VIRGÍLIO RICARDO COELHO MEIRELLES
(Prof. Me. Orientador)[1]
RESUMO: O objeto do presente trabalho de curso avaliar o sistema de monitoramento eletrônico do preso no âmbito penal brasileiro frente à superlotação carcerária no país. No Brasil o surgimento do monitoramento eletrônico se deu primeiramente com duvidosas leis estaduais bastantes questionadas constitucionalmente. Logo foi regulamentada com o advento da lei 12.258/10, a qual alterou parte da LEP (Lei de Execução Penal), ensejando mais tarde a aprovação da Lei 12.403/11 que passou a oferecer mais alternativas no rol das medidas cautelares. Conclui-se então que, com a possibilidade de restrição e limitação dos direitos fundamentais, bem como observados o binômio da “necessidade e adequação” e a presença do Princípio da Proporcionalidade na aplicação da medida, não há que se falar na violação dos direitos fundamentais. Pelo contrário: Ela apenas os válida, pois indubitável restou que a medida, se comparada com o sistema prisional, tem uma harmonia bem maior com os princípios constitucionais. Assim, dando continuidade à aplicação da medida pelo país, de forma com que se invista na aquisição de um número maior de equipamentos eletrônicos e na edificação de centrais de monitoramento, o Brasil tem grandes chances de alcançar o nível internacional de sucesso do monitoramento eletrônico de presos, solucionando, quiçá, o problema da superlotação dos estabelecimentos prisionais, sem parecer violar, em nenhum momento, a Carta Magna.
Palavras-chave: Monitoramento eletrônico – Constituição Federal – Sistema Penitenciário.
ABSTRACT: The purpose of this course work is to evaluate the prisoner's electronic monitoring system in the Brazilian criminal justice system in the face of overcrowding in the country. In Brazil, the emergence of electronic monitoring took place first with dubious state laws that were considerably questioned constitutionally. It was soon regulated with the enactment of Law 12.258 / 10, which amended part of the Criminal Execution Law (LEP), prompting later approval of Law 12,403 / 11, which now offers more alternatives in the role of precautionary measures. It is concluded that, with the possibility of restricting and limiting fundamental rights, as well as observing the binomial of "necessity and adequacy" and the presence of the principle of proportionality in the application of the measure, it is not necessary to speak about the violation of fundamental rights . On the contrary: It only validates them, since it is undoubted that the measure, if compared with the prison system, has a much greater harmony with the constitutional principles. Thus, by continuing to apply the measure in the country, in order to invest in the acquisition of a greater number of electronic equipment and in the construction of monitoring centers, Brazil has a good chance of achieving the international level of success of electronic monitoring of prisoners, solving, perhaps, the problem of overcrowding of prisons, without seeming to violate, at any moment, the Constitution.
Key words: Electronic monitoring - Federal Constitution - Penitentiary System.
O presente estudo tem como objetivo avaliar o sistema de monitoramento eletrônico do preso no âmbito penal brasileiro frente à superlotação carcerária no país. Paralelamente tem a finalidade de obter o requisito parcial a obtenção do grau de Bacharel em Direito.
Pois bem. Em virtude do avanço da criminalidade em diversos países do mundo, acarretando por sua conta a superlotação nas unidades prisionais, estudou-se uma maneira que se pudesse amenizar esta situação sendo uma dessas foi focada na utilização de sistemas eletrônicos de fiscalização que pudessem trazer maior eficácia no cumprimento e aplicabilidade nas execuções das penas nos casos especificados por lei.
No Brasil o surgimento do monitoramento eletrônico se deu primeiramente com duvidosas leis estaduais que foram bastante questionadas constitucionalmente, citam-se, a Lei 12.906/08 que surgiu no estado de São Paulo como uma das primeiras tentativas para a utilização deste sistema frente à estrondosa e crescente população carcerária e busca de melhor retorno do indivíduo à sociedade. Medida esta que somente foi regulamentada com o advento da lei 12.258/10, a qual alterou parte da LEP (Lei de Execução Penal), ensejando mais tarde a aprovação da Lei 12.403/11 que passou a oferecer mais alternativas no rol das medidas cautelares.
Desta forma, o monitoramento eletrônico como observado anteriormente, surgiu não só com o fim de resolver o grave problema da superlotação dos presídios, mas também, como forma de humanização do cumprimento da pena, o que, de fato, não ocorre dentro das unidades prisionais brasileiras, pela forma degradante que os presos são tratados.
Assim, a Lei de Execuções Penais vem afrontando os direitos fundamentais dos presos, previstos na Carta Magna, sem que haja, sequer, o cumprimento do seu papel e o alcance de suas finalidades, como por exemplo, a ressocialização dos detentos.
Todavia, cabe ressaltar que, referidos direitos constitucionais não são absolutamente protegidos, uma vez que admitem restrições e limitações, quando em colisão com interesses coletivos.
É visível a insuficiência da pena privativa de liberdade e do sistema penitenciário que não alcança seu objetivo de ressocializar, viabilizando o retorno à sociedade sem que o mesmo possua condições sociais para encarar uma nova realidade perplexa e cheia de preconceito e estigmatização. Portanto o sistema prisional dará o primeiro e mais importante passo na busca pela eficácia e eficiência do sistema a partir do momento em que passe a garantir os direitos sociais, não marginalizando, humilhando e excluindo cada vez mais o reeducando e o egresso, mas sim, punir de forma a possibilitar de fato que o ex-preso possa se reinserir na sociedade de forma justa e equitativa.
A Constituição Federal de 1988 trouxe em seu bojo os princípios, direitos e garantias fundamentais, como um dos principais objetivos da nossa lei maior, para que assim pudéssemos “construir uma sociedade livre, justa e solidária”, como também “erradicar a pobreza, a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais” (art. 3º, CF/88). Assim cabe aos governantes a tarefa de elaborar, executar e fiscalizar todos os atos que contribuam para que estes objetivos sejam alcançados na forma da lei maior.
O monitoramento eletrônico do preso por sua vez contribuiu para que os estudiosos apresentarem, também, posicionamentos opostos sobre a medida inserida no bojo do ordenamento jurídico penal brasileiro.
Alguns destes posicionamentos foram no sentido de que esta medida afronta o princípio da dignidade da pessoa humana, princípio este contemplado pela CF/88. Contudo o apenado estaria por consequência sofrendo constrangimento de sua integridade física e moral ao portar o aparelho sinalizador, como também tendo afronta aos seus direitos fundamentais ameaçados, tais como a privacidade, liberdade de locomoção, inviolabilidade de seu domicílio, dentre outros elencados pelo ordenamento pátrio.
Tais discussões e questionamentos sobre lei do monitoramento eletrônico são as causas que justificam a realização do referido trabalho monográfico, podendo, destarte, fazer um aprofundamento sobre estas dúvidas que pairam nos espíritos dos críticos, como algumas aqui citadas: O monitoramento eletrônico do preso veio indiscutivelmente para resolver questões de abarrotamentos dos estabelecimentos prisionais? Quais são seus aspectos jurídicos? E mais: o instituto do monitoramento eletrônico obedece aos pressupostos estabelecidos na Constituição Federal?
O principal método a utilizado foi o dedutivo, sendo este conceito segundo o autor, considerando que partirá de um aspecto geral para basilar a pesquisa a ser realizada. Destaca-se que o método dedutivo consiste no mecanismo lógico que utiliza da dedução para a conclusão quanto às premissas. Para tanto, foi feita uma pesquisa bibliográfica caracterizada pela leitura e interpretação de livros, artigos, jurisprudências, leis e outras fontes do Direito. A pesquisa de revisão bibliográfica consistirá na seleção de textos relativos a área, sendo excluídos trabalhos de autores não especializados na área.
Após verificadas as hipóteses de atuação do monitoramento eletrônico no Brasil e, conforme pesquisas realizadas no país, pôde-se verificar que o âmbito de maior incidência da medida é, atualmente, na prisão domiciliar, a qual ocorre em Estados como: Alagoas, Acre, Pernambuco, Ceará, Rio de Janeiro e Rondônia. (SOUZA, 2014, p. 212).
Já como medida cautelar, Souza (20124 p. 212) informa que a monitoração ocorre no Acre, Rio de Janeiro, Alagoas e Rondônia. Por outro lado, o especialista explica que, no regime aberto - com as saídas temporárias - o monitoramento é aplicado em Alagoas, Ceará, Pernambuco, Rondônia e São Paulo e, por fim, nas hipóteses de livramento condicional e de outras possivelmente impostas judicialmente, a medida é aplicada somente em Alagoas.
A esse respeito, Mariath justifica a medida:
Diante do quadro atual do sistema carcerário, pergunta-se: Como deixar de oferecer a alguém, em uma fase pré-executória, ciente da realidade cruel que permeia o sistema penitenciário, a oportunidade de aguardar o trânsito em julgado da sentença (por muitas vezes absolutória) em sua residência (ao lado de seus familiares e amigos), alegando que este deve se recolher ao cárcere porque o instrumento que poderia salvaguardá-lo fere o princípio da intimidade ou ainda o da presunção de inocência?!! É certo que, com a evolução tecnológica, rapidamente serão manufaturados equipamentos de tamanho reduzidíssimos, conforme ocorreu com os aparelhos de telefonia móvel ("celulares"). (MARIATH, 2010, p. 3).
Sofrendo grandes dificuldades e obstáculos, a monitoração eletrônica de presos é medida que ainda vem sendo estudada, experimentada e, aos poucos, implementada no cenário jurídico brasileiro.
Conforme pesquisa realizada por meio de questionários aplicados a todas unidades federativas, Bernardo de Azevedo (2014, p. 213) concluiu a existência de alguns obstáculos, conforme cada Estado.
No Rio Grande do Norte e no Distrito Federal a dificuldade encontrada é a mesma: Financeira/orçamentária. Ambos os Estados se preocupam em avaliar o custo-benefício das tecnologias que envolvem a monitoração eletrônica.
Já Maranhão e Roraima tiveram que lidar com a falta de previsão orçamentária em 2012, fato este que impediu a implantação da medida até o presente momento. O Estado do Maranhão também enfrentou problemas de natureza organizacional e estrutural, pois a incumbência da administração do sistema prisional que cabia à Secretaria de Segurança Pública, passou a ser da Secretaria de Estado da Justiça e da Administração Penitenciária (RITTER, 2013, p, 53).
Igualmente, em 2011 Santa Catarina sofreu um processo de transição da Secretaria Executiva de Justiça e Cidadania para Secretaria de Estado da Justiça e Cidadania, o que também levou à morosidade na implementação da medida.
Já o Amazonas, Mato Grosso do Sul e Piauí apresentam dificuldades ideológicas, pois diante da possibilidade de rompimento da tornozeleira/pulseira, o que possibilita a fuga do monitorado, a medida não passa grande credibilidade ao substituir a prisão. Contando com dificuldades geográficas, em razão de sua vegetação, Roraima tem dificuldade na aplicação da medida, por algumas regiões do Estado não conter sinal suficiente para o efetivo monitoramento (RITTER, 2003, p. 53).
Por fim, Bernardo de Azevedo Souza (2014, p. 213) cita as dificuldades operacionais nos Estados de Rondônia, Pernambuco e Alagoas, os quais demonstram a necessidade de legislações específicas para aplicação da medida.
Deste modo, verifica-se que, apesar da existência da Lei Federal nº. 12.258/2010, ainda se tem um longo caminho a percorrer para o aperfeiçoamento do monitoramento eletrônico no país, que necessita de uma maior aquisição dos equipamentos tecnológicos, da edificação de centrais de monitoração, assim também como de treinamento de pessoal. (SOUZA, 2014, p. 214).
Ao contrário dos Estados Unidos e dos países mais desenvolvidos, o Brasil ainda passa por uma fase inicial, em que nem todos os seus Estados aplicam a medida, e ainda se exige muitos estudos e pesquisas para sua plena eficácia. Fabio Ritter (2013, p. 55) afirma que: “No Brasil, o uso dessa tecnologia é recente, mas nos Estados Unidos funciona desde a década de 1990 com muita eficiência.”
No tocante à economia, também se verifica prosperidade na aderência da medida eletrônica: Atualmente um preso que cumpre pena no regime semiaberto em estabelecimento prisional custa cerca de R$ 1.200,00 (mil e duzentos reais). Já um equipamento eletrônico para monitoração, apenas R$ 400 (quatrocentos reais). (RITTER, 2013, p. 56).
Deste modo, apesar da situação atual do monitoramento eletrônico ainda ser precária em muitos estados, acredita-se que a medida tem tudo para dar certo e ser tornar uma excelente opção ao encarceramento brasileiro.
Diferentemente da prisão pena, a qual é resultante de sentença penal condenatória irrecorrível, aplicada àquele que for comprovadamente culpado pela prática de algum delito, a prisão processual considerada medida assecuratória, possui caráter provisório não decorrendo de condenação, só podendo ser decretada antes ou no curso do processo. Possui caráter preventivo, nos termos da lei.
A prisão processual é uma dentre as modalidades possíveis de medidas cautelares que buscam a efetividade do processo penal. Com isso, consiste em instrumento processual e não pena, devendo seguir o pressuposto de medida de exceção a aplicação da prisão como medida cautelar no processo penal.
Nesse contexto, entende-se que as prisões cautelares servem para garantir os resultados da realização do processo, recaindo sobre o suspeito ou acusado, antes de qualquer decisão definitiva, não exigindo comprovação plena em razão de seu caráter de urgência. Seus requisitos são fumus comissi delicti e periculum libertatis.
Após verificado o modo de aplicabilidade do monitoramento eletrônico, necessária se faz a análise dele referente às circunstâncias em que é cabível. Antes de tudo, cumpre definir a prisão processual como sendo aquela cautelar; provisória, ou seja, que não exige pena imposta para ser decretada, podendo ocorrer, então, desde o momento do fato criminoso, até o trânsito em julgado da sentença condenatória, se preenchidos os requisitos do fumus comissi delicti e periculum libertatis (MIRABETE, 2014, p. 398).
O Superior Tribunal de Justiça demonstra seu entendimento acerca da excepcionalidade da prisão processual:
PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO. PRISÃO PROCESSUAL. FUNDAMENTO. ANÁLISE CRONOLÓGICA. PERICULUM LIBERTATIS. AUSÊNCIA. ILEGALIDADE E CONHECIMENTO. 1. A prisão processual é medida odiosa e excepcional, marcada pelo signo de sua imprescindibilidade. O indispensável periculum libertatis deve ser apurado quando da decretação da medida constritiva, sendo ilegal o indeferimento do direito de recorrer em liberdade com a reiteração de pretéritos fundamentos que ensejaram a preventiva, relaxada por excesso de prazo. 2. Ordem concedida para deferir liberdade provisória ao paciente, mediante termo de comparecimento aos atos do processo - com voto vencido. STJ - HABEAS CORPUS HC 106602 RJ 2016/0107061-5 (STJ).
A prisão processual é composta por várias espécies, tais quais: A) prisão em flagrante; b) prisão temporária; c) prisão decorrente de sentença de pronúncia; d) prisão preventiva; e) prisão preventiva strictu sensu f) prisão resultante de sentença condenatória recorrível.
De um modo, analisa-se que, o fato da prisão processual pode ser decretada antes mesmo da condenação do réu - quando ainda vigora o Princípio da Presunção de Inocência – faz com que ela seja bem vista perante a sociedade, por transmitir a sensação de justiça feita. Todavia, absurda seria a decretação de uma prisão, para apenas saciar a vontade popular (MIRABETE, 2014, p. 398).
No entanto, na prisão temporária , tal hipótese não prospera, pois como visto acima, a prisão temporária tem a finalidade de preservar a investigação e a instrução criminal, logo, sentido algum faz o preso temporário deixar o presídio, ainda que com o uso da tornozeleira. (MORAIS, 2016, p. 61) Também não se fala na aplicabilidade do monitoramento eletrônico para presos em flagrante, mas sim, posterior e somente tal prisão se tornar preventiva.
Na prisão preventiva poderá ocorrer a utilização do monitoramento eletrônico. Vale lembrar, que esta modalidade de prisão, conforme preconiza o artigo 312 do Código de Processo Penal, deve ser decretada como: ‘‘Garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria.’’
Assim, verifica-se que ela deve ocorrer para justificar uma eventual fuga do acusado, e não para fazer justiça perante a sociedade, sendo que, sequer, houve trânsito em julgado da sentença e, portanto, presumida está a inocência dele. Inadmissível o cerceamento do indivíduo para satisfação social. (MORAIS, 2016, p. 63)
Deste modo, Paulo Morais (2012, p.64) ainda afirma que, para os casos em que há grandes possibilidades de fuga do preso, a tornozeleira pode ser utilizada para efetivação da medida cautelar do monitoramento eletrônico, como alternativa à prisão preventiva.
Ante o exposto, conforme o autor, que o uso do equipamento eletrônico dá ao preso a exata ideia de liberdade provisória e não plena. Com a tornozeleira, ele tem a possibilidade de estar em liberdade, ao mesmo tempo em que sabe que esta é vigiada e possível somente mediante o preenchimento de certo requisitos, que devem ser cumpridos para se evitar a revogação de tal liberdade, assim como todas as outras consequências de cunho processual decorrentes de tal ato.
Assim, em tais tipos de prisão poderá ocorrer o monitoramento eletrônico. Isso porque grande parte dos presos situados no sistema penitenciário são provisórios, sendo que tal situação poderia ser mitigada com a utilização da tecnologia. Destaca-se que a utilização da monitoramento eletrônico poderá satisfazer, em certas situações, os requisitos da prisão preventiva, nos moldes do caso em concreto.
A prisão domiciliar, que “consiste no recolhimento do indiciado ou acusado em sua residência, só podendo dela ausentar-se com autorização judicial”, aceita o monitoramento eletrônico do preso, desde que reste esclarecido se essa prisão é aquela substituta da prisão preventiva, nos moldes do artigo 318 do Código de Processo Penal, ou se aquela prevista no artigo 117 da LEP, em que o preso cumpre pena no regime aberto, pois como já falado, não se admite a monitoração eletrônica de presos que cumpram pena neste tipo de regime de cumprimento de pena.
Neste sentido, entende o Alceu Corrêa Júnior (2014, p. 90-91):
Ocorre que a ausência de estabelecimentos adequados para o cumprimento da pena privativa de liberdade no regime aberto autoriza a concessão da “prisão domiciliar” ao condenado, que não tem culpa da ineficiência do poder público.
Outro não é o entendimento da jurisprudência:
Execução penal. Prisão domiciliar. Monitoramento Eletrônico. Decisão que deferiu a prisão domiciliar e a inclusão no programa de monitoramento eletrônico, por ausência de vagas e por não apresentarem condições mínimas de segurança e fiscalização os estabelecimentos prisionais, proferida em 1ºJUL2013. Decisão posterior - em 30JAN2014 - que apenas determinou, à SUSEPE, o cumprimento do que decidido anteriormente. A decisão recorrível seria a anterior, mas o agravo atacou a posterior. E assim apresenta-se como intempestivo. Agravo do Ministério Público não conhecido. 17“grifo nosso” HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL. (1) IMPETRAÇÃO SUBSTITUTIVA DERECURSO ESPECIAL. IMPROPRIEDADE DA VIA ELEITA. (2) PROGRESSÃO DE REGIME. MÉRITO DO CONDENADO. AGRAVO EM EXECUÇÃO. DECISÃO REFORMADA. ELEMENTO SUBJETIVO. JUSTIFICAÇÃO FORA DOS PARÂMETROS LEGAIS. ILEGALIDADE MANIFESTA. (3) WRIT NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO.É imperiosa a necessidade de racionalização do emprego do habeas corpus, em prestígio ao âmbito de cognição da garantia constitucional, e, em louvor à lógica do sistema recursal. In casu,foi impetrada indevidamente a ordem como substitutiva de recurso especial. Hipótese em que há flagrante ilegalidade a ser reconhecida. A teor do art. 112 da Lei de Execuções Penais, com a redação que lhe deu a Lei n.º 10.792/2003, ao indeferir a progressão de regime, porque não cumprido o requisito subjetivo, o julgador deve fazê-lo de forma motivada em dados concretos da execução da pena, não podendo cercar-se de elementos ou circunstâncias não previstos na lei de regência. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício, ratificando a liminar, para reformar o acórdão proferido em sede de agravo em execução e restabelecer a decisão proferida pelo juízo da execução, que deferiu ao paciente a progressão ao regime aberto, a ser cumprido em prisão domiciliar com monitoramento eletrônico.
Observa-se que a monitoração eletrônica é cabível na prisão domiciliar nos termos do artigo 117 da LEP, , sendo, então, concedido o benefício da prisão domiciliar. (CORRÊA JÚNIOR, 2014, p. 90).
Conforme dispõe o artigo 122 da LEP, a saída temporária é um benefício que pode ser concedido ao preso que cumpre sua pena em regime semiaberto, para o fim de visita à família ou frequentar a cursos ou a atividades que o ressocializem. Já o artigo 146-B da mesma lei autoriza a fiscalização eletrônica do detento beneficiado pela saída temporária, mediante decisão judicial fundamentada, sob pena de ferir o artigo 93, inciso IX da Constituição Federal de 1988.
Porém, deve-se atentar ao verbo “autoriza”, pois o monitoramento não é requisito obrigatório para concessão da saída, sendo cabível conforme a situação de cada caso.
O monitoramento em questão tem a finalidade de fiscalizar apenas o cumprimento das exigências judiciais, como por exemplo, verificar se o preso não está frequentando bares, casas noturnas; se ele tem retornado à residência visitada durante o período noturno e outras mais que possa eventualmente ser impostas pelo Juiz, sendo vedada a fiscalização das demais atividades que o preso possa vir a praticar durante o benefício. (CORRÊA JÚNIOR, 2014, p. 92)
Novamente, ensina Alceu Corrêa Júnior (2014 p. 47):
A vigilância eletrônica é justificada, na saída temporária, pela necessidade de fiscalização das condições impostas ao beneficiário e não por uma suposta conveniência de acompanhamento das atividades do condenado fora do estabelecimento prisional.
Por outro lado, válido é relembrar que o descumprimento às regras impostas gera a revogação automaticamente do benefício e o preso ainda pode sofrer regressão ao regime fechado. A jurisprudência caminha para o seguinte entendimento:
Agravo em Execução. Saída temporária. Monitoramento Eletrônico. Condição de permanência integral no endereço declinado. Violação aos limites da lei. Desproporcionalidade. Desatendimento ao recolhimento à residência no período noturno. Motivo que enseja a revogação do benefício. Falta grave. Ausência de previsão legal. Desconstituição. Regressão ao regime fechado. Impossibilidade. Restabelecimento do regime semiaberto Agravo provido em parte. (Processo: EP 453560420128260000 SP 0045356-04.2012.8.26.0000 Relator(a): Marco Nahum
Julgamento: 30/07/2012 Órgão Julgador: 1ª Câmara de Direito Criminal Publicação: 03/08/2012
Assim, o uso da tornozeleira eletrônica se faz, totalmente, possível durante a saída temporária, desde que com o intuito exclusivo de fiscalização das regras impostas judicialmente, cabendo à revogação do benefício em casos de descumprimento destas.
Desse modo, forçoso é reconhecer que o monitoramento eletrônico se tornou uma medida de importante instrumentalidade durante a saída temporária nos moldes da Lei de Execuções Penais.
Uma das grandes polêmicas que se depreende surge dos estudos sobre o monitoramento eletrônico se refere a sua constitucionalidade. Após a introdução e o desenvolvimento feitos sobre a medida, neste capítulo se pretende abordar, o tema, levando-se em consideração seus prós e contras.
Primeiramente, é importante abordar a questão dos direitos fundamentais que, apesar de não receberem proteção absoluta, são os maiores responsáveis pelos debates acerca da constitucionalidade da monitoração eletrônica.
O monitoramento eletrônico, como já visto, surgiu não só com o fim de resolver o grave problema da superlotação dos presídios, mas também, como forma de humanização do cumprimento da pena, o que, de fato, não ocorre dentro das unidades prisionais brasileiras, pela forma degradante que os presos são tratados.
Visível é, que a Lei de Execuções Penais vem afrontando os direitos fundamentais dos presos, previstos na Carta Magna, sem que haja, sequer, o cumprimento do seu papel e o alcance de suas finalidades, como por exemplo, a ressocialização dos detentos.
Todavia, cabe ressaltar que, referidos direitos constitucionais não são absolutamente protegidos, uma vez que admitem restrições e limitações, quando em colisão com interesses coletivos.
Doutrinariamente, explica André Puccinelli Júnior (2013, p. 207) a respeito da imutabilidade dos direitos fundamentais:
É entendimento comum o de inexistir direito absoluto. Como não fogem à aplicação dessa regra basilar, os direitos fundamentais encontram inúmeros limites, a começar pela impossibilidade de acobertar atividades ilícitas e afastar a correspondente responsabilidade civil, administrativa e penal dos indivíduos infratores. Mas não é só. A imutabilidade dos direitos fundamentais também se expressa na interação com outros direitos igualmente relevantes. Vez por outra, contudo, a limitação do direito fundamental é ditada pela necessidade de se preservar a ordem pública ou qualquer outro bem coletivo que consagra valores constitucionalmente tutelados. “grifo nosso”
Joaquim Leitão Júnior (2010, p. 28) também explana:
Os direitos constitucionais e fundamentais da intimidade, dignidade da pessoa humana, privacidade e o direito de ir e vir não são absolutos e devem se curvar diante do princípio da segurança pública (reduzida também a direito constitucional social fundamental), da prevalência do direito a uma vida digna do cidadão de bem da sociedade frente ao interesse público individual, da dignidade da pessoa humana da vítima atingida pelo criminoso, etc.
Ministro Gilmar Mendes (2011, p. 45) ratifica as exposições feitas acima: ‘‘Não há, portanto, em princípio, que falar, entre nós, em direitos absolutos. Tanto outros direitos fundamentais como outros valores com sede constitucional podem limitá-los.’’
Um exemplo que aqui se faz coerente, para uma melhor compreensão do assunto, é o da prisão. Na prática, esta viola os direitos à intimidade e à privacidade do preso, porém, na teoria, como ela ocorre em prol da segurança pública, é constitucionalmente permitida, desde que seja legal, obedecendo preceitos constitucionais. Desta forma, o debate da utilização do monitoramento eletrônico e os princípios constitucionais é parecido com a análise da relação entre o monitoramento e tais princípios.
Segundo Alceu Corrêa Júnior (2014, p. 75):
Com efeito, a restrição ou limitação ao exercício de um direito fundamental deve ser sempre prevista em lei e respeitar o conteúdo essencial do referido direito, observando também o princípio da proporcionalidade, isto é, a restrição deve ser necessária e adequada à finalidade buscada, respondendo efetivamente aos objetivos de interesse geral pela necessidade de proteção dos direitos e liberdades de outros.
Assim, atendendo a tais requisitos formais e materiais, deve ser considerada válida e constitucional a prisão; diga-se, que restringe alguns dos direitos fundamentais, para que prevaleçam os interesses coletivos da ordem e segurança pública.
Porém, é necessário que a Lei de Execuções Penais também atinja seus objetivos legais, pois nada adianta manter um condenado preso sofrendo restrições aos seus direitos fundamentais, se ela, sequer, o ressocializa.
Felipe Caldeira afirma:
Outro fenômeno que merece atenção pela sociedade brasileira é a ineficácia da execução penal. Na verdade, da invalidade na aplicação da Lei nº.7.210/84 (Lei de Execução Penal – LEP) porque inconstitucional on its enforcement, tendo em vista não atender ao seu objetivo de promover a ressocialização do acusado de forma a permitir o seu convívio em sociedade (artigo 1º, da LEP), cujo fundamento constitucional reside no princípio da dignidade da pessoa humana (artigo 1º, inciso III, da CRFB/88).
Cabe ressaltar também, a grande importância do preenchimento de ambos os requisitos da prisão processual, na qual se deve respeitar, rigorosamente, o Princípio da Presunção de Inocência do réu, que ainda não fora condenado. Desta feita, mesmo que a utilização do monitoramento eletrônico seja significativamente menos drástica que a da prisão em si, necessário se faz seguir os mesmos pressupostos processuais e constitucionais.
Por outro lado, além da obediência à legislação vigente, bem como aos Princípios Constitucionais, deve-se levar em conta, também, as circunstâncias de cada caso concreto, sendo que alguns autores entendem que o monitoramento eletrônico somente é cabível se não houver medidas menos lesivas ou restritivas aos seus direitos fundamentais.
Para Escobar Marulanda (1997 apud CORRÊA JÚNIOR, 2014, p. 78), a intromissão na intimidade causada pela monitoração deve depender da imprescindibilidade da medida da fiscalização eletrônica, não sendo possível sua aplicação quando cabíveis outras medidas menos lesivas.
Porém, claro resta que o monitoramento eletrônico limitado, ou seja, aquele que ocorre somente em algumas horas diárias, é menos lesivo que o cumprimento da pena em um estabelecimento prisional. Para Alceu Corrêa Júnior (2014, p. 78):
Por outro lado, um monitoramento eletrônico limitado (algumas horas diárias) parece menos intrusivo que o cumprimento em estabelecimento penitenciário (Casa de Albergado), além de mais adequado para fins de reinserção social e segurança pública.
Por fim, verificadas as possibilidades e os requisitos necessários para existência de restrições e limitações de alguns direitos fundamentais, para que outros do mesmo “status” tenham eficácia, verificar-se-á a seguir um pouco mais sobre os direitos fundamentais e os argumentos acerca da constitucionalidade do monitoramento eletrônico de presos.
No entanto, vale frisar que os princípios constitucionais sofrem limitações quando há conflito com interesses de maior repercussão social, haja vista a proporcionalidade entre os bens jurídicos envolvidos.
Quando se refere ao monitoramento eletrônico, a partir do questionamento acerca de eventuais afrontas aos direitos fundamentais, consagrados pela Constituição Federal de 1988, o que, aparentemente não ocorre, em se comparando a medida com o cumprimento da pena privativa de liberdade dentro das unidades prisionais.
Cabível se faz a análise de alguns dos princípios constitucionais, os quais fazem com que o monitoramento eletrônico se torne mais polêmico e questionável no tocante a sua constitucionalidade, mediante argumentos e opiniões de diversos operadores do Direito.
Muitos juristas são contra o monitoramento eletrônico de presos, por acreditarem, “cegamente”, na violação do direito à intimidade. Todavia, conforme os ensinamentos de Rogério Greco, mais uma vez o cabimento da medida se demonstra favorável
Esse direito à intimidade deve ceder no caso concreto quando estivermos diante da possibilidade de monitoramento eletrônico. Na verdade, essa limitação ao direito à intimidade é levada a efeito em benefício do próprio condenado, uma vez que, sujeitando-se ao monitoramento eletrônico, ficará livre do ambiente pernicioso do cárcere. [...]
Assim, por mais que tenhamos que proteger o direito à intimidade daqueles que foram condenados pela Justiça Penal, entendemos que a submissão do autor da infração penal ao monitoramento eletrônico deve ser entendida em seu benefício, mesmo que venha a causar pequenos transtornos.
Mediante todo o exposto e considerando que a medida se faz cabível nas conformidades do binômio “necessidade e adequação”, e ainda não incide diretamente na intimidade do preso, bem como é aplicada somente mediante previsão legal, conclui-se que a monitoração eletrônica até mesmo favorece alguns dos aspectos da intimidade do preso, ao permitir seu convívio e manutenção das relações familiares, sexuais, dentre outras, colaborando, assim, para sua ressocialização, o que não ocorre com o cumprimento da pena privativa de liberdade dentro do estabelecimento prisional. (CORRÊA JÚNIOR, 2014, p. 80).
Deste modo, apesar da resistência de alguns juristas ao monitoramento eletrônico, pela alegação de inconstitucionalidade da medida mediante a violação da intimidade do preso, restou demonstrado que há também muitos argumentos favoráveis a sua constitucionalidade nessa esfera, sem apontar nenhuma afronta em questão.
A dignidade humana, além de ser um valor fundamental ou superior do Estado Democrático de Direito, é também um Direito Fundamental e, por isso, não absoluto, podendo ser limitado conforme a imprescindibilidade para proteção do interesse público. (CORRÊA JÚNIOR, 2014, p. 80).
Para Escobar Marulanda (2010, p. 31), é a soma das condições básicas de vida às oportunidades de satisfação de necessidades. Deste modo, visualizando o monitoramento eletrônico face à Dignidade da Pessoa Humana, questiona-se uma possível afronta, pelo fato da medida violar exatamente estes dois fatores.
Conforme o autor, a monitoração dá ciência a terceiros sobre as atividades e sensações de uma pessoa, afetando sua autonomia ética e diminuindo sua qualidade de vida. Contrariamente, a autora María Poza Cisneros (2012, p. 32) afirma que a medida potencializa a integridade do preso como ser social, se compará-la com o cumprimento de pena em estabelecimento prisional.
Alceu Corrêa Júnior (2014, p. 81) ressalta que, também em relação à intimidade, a limitação ao princípio da dignidade humana também deve ser proporcional a sua necessidade.
Por outro lado, diferentemente do princípio da intimidade, na dignidade humana “existe um limite intolerável inclusive se é voluntariamente admitido pelo titular do Direito” (LEITÃO JÚNIOR, 2010, p. 65).
Assim, indaga-se se o monitoramento eletrônico de presos não viola este limite de restrição à dignidade humana, ao se questionar sobre eventual condição vexatória que o preso venha a passar usando a tornozeleira, que o identifica como um delinquente. Este é o ponto polêmico do assunto, que conta com diversas opiniões a respeito.
Para Carlos Weis (2016, p. 145), a população carcerária é composta, em sua maioria, por pessoas de classe social menos favorecida e que, por conta disso, usam vestes mais simples, como bermudas e camisetas de manga curta, tornando totalmente visível o equipamento eletrônico.
Ademais, mesmo que utilizando roupas longas, o autor entende que ainda é possível a estigmatização do monitorado, por exemplo, ao tentar entrar numa agência bancária, passando pela porta giratória com detector de metais.
Assim, apesar de reconhecer que, com o avanço da tecnologia, hoje é possível a monitoração por equipamentos menores e mais discretos, Carlos Weis (2016, p. 145) acha arriscada a aplicação da medida, ao pensar na dignidade humana.
Neste sentido, levando-se em conta o tamanho dos aparatos eletrônicos, Pilar Otero González (2012, p. 162) afirma que a Dignidade Humana é afetada apenas secundariamente, além do que, o consentimento do monitorado também se refere ao tipo de aparato que ele usará em sua monitoração.
Citados por Alceu Corrêa Júnior (2014. p. 12), Iglesias Río e Péres Parente entendem que a “(...) medida é menos lesiva e mais humana que o cárcere onde, além dos portões e muros, também se instalam microfones e câmeras de vídeo em locais estratégicos”. O monitoramento eletrônico é mais vantajoso até nesse sentido, visto que sua invasão à intimidade e dignidade do cidadão preso é menor.
Os ditos autores afastam eventual lesão ao Direito Fundamental, afirmando que a medida tem natureza preventiva e ressocializadora, e não a finalidade de conduzir a uma culpabilidade.
A esse respeito, ensina a Desembargadora do TJRS, Dra. Lizete Andreis Sebben, por meio do julgado do Agravo em Execução Penal nº. 70059790519:
AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL. PRISÃO DOMICILIAR. MONITORAMENTO ELETRÔNICO. PRELIMINAR. A não determinação de abertura de vista dos autos para manifestação do órgão ministerial não acarreta ofensa ao art. 67 da Lei de Execução Penal, já que, no caso, o parquet oficiou no processo executivo. Ademais, na forma do que autoriza o art. 66, inciso VI, do mesmo Diploma Legal, o juiz pode conhecer de ofício questões que digam respeito ao cumprimento da pena e da medida de segurança, com o que resta desacolhida a prefacial suscitada. MÉRITO. As condições impostas ao apenado que está sob monitoramento eletrônico são condizentes com os objetivos da pena e permitem ao Estado a vigilância do detento 24 horas por dia. Ademais, o monitoramento eletrônico de apenados representa uma importante ferramenta de segurança pública, ao mesmo tempo em que permite ao reeducando a sua reinserção social, em harmonia com o princípio da dignidade humana. PRELIMINAR REJEITADA. RECURSO IMPROVIDO. POR MAIORIA.
Por fim, Joaquim Leitão Júnior (2010, p. 67) lembra que os Direitos Humanos não são apenas de titularidade dos presos, mas também das vítimas. Assim, conclui-se que, pelo fato dos Direitos Fundamentais sofrerem restrições em face do interesse coletivo, o monitoramento eletrônico de presos se torna eficaz por beneficiar, não só os presos, mas também, a sociedade como um todo, respeitando a Dignidade Humana coletiva.
Por derradeiro, aborda-se a questão do monitoramento eletrônico e suas controvérsias em relação ao Princípio da Liberdade. Não se pode dizer que a medida incida na liberdade de comoção em si, apesar de ser até recomendado que isso ocorra, para controle dessa limitação. (CORRÊA JÚNIOR, 2014, p. 86)
Cabe destacar que, ao mesmo tempo que a medida pode submeter o preso a um controle sistemático e intensivo, perceptível é que ela o devolve parcela da liberdade que não é encontrada dentro do presídio.
A respeito, explica Alceu Corrêa Júnior (2014, p. 86):
Assim, parece certo que o cumprimento da pena privativa de liberdade através do sistema de vigilância eletrônica permite um maior grau de liberdade de locomoção ao condenado, mesmo nos casos de regime aberto em que o condenado deveria permanecer períodos em estabelecimentos penitenciários.
Por outro lado, deve-se considerar também o benefício da medida quando aplicada na prisão domiciliar, pois a pena privativa de liberdade deixa de ser cumprida em cárcere, para assim ser feita em casa, junto a família, o que faz toda diferença para ressocialização do preso. A maior diferença entre o cumprimento da pena privativa de liberdade, dentro ou fora do presídio, é a aparência superficial, pois dá a sensação ao preso de que ele é livre.
Porém, vale lembrar que o Estado pode estar mais presente em sua vida, agora monitorada, do que no cárcere, onde ocorrem muitas omissões estatais. De qualquer maneira, o monitoramento eletrônico se mostrou positivo pelo fato de evitar problemas sociais, psicológicos e sexuais, geralmente associados à institucionalização da pessoa, além do que se torna mais coerente com a finalidade da execução penal, a qual, definitivamente, conclui-se não ser alcançada por meio do cárcere.
Ainda, não há que falar em monitoramento eletrônico de “soltos”, pelo fato do indivíduo que já se encontra no regime semiaberto ter que usar os aparatos fiscalizatórios, pois neste regime os apenados devem retornar para a Casa do Albergado à noite e durante os finais de semana, permanecendo, neste último caso, por período integral nele. Além do mais, conforme já visto, a vigilância eletrônica não é pressuposto para concessão do benefício da saída temporária, sendo aplicada apenas aos casos que a demandarem.
Não há muitos apontamentos contrários ao monitoramento eletrônico de presos, quando relacionado à liberdade deles. Com isso, verifica-se que a doutrina acata sua utilização, mesmo porque tal instrumento tecnológico é fundamental para a manutenção do preso em sociedade, garantindo sua ressocialização. E ainda: a utilização do monitoramento de presos é fundamental para auxiliar na solução do encarceramento desnecessário e da problemática do sistema penitenciário brasileiro.
A Casa de Prisão Provisória de Palmas teve a sua fundação em 24 de janeiro de 2002, e se localiza na estrada de saída para Aparecida do Rio Negro, no quilômetro 01, Zona Rural, cerca de dez quilômetros do centro da Capital. É cercada por paisagem do cerrado, o que faz com que queimadas se proliferam na época seca.
Considerando-se como ambiente externo da Casa de prisão Provisória de Palmas possuem uma extensa área de acesso largo e considerado livre, mas possui algumas limitações tais como cercados. Na entrada há uma pequena casa onde ficam os presos do regime semiaberto. Ao adentrar nesta área, reduzem-se drasticamente as árvores a fim de auxiliar na visibilidade de quem passa pela unidade e, caso haja alguma fuga, a captura dos reeducandos. Existem certas árvores frutíferas, como o cajuí, conforme se vê na estrada que dá acesso a parte administrativa da Unidade Prisional.
A Casa de Prisão tem capacidade para receber 260 presos, segundo dados da Secretaria da Defesa Social (órgão que administra os presídios do Estado) apesar de ter mais de quinhentos há mais de dois anos, os quais estão divididos entre os pavilhões “A” e “B”, os quais possuem cinquenta e seis celas comuns e 4 especiais, destinadas a presos ameaçados e que tenham praticado o crime de estupro, todas em média com aproximadamente dezesseis metros quadrados. A unidade não possui estrutura nem para atender a essa quantidade visto que possui infiltrações, calor, insetos, o que afeta o tratamento dos presos. Na data da verificação dos elementos da presente pesquisa, a Casa de Prisão Provisória de Palmas possuía um total superior a 600 reclusos, mais do dobro de sua capacidade.
Mediante todo o explanado constantemente nos veículos midiáticos do Estado d o Tocantins, verifica-se que a Casa de Prisão Provisória de Palmas, não diferente de outros presídios do país, sofre com graves problemas em seu sistema prisional, sendo o mais polêmico deles a superlotação dos estabelecimentos penais. A população carcerária brasileira, que hoje é uma das maiores do mundo, conta com a escassez de alimentos e condições de higiene pessoal para o preso, o que, de fato, degrada sua dignidade humana como pessoa, tornando, assim, a Lei de Execução Penal ineficaz.
Vale destacar, nesse sentido, que a superlotação, as péssimas condições na cela, as bactérias, os estupros, as agressões promovidas entre os presos, a falta de assistência jurídica, odontológica, psicossocial e médica também constituem em meios estatais de tortura. O Estado em sua inépcia poderia ser considerado, ao menos no plano sociológico, como o maior torturador das populações carcerárias (CABRAL, 2010).
Ante tal quadro, a Central de Monitoramento Eletrônico situada em Palmas do Tocantins (em local sob sigilo) é fundamental para aplacar o gradativo grau de superlotação carcerária na Casa de Prisão Provisória de Palmas. Logo, além de fins políticos, como é o do “desafogamento” do sistema prisional, a medida também veio como forma humanizada do cumprimento da pena, visando, acima de tudo, a humanização dos detentos. No cenário mundial, pode-se dizer que a medida tem como principal finalidade acabar com a superlotação dos presídios.
Assim, existem mais de 380 (trezentos e oitenta monitorados) em Palmas, Gurupi e Araguaína, todos municípios do Tocantins. Imagina-se que se não fosse decretado o uso de tornozeleiras eletrônicas, a maioria desses beneficiados estariam no sistema prisional, agravando o grau de superlotação, em especial da Casa de Prisão Provisória de Palmas. A medida ainda não se faz totalmente eficiente na questão do controle dos apenados bem como na diminuição da reincidência, haja vista que mais de 50% descumprem as medidas judicialmente impostas pelo uso de tornozeleiras. Como saldo negativo de tal realidade, observa-se nos veículos midiáticos que vários monitorados cometem crimes, voltando para as unidades prisionais quando o Poder Judiciário se depara com tais casos.
Conforme visto anteriormente, a medida em questão é aplicada aos presos que cumprem pena no regime semiaberto, nas saídas temporárias, ou àqueles que se encontram em prisão domiciliar ou processual – nesta, como medida cautelar.
Vários são os dispositivos eletrônicos capazes de efetivar o monitoramento eletrônico, tais quais: Tornozeleira, pulseira, cinto e até mesmo um microchip implantado no corpo humano, mas este ainda é passível de testes nos Estados Unidos e Inglaterra. (WEIS, 2016, p. 418). Em Palmas-TO, é utilizada a tornozeleira eletrônica.
Ademais, em casos de rompimento da tornozeleira, a empresa responsável pela monitoração, que não tem acesso à identidade do monitorado (usando apenas ao número de seu prontuário), aciona os Técnicos de Defesa Social da Central de Monitoramento de Palmas do Tocantins, os quais acompanham diuturnamente as ocorrências, sendo que tais profissionais identificam quem é o detento “fugitivo”, por meio do número da tornozeleira informado o Judiciário via E-Proc, para a decretação do competente Mandado de Regressão.
Como consequência disto, ou até mesmo de falta grave e descumprimento de outros deveres impostos pela decisão que concedeu a monitoração eletrônica, o preso, nos casos de saída temporária ou prisão domiciliar, tem seu benefício revogado, além de advertência expressa é possível regressão de regime.
A esse respeito, tal situação deverá ocorrer nos moldes dos incisos do parágrafo segundo, do artigo 146-C da Lei de Execuções Penais:
Art. 146-C. O condenado será instruído acerca dos cuidados que deverá adotar com o equipamento eletrônico e dos seguintes deveres: [...] Parágrafo único. A violação comprovada dos deveres previstos neste artigo poderá acarretar, a critério do juiz da execução, ouvidos o Ministério Público e a defesa: I - a regressão do regime; II - a revogação da autorização de saída temporária; III - (VETADO);IV - (VETADO); V - (VETADO); VI - a revogação da prisão domiciliar; VII - advertência, por escrito, para todos os casos em que o juiz da execução decida não aplicar alguma das medidas previstas nos incisos de I a VI deste parágrafo.
Tanto a revogação da autorização de saída, quanto a advertência escrita, são sanções aplicadas às violações de menor potencial ofensivo. Aquela, não implica na regressão de regime, podendo continuar o preso violador cumprindo sua pena no semiaberto. Por outro lado, a advertência expressa não significa que haja revogação dos benefícios da saída temporária ou da prisão domiciliar, nem tampouco o monitoramento eletrônico. (CORRÊA JÚNIOR, 2014, p. 95).
Porém, em se tratando de possível aplicação da medida para a prisão domiciliar do artigo 117 da LEP, cumpre destacar que a revogação da prisão não acarreta em regressão do regime aberto, logo, o condenado deve retornar à Casa do Albergado no período noturno e nos dias de folga. Todavia, destacando a possível hipótese de inexistência de Casa do Albergado no Estado de cumprimento da pena, o condenado continuaria a cumpri-la em domicílio, mas sem a aplicação do monitoramento (SOUZA, 2014, p. 214).
Logo, Alceu Corrêa Júnior (2014, 94-95) conclui que, ao descumprir algum dever imposto pelo Magistrado, o condenado sairia em vantagem, pois além de continuar cumprindo pena em sua residência, não estaria sendo monitorado. É o entendimento, tanto do Superior Tribunal de Justiça, quanto do Supremo Tribunal Federal: ‘‘
A jurisprudência deste STJ vem admitindo o cumprimento da pena no domicílio do réu, se já prova de que não existe Casa de Albergado ou local reservado com igual finalidade o qual, ainda que não seja o ideal, mas considerada a realidade do país, pode-se admitir como solução emergencial’’. Em Palmas- TO, em virtude da superlotação da Casa de Prisão Provisória, e considerando o caso concreto, o juiz corriqueiramente determina tal medida.
Nesse enfoque, situa-se às colocações de Rogério Greco, o qual ressalta que a tecnologia faz com que a pena seja devidamente aplicada:
Podemos, com a ajuda da tecnologia, fazer com que a pena, efetivamente, cumpra suas funções, sem que, para tanto, o homem seja retirado do seu meio social. Exemplo disso é o que ocorre com nossos filhos. Quando os corrigimos, não retiramos nossos filhos de casa, não os levamos a um local distante, fazendo com que fiquem isolados de seus irmãos. Na verdade, os colocamos em um lugar onde, embora dentro de sua própria casa, saberão que estarão privados de uma série de “direitos”, que lhe seriam naturais, caso não tivessem desobedecido a seus pais. O castigo, mesmo dentro de casa, funciona. Se retirássemos nossos filhos e os levássemos para um local fora do seu ambiente familiar, isso certamente os traumatizaria. É o que acontece com os presos que são retirados do seu meio social, e levados a conviver com pessoas estranhas, hostis, sem falar no fato de que passam a se isolar de seus familiares. A tecnologia é o presente. Ela já chegou e está à disposição de todos, para inúmeras finalidades. A cada dia se descobre algo novo, uma evolução que, certamente, deverá ser utilizada pelo Sistema Penal. (GRECO, 2010, p. 01).
Tendo o condenado atendido as condições objetivas e subjetivas para obter regime prisional aberto, mas não possuindo o estado a casa do albergado (haja vista que a Unidade de Semiaberto de Palmas-TO está inativa há meses), em estabelecimento que adequadamente possa substituí-la, deve ele ser colocado, então, em prisão domiciliar, como opção válida para que permaneça na mesma situação, mas sim possa iniciar seu processo de reintegração a sociedade podendo voltar ao trabalho, para seu sustento e de sua família.
Por outro lado, de todas as consequências, a mais severa é a regressão de regimes, aplicada para as faltas mais graves e que, além de revogar o benefício, se torna incompatível com o novo regime, o fechado.
A Constituição Federal de 1988 surge para sepultar de vez o regime de exceção. Nela se proíbe o tratamento desumano e se estabelecem garantias processuais aos que sofrem processos (tais como o devido processo legal e a ampla defesa).
O novo texto constitucional ainda restringe os poderes estatais garantindo ao indivíduo direitos primordiais para a sua ‘’dignidade’’ enquanto pessoa humana. A nova norma jurídica foi criada em observância aos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, do direito à vida, da integridade física, do respeito aos direitos humanos e aos ditames do Direito Internacional no que tange ao tratamento de pessoas presas.
Foi um grande salto do legislador no que tange a questão. A Lei de Execução Penal(LEP), como é conhecida a Lei n° 7.210, de 11 de julho de 1984, surgiu com o fito de instituir a execução penal no país. Em linhas gerais, consiste na lei do sistema penitenciário. Essa norma estabelece o regime de progressão de penas, as condições das cadeias e presídios, os direitos e deveres dos presos entre outras questões correlatas.
Por esta razão é que, nos últimos anos, iniciou-se uma busca por alternativas à prisão provisória e definitiva, a fim de diminuir o número de presos encarcerados e dar àqueles que, por diversas condições não fazem jus ao benefício, condições mínimas e dignas para o cumprimento da pena imposta. Com a frutífera repercussão, o Brasil então deu início aos trabalhos, iniciados legalmente na Paraíba e, que hoje, ocorrem em muitos de seus Estados. Inclusive no Tocantins, tal utilização está em fase de implementação.
Todavia, cabe ressaltar que a medida ainda demanda muitos estudos e pesquisas, bem como o saneamento de dificuldades e obstáculos encontrados nas regiões brasileiras, como aqueles relacionados às questões sociais, econômicas, estruturais, geográficas, dentre outras.
No tocante a sua constitucionalidade, o presente trabalho não teve, em nenhum momento, a intenção de questionar os posicionamentos contrários e favoráveis ao monitoramento eletrônico de presos.
Observou-se, posicionamentos contrários. Por outro lado, muitos outros operadores do Direito se posiciona totalmente a favor do método, defendendo a tese de não violação dos referidos princípios, pois a medida dá ao preso condições de ressocialização e humanização, por meio de uma suposta liberdade vigiada, além de diminuir o índice de reincidência em crimes.
Neste sentido, cabe ressaltar que não somente os presos monitorados são beneficiados com a medida, uma vez que os presos do regime fechado também são beneficiados, ainda que indiretamente, com a consequente diminuição do número de presos nas celas.
Conclui-se então que, com a possibilidade de restrição e limitação dos direitos fundamentais, bem como observados o binômio da “necessidade e adequação” e a presença do Princípio da Proporcionalidade na aplicação da medida, não há que se falar na violação dos direitos fundamentais. Pelo contrário: Ela apenas é válida, pois indubitável restou que a medida, se comparada com o sistema prisional, tem uma harmonia bem maior com os princípios constitucionais.
Assim, dando continuidade à aplicação da medida pelo país, de forma com que se invista na aquisição de um número maior de equipamentos eletrônicos e na edificação de centrais de monitoramento, o Brasil tem grandes chances de alcançar o nível internacional de sucesso do monitoramento eletrônico de presos, solucionando, quiçá, o problema da superlotação dos estabelecimentos prisionais, sem parecer violar, em nenhum momento, a Carta Magna. Observa-se ainda que o monitoramento eletrônico está se consolidando no País sendo utilizado, por exemplo, por alguns presos da Operação Lava Jato.
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[1] Professora do curso de Direito da Faculdade Serra do Carmo, [email protected]
Bacharelando do Curso de Direito da Faculdade Serra do Carmo.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, Alexandre Barbosa da. Monitoramento eletrônico: análise quanto à sua aplicabilidade Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 08 dez 2017, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/51116/monitoramento-eletronico-analise-quanto-a-sua-aplicabilidade. Acesso em: 23 dez 2024.
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