1 O INSTITUTO DA ESTABILIZAÇÃO DA TUTELA ANTECIPADA ANTECEDENTE
Umas das maiores inovações do novo Código de Processo Civil de 2015 foi o instituto da estabilização da tutela antecipada antecedente, previsto nos artigos 303 e 304 da referida legislação.
O diploma processual em vigor dispõe que a tutela antecipada concedida nos termos do artigo 303, leia-se, tutela antecipada requerida em caráter antecedente, se torna estável se não for interposto o respectivo recurso contra a decisão que a conceder.
Assim, o CPC/15 estabelece que a tutela antecipada satisfativa requerida de forma antecedente ao pedido principal, uma vez concedida pelo órgão jurisdicional, se estabilize e sobreviva como decisão judicial idônea a regular a crise de direito material, sem que seja necessário se interpor um processo principal de cognição exauriente para discutir a matéria.
Tornando-se estável, a tutela antecipada antecedente, o processo se extinguirá e a tutela de urgência continuará a produzir seus efeitos concretos enquanto não revista, reformada ou invalidada por decisão de mérito. Entretanto, se contra a decisão que concede a medida de urgência antecipada não for interposto recurso, mais especificamente um agravo de instrumento, conforme assevera o art. 1015, I, CPC, esta não tornar-se-á estável.
Ao ser extinto o processo pelo qual houve a concessão da medida satisfativa antecedente objeto de estabilização, desejando a parte - qualquer das partes poderá demandar, nos termos do 304, § 2º, CPC/15 - obter rediscussão sobre a questão, esta não ocorrerá no mesmo processo, sendo necessário que seja interposta uma nova ação, onde o autor desta requererá que a decisão que concedeu a referida medida, seja revista, reformada ou invalidada.
A nova demanda interposta com o intuito de rever, reformar ou invalidar a tutela antecipada estável deverá ser interposta no lapso temporal de dois anos, contados da ciência da decisão que extinguiu o processo, tal como estabelece o artigo 304, § 6º, do CPC/15. Note-se ainda que, neste caso, o juízo competente para processar tal feito será o mesmo que proferiu a tutela estabilizada, contemplando a legislação processual em vigor, uma hipótese de competência absoluta prevista no § 4º, do dispositivo outrora mencionado.
Deste modo, a principal finalidade do mecanismo da estabilização da tutela antecipada requerida em caráter antecedente seria o de conservar os resultados práticos auferidos pela medida de urgência, diante da inércia do réu, na busca de uma prestação jurisdicional mais efetiva e célere, na medida em que confere às partes a faculdade de se conformar com a decisão que concede a tutela antecipada antecedente, não mais se valendo de um processo de cognição exauriente, materializando uma gama de valores constitucionais como a ampliação do acesso à justiça, a duração razoável do processo e a primazia do julgamento de mérito.
2 O QUE SE ENTENTE POR NEGÓCIOS JURÍDICOS PROCESSUAIS
Mais uma vez visando a promoção da eficiência e celeridade processual, o Novo Código de Processo Civil regulamentou mais uma no ordenamento jurídico brasileiro, o instituto chamado Negócio Jurídico Processual.
A bem da verdade, o negócio jurídico processual não é integralmente uma novidade visto que, já no Código de Processo de 73, existiam algumas passagens que o consubstanciava expressamente. Ocorre que, com o advento do CPC/15 tal mecanismo fora aprimorado e alargado.
Pois bem, entende-se por negócios jurídicos processuais é um instituto que possibilita às partes o poder de moldar determinadas situações jurídicas processuais na medida em que, poderá escolher o regramento jurídico que lhe for conveniente em determinado caso, desde que não ultrapasse os limites fixados pela ordem jurídica.
A título de exemplo, o mais comum inclusive, tem-se a cláusula de eleição de foro, prevista no art. 63 do CPC, que confere aos sujeitos a faculdade de alterar o foro competente para julgar a lide anteriormente à interposição da demanda, ou seja, as partes elegem expressamente e de forma escrita o foro - e não o juízo – em que será interposta a ação, prorrogando-se voluntariamente a competência.
Mas não é só, existem uma série de negócios processuais consubstanciados na legislação processual em vigor, como a convenção de redistribuição do ônus da prova (art. 373, § 3º), convenção de arbitragem (art.3º, § 1º), a escolha consensual do perito (art. 471), negócio tácito para que a causa tramite em juízo relativamente incompetente (art. 65), adiamento negociado da audiência (art. 362, I), convenção entre os litisconsortes para dividir entre si o tempo das alegações finais orais em audiência (art. 364, § 1º), dentre outros.
Os negócios processuais outrora mencionados são os chamados típicos uma vez que, são previstos expressamente em lei, mas o art. 190, do CPC/15, confere também a possibilidade de celebração de negócios processuais atípicos.
O referido dispositivo estabelece uma clausula geral de negociação do processo, onde autoriza que os sujeitos processuais estabeleçam determinadas alterações no procedimento, acordando sobre faculdades, deveres, poderes e ônus, com a condição de que sejam as partes capazes e, evidentemente que a causa objeto de convenção trate-se de direito que permita a autocomposição.
Registre-se que, o negócio processual pode ser feito antes ou durante o processo e, não pode versar sobre os poderes e deveres do magistrado já que os sujeitos não titularizam tais posições processuais além do que, colocaria em risco a possibilidade de que o juiz emitisse uma tutela jurisdicional adequada, justa e em consonância com o ordenamento jurídico.
É neste viés, inclusive, que ao juiz é outorgado o dever de que fiscalize a regularidade do acordo celebrado pelas partes, a requerimento de uma delas ou ex oficio, podendo não permitir a aplicação do negócio ou até mesmo vir a anulá-lo, caso entenda que uma das partes se tornou extremamente vulnerável, que houve vícios sociais, do consentimento ou simulação, ou que não fora preenchido os requisitos formais exigidos – gerais, previsto no art. 104 CC e específicos previsto no art. 190, caput, do CPC/15.
3 NEGÓCIO JURÍDICO PROCESSUAL VERSANDO SOBRE A ESTABILIZAÇÃO DA TUTELA ANTECIPADA ANTECEDENTE
O dispositivo 190 do CPC/15 ao versar sobre os negócios jurídicos processuais, regulamenta-o de forma bem genérica, instituindo a bem da verdade, uma cláusula geral de atipicidade de negócios jurídicos processuais, gerando por sua vez, dúvidas acerca da extensão do seu objeto, já que as partes possuem a faculdade de celebrar negócios não previamente estabelecidos pelo legislador.
Tal como fora dito, segundo o Código de Processo Civil, a tutela antecipada antecedente se estabiliza com a não insurgência da parte contra a decisão que a concede. Deste modo, questiona-se a possibilidade de ocorrer a estabilização da tutela de urgência em virtude do estabelecimento de um negócio jurídico processual ente as partes.
Pois bem, prevalece que não há óbice de haver negociação processual acerca do fenômeno da estabilização da tutela de urgência, na esteira que um dos principais objetivos do CPC/15, foi privilegiar o auto regramento da vontade das partes, permitindo que alterem o procedimento da maneira de como lhe for conveniente, uma vez cumpridos seus requisitos e não atinja a ordem pública.
Assim, as partes poderiam estabelecer a referida convenção com o intuito, por exemplo, de convencionar outras hipóteses além das já prevista em lei, para que ocorra o fenômeno da estabilização da tutela antecipada antecedente ou realizar a convenção especificando outros meios processuais cabíveis destinado à evitar o fenômeno da estabilização.
Neste diapasão, são os ensinamentos de Redondo (2015):
Tampouco há impedimento para a celebração de negócio processual destinado a modificar o regime da tutela antecedente. No caso da tutela antecipada, podem as partes alterar o regime de estabilização, convencionando no sentido do descabimento integral da estabilização apesar da inexistência de impugnação pelo réu. É possível, ainda, convenção para indicar as espécies de atos de resistência (apenas o agravo de instrumento somente a contestação exclusão da reconvenção etc.) que são capazes de impedir a formação da estabilidade.
Há quem sustente ainda, a possibilidade de utilizar a medida para rechaçar a estabilização da tutela antecipada antecedente, aduzindo simplificar a marcha uma vez que inibiria a interposição de recursos, atendendo aos princípios da economia processual, duração razoável do processo e primazia do julgamento do mérito.
Do mesmo modo, caberia a utilização do negócio jurídico processual para alterar o lapso temporal de dois anos estabelecido para que seja interposta a ação de modificação da tutela estável, desde que não ultrapasse o limite temporal prescricional ou decadencial consubstanciado na lei referente ao direito objeto de convenção.
Em consonância com o exposto, assevera o Enunciado 32 do Fórum Permanente de Processualistas Civis, que além das hipóteses prevista no art. 304, é possível a estabilização expressamente negociada da tutela antecipada de urgência antecedente.
REFERÊNCIAS
DIDIER JR., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael Alexandria. Curso de Direito Processual Civil. 12.ed. Salvador: Juspodivm, 2017.
MASCARENHAS, Caio Gama. Negócio Jurídico Processual – um instrumento alternativo contra a estabilização da tutela antecipada do CPC/2015. Mato Grosso do Sul. Disponível em: . Acesso em: 11 fev.2018.
NEVES, Daniel Amorim Assunção. Manual de Direito Processual Civil. 8.ed. v.único. Salvador: Juspodivm, 2016.
REDONDO, Bruno Garcia. Estabilização, Modificação e Negociação da Tutela de urgência antecipada antecedente: principais controvérsias. Coordenação: Teresa Arruda Alvim Wambier. Revista de Processo. Ano 40, v.244. São Paulo: Revista dos Tribunais Ltda., jun.2015.
Advogada.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ARAUJO, Illa Karla Ramos. Negócio jurídico processual e estabilização da tutela antecipada antecedente Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 03 abr 2018, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/51508/negocio-juridico-processual-e-estabilizacao-da-tutela-antecipada-antecedente. Acesso em: 23 dez 2024.
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