Resumo: O artigo analisa comparativamente a postura legal adotada na américa latina frente a problemática do feminicídio. Após uma análise ampla do continente, são estudados os casos chileno e mexicano.
Palavras-chave: Feminicídio; América Latina; México; Chile
Sumário: 1 – Introdução, 2 – A legislação anti-feminicídio na américa latina como um fenômeno recente, 3 – Análise individual, 3.1 – Chile, 3.2 – México, 4 – Conclusão, 5 - Bibliografia
1 - Introdução
A Assembleia das Nações Unidas reconheceu, em dezembro de 1993, a necessidade da concreta e real aplicação universal às mulheres dos direitos já entendidos como pertencentes à todo ser humano. Na resolução, a organização explicitou que “a efetiva aplicação da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres contribuirá para a eliminação da violência contra as mulheres” (1993). Certamente, destaca-se como a mais severa violência contra a mulher o feminicídio.
O termo feminicídio possui diversas concepções variando ligeiramente a depender da cultura e do país em que se está inserido. O legislador brasileiro definiu como o “homicídio contra mulher por razões da condição de sexo feminino” (BRASIL, 2015). Este conceito assemelha-se, bastante, com a primeira definição formulada sobre o assunto pela feminista sul-africana Diana Russel. Embora a autora utiliza-se o termo femicídio, ela o definiu como:
Es el asesinato de mujeres realizado por hombres motivado por el odio, el desprecio, el placer o por un sentido de propiedad sobre las mujeres.(ALBARRAN, 2015)
A fim de possibilitar a análise aqui pretendida, consideraremos feminicídio como sendo o assassinato de uma mulher por ser mulher.
A partir da definição do termo central desse artigo, pode-se passar para a análise que aqui se pretende realizar. Esta é: a abordagem legal, em uma perspectiva comparada, que tem sido tomada na América Latina frente a esse latente problema social.
Delimita-se como campo de estudo a América Latina, pois é inegável a frequente sincronia entre os países a ela pertencentes historicamente. Essa similitude, contudo, não exclui as peculiaridades de cada nação, possibilitando, destarte, uma análise da legislação anti-feminicído em contextos semelhantes, mas sobre algumas variáveis diversas. Isso pode, possivelmente, levantar novas questões ou respostas quanto ao tema para os países latino-americanos.
Há de se esclarecer que este artigo não tem como pretensão exaurir a possibilidade de estudo da legislação anti-feminicídio na América Latina. Com efeito, pretende, ao contrário, demonstrar a importância e a relevância do estudo comparado para este tópico, principalmente se utilizando a América Latina como campo de estudo.
2 – A legislação anti-feminicídio na américa latina como um fenômeno recente
O primeiro fato a se destacar é que, embora a cultura de ofensa e desrespeito ao gênero feminino seja secular e enraizada no contexto latino-americano, somente 15 países possuem previsão legal quanto ao feminicídio. Além disso, o primeiro país a criminaliza-lo, a Costa Rica, somente o fez em maio de 2007 (LEGISLAÇÕES... 2015).
Nota-se, ainda, que embora as legislações sejam recentes, algumas preveem penas bastantes elevadas para o crime. Na argentina aplica-se prisão ou reclusão perpétua, na Bolívia há pena de 30 anos de prisão, no Chile, aplica-se a prisão perpétua qualificada, na Colômbia são previstos de 33 a 50 anos de prisão, em Honduras e na República Dominicana, de 30 a 40 anos de prisão e no México, são 40 a 60 anos de prisão (LEGISLAÇÕES... 2015).
Nota-se, portanto que o Brasil é uma exceção dentre seus países vizinhos. Na legislação brasileira, o feminicídio somente configura uma agravante do tipo de homicídio qualificado. Não se trata, portanto de um tipo próprio. Além disso, a lei 13.104, que criou a agravante e a incluiu no Código Penal, somente foi editada em março de 2015, posicionando o Brasil como o mais recente país da América Latina a incluir o feminicídio em sua legislação (LEGISLAÇÕES... 2015).
3 – Análise individual
Analisaremos, agora, como é mais detalhadamente tratado o feminicídio em dois países latino americanos a fim de demonstrar que uma simples observação das penas não é suficiente para demonstrar como o problema está sendo tratado. Muito embora, ao se analisar as penas haja a impressão de que o legislador passou a se preocupar seriamente com o problema e esteja se esforçando para barra-lo, isto não é uma verdade necessária.
3.1 – Chile
O Código Penal chileno prevê o feminicídio como uma agravante, que eleva a pena à prisão perpétua qualificada. No entanto, ela “contempla apenas os crimes cometidos por companheiros e ex-companheiros, ou pelo pai de um filho da vítima.” (MONTES, 2016).
Como consequência dessa limitação, diversos crimes motivados por questão de gênero (configurando feminicídio de fato) não tem sido punidos adequadamente, por terem sido praticados por namorados, ou desconhecidos, por exemplo. O recente caso da estudante Alison Calderón encontrada enterrada no pátio do colégio onde estudava, renovou os debates sobre o assunto no país (MONTES, 2016).
3.2 – México
No México, a legislação prevê como feminicídio a privação de uma mulher da vida por razões de gênero, adotando uma noção bem ampla para a expressão “razões de gênero”. A lei considera que há razões de gênero, no crime, sempre que a vítima apresentar sinais de violência sexual, quando existirem históricos de violência do autor contra a vítima, entre outros casos (MÉXICO, 2012).
A lei penal mexicana, claramente trata o assunto de forma mais séria do que a chilena, buscando realmente abranger todos os casos de feminicídio de fato. Nota-se, contudo, que a aplicação da lei não parece ocorrer de forma adequada. O Observatório Nacional Cidadão de Feminicídio indica que seis mulheres são mortas por dia no país. Além disso, somente 1,6% dos casos ocorridos entre 2012 e 2013 resultaram em condenação (MUNDI, 2015).
4 - Conclusão
Como afirmado anteriormente, este artigo não pretende esgotar o assunto, mas somente demonstrar a necessidade de se analisar o feminicídio e sua criminalização a partir de uma perspectiva comparada. A análise dos efeitos concretos da previsão legal desse grave problema social bem como das variações nos textos que o preveem demonstram que não há somente uma forma de aborda-lo e talvez possa indicar um método mais efetivo que os demais.
Faz-se mister alertar, contudo, que não se pode ignorar, contudo, as peculiaridades do contexto onde a lei estará inserida, tal como ficou evidenciado pelo caso mexicano, em que a lei, embora bem estruturada, não é adequadamente aplicada. O estudo comparado do Direito, é uma ferramenta que pode indicar caminhos, mas jamais pode ser interpretado ingenuamente, desconsiderando-se o contexto normativo e social em que a legislação em análise está inserida. É necessário, portanto, realizar um estudo mais abrangente e detalhado sobre o assunto abarcando mais países e mais dados a fim de se alcançar um estudo denso o suficiente que possa apontar uma provável solução.
5 - Bibliografia
ALBARRAN, Jenny.Referentes conceptuales sobre femicidio / feminicidio: Su incorporación en la normativa jurídica Venezolana. Comunidad y Salud [online]. 2015, vol.13, n.2, pp. 75-80. ISSN 1690-3293.
ASSEMBLEIA GERAL DAS NAÇÕES UNIDAS. Declaração Sobre A Eliminação Da Violência Contra As Mulheres. 1993. Disponível em: . Acesso em: 09 out. 2016.
BRASIL. Altera o art. 121 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, para prever o feminicídio como circunstância qualificadora do crime de homicídio, e o art. 1o da Lei no 8.072, de 25 de julho de 1990, para incluir o feminicídio no rol dos crimes hediondos. Lei do Feminicídio. Brasília, DF, 09 out. 2015.
LEGISLAÇÕES da América Latina que penalizam o feminicídio. 2015. Disponível em: . Acesso em: 08 out. 2016.
MEXICO. Lei nº D.O.F., de 14 de junho de 2012. Código Penal Federal. Ciudad de Mexico, 14 jun. 2012.
MONTES, RocÍo. Chile não consegue conter feminicídios: A morte de 12 mulheres só este ano revela um problema até agora invisível e leis fracas. 2016. Disponível em: . Acesso em: 09 out. 2016.
PÉREZ, D. Marcial; GÓMEZ-ROBLEDO, M.. Mais de 100 mulheres ao ano são assassinadas na Cidade do México: O homicídio de quatro mulheres na capital mexicana retrata um doloroso problema do país. 2015. Disponível em: . Acesso em: 09 out. 2016.
Estudande de graduação pela Universidade de Brasília - UNB
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: DIAS, Fábio Mattos Leal. A Legislação Anti-Feminicídio na América Latina Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 09 fev 2018, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/51325/a-legislacao-anti-feminicidio-na-america-latina. Acesso em: 23 dez 2024.
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