de Vidal Serrano Nunes Júnior; publicidade seria:
(...) o ato comercial de índole coletiva, patrocinado por ente público ou privado, com ou sem personalidade, no âmago de uma atividade econômica, com a finalidade de promover, direito ou indiretamente, o consumo de produtos e serviços (NUNES JÚNIOR, 2001, p. 22-23).
Existe diferenciação entre publicidade e propaganda, sendo a primeira atividade realizada a fim de promover e auferir valores monetários, e a segunda desprovida deste intuito, destinando-se primordialmente a divulgar ideias, opiniões, etc. Porém, para fins de facilidade didática, e melhor entendimento, será utilizada neste trabalho a palavra propaganda como a população de forma geral costuma utilizar. Que seria atividade de promover e vender algo, seja produto ou serviço.
Retomando o foco da responsabilidade da “propaganda” no CDC, ele é bem claro quanto á responsabilidade que o fornecedor, vendedor, comerciante traz para si quando realiza a propaganda de determinado produto, devendo este demonstrar os riscos do mesmo na embalagem, de forma clara e compreensível ao consumidor.
Faz referência também ao fato de que se obriga quanto ao fim por ela prometido quando a pessoa adquire o produto ou serviço em função do convencimento pela propaganda. Esta por sua vez não pode ser falsa, enganosa, nem omissa, quanto aos detalhes pequenos ou não da prestação de serviço ou produto ofertados, sob pena de nulidade da clausula contratual que a fizer com um destes vícios.
Incorre também em ilícito penal aquele que, na publicidade, fizer omissão de dizeres ou sinais ostensivos quando á periculosidade e nocividade à saúde do produto que está expondo à venda. Aí, encaixa-se aquele que, fabricando e comercializando produto com formaldeído, altera a informação da sua proporção na fórmula, ou ainda omite a sua presença no produto do rótulo; que é a única maneira de informação que o cliente tem acesso acerca daquele determinado produto.
O artigo 36 do CDC diz que a publicidade deve ser veiculada de uma forma que o consumidor possa imediatamente e facilmente a identificar. O fornecedor deve, na publicidade de seus produtos ou serviços, manter em seu poder as informações para os legítimos interessados, contendo dados fáticos, técnicos e científicos que sustentam a mensagem que está passando.
É proibida, de acordo com o artigo 37 do referido código, qualquer forma de propaganda enganosa ou abusiva; caracterizando-se como tal qualquer veiculação de caráter publicitário que seja parcial ou totalmente falso, ou que até mesmo por omissão, seja capaz de induzir a erro o consumidor a respeito da natureza, características, qualidade, quantidade, propriedade, origem, preço, ou quaisquer outros dados e características acerca do produto ou serviço.
A modalidade omissa é quando a publicidade deixa de informar sobre dado essencial do produto ou serviço. É punido com detenção de seis meses a dois anos e multa, aquele que omite sinais ostensivos sobre a nocividade ou periculosidade de produtos, nas embalagens, invólucros, recipientes ou publicidade, em concordância com o artigo 63 do Código de Defesa do Consumidor.
Acerca da rotulagem dos produtos o primeiro passo que o consumidor deve realizar é procurar do rótulo da embalagem se o produto é autorizado pela ANVISA. Todos os salões de beleza devem dar ao cliente o direito de ler o rótulo daquilo que será utilizado no procedimento, devido ao princípio da garantia de informação.
É fácil saber se existe ou não registro na ANVISA, todos os que tem autorização para circular no mercado, possuem um número de registro que se inicia pelo numeral 2 e terá 9 ou 13 dígitos. Outra possibilidade é encontrar o número do processo, que se inicia pelo numeral 2 e terá 15 ou 17 números.
Essas são recomendações dadas para identificação, no próprio site da ANVISA, que ainda recomenda a denúncia de qualquer produto que não contenha esta numeração na rotulagem. O referido site, também disponibiliza uma área para pesquisa aberta ao consumidor, onde este pode pesquisar se o produto que vai adquirir ou utilizar está no rol dos permitidos pelo órgão.
A função da responsabilidade civil é a de proteger a parte vulnerável na relação de consumo, dos eventuais abusos, irregularidades ou danos que vierem a ser causados ou que possam decorrer da relação entre o fornecedor e o consumidor.
A relação de consumo é composta pelo consumidor final do produto ou serviço, de acordo com a teoria finalista, adotada de forma majoritária pelo ordenamento, e do fornecedor do produto ou serviço. De acordo com o artigo 3º do CDC:
Art. 3° do CDC- Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.
O fabricante, tratado neste tópico, é aquele responsável pela efetiva criação do produto. O vício em seu produto que cause ou não dano ao consumidor, deve ser por ele reparado assim como prevê o Código de Defesa do Consumidor. Segundo Rizzatto Nunes:
Considera-se vícios as características de qualidade ou quantidade que tornem os produtos ou serviços impróprios característica que impede seu consumo ou uso inadequados podem ser utilizados, com eficiência reduzido o consumo a que se destina e também que lhes diminuam o valor. Da mesma forma são considerados vícios os decorrentes da disparidade havida em relação às indicações constantes do recipiente, embalagem, rotulagem, oferta ou mensagem publicitária. (NUNES, 2000, p. 278)
Como já mencionado neste artigo, a propaganda, obriga aquele que a faz, nos termos utilizados para captar o consumidor. Logo,a mensagem publicitária que garante a não existência de formaldeído em seu produto, quando na verdade, este o contém em quantidade superior á permitida, gera vício no produto ofertado; fato que por si só faz nascer a responsabilidade civil para o fabricante em relação aos consumidores.
O código de Defesa do Consumidor engloba a responsabilidade do fabricante de diversas formas, dentre elas, no artigo 12, expondo que, o fabricante, produtor, construtor, nacional ou estrangeiro e o importador, respondem independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por qualquer defeito decorrente de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre a utilização do produto e seus riscos.
O produto é tido como defeituoso quando não oferecer a segurança esperada que se espera dele, levando em consideração, para isso circunstâncias como a sua apresentação, sua forma de uso e os riscos razoáveis esperáveis deste.
Respondem de forma solidária, pelos vícios de qualidade ou quantidade que tornar o produto impróprio para consumo, os fornecedores de produtos duráveis ou não duráveis. Classificados no parágrafo sexto do artigo 18 do CDC estão os tipos de produtos impróprios para consumo onde se encontram aqueles nocivos à saúde, perigosos, ou ainda aqueles em desacordo com as normas regulamentares de fabricação, distribuição ou apresentação.
A responsabilidade referente aos salões de beleza em si, é um tema relativamente novo, visto que o ordenamento vai se adequando á medida que as necessidades da sociedade vão surgindo. Apesar de estes estabelecimentos existirem há muitos e muitos anos, a demanda em relação á danos causados por eles, ainda é de certa forma recente. A maioria, portanto, da base legal neste tópico, é jurisprudencial.
O presente artigo abrange os salões de beleza de forma geral, como sendo este o responsabilizado pelo dano, sem a subjetivação da pessoa em si que efetuou a prestação de serviços, mas sim a responsabilidade do estabelecimento quanto ao acidente de consumo.
O CDC traz a forma de responsabilidade quanto ao prestador de serviços em seu artigo 14 ensinando que este responde independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos que causar aos consumidores por defeitos relativos à prestação de serviço, bem como pela insuficiência das informações sobre os possíveis riscos.
O serviço seria considerado defeituoso quando não fornecer a segurança que o consumidor poderia esperar, levando-se em consideração circunstâncias relevantes como o modo do fornecimento do serviço e os resultados e riscos razoavelmente esperados. A adoção de novas e diferentes técnicas, não caracteriza o serviço como defeituoso, desde que, estejam em acordo com padrões de segurança e sejam condizentes com a normalidade para o tipo d serviço oferecido.
Como o Salão é um fornecedor de serviços estéticos, pode-se então aduzir que, sua responsabilidade quanto ao serviço prestado é objetiva, devendo, independentemente da análise de culpa, indenizar aquele que sofreu lesão em razão do fato de serviço. Só não será, este responsabilizado, na hipótese do já referido artigo 14 em seu parágrafo 3º “ § 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar: I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.”
Outro ponto é a culminação do dano moral, adjunta ao dano estético, que já restou entendido e demonstrado neste artigo, que são entidades diversas. A maioria dos Tribunais vem entendendo que o fato de ter os cabelos danificados, por si só gera sofrimento, devendo também ter sua parcela de indenização.
O estabelecimento arcaria então, com as duas modalidades de dano, quando do acidente de consumo em relação ao formaldeído; isto se, não resultar fato mais gravoso qualificando a lesão corporal simples ou grave, mediante a aplicação do formol. Se este for o caso, além da ação civil de reparação de danos, responderá penal e independentemente.
Na sequência serão apresentados julgados em relação ao tema e seus respectivos embasamentos nas condenações concedidas, para o fechamento da tese de responsabilidade do salão quanto á prestação de serviços estético-capilares com a aplicação do formol. Este é o entendimento do Egrégio Tribunal de São Paulo:
PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS – PROCEDIMENTO DE ESCOVA PROGRESSIVA – QUEDA DE CABELOS - Ação de indenização por danos materiais e morais - Relação de consumo configurada - Inversão do ônus da prova - Requisitos presentes – Fornecedora que não se desincumbiu de seu ônus probatório de provar a ocorrência de culpa - Prestação de serviços defeituosa - Artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor – Sentença mantida – Recurso improvido.
Na supracitada apelação, a requerida foi condenada ao pagamento de R$ 65,00 reais a título de danos materiais e a R$ 500,00 reais a título de danos morais em razão da queda de cabelos sofrida após se submeter a procedimento de escova progressiva. Produto presente no mercado com formaldeído. No referido caso, a ré não provou os fatores excludentes da responsabilidade, sendo, portanto, condenada ao pagamento das importâncias já mencionadas. Também segue o entendimento do Tribunal do Rio Grande do Sul:
RECURSO INOMINADO. CONSUMIDOR. ESCOVA PROGRESSIVA. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MATERIAIS E MORAIS. QUEDA DE CABELO E REAÇÃO ALÉRGICA. DANOS MORAIS E MATERIAIS CONFIGURADOS. A parte recorrente pede provimento ao recurso alegando que inexiste falha na prestação de serviço, sendo a queda de cabelo culpa exclusiva da autora, esta que supostamente fez uso posterior de produtos e tratamentos não indicados pela ré. Restou comprovada pela autora que o dano capilar ocorreu logo após o tratamento efetuado pela ré, o que se verifica na conversa acostada nas fls. 33/37. Visto que a parte recorrente não comprovou a alegação de que a queda ocorreu por uso posterior de produto inadequado, constata-se a culpa exclusiva da ré pelos danos causados à autora. Relação de consumo, onde há inversão do ônus da prova, nos termos do art. 6º, VIII, do CDC. Cabível, portanto, a condenação da ré à indenização por danos morais, em quantum de R$ 2.000,00 que não merece ser minorado, visto que aquém aos parâmetros das Turmas Recursais Cíveis. O dano material de R$ 306,02 resta mantido, pois suficientemente demonstrado que o dispêndio decorreu em virtude da falha no serviço prestado pela recorrente e do dano subsequente. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO IMPROVIDO.
(Recurso Cível Nº 71004662805, Primeira Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Fabiana Zilles, Julgado em 28/10/2014).
Na decisão acima, mantém-se também nos votos dos relatores, menções aos danos morais sofridos decorrentes da queda de cabelo pelo serviço, e da responsabilidade trazida pelo CDC quanto á prestação de serviços e de que, foi esta, que originou o problema em questão. Agora segue-se o posicionamento do Tribunal de Pernambuco:
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. FATO DO PRODUTO. TRATAMENTO CAPILAR. QUEDA DE CABELO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. ART. 12, CDC. DANO MORAL IN RE IPSA. MANUTENÇÃO DO QUANTUM ARBITRADO. RECURSO NÃO PROVIDO. 1. Conforme o art. 12 do Código do Consumidor, o fabricante responde objetivamente pelos danos decorrentes de acidentes de consumo, causados por produtos que não se apresentam com a qualidade e segurança que deles se podia legitimamente esperar. 2. Manutenção da indenização relativa ao dano moral, com base nos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, a qual fixou seu valor em R$ 7.000,00 (sete mil reais). 3. Recurso não provido. Decisão unânime.
A apelação acima possui o teor um pouco diferente das anteriores por se tratar de responsabilização do fabricante, também trazida neste artigo, porém não objeto principal dele. O fato é enquadrado no artigo 12 do CDC responsabilizando o fabricante pela inadequação e inobservância das normas estabelecidas quanto aos padrões de produção e circulação dos produtos cosméticos. Ainda, é o entendimento do Tribunal do Rio Grande do Sul:
APELAÇÃO CÍVEL. PRELIMINAR. PROCESSUAL CIVIL. ILEGITIMIDADE PASSIVA. Reconhecida a ilegitimidade passiva da codemandada Griff do Cabelo, pois se trata apenas do nome fantasia do salão de beleza de propriedade pessoa física codemandada, inexistindo qualquer indício da existência de personalidade jurídica. Inexistindo personalidade jurídica, sequer se tratando de empresa individual, inviável sua manutenção no polo passivo da demanda. Ausência de condenação da autora ao pagamento dos ônus de sucumbência em relação ao codemandado ilegítimo, considerando a teoria da aparência e o princípio da causalidade. RESPONSABILIDADE CIVIL. FATO DO SERVIÇO. TRATAMENTO DE "PLÁSTICA CAPILAR". UTILIZAÇÃO DE FORMOL. VEDAÇÃO PELA ANVISA. DANOS AOS CABELOS DA AUTORA. CONFIGURAÇÃO DO DEVER DE INDENIZAR. VALOR DA CONDENAÇÃO. Conjunto probatório dos autos que demonstra a ocorrência de evento danoso decorrente de fato de serviço, consubstanciado em tratamento capilar com o uso de formol - diferente do desejado pela consumidora e vedado pela ANVISA - deixando os cabelos da autora danificados, com aspecto ressecado, com fios quebradiços, perda de cabelo e diminuição de volume, necessitando de tratamento dermatológico para recuperar a qualidade dos cabelos. Configuração do dever de indenizar. Danos morais in re ipsa. Valor da indenização (R$ 5.000,00) mantido, de acordo com as peculiaridades do caso concreto, bem como observada a natureza jurídica da condenação e os princípios da proporcionalidade e razoabilidade. RECONVENÇÃO. OFENSAS VERBAIS. DISCUSSÃO MÚTUA ACERCA DO RESULTADO DO TRATAMENTO. AUSÊNCIA DE ILÍCITO E DE DANO. Mantida a improcedência do pedido reconvencional, uma vez que a discussão havida entre as partes foi mútua, decorrente do desacordo quanto ao resultado do tratamento capilar e da legítima pretensão da autora/reconvinda quanto à restituição do valor pago, restrita às partes via telefone, não se mostrando a divergência comercial capaz de violar os direitos da personalidade.
A decisão acima reforça o referido no artigo no sentido de responsabilização dos salões que fazem uso dos produtos em desacordo com as normas estabelecidas pela ANVISA e a obrigação dos mesmos em reparar os danos causados aos clientes quando da utilização inadequada do formaldeído.
Diante de todo o exposto, pode-se aferir então que, de fato, existe a responsabilidade civil quanto aos danos estéticos, em todas as suas formas, leve ou grave. A responsabilidade de indenizar é indiscutível, diante do caso concreto, de acordo com os apontamentos doutrinários trazidos.
A responsabilidade do salão é quanto à prestação do serviço que gera dano ao consumidor, quando o serviço possui vício que lesiona o consumidor de qualquer forma, este deve indenizá-lo. Diante disto, aquele profissional que no estabelecimento de beleza, aplica produto com quantidade superior de formaldeído, deve ser responsabilizado, pois, deveria saber, por desenvolver atividade específica e técnica da área, da lesividade do produto, obrigando-se perante o consumidor, nesta situação.
O fabricante também pode ser responsabilizado, pelo produto que é posto em circulação, que está em desacordo com as determinações legais. AA responsabilidade aumenta diante de propaganda enganosa, quando expõe que não possui a substância formaldeído, quando na verdade, ela está, não só inclusa na fórmula, mas também em quantidade superior àquela permitida.
Por fim, o dano requerido pelo cliente, polo hipossuficiente da relação de consumo, pode haver modalidades diferentes. O consumidor do serviço pode, requerer tanto a indenização por danos materiais, pelo valor gasto no tratamento que não obteve o resultado proposto quando da contratação do serviço; pode pedir danos morais, pois sofre transtornos inegáveis quando não obtém os resultados esperados e ainda sai lesado, que foi o ponto em análise neste artigo e ainda, cumulativamente, a indenização por dano estético, visto que é reconhecido, atualmente, como modalidade autônoma de dano, sendo ele justificado pela alteração física e visível no indivíduo que altera seu estado, em menor ou maior grau, para pior após receber um tratamento estético.
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[1] Professora da Faculdade Católica do Tocantins; Mestre em Direito pela Universidade de Marília; E-mail: [email protected]
Acadêmica do curso de Direito da Faculdade Católica do Tocantins.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: TEIXEIRA, Tamara Laíse Marques Filgueiras. Responsabilidade civil nos danos causados por procedimento estético capilares com aplicação de formol Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 18 maio 2017, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/50084/responsabilidade-civil-nos-danos-causados-por-procedimento-estetico-capilares-com-aplicacao-de-formol. Acesso em: 23 dez 2024.
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