RESUMO: O presente artigo objetiva estudar a possibilidade de inclusão da iniciativa popular como meio apto a dar início ao processo legislativo de emenda constitucional. Para tanto, parte-se, incialmente, de uma análise acerca da evolução dos conceitos de Constituição, Estado de Direito e democracia em nosso país. Pretende-se esclarecer, ainda, à luz da doutrina, a forma como os ideais de soberania popular e participação social se desenvolveram ao longo do tempo. Os referidos conceitos mostram-se essenciais à compreensão do presente tema, uma vez que a Constituição de 1988 consagrou a soberania popular como um dos seus principais fundamentos, e estabeleceu, além do plebiscito e referendo já existentes, inédito meio de participação do cidadão: a iniciativa popular de lei. Apesar de não haver previsão da iniciativa popular como meio legítimo a iniciar trâmite de emenda constitucional, a questão está longe de ser pacífica na doutrina e nos Tribunais Superiores, razão pela qual coteja-se, ainda, as opiniões divergentes a respeito do tema. De um lado, têm-se os que defendem a iniciativa popular como forma de fortalecimento da participação política dos cidadãos, e, de outro, os defensores da rigidez constitucional como instrumento hábil a manter a estabilidade política nacional. Para melhor compreensão do objeto de estudo, faz-se uma análise não apenas da Constituição da República, mas também da legislação federal pertinente ao tema, sempre em uma perspectiva crítica e atenta às implicações que eventuais mudanças constitucionais nesse sentido poderiam gerar.
Palavras-chave: democracia; rigidez constitucional; processo legislativo; emenda constitucional; iniciativa popular
SUMÁRIO: INTRODUÇÃO. CAPÍTULO 1) O Estado Democrático de Direito, Constitucionalismo e a base principiológica da Constituição Federal. 1.1) Constitucionalismo: Aspectos históricos e constitucionalismo no século XXI…. 1.2) Estado de Direito, Estado Social de Direito, Estado Democrático de Direito…. 1.2.1) Estado de Direito…. 1.2.2) Estado Social de Direito… 1.2.3) Estado Democrático de Direito…. 1.3) Democracia…. 1.3.1) Democracia representativa…. 1.3.2) Democracia direta…. 1.3.3) Democracia participativa…. 1.4) Os princípios de defesa e de reforma da Constituição……. 1.4.1) A supremacia constitucional e seus desdobramentos…. CAPÍTULO 2) A INICIATIVA POPULAR NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO.37 2.1) A iniciativa popular na Constituição Federal de 1988…. 2.2) A regulamentação da iniciativa popular pela Lei 9709/1998 2.3) A Proposta de Emenda Constitucional número 3 de 2011. CONCLUSÃO. BIBLIOGRAFIA.
INTRODUÇÃO
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB88) é fruto da evolução histórica e política de nosso país, representando um marco de rompimento com o modelo político-constitucional ditatorial anterior, iniciado com o Golpe Militar de 1964 e constitucionalizado, em um primeiro momento, na Constituição Federal de 1967 e, posteriormente, radicalizado através da emenda constitucional (EC) 1/69, considerada uma nova Constituição, diversa daquela, e ainda mais autoritária.[1]
Atendendo a essa necessidade de democratização das instituições e do ordenamento jurídico, a CRFB88 inovou em nossa tradição jurídica, dando um passo à frente da clássica ideia de democracia representativa simples, prevendo expressamente institutos de soberania popular, a ser exercida diretamente pelo povo, conforme consta do art. 1º, parágrafo único da CRFB/88.
A previsão de exercício de poder direto pela população caracteriza típica manifestação da democracia direta, expondo o caráter híbrido do modelo democrático inaugurado pela Constituição Federal de 1988, com previsão conjunta de institutos da Teoria Representativa e da Teoria Direta da democracia, o que levou muitos autores a defenderem que a nossa Lei Maior adotou um modelo semiparticipativo ou participativo, expressões que serão utilizadas como sinônimas neste estudo. Estas expressões podem ser conceituadas como “o regime democrático em que existe uma mescla entre a representação política e o exercício direto da soberania popular [2].
Em vistas a uma melhor compreensão acerca do tema, é necessário tecer alguns breves comentários a respeito da evolução constitucional pátria, abordando o longo caminho que foi feito para a consolidação da participação popular direta no âmbito constitucional.
Inicialmente, ressalte-se que o conceito de democracia direta é defendido neste artigo como a forma de participação direta dos cidadãos na formação de vontade do Estado, sem intermédio de representantes eleitos para este fim. Por sua vez, a contrário senso, a democracia representativa define-se como o modo de participação indireto dos cidadãos na formação da vontade do Estado, em que as aspirações da população são manifestadas por representantes eleitos para este fim.
A primeira Constituição brasileira a prever algum mecanismo de democracia direta foi a de 1937, outorgada e conhecida também como “Constituição Polaca”, que previu 4 hipóteses de plebiscitos em seu texto – nos artigos 5º, 63, 174 e 186[3]. A Carta de 1946, por sua vez, não obstante tenha sigo promulgada e surgida em um contexto democrático, previu apenas uma forma de plebiscito, em seu artigo 2ª[4]. A Constituição de 1967 e a EC 1/69, considerada pela maioria da doutrina uma nova Constituição, não estabeleceram nenhum mecanismo de democracia direta em seu texto.
Diante desse histórico das Constituições, que evidencia a timidez dos institutos de democracia direta em comparação aos de democracia representativa, no que tange aos meios de participação popular, é importante perceber os avanços advindos com a promulgação da chamada “Constituição Cidadã”, que, em seu artigo 14, trouxe três formas de participação direta da população, duas delas inéditas no contexto constitucional pátrio até então: referendo e iniciativa popular.
“Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante:
I - plebiscito;
II - referendo;
III - iniciativa popular.”
Com esses novos mecanismos, o legislador constituinte buscou dar um passo além da mera consulta prévia à população, característica que define os plebiscitos, instituindo o referendo – consulta posterior a aprovação de um ato normativo de interesse público já previamente escolhido pelo legislador, para que os representados decidam “sim” ou “não” – e a iniciativa popular, instituto objeto deste estudo e prevista no caput do artigo 61 da Constituição, que legitima os cidadãos a iniciarem o processo de tramitação de leis.
Todavia, mesmo com essa nova posição incorporada pelos instrumentos de democracia direta, a iniciativa popular só é unanimemente aceita para elaboração de leis. Quanto ao processo legislativo de tramitação de propostas de emenda à Constituição (PEC), a CRFB/88, em seu artigo 60, nada prevê a respeito da capacidade de apresentação destas por meio de iniciativa popular, elencando um rol bem mais restrito de legitimados, sendo estes: o Presidente da República, um terço dos membros da Câmara Federal ou um terço dos membros do Senado Federal e de mais da metade das Assembleias Legislativas das unidades da Federação, manifestando-se cada uma delas pela maioria relativa dos seus membros.
No que tange aos outros mecanismos de participação popular pela via direta, quais sejam, o referendo e o plebiscito, a CRFB/88 não os tem como necessários quando da aprovação de PEC.
Dentre esses mecanismos, a iniciativa popular, é conceituada como um instrumento da democracia direta com grande teor democrático, visto que amplia, para além das três esferas de poder usualmente legitimadas a dar início ao trâmite legislativo – seja de forma típica, como o Legislativo, ou atípica, no caso do Executivo e do Judiciário –, este poder. Amplia-o, portanto, ao conferir parcela deste diretamente ao próprio povo, que, quando mobilizado, pode levar a apreciação do Congresso Nacional projetos de seu interesse, sem necessidade de intermediação ou “apadrinhamento” por representantes eleitos.
Entretanto, a realidade muitas vezes mostra-se mais complexa e difícil do que as boas intenções do legislador poderiam prever. Apesar do princípio da soberania popular e dos já citados mecanismos de democracia direta, o Brasil continuou em um modelo majoritariamente representativo, com raríssimos plebiscitos, referendos e projetos de lei (PL) oriundos de iniciativa popular sendo vistos no dia a dia da nossa jovem democracia. A regra, infelizmente, não obstante as intenções do legislador constituinte originário, ainda é a baixa participação popular.
Percebe-se essa tendência à baixa participação na medida em que se constata que foram necessários 22 anos para que a primeira lei fruto de iniciativa popular fosse aprovada pelo Congresso Nacional.
Em 2010, foi aprovada a Lei Complementar nº 135, depois de recolher 1,6 milhões de assinaturas e ser entregue ao Congresso em 2009. Desde então, nos últimos quatro anos e meio, até meados de 2014, nenhum outro PL de iniciativa popular foi apresentado.
Assim, não obstante a ausência de efeitos práticos da referida previsão constitucional, muito em virtude das dificílimas exigências elencadas no artigo 61, §2º da CRFB/88, que serão vistas no decorrer desse estudo, existem algumas propostas de emenda à Constituição que visam ampliar o escopo da iniciativa popular. Nesse sentido, tem-se a PEC 3/2011, já aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal, que visa reduzir exigências e formalidades e estender essa possibilidade para a apresentação de PEC.
Diante de todas essas informações, deve ficar claro que se pretende, neste estudo, abordar alguns aspectos a respeito do instituto da iniciativa popular, com ênfase na sua aplicabilidade ao mecanismo de propostas de emenda. Abordar-se-á a situação atual do texto constitucional, com o intuito de esclarecer se a eventual ampliação do rol de legitimados para a propositura de PECs estaria em conformidade, ou não, com o sistema previsto pelo legislador constituinte originário.
Dessa forma, objetiva-se fornecer uma visão geral de aspectos relacionados ao tema da iniciativa popular e ao direito constitucional pertinentes. Não se furtando a posicionar-se criticamente frente à problemática envolvida e, com o intuito de contribuir para o fortalecimento institucional brasileiro, o presente trabalho intenta, ao final, demonstrar a incompatibilidade da iniciativa popular com o rígido processo de tramitação de PECs no Brasil.
1. O ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO, CONSTITUCIONALISMO E A BASE PRINCIPIOLÓGICA DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL
1.1. Constitucionalismo: Aspectos históricos e constitucionalismo no século XXI
O conceito de constitucionalismo, em sua forma básica, está diretamente ligado a limitação do poder e supremacia da lei. De acordo com este modelo de organização, o poder estatal está submetido ao império das leis e, como o nome sugere, a existência de uma Constituição. Ressalte-se, entretanto, que nem toda Constituição precisa ser escrita.[5]
Luís Roberto Barroso[6], aprofundando a matéria, em lição que conceitua as características do neoconstitucionalismo da forma como adotada por este estudo, leciona que:
“Em um Estado constitucional existem três ordens de limitação do poder. Em primeiro lugar, as limitações materiais: há valores básicos e direitos fundamentais que hão de ser sempre preservados, como a dignidade da pessoa humana, a justiça, a solidariedade e os direitos à liberdade de religião, de expressão, de associação. Em segundo lugar, há uma específica estrutura orgânica exigível: as funções de legislar, administrar e julgar devem ser atribuídas a órgãos distintos e independentes, mas que, ao mesmo tempo, se controlem reciprocamente (checks and balances). Por fim, órgãos do poder devem agir não apenas com fundamento na lei, mas também observando o devido processo legal, que congrega regras tanto de caráter procedimental (contraditório, ampla defesa, inviolabilidade do domicílio, vedação de provas obtidas por meio ilícitos) como de natureza substantiva (racionalidade, razoabilidade-proporcionalidade, inteligibilidade). Na maior parte dos Estados ocidentais instituíram-se, ainda, mecanismos de controle de constitucionalidade das leis e dos atos do Poder Público.”
Diante dessa exposição, vê-se que o neoconstitucionalismo assegura uma série de garantias aos cidadãos e limites ao Estado. Ressalte-se, entretanto, que nem sempre foi assim. Para atingir este patamar houve um longo caminho histórico, de enfrentamento de governos despóticos e autoritários.
Para uma melhor compreensão do quadro atual é necessário demonstrar, de forma breve, alguns aspectos mais destacados desta evolução, desde o embrião do conceito de constitucionalismo nas civilizações antigas, passando pela Idade Média, Idade Moderna, até chegar-se aos dias contemporâneos.
No caso das experiências das Idades Antiga e Média, invoca-se os casos das experiências da Grécia, na antiguidade, e Inglaterra, na Idade Média, como trazido em obra do Professor Nelson Saldanha.[7] Segundo o referido autor, em Atenas, teria ocorrido o surgimento da mais avançada forma de governo vista à época, um verdadeiro caso de democracia constitucional. Já no caso inglês, alguns séculos depois, são estabelecidos aspectos embrionários do constitucionalismo liberal que viria a seguir, o Professor Marcelo Novelino expõe que aspectos seriam estes:
“I) a supremacia do parlamento; II) a monarquia parlamentar; III) a responsabilidade parlamentar do governo; IV) a independência do Poder Judiciário; V) a carência de um sistema formal de direito administrativo; e VI) a importância das convenções constitucionais.[8]”
Com o advento do Estado Moderno e o ocaso do feudalismo, surge uma nova fase do constitucionalismo. Na seara desta classificação, utilizar-se a divisão adotada por Paolo Biscaretti di Ruffia[9], que divide os períodos do constitucionalismo entre clássicas, aquele compreendido como o período entre as revoluções liberais e o fim da Primeira Guerra Mundial, e modernas, que tiverem o seu auge no período entre guerras.
O constitucionalismo clássico, também chamado de constitucionalismo liberal, surge pela influência direta da Revolução Francesa e da Independência Americana.
Como grande exemplo deste período têm-se a Constituição dos Estados Unidos da América de 1787, que trouxe inúmeras inovações, como ter sido a primeira constituição escrita do mundo moderno. A respeito desta, o Ministro Luís Roberto Barroso[10] afirma, em excelente lição:
“passou a ser um marco do tríplice conteúdo da Revolução americana, quais sejam: a) a independência das colônias; b) superação do modelo monárquico; c) implantação de um governo constitucional, fundado na separação de poderes, na igualdade e na supremacia da lei (rule of law).”
Outra inovação da experiência norte-americana foi adotar um modelo federalista de fato, com uma divisão relevante de competências legislativas e organizatórias entre os entes federados e uma separação entre os poderes constituídos, com a divisão equilibrada e equânime entre Executivo, Legislativo e Judiciário, conforme preceituado por Montesquieu.
Chega-se, posteriormente, ao constitucionalismo moderno, cuja grande marca são as Constituições Sociais. Nestas, as questões existenciais passam a ser absorvidas pelo Estado, que vê-se instado a promover o bem-estar social, através de medidas ativas e positivas, marcando um rompimento com a função meramente negativa típica do Estado Liberal. O Estado torna-se um prestador de serviços. [11] A Constituição de Weimar no pós-primeira guerra é o principal exemplo histórico dessa época.
Por fim, finda a Segunda Guerra, surgem os primeiros conceitos de neoconstitucionalismo. Este abrange tanto as Constituições de bem-estar social da Europa do pós-guerra, quanto Constituições analíticas, formadas por extensa gama de direitos positivos ao lado da presença de direitos clássico negativos, caso das Constituições da Índia e até a CRFB/88. O neoconstitucionalismo traz os valores morais de volta ao direito, visando evitar atrocidades dentro da Lei, como ocorreu com o nazi-facismo sob o manto do positivismo puro. No tópico destinado ao conceito de Estado de Direito, retorna-se este tema.
Uma conceituação única do neoconstitucionalismo moderno é tarefa inglória, de forma que o Ministro Barroso, trata esta como uma das grandes missões do constitucionalismo contemporâneo, conforme se depreende do excerto:
“ao final da primeira década do século XXI, ainda se debate com as complexidades da conciliação entre a soberania popular e os direitos fundamentais. Entre governo da maioria e vida digna e em liberdade para todos, em um ambiente de justiça, pluralismo e diversidade. Esse continua a ser, ainda, um bom projeto para o milênio.[12]”
Dessa forma, retorna-se ao conceito apresentado no início do capítulo, afirmando que o neoconstitucionalismo é definido neste estudo como a união entre a submissão do poder estatal às leis e a supremacia da constituição, que passa a irradiar princípios sobre todos os campos do direito. Um constitucionalismo moderno é, portanto, o modelo dos Estados que buscam efetivar a dignidade humana, o pluralismo e a diversidade.
O respeito a diversidade e o pluralismo exigem o respeito as minorias étnicas, política, entre outras, de forma que a democracia entendida simplesmente como a vontade da maioria pode chocar-se com estes valores. O neoconstitucionalismo deve buscar respostas ao choque entre os desejos da maioria e direitos das minorias.
Os instrumentos de democracia direta, como é o caso da iniciativa popular, até pela exigência intrínseca de participação de uma grande quantidade de cidadãos, são apoiados na noção de democracia como expressão da vontade majoritária. Diante da nova realidade constitucional, que preconiza de ausência de direitos absolutos, podem ser relativizados para conviver com o núcleo essencial da Constituição.
1.2) Estado de Direito, Estado Social de Direito, Estado Democrático de Direito
1.2.1) O Estado de Direito
O conceito de Estado de Direito é amplíssimo, possuindo definições que variam de acordo com quem se propõe a conceituar o tema. Dessa forma, o que se busca, portanto, é a melhor definição técnica possível. Com esse objetivo explicitado, invoca-se a lição de Roberto Lyra Neto, em passagem narrada por Gilmar Mendes, que definiu Estado de Direito como “aquele Estado que tem limites e fundamentos definidos pelo direito”[13].
Essa definição, por óbvio, não engloba todas as características do Estado de Direito e nem a sua relação ou não com a democracia. Afinal, a própria experiência pátria mostrou que o Regime de Exceção que vigorou durante 20 anos no Brasil tentou apresentar-se como legitimado através de instrumentos legais, caso dos famigerados Atos Institucionais.
Quanto as suas origens, conceito de Estado de Direito surge “no campo do direito administrativo, onde designa uma ordem de relações entre a lei, a administração e o indivíduo, e significa a máxima justiciabilidade possível dos atos da administração”.[14] Em virtude deste início, resta nítida a função negativa do Estado de Direito, que objetivava ser uma defesa do particular em face do Leviatã estatal.
Com o tempo, a noção de Estado de Direito foi sendo ampliada, até adentrar ao direito constitucional, aonde atingiu o ponto de “se converter em sinal de legitimidade de todo sistema jurídico, inicialmente apenas do ponto de vista formal, mas, depois, ao término do processo, também do ângulo material.”[15]
O avanço do Estado de Direito, corroborado pelas passagens citadas, alimentou-se mutuamente da consolidação do constitucionalismo liberal. Os burgueses que ascendiam não aceitavam mais a manutenção de privilégios feudais aos nobres e buscaram, através da defesa do direito positivo e da noção igualdade formal, o controle e limitação da atuação do Estado – que deveria ser neutra em relação aos Administrados.[16]
Atentando para os caminhos que levaram o Estado de Direito a sua posição proeminente, Gilmar Mendes entende que o Estado de Direito deve seguir, pelos menos as seguintes exigências fundamentais para ser caracterizado:
“a) império da lei, lei como expressão da vontade geral;
b) divisão de poderes: legislativo, executivo e judicial
c) legalidade da administração: atuação segundo a lei, com suficiente controle judicial; e
d) direitos e liberdades fundamentais: garantia jurídico-formal e efetiva realização material[17]”
Essas aspectos se estabeleceram surgiram durante a evolução, que abrangeu desde o início como meio de resistência burguesa ante o Estado absolutista, passando pela concepção social até atual concepção democrática de constitucionalização do direito, do Estado de Direito, que cada vez mais, como visto, se confunde com o ideal de democracia.
1.2.2) Estado Social de Direito
A mudança para o chamado Estado Social, sem alongar-se no tema já tratado no tópico dedicado a história do constitucionalismo, surgiu em decorrência da natural concentração de renda que o capitalismo provoca. O Estado liberal-burguês trouxe uma concentração de renda enorme, gerando grande tensão social. Essa situação passou a exigir do Estado uma atuação muito mais incisiva para resolução dos conflitos e manutenção da paz. Dessa forma, a clássica postura meramente negativa e respeitadora das liberdades públicas se mostra insuficiente para atender aos anseios da população.
A atuação de pacificação social busca fornecer mais serviços públicos, assegurando um mínimo a toda a população. Os direitos básicos, tais quais saúde, educação e segurança são reconhecidos como devidos pelo Estado em favor dos administrados. O conceito de “império da lei” sozinho, não é mais suficiente. O Professor Bonavides, assim define o Estado Social de Direito:
“O Estado Social, por sua pro?pria natureza, e? um Estado intervencionista, que requer sempre a presenc?a militante do poder poli?tico nas esferas sociais, onde cresceu a depende?ncia do indivi?duo, pela impossibilidade em que este se acha, perante fatores alheios a sua vontade, de prover certas necessidades existenciais mi?nimas.[18]”
Se o Estado liberal foi produto das revoluções burguesas, o Estado social, por sua vez, teve como maiores expoentes a Revolução Russa de 1917, cujo ator principal foi o proletariado, e a chamada Revolução Mexicana de 1910, que não instaurou um regime socialista da mesma forma que a russa, mas obrigou o governo a assegurar mais direitos aos trabalhadores. Posteriormente, em 1919, surgiu a Constituição de Weimar, que tornou-se, como já explicado, o símbolo do período do Estado Social.
No Brasil, a primeira Constituição a adotar o modelo social foi a de 1934, o que é muito bem explicado por Anna Cândida da Cunha Ferraz:
“Mantendo, embora, o regime republicano federativo e o sistema presidencialista de governo, incorpora inúmeras inovações, algumas dissonantes de ambos, e alinhava o texto constitucional no constitucionalismo moderno, na linha das constituições mais avançadas da época, sinalizando a introdução de um novo tipo de Estado Brasileiro: o Estado Social, apto a responder aos reclamos do momento histórico em que foi elaborada.[19]”
Esse modelo também não foi imune a problemas. Apesar de ter resistido a Segunda Guerra Mundial, as dificuldades de sua manutenção devido as crises econômicas dificultaram a sua continuidade.
Felizmente, as conquistas adquiridas foram mantidas, e, atualmente, a maioria dos Estados preveem deveres referentes a necessidade de assegurar o mínimo existencial aos seus cidadãos, com a importância cada vez maior da dignidade dos seres humanos. A busca se torna por um ponto de equilíbrio entre os Estados Liberais e Sociais.
Os horrores da 2ª Grande Guerra demonstraram que apenas o império das leis e o direito entendido como ciência totalmente independente da moral (positivismo) não foram suficientes para evitar que as maiores injustiças ou atrocidades fossem cometidas sob o seu manto. O nazismo e o fascismo, que assolaram e abriram chagas terríveis na Europa na primeira metade do século XX, estavam de acordo com as leis e o devido processo legislativo do período, de forma que autores renomados [20], entendem que:
“a decadência do positivismo é emblematicamente associada à derrota do fascismo na Itália e do Nazismo na Alemanha. Esses movimentos políticos e militares ascenderam ao poder dentro do quadro de legalidade vigente e promoveram a barbárie em nome da lei.”
1.2.3) Estado Democrático de Direito
Ao final da Segunda Guerra, portanto, era necessário o surgimento de uma nova concepção de Estado de Direito. Esta necessidade foi atendida pela noção do neoconstitucionalismo, de valorização de princípios abstratos que devem guiar o legislador e a própria atuação da Administração Pública. O neoconstitucionalismo é relacionado com o Estado Democrático de Direito.
A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 1º, caput, utilizou a expressão “Estado Democrático de Direito”. Uma parcela de autores, como Luís Roberto Barroso, preferem a expressão “Estado Constitucional de Direito”, entretanto, até por reverência ao texto adotado pelo legislador constituinte, adota-se, neste estudo, a nomenclatura utilizada pela Constituição.
É mister ressaltar que alguns doutrinadores de renome, como o Professor Nagib Slaibi Filho, consideram a Constituição redundante ao usar a expressão “Estado Democrático de Direito”, pois, nas palavras do referido autor, “A Constituição é, talvez, redundante no emprego da expressão ‘Estado Democrático de Direito’, porque já estão indissociáveis as ideias de prévia regulamentação legal e democracia.”[21]
Discorda-se desta ideia, pois, como visto, o conceito de Estado de Direito é bem mais restrito que o Estado Democrático de Direito. Em nome da lei, inúmeras barbaridades foram praticadas e, pior, referendadas pelo positivismo. No Tribunal de Nuremberg a defesa dos agentes nazistas tentou justificar o genocídio de judeus a partir da alegação de “estrito cumprimento do dever legal”. O pior é que era um fato que estes agentes estavam apenas cumprindo as suas funções previstas em lei. Todavia, não era possível aceitar que tantos crimes ficassem impunes, sendo o resultado do julgamento dos crimes da 2ª Guerra um dos primeiros exemplos de superação do positivismo puro.
O conceito democrático ou constitucional dentro do de Estado de Direito, portanto, é fundamental para o colocar em um novo grau civilizatório, de respeito e submissão, inclusive da lei, a dignidade da pessoa humana.
O Ministro Alexandre de Moraes, leciona muito bem a respeito da questão, ao afirmar, que: “O Estado Constitucional, portanto, é mais do que o Estado de Direito, é também o Estado Democrático, introduzido no constitucionalismo como garantia de legitimação e limitação do poder.” [22]
O mesmo autor, em excelente lição, traça em linhas gerais o significado do Estado Democrático de Direito, assim o definindo:
“O Estado Democrático de Direito, caracterizador do Estado Constitucional, significa que o Estado se reger por normas democráticas, com eleições livres, periódicas e pelo povo, bem como o respeito das autoridades públicas aos direitos e garantias fundamentais, é proclamado, por exemplo, no caput do artigo 1º da Constituição da República Federativa do Brasil, que adotou igualmente em seu parágrafo único, o denominado princípio democrático ao afirmar que ‘todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição’ para mais adiante, em seu art. 14, proclamar que ‘a soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante: I – plebiscito; II – referendo; III – iniciativa popular’” [23]”
Diante disso, o princípio democrático busca evitar que tiranias ou governos autoritários venham a ser legitimados pelo ordenamento jurídico. A própria ordem principiológica-axiológica celebrada em constituições como a CRFB/88 ou a Lei Fundamental Alemã de 1949 não podem conviver com regimes racistas, autoritários ou preconceituosos, sem desvirtuar toda a sua base e romper com o conteúdo do seu núcleo.
A moderna noção de Estado Democrático de Direito tem como escopo da defesa do ser humano como um fim em si mesmo. Adota-se a moral kantiana de que “objetos têm preço, pessoas têm dignidade”. Ao lado do reconhecimento da dignidade, é reconhecido o direito de participação. Os seres humanos devem ser ouvidos pelo Estado e autorizados a participar da Administração.
Nesse ponto de evolução das noções de constitucionalismo e do Estado de Direito, agora transmutado em Estado Democrático de Direito, vê-se que o conceito tradicional de democracia representativa deixa de reinar de forma absoluta e passa a conviver, cada vez mais, com a chamada democracia semidireta ou participativa.
A iniciativa popular é um bom exemplo de como a nova realidade do Estado e da Constituição busca celebrar o princípio da soberania popular e a superação da democracia representativa por um modelo misto, informado pelos princípios democráticos da CRFB/88. Em face dessa nova situação, faz-se necessário abordar algumas questões, como a convivência entre a vontade popular e a novo constitucionalismo, ponto em que retorna-se ao dilema de tratado por Luís Roberto Barroso sobre a nova missão do constitucionalismo do século XXI.
Antes, porém, de abordar a questão da coexistência entre a soberania popular, as noções de Estado democrático em que a iniciativa popular foi inserida e as prováveis colisões destes com os princípios da rigidez e da supremacia constitucional, é necessário tecer algumas considerações a respeito do que entende-se como democracia, democracia representativa e democracia participativa ou semidireta.
1.3) Democracia
A democracia já foi conceituada das mais variadas formas pelas mais diversas ciências, possuindo definições sociológicas, filosóficas e jurídicas. A clássica definição de Abraham Lincoln, é novamente trazida a tona por JJ Gomes Canotilho, afirmado ser a democracia o “governo do povo, pelo povo, para o povo”.[24] Também pode-se definir a democracia como “uma associação política, isto é, um dos modos pelos quais as pessoas se relacionam, unindo seus esforços no sentido de conseguir os bens de vida que sua individualidade exige.[25]”
José Duarte Neto, informa que tradicionalmente três regimes foram ditos como democráticos:
“Temos que, historicamente, três regimes constitucionais oram tidos como democráticos:
a) democrático direto: o povo, por ele mesmo, dirige o negócio público, existindo identidade entre o titular do poder político e aquele encarregado de exercê-lo;
b) democrático indireto ou representativo: no qual as decisões fundamentais do Estado são tomadas por mandatários que, periodicamente, são nomeados para o exercício desse mister;
c) democrático participativo: aliado a uma base decisória representativa ou indireta, institutos que permitem a intervenção direta e eventual do povo nos negócios públicos são admitidos.[26]
1.3.1) Democracia Representativa
A definição tradicional de democracia é bastante vinculada a ideia da democracia representativa, cuja definição é no sentido de o povo exercer o poder por intermédio de representantes eleitos para atuar em seu nome. Nesse contexto, a participação popular e a influência nos governantes acaba por se resumir ao momento do voto e não no dia a dia da administração pública.
Durante muito tempo, sob a égide do Estado Liberal, foi a forma preponderante de democracia. José Afonso da Silva trata da vinculação entre a ideia de democracia representativa e o Estado liberal, conforme pode-se extrair das suas palavras abaixo:
O regime representativo, no Estado Burgue?s, procura resolver o conflito de interesses sociais por deciso?es da maioria parlamentar. Maioria que nem sempre exprime a representac?a?o da maioria do povo, porque o sistema eleitoral opo?e grandes obsta?culos a parcela pondera?vel da populac?a?o, quanto ao direito de voto, para a composic?a?o das Ca?maras Legislativas. Dai? decorre que a legislac?a?o nem sempre reflete aquilo a que a maioria do povo aspira, mas, ao contra?rio, em grande parte, busca sustentar os interesses da classe que domina o poder e que, a?s vezes, esta? em contraste com os interesses da Nac?a?o. As classes dirigentes, embora constituindo concretamente uma minoria, conseguem, pelo sistema eleitoral, impedir a representac?a?o, nos Parlamentos, da maioria do povo, raza?o por que, fazendo a maioria parlamentar, obte?m uma legislac?a?o favora?vel.[27]
A democracia representativa pura, portanto, não obstante a profunda evolução que representou frente ao Estado absolutista da Idade Moderna, não é suficiente, sozinha, para representar os anseios populares, ainda mais em um país cujo sistema política se encontra em uma situação de descrédito perante boa parte da população e em que a influência do capital nas eleições é enorme. Todavia, não pense ser exclusividade do Brasil o problema de representatividade da democracia representativa, nesse sentido Duarte Neto:
A total dissonância entre o titular da soberania e o encarregado de exercê-la, permitida pela figura do mandado político representativo, e presente ainda em dias atuais, é causa da nunca debelada crise de legitimidade do modelo de democracia indireta. Sobre ele detiveram-se não poucos autores, na tentativa de esclarecê-lo, justificá-lo e superá-lo em instituições factíveis.[28]
A democracia representativa foi adotada pela Constituição Federal de 1988 em seu preâmbulo (“ Nós, representantes do povo brasileiro”), no parágrafo único do artigo primeiro (“Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos, ou…”), entre diversos outros dispositivos neste sentido.
1.3.2) Democracia direta
Outro modelo de democracia é a democracia direta, ou pura, que se encontra em desuso há muito tempo e não é preponderante em nenhum país do mundo (alguns países como a Suíça tem tradição nessa área, mas mesmo nela e em outros países de tradição plebiscitária, há convivência conjunta da democracia direta com a democracia representativa).
O grande exemplo de democracia direta citado na doutrina foi o da democracia ateniense, em que os cidadãos se reuniam em assembleias e nas praças para deliberar a respeito de decisões de interesse da comunidade. A grande dificuldade prática é de que maneira seria possível reunir a população dos enormes países existentes na atualidade, com grandes contingentes populacionais e sufrágio universal estabelecido, para que fosse possível tomar decisões de forma direta.
1.3.3) Democracia Participativa
A democracia mista, participativa, ou semidireta, por sua vez, é pode ser definida como a mistura dos dois modelos anteriores, Nagib Slaibi Filho, a define como “reservando-se ao o povo, por previsão na Constituição e nas leis, para decidir as questões que repute mais importantes e deixando as outras questões para os representantes por ele escolhidos”.
Neste estudo utilizar-se-á a nomenclatura democracia participativa, pois, conforme ensina José Duarte Neto:
“Na realidade, os instrumentos referidos sa?o caracterizados pela atuac?a?o conjunta e cooperativa dos mandantes e dos mandata?rios, e na?o por uma atuac?a?o dos primeiros independentemente dos u?ltimos. Precisamente por isso preferimos apenas a utilizac?a?o do termo democracia participativa, dado o fato que melhor expressa a coexiste?ncia de norma(s) prevendo o uso de instrumento(s) de atuac?a?o conjugada (= mandante e mandata?rios), direta (= mandantes) e indireta (= mandata?rios agindo em nome de mandantes) num mesmo ordenamento juri?dico.[29]”
A democracia participativa, portanto, foi o modelo adotado pela nossa Constituição Federal, tendo em vista que o já citado parágrafo único do artigo primeiro afirma: “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.” (grifo nosso)
O modelo participativo impõe uma participação efetiva do povo não apenas no sentido formal, de cada pessoa um voto. O escopo participativo se manifesta também pela possibilidade de estar inserido na rotina administrativa, de poder fiscalizar a Administração Pública, de cobrar e opinar a respeito da atuação dos governantes.
A respeito da importância da participação para fortalecimento da democracia, o sempre preciso magistério de Paulo Bonavides ensina:
“Na?o ha? democracia sem participac?a?o. De sorte que a participac?a?o aponta para as forc?as sociais que vitalizam a democracia e lhe assinam o grau de efica?cia e legitimidade no quadro social das relac?o?es de poder, bem como a extensa?o e abrange?ncia desse feno?meno poli?tico numa sociedade repartida em classes ou em distintas esferas e categorias de interesses.[30]”
A importância da participação popular está presente em inúmeros dispositivos da Constituição Federal, do qual pretendemos destacar, novamente, o artigo 14, que estabelece, além do voto direto, universal e secreto, a possibilidade de plebiscito, referendo e iniciativa popular. Todos típicos instrumentos desta modalidade de democracia.
A título de exemplo da opção pela democracia participativa, pode-se elencar: os remédios jurídicos processuais como ação popular, ação civil pública, mandado de segurança coletivo; a participação de trabalhadores e empregadores nos colegiados dos órgãos públicos; cooperação das associações representativas no planejamento municipal; ação popular penal em crimes de responsabilidade, entre inúmeros outros.
O Professor Luigi Bonizzato também trata do tema de participação democrática, ao analisar o artigo 14 da CRFB/88, leciona:
“Os três incisos [do artigo 14], de forma mais ou menos intensa, versam sobre formas de participação predominantemente entendidas como semidiretas da população na criação de direitos e obrigações no país. Ergue-se a participação popular senão a princípio, como já exposto, a um objetivo límpido, a uma característica patente da democracia brasileira, enfim, até mesmo, a um explícito princípio de natureza constitucional. [31]”
Por todo o exposto, resta evidente a força que a Constituição Federal conferiu aos instrumentos de participação direta da população na rotina do Poder Político, explicitando a adoção da democracia participativa. Dessa forma, muito bem faz o Professor Nagib Slaibi Filho, ao explicar, na mesma linha trazida por Bonizzato, que a legislação infraconstitucional também pode ampliar as formas de participação popular. Diz o autor:
Pergunta-se se somente a Constituição pode criar mecanismos de participação direta do povo no exercício do poder, em face da restrição aparente que se encontra no parágrafo único do artigo 1º - a resposta positiva seria absurda, e teria a consequência de se considerar inconstitucionais todos os mecanismos de democracia a serem exercidos diretamente pelo titular do poder. O próprio caput do artigo dispõe que é fundamento da atuação do Estado o respeito à soberania (evidentemente do titular do poder) e a cidadania.[32]
Diante disto, não resta dúvidas sobre a constituição ter adotado a democracia participativa, com instrumentos representativos e diretos em igualdade. Também é evidente que soberania popular não esgota-se nos mecanismos previstos no texto constitucional, podendo ser ampliada pelo legislador infraconstitucional desde que respeitando, evidentemente, os demais princípios constitucionais.
É válido também ressaltar que a soberania popular não é um princípio absoluto, e deve conviver com outros valores constitucionais, tais quais a segurança jurídica, a rigidez constitucional e a supremacia da constituição. Diferentemente do que apregoa Nagib Slaibi Filho[33], não há hierarquia entre os mecanismos de democracia direta e representativa e sim coexistência harmônica, nos termos da Constituição.
1.4) Os princípios de defesa e de reforma da Constituição
Como já exaustivamente visto neste estudo, a evolução do constitucionalismo e a influência dos princípios constitucionais ganhou muita força e relevo a partir da concepção neoconstitucionalista do direito.
Diante da crescente importância dos princípios em face das regras, é necessário diferenciar os conceitos de princípios e regras, tema sobre o qual Robert Alexy é leitura obrigatória:
“O ponto decisivo para a distinção entre regras e princípios é que os princípios são normas que ordenam que algo seja realizado na melhor medida possível, dentro das possibilidades jurídicas e reais existentes. Portanto, os princípios são mandados de otimização, que estão caracterizados pelo fato que podem ser cumpridos em diferentes graus e que a medida de seu cumprimento depende não só das possibilidades reais mas também das jurídicas. O âmbito das possibilidades jurídicas é determinado pelos princípios e regras opostos.
De outro lado, as regras são normas que só podem ser cumpridas ou não. Se uma regra é válida, então deve fazer-se o que ela exige, nem mais nem menos. Portanto, as regras contém determinações no âmbito do fática e juridicamente possível. Isto significa que a diferença entre regras e princípios é qualitativa e não de grau. Toda norma ou é uma regra ou é um princípio.[34]”
Estabelecido o conceito de princípio e a sua diferença em relação as regras, sem pretender esgotar o assunto, mas visando não desviar-se do objetivo aqui proposto, cumpre destacar os princípios fundamentais no que tange a estrutura da Constituição e a sua reforma.
Dentre estes princípios, merece destaque o princípio da supremacia da Constituição, de cujo conceito precisa-se ter nitidez para entender a problemática da sua relação com a soberania popular e a possibilidade de alteração no rol de legitimados para apresentar PEC.
1.4.1) A supremacia constitucional e seus desdobramentos
A Constituição Federal de 1988, fruto da redemocratização do Brasil, possui um complexo sistema que visa resguardar o seu núcleo essencial e a sua feição democrática e cidadã. Esta preocupação é válida pois a CRFB/88 está no topo do ordenamento jurídico pátrio, possuindo predominância sobre todas as demais normas do sistema jurídico.
Em suma, pode-se falar que a supremacia da Constituição é a especial característica que lhe confere predominância sobre as demais normas jurídicas, subordinando-as aos seus comandos. São decorrência deste princípio da supremacia alguns outros princípios, como: o princípio da unidade, em que todas as normas da legislação infraconstitucional devem ser adequadas e interpretadas à luz da Constituição e não o contrário; o princípio do controle de constitucionalidade, consistente na possibilidade do judiciário controlar os atos normativos no que tange a sua compatibilidade com a Constituição; o princípio da razoabilidade, cuja diretriz é que a legislação infraconstitucional deve devem ser meios razoáveis para concretização dos fins previstos em sede constitucional; o princípio da rigidez constitucional, sendo este o princípio em se distingue o processo de elaboração de normas constitucionais das normas infraconstitucionais, de forma a conferir a supremacia à Constituição; distinção entre poder constituinte e derivado; gradação do ordenamento jurídico e a garantia do Estado de Direito. [35]
Dessa forma, observa-se que a Supremacia Constitucional é um corolário do direito constitucional moderno, posto que a Constituição é a base de todo o ordenamento jurídico pátrio e do constitucionalismo do Estado Democrático de Direito. Dentre os princípios listado há pouco, que são extraídos da Supremacia, é fundamental estabelecer um conceito claro e aprofundar o estudo dos subprincípios da rigidez constitucional e da unidade constitucional.
Do sistema de alteração de suas próprias normas, ou seja, de reforma constitucional, presente no artigo 60, é que extrai-se a noção de que a Constituição Federal brasileira é do tipo rígida, cuja definição pode ser dada como “aquelas que exigem procedimento legislativo especial e complexo para modificação do seu texto”[36]. O Ministro Gilmar Ferreira Mendes aprofunda a análise das Constituições rígidas da seguinte maneira:
“Rígidas são as constituições que somente são alteráveis por meio de procedimentos especiais, mais complexos e difíceis do que aqueles próprios à atividade comum do Poder Legislativo. A Constituição flexível, de seu lado, equipara-se, no que tange ao rito de sua reforma, às leis comuns.”[37]
Pela leitura do artigo 60 da CRFB/88 não resta dúvida de que se trata de um procedimento muito mais rígido do que o previsto no artigo 59 e seguintes da Carta Magna, que se referem ao processo legislativo infraconstitucional. Essas maiores exigências, junto da amplitude das cláusulas pétreas consagradas no artigo 60, §4º, fizeram com que autores, cujo exemplo cita-se novamente o Ministro Alexandre de Moraes, considerassem a Constituição de 1988 como super-rígidas, uma vez que a CRFB só pode ser alterada por um processo legislativo diferenciado (o que caracteriza a rigidez), mas, de forma excepcional, em alguns pontos é imutável – a soma dessas duas características conferiria, na visão de Moraes, um caráter super-rígido a Lei Maior[38].
Todavia, esta classificação mais restritiva não recebeu uma grande acolhida em sede doutrinária, prevalecendo a posição de que a Constituição se classifica apenas como rígida.
A rigidez constitucional é importante, pois o processo mais dificultoso de emenda à Constituição é “uma garantia sua, um arranjo, que visa proteger os mandamentos constitucionais. Ora, o hábito, a prática de alterar rotineiramente a Constituição pode denotar investidas contrárias a plataforma constitucional”.[39]
A rigidez constitucional, portanto, visa resguardar a substância do texto, manter os valores axiológicos que ali foram celebrados. Fábio de Oliveira, em artigo presente na Obra “Neoconstitucionalismo”, aborda brilhantemente o tema:
Além de um procedimento mais complicado, solene, é traço da rigidez a vedação de revisar certas normas, que são retiradas do lastro reformista. São aqueles dispositivos que compõem a alma da Constituição, que não podem ser mudados, sob pena de desnaturar, descaracterizar a Lei maior, a qual, desta feita, já não seria mais a mesma e sim uma nova Constituição. São as cláusulas pétreas. E, como, se sabe, em concordância com esse modelo, o Poder Constituinte Derivado não é legitimado para criar uma outra Constituição. Tal ação cabe ao Poder Constituinte Originário, à Assembleia Nacional Constituinte.[40]
O procedimento de alteração da Constituição, no que, obviamente, se inclui também a iniciativa de proposta de reforma, é para grande parte da doutrina, também uma garantia da rigidez e da Supremacia da Constituição. O procedimento de reforma constitucional, engloba também a questão do órgão incumbido de iniciar a reforma e os requisitos exigidos pela Constituição para isto, bem como se são iguais ou diferentes do exigido para a criação de leis ordinárias – no Brasil, como já visto, o procedimento é diferente, mais rigoroso, tornando a CRFB/88 rígida desde a questão da iniciativa, até o quórum de aprovação.
Nesse sentido, invoca-se novamente Paulo Bonavides, que leciona a respeito da ligação entre rigidez constitucional e a dificuldade para alteração do texto da Constituição:
“A questão da iniciativa constitucional guarda íntimas conexões com o problema da imutabilidade das Constituições. Com efeito, os sistemas políticos mais propensos à tese de elaborar Constituições que, sem tropeço, se amoldem a realidades novas, imprevistas, dinâmicas, movediças, em geral se furtam ao estabelecimento de prescrições demasiado rígidas com respeito à iniciativa da reforma, que eles fazem por conseguinte mais aberta e, menos restrita, de fácil emprego ou utilização.
(…)
A iniciativa restrita, limitada ou reservada, ordinariamente inclina o sistema a rigidez, conferindo uma posição de preponderância ou privilégio ao órgão incumbido de propor ou movimentar a reforma.[41]”
Diante desta lição de Paulo Bonavides, torna-se claro que a opção do legislador constituinte originário foi de fazer a Constituição ser rígida, como o objetivo de proteger o seu sentido originário e, nessa mesma linha, a proteção do próprio sistema de reforma do seu texto é uma cláusula pétrea implícita, sendo inadequada e equivocada a ideia de possibilidade de dupla revisão do texto constitucional. [42]
A dupla revisão é definida pela defesa de que seria possível alterar o artigo 60 da CRFB/88, de forma a permitir-se a posterior alteração das limitações que constavam neste dispositivo, que abriga os aspectos imutáveis da Lei maior. Em suma, a dupla revisão seria um caminho mais longo para conseguir-se a reforma do texto constitucional, inclusive das cláusulas pétreas. Caso fosse aceita essa teoria, estas cláusulas de imutabilidade poderiam ser superadas, o que não se compatibiliza com o espírito da totalidade da Constituição.
Ao lado do princípio da rigidez constitucional e também ligado a ideia da Supremacia da Constituição, surge o princípio da unidade da Constituição. Este princípio consiste na defesa de que, conforme ensina Nagib Slaibi Filho:
“as normas inferiores devem adequar-se as normas contidas na Constituição, havendo-se todo o conjunto normativo ou o ordenamento de um país como uma unidade jurídico de um país com uma só unidade normativa, em que todas as normas jurídicas, decorrentes ou não da função legislativa do Estado, mas por este aceitas são consideradas como uma unidade[43]”
O princípio da unidade, portanto, exige ao intérprete uma leitura sistemática do sistema jurídico e, como pretende-se especificar, das normas constitucionais.
É importante ressaltar que não existe hierarquia entre normas constitucionais e não existem verdadeiras antinomias entre os princípios e normas presentes na Constituição, de forma que estes conflitos sempre serão aparentes. O princípio da unidade impõe ao intérprete a obtenção de um resultado interpretativo que harmonize os princípios e normas dentro do sistema constitucional. Pela unidade, desta feita, é mister a compreensão de toda a Constituição, sendo erro grosseiro interpretar um dispositivo ou princípio isoladamente.[44]
Em virtude de todo o exposto, Motta e Barchet resumem e completam o conceito de Unidade da Constituição, afirmando:
“O princípio da unidade da Constituição impõe uma interpretação sistemática da Constituição, que negue a possibilidade de verdadeiras contradições (as contradições jurídicas) entre seus dispositivos, a partir da compreensão de que eles compõem um todo unitário (a Constituição), ostentando idêntico status hierárquico.[45]”
2. A INICIATIVA POPULAR NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO
A análise do instituto da iniciativa popular no ordenamento jurídico pátrio necessita da observação do direito positivo nacional, em especial de suas manifestações na Constituição Federal e no plano infraconstitucional, em que o tema é regulamentado pela Lei 9709/98 em seus artigos 13 e 14, que irá ser analisado no decorrer deste capítulo.
Por fim, trabalhar-se-á com a Proposta de Emenda Constitucional número 3 de 2011, que visa acrescentar a alínea “D” no artigo 60 da CRFB/88, de forma a constar a iniciativa popular no rol dos legitimados para a propositura de emenda constitucional, entre outras mudanças no instituto, quem caso aprovada, irá alterar substancialmente a iniciativa popular em relação à regulação atual.
2.1) A iniciativa popular na Constituição Federal de 1988
A questão da iniciativa popular no texto da Constituição Federal de 1988, já foi tratada em algumas passagens deste estudo, como na sua relação com a ideia de democracia e soberania popular, bem como na análise da restrição de legitimados para propositura de PEC e a rigidez constitucional. Todavia, faz-se mister trazer novamente os dispositivos que regulam o tema para uma melhor compreensão.
O artigo 14 traz a iniciativa popular como meio de exercício da soberania popular.
Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante:
(…)
III - iniciativa popular.
O artigo 61, §2º da CRFB/88, por sua vez, faz uma discreta regulamentação de como se procederá esta iniciativa popular, trazendo o número mínimo de assinaturas exigidas, a forma da divisão destas no território brasileiro, bem como a Casa em que deve-se iniciar o trâmite da proposta.
§ 2º - A iniciativa popular pode ser exercida pela apresentação à Câmara dos Deputados de projeto de lei subscrito por, no mínimo, um por cento do eleitorado nacional, distribuído pelo menos por cinco Estados, com não menos de três décimos por cento dos eleitores de cada um deles
A iniciativa popular também aparece na Constituição em seu artigo 27, §4º, que expressamente possibilita a iniciativa popular na seara das Constituições estaduais, sem fazer qualquer regulamentação ou a direcionamento mais específico sobre que espécies normativas elas podem dar início ou se as exigências são as mesmas previstas no art. 61, §2º da CRFB/88.
Art. 27. §4º A lei disporá sobre a iniciativa popular no processo legislativo estadual.
Por fim, o artigo 29, XIII da CRFB/88 versa sobre a possibilidade de iniciativa popular no âmbito dos Municípios, mas, diferentemente do verificado para os Estados Federados, a Constituição fez uma ressalva, estabelecendo o número mínimo de assinatura em 5% - muito acima do previsto para os projetos de leis federais.
Art. 29. O Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta Constituição, na Constituição do respectivo Estado e os seguintes preceitos:
(…)
XIII - iniciativa popular de projetos de lei de interesse específico do Município, da cidade ou de bairros, através de manifestação de, pelo menos, cinco por cento do eleitorado;
Essas são os quatro dispositivos da Constituição Federal que trabalham com a temática da iniciativa popular. À exceção do caso dos Estados, em que toda a regulamentação é remetida a lei, resta evidente que a possibilidade de iniciativa popular é restrita a hipótese de leis infraconstitucionais.
2.2) A regulamentação da iniciativa popular pela Lei 9.709/1998
Em 1998, foi editada a Lei número 9.709, que tem por objetivo regulamentar os instrumentos de democracia direta previstos no artigo 14, I, II, III da Constituição Federal, quais sejam: plebiscito, referendo e iniciativa popular de lei.
No caso específico da iniciativa popular a regulamentação foi bastante tímida, se limitando, na prática a reproduzir os ditames constitucionais, conforme pode-se extrair da leitura dos artigos 13 e 14, que tratam do instrumento da iniciativa popular:
Art. 13. A iniciativa popular consiste na apresentação de projeto de lei à Câmara dos Deputados, subscrito por, no mínimo, um por cento do eleitorado nacional, distribuído pelo menos por cinco Estados, com não menos de três décimos por cento dos eleitores de cada um deles.
§ 1o O projeto de lei de iniciativa popular deverá circunscrever-se a um só assunto.
§ 2o O projeto de lei de iniciativa popular não poderá ser rejeitado por vício de forma, cabendo à Câmara dos Deputados, por seu órgão competente, providenciar a correção de eventuais impropriedades de técnica legislativa ou de redação.
Art. 14. A Câmara dos Deputados, verificando o cumprimento das exigências estabelecidas no art. 13 e respectivos parágrafos, dará seguimento à iniciativa popular, consoante as normas do Regimento Interno.
As únicas complementações que a Lei 9709/98 fez ao previsto em sede constitucional foi exigir que o projeto de iniciativa popular circunscreva-se a apenas um assunto e que não possa ser rejeitado por vício de forma, o que expressa a vontade do legislador de prestigiar a soberania popular e a democracia em detrimento de mera formalidade legislativa.
Essa pouca regulamentação manteve dificuldades para a utilização prática e do dispositivo, ao não prever, por exemplo, a questão de assinaturas virtuais, tornando-se uma norma quase que inútil para a eficácia do dispositivo constitucional, visto que apenas repetiu o previsto na Carta Magna. Autores do quilate de Paulo Bonavides, seguindo a linha aqui apresentada, entendem que essa regulamentação foi “atestado da incu?ria do Congresso em fazer efetiva a vontade constitucional, com respeito ao exerci?cio da soberania popular na sua dimensa?o mais legi?tima” [46]
2.3) A Proposta de Emenda Constitucional número 3 de 2011
Em julho de 2013, na sequência aos grandes protestos de rua, foi aprovada[47] na Comissão de Constituição e Justiça do Senado a Proposta de Emenda Constitucional número 3 de 2011, que flexibiliza as exigências para apresentação de iniciativa popular, prevê caráter de urgência a estas propostas e, por fim, atribui legitimidade para apresentação de PECs decorrentes da iniciativa popular[48].
O texto é de autoria do Senador pelo Distrito Federal Ricardo Rollemberg, sendo relatado pelo Senador pelo Rio de Janeiro Lindberg Farias. A proposta pretende incluir um inciso IV no artigo 60, um §3º no artigo 61, bem como a alteração da redação do §2º do artigo 61. Caso aprovado, a Constituição receberia as seguintes alterações:
Art. 60, IV – dos cidadãos e cidadãs, nos termos do §2º do art.61
Art. 61, §2º. A iniciativa popular pode ser exercida pela apresentação à Câmara dos Deputados de projetos de lei e propostas de emenda à Constituição com o apoiamento de eleitores correspondente a, pelo menos, meio por cento dos votos dados na última eleição geral para a Câmara dos Deputados, não computados os em branco e os nulos distribuídos por um terço, ou mais, das unidades federadas, com um mínimo de um décimo por cento do eleitorado que haja votado em cada um deles.
§3º. Os projetos de lei tramitarão em regime de urgência, salvo decisão em contrário do plenário da Casa Legislativa
Se a referida emenda for aprovada, é dessa maneira exposta acima que ficará a redação da Constituição Federal. Diante disso, pode-se listar algumas mudanças significativas na sistemática da iniciativa popular que seriam acarretas por esta emenda.
A exigência de assinaturas seria reduzida pela metade, dos atuais 1% para apenas meio por cento. A justificativa apresentada para isto é a desproporcionalidade em se exigir o dobro da quantidade de assinaturas de apoiamento que é preciso para fundar um partido político, de forma que a redução da quantidade das assinaturas serviria para, segundo consta da justificação da PEC nº 03/11, “aproximar a cidadania do Poder Legislativo, ao realizar, em termos concretos a harmonização da democracia representativa com a iniciativa popular.”
Em primeiro lugar, ressalte-se que se reconhece neste artigo a grande dificuldade em se conseguir a assinatura de mais de 1% do eleitorado. A esse respeito, tratou Manoel Gonçalves Ferreira Filho, de forma correra, afirmando que “Sendo rigorosas essas exigências, não será fácil que sejam apresentados projetos de lei de iniciativa popular. Trata-se de instituto decorativo”[49].
Isto posto, é justo e possível que o legislador apresente uma redução da quantidade de assinaturas com vista a uma melhor efetivação do princípio constitucional da soberania popular. Como em mais de 25 anos da atual Constituição houve apenas uma Lei oriunda de iniciativa popular, a preocupação com a inutilidade da iniciativa popular na forma em que se apresenta atualmente, encontra lastro na realidade e justifica essa inovação do legislador.
O segundo ponto que é alterado pelo projeto de emenda e que merece maior atenção, é a atribuição de regime de urgência aos procedimentos decorrentes de iniciativa popular, conforme consta do futuro §3º do artigo 61. Mas uma vez a estrutura criada pelo legislador constitucional originário é mantida, apenas se conferindo um maior valor a soberania popular expressa através da iniciativa popular.
A grande questão, porém, da PEC nº 03/11 trata sobre a inclusão do inciso IV no artigo 60, atribuindo “aos cidadãos e cidadãs” o direito de apresentar Emenda à Constituição mediante apresentação de projeto de iniciativa popular. Esta alteração já se situa em uma zona cinzenta quanto a sua constitucionalidade e adequação ao resto do sistema da Carta Magna.
Ora, segundo a própria justificação do texto, o objetivo é “viabilizar a apresentação de propostas de emenda à Constituição” e, em outra passagem, afirma-se que “as proposições legislativas de iniciativa popular são instituições cuja prática deve ser facilitada, e não dificultada”.
Isto pode ser verdade quanto as propostas de lei de iniciativa popular, mas não parece ser a melhor interpretação e nem melhor justificativa para as Emendas à Constituição. O procedimento de apresentação de emendas é rígido e como forma de salvaguardar a vontade constitucional, por isso incorre em erro quem busca justificar a transposição do modelo de iniciativa popular para a sistemática das emendas constitucionais sob o argumento de que a apresentação destas deve ser facilitada. Enfim, são inúmeras as dúvidas sobre a constitucionalidade do acréscimo deste inciso IV ao artigo 60 e esta questão será aprofundada no capítulo conclusivo subsequente.
CONCLUSÃO
Nesta conclusão busca-se, à luz da noção de democracia do constitucionalismo moderno, do direito comparado e do ordenamento jurídico brasileiro, abordar se a inclusão da iniciativa popular no rol de legitimados para apresentação de PECs resistiria a um juízo de constitucionalidade. Da mesma forma, questiona-se o defendido por parte da doutrina, de que a possibilidade de apresentação de propostas de emenda à Constituição por iniciativa popular já poderia ser depreendida da Constituição ao se fazer uma interpretação principiológica de seu texto.
O cabimento da iniciativa popular ao processo legislativo de PEC, de forma analógica ao previsto para PLs, é defendido por autores do quilate de Fábio Konder Comparato[50] e José Afonso da Silva. Sustentam esses autores que o rol do artigo 60 não é taxativo, o que tornaria possível, através de uma interpretação sistemática, a inclusão do referido mecanismo de democracia direta para apresentação de PECs. José Afonso, inclusive, chega a atribuir a forças conservadoras a não previsão de instrumentos de democracia direta para reforma do texto constitucional.
Para ilustrar a posição, cita-se as palavras do Professor José Afonso da Silva, em defesa da adoção imediata de iniciativa popular de PEC:
“A Constituição não introduziu inovação de realce no sistema de sua modificação. Até a votação no Plenário, anteprojetos e projetos admitiam, expressa e especificamente, a iniciativa e o referendo populares em matéria de emenda constitucional. No plenário, contudo, os conservadores derrubaram essa possibilidade clara que constava do §2º do art. 74 do Projeto aprovado na Comissão de Sistematização. Não está, porém, excluída a aplicação desses institutos de participação popular nessa matéria. Está expressamente estabelecido que o poder que emana do povo será exercido por meio de representantes ou diretamente (art. 1º, parágrafo único), que a soberania popular será exercida também por referendo e iniciativa populares (art. 14, I, II, III) e que cabe ao Congresso Nacional autorizar referendo sem especificação (art. 49, XV), o que permite o referendo facultativo constitucional. Vale dizer, pois, que o uso desses institutos em matéria de emenda constitucional vai depender do desenvolvimento e da prática da democracia participativa que a Constituição alberga como um de seus princípios fundamentais.
(…)
Pelo citado art. 60, I, II, III, vê-se que a Constituição poderá ser emendada por propostas de iniciativa: (1) de um terço, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal; (2) do Presidente da República; (3) de mais da metade das Assembleias Legislativas das unidades da Federação, manifestando-se cada uma delas, pela maioria relativa de seus membros, retomando, aqui, uma regra que vinha desde a Constituição de 1891, suprimida pela de 1969, regra que não teve uma única aplicação nesses cem anos de República; (4) popular, aceita a interpretação sistemática referida acima, caso em que as percentagens previstas no §2º do art. 61 serão invocáveis, ou seja, a proposta de emenda terá de ser subscrita por, no mínimo, um por cento do eleitorado nacional, distribuído pelo menos em cinco Estados, com não menos de zero vírgula três por cento dos eleitores de cada um deles. Repita-se que esse tipo de iniciativa popular pode vir a ser aplicado com base em normas gerais e princípios fundamentais da Constituição, mas ele não está especificamente estabelecido para emendas constitucionais como o está para as leis (art. 61, §2º).[51]
Nessa longa explicação, José Afonso da Silva explícita porque acredita, com respeitáveis motivos, que a iniciativa popular de PEC já é uma realidade no atual texto da Constituição, podendo ser aplicado até mesmo sem a aprovação de nenhuma emenda constitucional neste sentido.
Todavia, entende-se, neste artigo, que essa interpretação não é a mais adequada ao espírito da Constituição. Como é dito na própria transcrição acima, a não inclusão da iniciativa popular de PECs foi uma opção do próprio legislador constituinte originário, que não teve o mesmo entendimento ao tratar das propostas de Leis ordinárias. Isso se explica e se coaduna, inclusive, com a natureza rígida dada pelos constituintes à Constituição Federal, que prevê uma série de limitações a aprovação de PEC, como um quórum diferenciado, bem como restrições a possibilidades de proposição.
Em um país que, em menos de 200 anos de Estado independente, está em seu oitava Constituição, a tentativa de conferir maior rigidez e estabilidade ao texto constitucional é absolutamente legítima e não deve ser confundida com mero conservadorismo.
Uma Constituição rígida, que protege seu núcleo essencial, é uma conquista democrática, constando o meio de reforma da Constituição entre as cláusulas pétreas do sistema. A facilitação da apresentação de Emendas Constitucionais através de uma interpretação demasiadamente extensiva poderia colocar em risco o espírito da CRFB/88, assim como acrescentar, pela via interpretativa, um “inciso IV” ao art. 60 que o próprio legislador constituinte originário optou, após calorosos debates, por não prever – estaria em claro desacordo com a separação de poderes.
Superada esta primeira teoria, impende agora desconstruir a possibilidade de inclusão, pela via de emenda, da iniciativa popular de PEC ao nosso artigo 60. Em sua obra que aborda especificamente este tema, José Duarte Neto, defende uma posição intermediária acerca do tema:
Com o resguardo devido à rigidez constitucional, possível de ser garantido com o aumento do quórum de adesões, entendemos possível a inclusão da iniciativa popular para a reforma da Constituição
Para tanto seria necessário que alguns dos legitimados do art. 60 e inciso da CF/1988 aprovassem a idéia, propondo emenda à Constituição que concedesse mais esse direito aos cidadãos.[52]
Esta proposta defende ser possível a inclusão da iniciativa popular à Constituição pela via de emenda, entretanto, entende-se neste artigo que, ainda assim, não seria cabível a ampliação do rol de legitimados do artigo 60 da Constituição.
Conforme já extensamente demonstrado neste presente estudo, a rigidez constitucional é uma defesa da própria Constituição e o artigo 60 é protegido pelo status de cláusula pétrea. O poder constituinte derivado, ao contrário do seu congênere originário, não é ilimitado, devendo submeter-se a essência da Constituição.
Nesse sentido, explica Paulo Bonavides:
O primeiro (originário) entendido como um poder político fora da Constituição e acima desta, de exercício excepcional, reservado a horas cruciais no destino de cada povo ou na vida das instituições; o segundo (poder constituinte derivado) como poder jurídico, um poder menor, de exercício normal, achando-se contido juridicamente na Constituição e sendo de natureza limitada. Não poderia ele sobrepor-se assim ao texto constitucional. É óbvio, pois que a reforma da Constituição, nessa última hipótese só fará segundo os moldes estabelecidos pelo próprio figurino Constitucional;[53]
Estas palavras confirmam o aqui defendido. O estabelecimento de legitimados à propositura de PECs é um exemplo da rigidez do nosso sistema, de forma que o constituinte originário ao pontuar, de maneira taxativa, o rol dos legitimados a impulsionar o processo legislativo de alteração constitucional impôs limites implícitos à alteração constitucional.[54]. Limites estes que vão além daqueles limites previstos no art. 60 §4º, que trata das cláusulas pétreas.
Explica-se: aqueles que detêm o poder de iniciativa provocam e, literalmente, dão início ao processo de emenda à Constituição. Não poderia o poder constituinte derivado, portanto, vir a alterar esse rol de legitimados, posto que estes antecedem à sua própria concepção. Não há poder constituinte derivado sem a legítima iniciativa de proposta de emenda, e assim escolheu o poder constituinte originário. Não pode, pois, esse rol de legitimados ser alterado sem que se altere a própria estrutura e o núcleo essencial da Constituição Federal de 1988.
Frise-se que não há incompatibilidade entre o artigo 1º, parágrafo único e a impossibilidade de ampliação do grupo de legitimados para apresentar emendas à Constituição. A iniciativa popular foi prevista na Constituição e deve ser celebrada e, como defendido neste estudo no Capítulo 3, ter sua utilização facilitada através da liberação de assinaturas digitais, bem como a equiparação ao quantum exigido para a formação de partidos políticos (0,5% do eleitorado).
Porém, ao lado dessa valorização da soberania popular está a busca pela estabilidade da Constituição de Outubro de 1988. Corrobora para este entendimento a opinião de Luigi Bonizzato:
A iniciativa popular de lei no país, portanto, é plenamente exercitável – e isto desde a promulgação da Constituição, uma vez que todos os seus requisitos estão e sempre estiveram contidos no Art. 61, §2º -, o mesmo não se podendo dizer para a iniciativa popular de emenda à Constituição, a qual foi propositalmente não inserida no texto da Constituição pelos detentores do poder constituinte originário, somente outra Assembleia Nacional Constituinte, com poderes ilimitados e iniciais, podendo criar novas bases para um novo e futuro ordenamento jurídico.[55]
Por fim, ressalte-se a importância dos mecanismos de democracia participativa, também dita como direta, que devem ser incentivados, de forma a encorajar a participação popular e uma maior consciência política dos cidadãos brasileiros.
É necessário um melhor regramento do tema, indo além da tímida regulamentação da Lei 9709/98, adequando a legislação e o instituto da iniciativa popular ao século XXI (através de assinaturas digitais), bem como a aprovação de algumas mudanças previstas na PEC nº 03/2011, tal como a redução pela metade do número de assinaturas, seriam uma excelente forma de incentivar a participação popular no Brasil.
Esse aprofundamento democrático, contudo, necessariamente deve conviver e reverenciar o sistema constitucional vigente, que preza pela segurança jurídica e por um sistema restritivo de reformas em seu próprio corpo, sob pena de banalização dos regramentos constitucionais, colocando em risco as conquistas democráticas a duras penas conquistadas ao longo da História brasileira e fielmente protegidas pela Constituição de 1988.
Por tudo isso, o constituinte originário optou por deixar o mecanismo da iniciativa popular restrito às leis ordinárias, de forma que este instrumento não pode ser transposto para o procedimento de emendas constitucionais, seja por meio de uma interpretação sistemática da Constituição ou seja por meio de uma emenda que inclua esta possibilidade no artigo 60. A iniciativa popular é um instrumento importantíssimo, que deve conviver de forma harmônica com a rigidez e as bases constitucionais vigentes.
BIBLIOGRAFIA
AUAD, Denise. Artigo “Mecanismos de Participação Popular no Brasil: Plebiscito, Referendo e Iniciativa Popular.” Disponível em: <http://gestaocomaprtilhada.pbh.gov.be/sites/gestaocompartilhada.pbh.gov.br/biblioteca/arquivos/mecanismos_de_participacao_popular_no_brasil.pdf>.
BARROSO, Luís Roberto. Curso de direito constitucional contemporâneo: os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. 3ª edição. São Paulo: Editora Saraiva, 2011,
BENEVIDES, Maria Victoria de Mesquita. A Cidadania Ativa: referendo, plebiscito e iniciativa popular. Sa?o Paulo: Editora A?tica, 1991.
BRANDÃO, Rodrigo. Artigo “Direitos Fundamentais, cláusulas pétreas e democracia: Uma proposta de justificação e aplicação do artigo 60, §4º, IV da CRFB/88.”. Disponível em: <http://www.direitodoestado.com/revista/REDE-10-ABRIL-2007-RODRIGO%20BRANDAO.pdf>
BONAVIDES Paulo. Curso de Direito Constitucional. 21ª edição. São Paulo: Editora Malheiros, 2008.
BONAVIDES, Paulo. Do Estado liberal ao Estado social. 4ª edição. Rio de Janeiro: Editora Forense, 1980.
BONAVIDES, Paulo. Poli?tica e constituição: os caminhos da democracia. Rio de Janeiro: Editora Forense, 1985.
BONAVIDES, Paulo. Teoria Constitucional da Democracia Participativa: por um Direito Constitucional de luta e resistência por uma nova Hermenêutica por uma repolitizac?a?o da legitimidade. 2ª edição. Sa?o Paulo. Malheiros Editores, 2003.
BONIZZATO, Luigi. Constituição, democracia e plano diretor: sob o influxo dos direitos sociais e de liberdade, políticas estatais e institucionais. Rio de Janeiro: Lumen Iures, 2014.
BONIZZATO, Luigi; REIS, José Carlos Vasconcellos dos. Direito Constitucional: questões contemporâneas, clássicas e críticas. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2011.
CANOTILHO, Jose? Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituic?a?o. 7ª edição. Coimbra: Editora Almedina, 2003.
COMPARATO, Fábio Konder. Direito Público: estudos e pareceres. São Paulo: Editora Saraiva, 1996.
CUNHA, Alexandre Sanches. Todas as constituic?o?es brasileiras. Campinas: Editora Bookseller, 2001.
DUARTE NETO, José. A iniciativa popular na Constituição Federal. São Paulo: Editora RT, 2005.
FERRAZ. Anna Candida da Cunha. As Constituições brasileiras. São Paulo: Editora Brasiliense, 1993.
FERREIRA, Gustavo Sampaio Telles Ferreira. Federalismo Constitucional e reforma federativa. Poder Local e Cidade-Estado. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2014.
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Do Processo Legislativo. 7ª edição. São Paulo: Editora Saraiva, 2012.
FIUZA, Ricardo Arnoldo Malheiros. Direito Constitucional Comparado. 4ª edição. São Paulo: Editora Del Rey, 2000.
MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO. Paulo Gustavo Gonet; COELHO, Inocêncio Mártires. Curso de Direito Constitucional. 2ª edição, São Paulo: Editora Saraiva, 2008.
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 27ª Edição. São Paulo: Editora Atlas, 2011.
MOTTA FILHO, Sylvio Clemente da; BARCHET, Gustavo. Curso de Direito Constitucional. Rio de Janeiro: Editora Elsever, 2007.
MOTTA FILHO, Slyvio Clemente da; DOS SANTOS, William Douglas Resinente. Direito Constitucional: teoria, jurisprudência e 1000 questões. 11ª edição. Rio de Janeiro: Editora Impetus, 2002.
NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 3ª edição. São Paulo: Editora Método, 2009.
OLIVEIRA, Fábio de. Neoconstitucionalismo e Constituição Dirigente. In: QUARESMA, Regina; OLIVEIRA, Maria Lúcia de Paula; OLIVEIRA, Farlei Martins Riccio (Coord.) Neoconstitucionalismo. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2009.
PEREIRA, Jane Reis Gonçalves; SILVA, Fernanda Duarte Lopes Lucas da. “A estrutura normativa das Normas constitucionais. Notas sobre a distinção entre princípios e regras IN: PEIXINHO, Manoel Messias; GUERRA, Isabella Franco; FILHO, Firly Nascimento. Os princípios na Constituição de 1988. 2ª edição. Rio de Janeiro, 2006.
RUFFIA, Paolo Biscaretti di. Introduzione al diritto costituzionale comparato. Le “forme di stato” e le “forme di governo”: le costituzione moderne. 6ª edição. Milano: Editora A. Giuffre, 1988.
SANTOS, Gustavo Ferreira. Neoconstitucionalismo e democracia. Revista de Informação Legislativa, Brasília, ano 43, nº 172, out-dez. 2006.
SALDANHA, Nelson. Formação da teoria constitucional. 2ª edição. Rio de Janeiro: Editora Renovar, 2000.
SILVA, Jose? Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 35ª edição. Sa?o Paulo: Malheiros Editores, 2012.
SLAIBI FILHO, Nagib. Direito Constitucional. 3ª edição. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2009.
TEMER, Michel. Elementos de Direito Constitucional. 22ª edição, São Paulo: Malheiros Editores, 2007.
VIEIRA, Felipe. Comentários à Constituição. 3ª edição. Rio de Janeiro: Editora Ferreira, 2007.
[1] SILVA, Jose? Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 35ª. ed. Sa?o Paulo: Malheiros Editores, 2012, p. 135
[2] BENEVIDES, Maria Victoria de Mesquita. A Cidadania Ativa: referendo, plebiscito e iniciativa popular., Sa?o Paulo: Editora A?tica,1991. p.129
[3] CUNHA, Alexandre Sanches. Todas as constituições brasileiras; Campinas: Editora Bookseller, 2001, P.87
[4] Idem, ibidem, p.209
[5] O Reino Unido é o clássico exemplo em que não há Constituição escrita
[6] BARROSO, Luís Roberto. Curso de direito constitucional contemporâneo: os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. 3ª edição. São Paulo. Editora Saraiva, 2011, p. 27
[7] SALDANHA, Nelson. Formação da teoria constitucional. 2ª edição. Rio de Janeiro, Editora Renovar, 2000, p. 14
[8] NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 3ª edição. Editora Método, São Paulo. P. 53
[9] RUFFIA, Paolo Biscaretti di. Introduzione al diritto costituzionale comparato. Le “forme di stato” e le “forme di governo”: le costituzione moderne. 6ª edição. Milano: A. Giuffre, 1988. p. 93 e seguintes.
[10] BARROSO, Luís Roberto. Curso de direito constitucional contemporâneo: os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. 3ª edição. São Paulo. Editora Saraiva, 2011, p. 39
[11] SANTOS, Gustavo Ferreira. Neoconstitucionalismo e democracia. Revista de Informação Legislativa, Brasília, ano 43, nº 172, out-dez. 2006, p. 265-268
[12] BARROSO, Luís Roberto. Curso de direito constitucional contemporâneo: os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. 3ª edição. São Paulo. Editora Saraiva, 2011, p. 64
[13] MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO. Paulo Gustavo Gonet; COELHO, Inocêncio Mártires. Curso de Direito Constitucional. 2ª edição, São Paulo. Editora Saraiva, 2008, p.39
[14] MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO. Paulo Gustavo Gonet; COELHO, Inocêncio Mártires. Curso de Direito Constitucional. 2ª edição, São Paulo. Editora Saraiva, 2008, p.43
[15] Idem, ibidem, p. 43
[16] BONAVIDES, Paulo. Poli?tica e constituic?a?o: os caminhos da democracia. Rio de Janeiro: Forense, 1985, p. 403
[17] MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO. Paulo Gustavo Gonet; COELHO, Inocêncio Mártires. Curso de Direito Constitucional. 2ª edição, São Paulo. Editora Saraiva, 2008, p.44
[18] BONAVIDES, Paulo. Do Estado liberal ao Estado social. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1980, p. 228.
[19] FERRAZ. Anna Candida da Cunha. As Constituições brasileiras, Editora Brasiliense. São Paulo, 1993. p. 41
[20] BARROSO, Luís Roberto. (...) 2012, p.264.
[21] SLAIBI FILHO, Nagib. Direito Constitucional. 3ª edição. Rio de Janeiro, Editora Forense, 2009. p. 125.
[22] MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 27ª Edição, São Paulo, Editora Atlas, 2011. p.6
[23] MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 27ª Edição, São Paulo, Editora Atlas, 2011. p.6
[24] LINCOLN, citado por CANOTILHO, Jose? Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituic?a?o. 7. ed. Coimbra: Almedina, 2003, p. 287.
[25] SLAIBI FILHO, Nagib. Direito Constitucional. 3ª edição. Rio de Janeiro, Editora Forense, 2009. p. 459
[26] DUARTE NETO, José. A iniciativa popular na Constituição Federal. Editora RT, 2005, p. 27
[27] SILVA, Jose? Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 35ª. ed. Sa?o Paulo: Malheiros Editores, 2012, p. 135.
[28] DUARTE NETO, José. A iniciativa popular na Constituição Federal. Editora RT, 2005, p. 35
[29] DUARTE NETO, Jose?. A iniciativa popular na Constituic?a?o Federal. Sa?o Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005, p. 45.
[30] BONAVIDES, Paulo. Teoria Constitucional da Democracia Participativa (por um Direito Constitucional de luta e resiste?ncia por uma nova Hermene?utica por uma repolitizac?a?o da legitimidade). 2. ed. Sa?o Paulo: Malheiros Editores, 2003, p. 51.
[31] BONIZZATO, Luigi. Constituição, democracia e plano diretor: sob o influxo dos direitos sociais e de liberdade, políticas estatais e institucionais. Rio de Janeiro, Lumen Iures, 2014. p. 198
[32] SLAIBI FILHO, Nagib. Direito Constitucional. 3ª edição. Rio de Janeiro, Editora Forense, 2009. p. 466
[33] SLAIBI FILHO, Nagib. Direito Constitucional. 3ª edição. Rio de Janeiro, Editora Forense, 2009. p. 464-466.
[34] ALEXY, Robert citado por PEREIRA, Jane Reis Gonçalves; SILVA, Fernanda Duarte Lopes Lucas da. “A estrutura normativa das Normas constitucionais. Notas sobre a distinção entre princípios e regras IN: PEIXINHO, Manoel Messias; GUERRA, Isabella Franco; FILHO, Firly Nascimento. Os princípios na Constituição de 1988. 2ª edição. Rio de Janeiro, 2006. p. 9
[35] SLAIBI FILHO, Nagib. Direito Constitucional. 3ª edição. Rio de Janeiro, Editora Forense, 2009. p. 3
[36] MOTTA FILHO, Slyvio Clemente da; DOS SANTOS, William Douglas Resinente dos. Direito Constitucional: teoria, jurisprudência e 1000 questões. 11ª edição. Editora Impetus, 2002, p.27
[37] MENDES, Gilmar. Curso de Direito Constitucional. 2ª edição revista e atualizada. Brasíli:, Ed. Saraiva, 2008 P. 213
[38] MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, 28ª Edição, Editora Atlas, 2012, pg. 10.
[39] OLIVEIRA, Fábio de. Neoconstitucionalismo e Constituição Dirigente. In: QUARESMA, Regina; OLIVEIRA, Maria Lúcia de Paula; OLIVEIRA, Farlei Martins Riccio (Coord.) Neoconstitucionalismo. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2009.
[40] OLIVEIRA, Fábio de. Neoconstitucionalismo e Constituição Dirigente. In: QUARESMA, Regina; OLIVEIRA, Maria Lúcia de Paula; OLIVEIRA, Farlei Martins Riccio (Coord.) Neoconstitucionalismo. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2009.
[41] BONAVIDES Paulo. Curso de Direito Constitucional, 21ª edição. Editora Malheiros, São Paulo, 2008. p. 204.
[42] Por todos, MORAES, Alexandre. Direito Constitucional, 27ª edição, Editora Atlas, São Paulo, 2011. p.697
[43] SLAIBI FILHO, Nagib. Direito Constitucional. 3ª edição. Rio de Janeiro, Editora Forense, 2009. p. 3
[44] MOTTA FILHO, Sylvio Clemente da; BARCHET, Gustavo. Curso de Direito Constitucional. Rio de Janeiro, Editora Elsever, 2007, p.23.
[45] MOTTA FILHO, Sylvio Clemente da. BARCHET, Gustavo. Curso de Direito Constitucional. Rio de Janeiro, Editora Elsever, 2007
[46] BONAVIDES, Paulo. Teoria Constitucional da Democracia Participativa: por um Direito Constitucional de luta e resiste?ncia, por uma nova hermene?utica, por uma repolitizac?a?o da legitimidade. 2. ed. Sa?o Paulo: Malheiros, 2003. p.108
[47] Disponível em: http://www12.senado.gov.br/noticias/materias/2013/07/10/aprovada-na-ccj-proposta-que-facilita-apresentacao-de-projeto-de-iniciativa-popular consultado dia 21/09/2014 acessado às 12:40h.
[48] Texto integral disponível em: http://www.senado.gov.br/atividade/materia/detalhes.asp?p_cod_mate=99067 acessado dia 20/09/2014 às 12:45.
[49] FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Do processo legislativo. 4ª edição. São Paulo. Editora Saraiva, 2001. p.205
[50] COMPARATO, Fábio Konder. Direito Público: estudos e pareceres. São Paulo, Editora Saraiva, 1996, p.17.
[51] SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo, 35ª Edição, Malheiros Editores, 2012, p.63-64
[52] DUARTE NETO, José. A iniciativa popular na Constituição Federal. São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2005. p. 126.
[53] BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito ConstitucionaL 22ª edição. São Paulo. Editora Malheiros, p.201.
[54] VIEIRA, Felipe. Comentários à Constituição. 3ª edição. Rio de Janeiro. Editora Ferreira, 2007.p.558
[55] BONIZZATO, Luigi; REIS, José Carlos Vasconcellos dos. Direito Constitucional: questões contemporâneas, clássicas e críticas. Rio de Janeiro, Editora Lumen Juris, 2011. p.141
Advogado. Pós-graduado em Direito do Estado e da Regulação na FGV-RJ (2016). Graduado em Direito pela UFRJ (2015).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: TOMAZ, Dante Silva. A iniciativa popular de propostas de emenda à Constituição e sua adequação ao ordenamento jurídico brasileiro Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 31 jul 2017, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/50553/a-iniciativa-popular-de-propostas-de-emenda-a-constituicao-e-sua-adequacao-ao-ordenamento-juridico-brasileiro. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: WALKER GONÇALVES
Por: Benigno Núñez Novo
Por: Mirela Reis Caldas
Por: Juliana Melissa Lucas Vilela e Melo
Precisa estar logado para fazer comentários.