RESUMO: O sequestro é medida assecuratória de natureza patrimonial que visa a garantir o ressarcimento do prejuízo causado pelo delito e, por conseguinte, a efetividade do processo penal. O presente artigo analisa as diferenças existentes entre o sequestro previsto no Decreto-lei nº 3.689/1941 (CPP) e o descrito no Decreto-lei nº 3.240/41 e aborda o entendimento jurisprudencial sobre a não revogação do segundo pelo primeiro, por força do princípio da especialidade.
SUMÁRIO: 1. Introdução; 2. Do sequestro previsto no capítulo VI do Código de Processo Penal (Decreto-lei nº 3.689/1941); 3. Do sequestro previsto no Decreto-lei nº 3.240/41; 4. Das diferenças entre o sequestro previsto no CPP e o previsto no Decreto-lei nº 3.240/41 e da coexistência dos institutos à luz da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça; 5. Conclusão; 6. Referências.
Palavras-chaves: Direito Processual Penal; medida assecuratória; sequestro; ressarcimento; Fazenda Pública; especialidade.
1. INTRODUÇÃO
As medidas assecuratórias no processo penal buscam garantir o ressarcimento pecuniário da vítima em face do delito ocorrido e impedem o locupletamento ilícito do criminoso. Segundo Nestor Távora e Rosmar Antonni, “tais medidas têm caráter de instrumentalidade e se destinam a evitar o prejuízo que adviria da demora na conclusão da ação penal”.
As medidas assecuratórias encontram-se previstas no Capítulo VI do CPP e dividem-se em sequestro, hipoteca legal e arresto. Há, ainda, previsões específicas no Decreto-lei nº 3.240/41, na Lei nº 9.613/98 (lavagem de capitais) e na Lei nº 11.343/2006 (lei de drogas). Este artigo, entretanto, limitar-se-á a fazer um cotejo entre o sequestro previsto no CPP e o tipificado no Decreto-lei nº 3.240/41.
Hodiernamente, observa-se o crescimento da criminalidade relacionada à corrupção e à movimentação irregular de recursos (crimes licitatórios, lavagem de capitais, peculato, etc.), bem como com o aprimoramento e a sofisticação do modus operandi empregado pelos agentes criminosos. Nesse contexto, as medidas assecuratórias ganham papel de destaque no cenário jurídico nacional, uma vez que, em delitos dessa natureza, revelar-se-ia inócua apenas a imposição de pena privativa de liberdade, sem a recuperação dos bens obtidos de modo ilegal e a obtenção do ressarcimento ao erário. Nesse sentido, Eugênio Pacelli e Douglas Fischer asseveram que com as medidas assecuratórias “pretende-se também a afirmação da efetividade do processo penal, fora do âmbito da imposição da pena privativa da liberdade e/ou de medidas cautelares de natureza pessoal”.
Especificamente quanto à cautelar patrimonial objeto do presente artigo, o sequestro descrito no Decreto-lei nº 3.240/41 possui contornos próprios e aplica-se aos delitos dos quais resulta prejuízo para a Fazenda Pública. Após a edição desse diploma normativo, foi publicado o Decreto-lei 3.689/1941 (CPP), que também prevê, entre seus arts. 125 e 133, a figura do sequestro.
Serão analisadas, a seguir, as características principais das referidas modalidades de sequestro, suas diferenças, a discussão sobre a revogação do sequestro previsto no Decreto-lei nº 3.240/41 pelo CPP, que lhe é posterior, e o posicionamento jurisprudencial sobre a matéria.
2. DO SEQUESTRO PREVISTO NO CAPÍTULO VI DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL (DECRETO-LEI Nº 3.689/1941)
O art. 125 do CPP assevera que caberá o sequestro dos bens imóveis, adquiridos pelo indiciado com os proventos da infração, ainda que já tenham sido transferidos a terceiro. O art. 126, por sua vez, é claro ao determinar que, para a decretação do sequestro, bastará a existência de indícios veementes da proveniência ilícita dos bens. A medida também se aplica aos bens móveis, desde que igualmente presentes indícios de sua proveniência clandestina, na forma do art. 132 do CPP.
Magalhães Noronha define o sequestro do art. 125 do CPP como a “retenção judicial de bem móvel ou imóvel havido com os proventos da infração, com o fim de assegurar as obrigações civis advindas deste”.
Acerca dos objetivos perseguidos com a decretação da referida medida cautelar patrimonial, leciona Renato Brasileiro que:
“Cuida-se de medida assecuratória da competência do juízo penal, que visa assegurar a indisponibilidade dos bens imóveis ou móveis adquiridos pelo agente com o proveito extraído da infração penal, permitindo, assim, a operacionalização dos dois efeitos extrapenais da sentença condenatória transitada em julgado: reparação do dano causado pelo delito e perda do produto do crime ou de qualquer bem ou valor que constitua proveito auferido pelo agente com a prática do fato criminoso (CP, art. 91, I e 11, "b").”
Como se viu, o art. 126 do CPP estabelece que é requisito indispensável à decretação dessa medida cautelar a existência de “indícios veementes da proveniência ilícita”. Por indícios veementes, deve-se compreender aqueles que estão acima dos meros indícios e de elementos circunstancias e abaixo da convicção exauriente. Nesse particular, Fernando Capez leciona que “podemos entender como tal a probabilidade séria de que o bem tenha proveniência ilícita”, ao passo em que, para Mirabete, indícios veementes são “os que levam grave suspeita, os que eloquentemente apontam um fato, gerando uma suposição vizinha da certeza, embora não plena da ilicitude”.
O sequestro em questão possui a característica de referibilidade, é dizer, somente pode recair sobre os bens obtidos pela prática do crime objeto do inquérito ou da ação penal em que decretada a medida. Assim, ainda que o investigado ou réu possua em seu patrimônio outros bens amealhados ilicitamente, oriundos de delitos diversos, não relacionados ao objeto da investigação ou da ação penal, sobre esses bens não poderá incidir o sequestro previsto nos arts. 125 a 132 do CPP. Nesse sentido, confiram-se as lições de Gustavo Badaró:
“Sendo o sequestro, como toda medida cautelar, um instrumento destinado a assegurar a utilidade e a eficácia de uma provável sentença penal condenatória, somente poderá incidir sobre bens que tenham relação com o próprio crime objeto da investigação ou da ação penal. Caso contrário, não haverá referibibilidade, o que é uma nota característica das medidas cautelares. Não se pode sequestrar bens que, ainda que integrem o patrimônio ilícito do acusado, tenham sido obtidos pela prática de um crime diverso daquele que é objeto do inquérito policial ou da ação penal em que se requereu a medida cautelar.”
Observa-se, pois, que é característica marcante do sequestro previsto no CPP que a medida recaia sobre bens imóveis ou móveis adquiridos pelo investigado ou acusado com os proventos da infração.
3. DO SEQUESTRO PREVISTO NO DECRETO-LEI Nº 3.240/41
O Decreto-lei nº 3.240/41, a seu turno, sujeita a sequestro os bens de pessoas indiciadas por crimes de que resulta prejuízo para a Fazenda Pública.
Esse sequestro, portanto, possui âmbito de incidência mais restrito do que a cautelar patrimonial prevista nos arts. 125 a 132 do CPP, a qual é aplicável em caso de delitos que causem ou não prejuízo ao erário.
O Decreto-lei nº 3.240/41 é usualmente utilizado em investigações relacionadas ao combate à corrupção, no enfrentamento de delitos licitatórios (arts. 89 a 98 da Lei nº 8.666/93), de organização criminosa (art. 2º da Lei nº 12.850/2013), peculato, corrupção ativa e passiva (arts. 312, 333 e 317 do Código Penal), de lavagem de capitais (art. 1º da Lei nº 9.613/98) e crimes contra a ordem tributária (Lei nº 8.137/90). Em razão da importância para a compreensão da extensão da medida, deve-se conferir os principais dispositivos do Decreto-lei nº 3.240/41:
“Art. 1º Ficam sujeitos a sequestro os bens de pessoa indiciada por crime de que resulta prejuízo para a fazenda pública, ou por crime definido no Livro II, Títulos V, VI e VII da Consolidação das Leis Penais desde que dele resulte locupletamento ilícito para o indiciado.
Art. 2º O sequestro é decretado pela autoridade judiciária, sem audiência da parte, a requerimento do ministério público fundado em representação da autoridade incumbida do processo administrativo ou do inquérito policial.
§ 1º A ação penal terá início dentro de noventa dias contados da decretação do sequestro.
§ 2º O sequestro só pode ser embargado por terceiros.
Art. 3º Para a decretação do sequestro é necessário que haja indícios veementes da responsabilidade, os quais serão comunicados ao juiz em segredo, por escrito ou por declarações orais reduzidas a termo, e com indicação dos bens que devam ser objeto da medida.
Art. 4º O sequestro pode recair sobre todos os bens do indiciado, e compreender os bens em poder de terceiros desde que estes os tenham adquirido dolosamente, ou com culpa grave.
Os bens doados após a pratica do crime serão sempre compreendidos no sequestro.”
O Decreto-lei nº 3.240/41 confere um tratamento específico e mais rígido aos acusados de delitos contra a Fazenda, com o objetivo de tutelar de forma mais efetiva o patrimônio público e, por conseguinte, o interesse de toda a coletividade atingida por delitos perpetrados contra o erário.
Com efeito, para a decretação da medida cautelar de sequestro com base no Decreto-lei nº 3.240/41, basta que haja indícios veementes da responsabilidade do investigado pelo cometimento de delitos contra a Fazenda Pública, não havendo qualquer exigência legal acerca da proveniência ilícita dos bens constritos.
4. DAS DIFERENÇAS ENTRE O SEQUESTRO PREVISTO NO CPP E O PREVISTO NO DECRETO-LEI Nº 3.240/1941 E DA COEXISTÊNCIA DOS INSTITUTOS À LUZ DA JURISPRUDÊNCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
O sequestro determinado com base no Decreto-lei nº 3.240/41 possui um regime próprio para a constrição de bens de pessoas indiciadas ou denunciadas pelo cometimento de delitos que implicaram prejuízo à Fazenda Pública, sistemática essa que não se confunde com a prevista para o sequestro nos arts. 125 a 133 do CPP.
De fato, o art. 126 do CPP determina que “para a decretação do sequestro, bastará a existência de indícios veementes da proveniência ilícita dos bens”. Dessa forma, os bens sequestrados com esteio no CPP devem ter origem ilícita, de sorte que esse sequestro se limita aos bens adquiridos após o cometimento do delito.
De outro lado, o art. 4º do Decreto-lei nº 3.240/41 estabelece que “o sequestro pode recair sobre todos os bens do indiciado, e compreender os bens em poder de terceiros desde que estes os tenham adquirido dolosamente, ou com culpa grave”. Destarte, para a aplicação do Decreto-lei nº 3.2401/41, mostra-se necessária, apenas, a existência de indícios da prática de crimes contra a Fazenda Pública, com a ocorrência de dano patrimonial, não havendo que se perquirir acerca da origem lícita ou ilícita dos bens constritos. Sobre o regime mais severo previsto no Decreto-lei nº 3.240/41, Pacceli e Fischer observam que:
“Há uma velha legislação nacional (...) dirigida para a proteção dos direitos da Fazenda Pública, contra a dissipação de patrimônio de autores de infrações penais praticados contra ela, de cujo resultado tenha implicado locupletamento sem causa (ilícito) ao seu autor. Para o sequestro em tais situações, exigem-se apenas os indícios de da prática de crimes contra a Fazenda, permitindo-se a apreensão (por sequestro) de tantos bens quantos sejam suficientes para reparar o dano. Não se exige que a coisa tenha sido adquirida com proventos do crime, como ocorre no CPP.”
Além disso, a medida cautelar do Decreto-lei nº 3.240/41 pode ser determinada em face de bens adquiridos antes ou depois da prática criminosa, uma vez que o mencionado art. 4º é explícito ao afirmar que “o sequestro pode recair sobre todos os bens do indiciado”.
O Decreto-lei nº 3.240/41, como se vê, constitui poderosa e fundamental ferramenta para o combate à corrupção e à tutela do interesse público, dado que permite a constrição mais abrangente do patrimônio do investigado ou do acusado, constituído antes ou depois do delito e oriundo tanto de condutas perpetradas à margem da legalidade como até mesmo de comportamento lícito.
Na linha do tempo, tem-se que o Decreto-lei nº 3.240/1941 foi publicado em 8/5/1941. O CPP, a seu turno, data de 3/10/1941 e entrou em vigor no dia 1/1/1942. Assim, com base no art. 2º, § 1º, da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB), que determina que lei posterior revoga a anterior quando com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior, levantaram-se vozes na doutrina no sentido de que o sequestro previsto no CPP, por ser posterior, havia revogado tacitamente a cautelar elencada no Decreto-lei nº 3.240/1941.
De fato, para Marcellus Polastri, “a atual disciplina das medidas cautelares reais no Processo Penal, elencadas atecnicamente no amplo termo ‘medidas assecuratórias’, veio substituir o Dec-lei 3.240/1941”. Já Rogério Tucci, citado por Polastri, é incisivo ao afirmar que “dúvida não pode restar, portanto, acerca de que as referidas medidas cautelares constritivas patrimoniais passaram a reger-se pelo Código de Processo Penal de 1941, a partir de 1942, não mais incidindo sobre elas as normas do Dec-lei 3.240/41.”
Ocorre que esse posicionamento não encontra guarida na jurisprudência do STJ. De acordo com reiterados precedentes da Corte Superior, o Decreto-lei nº 3.240/41 não foi revogado pelo CPP, tendo feição própria o sequestro de bens de pessoas indiciadas ou denunciadas por crime de que resulta prejuízo para a Fazenda Pública, cuja repressão mereceu tratamento mais rigoroso por parte do legislador.
Nessa toada, entende a Corte Cidadã que o sequestro previsto no CPP é lei nova que estabeleceu disposições gerais a par das já existentes no diploma anterior e, por força do princípio da especialidade (art. 2º, § 2º, da LINDB), não teve o condão de revogar as disposições especiais previstas no Decreto-lei nº 3.240/41.
Sobre a diferença entre as medidas cautelares de sequestro elencadas no CPP e no Decreto-lei nº 3.240/41, bem como sobre a coexistência entre os dois regimes, verifiquem-se os seguintes precedentes oriundos da Corte Superior:
“AGRAVO REGIMENTAL. EMBARGOS DE TERCEIRO. SEQUESTRO CAUTELAR PENAL. CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO. OFENDIDO. FAZENDA PÚBLICA. ART. 4º DO DECRETO-LEI 3.240/41. IMÓVEL. BEM QUE JÁ PERTENCEU AO ACUSADO. TRANSMISSÃO A TERCEIROS. EXAME DA BOA-FÉ OU DA INEXISTÊNCIA DE CULPA GRAVE. SOBRESTAMENTO. 1. O propósito recursal é determinar se é possível o levantamento do sequestro antes do julgamento definitivo da ação penal na qual determinada a medida assecuratória incidente sobre o bem alegadamente pertencente à agravada. 2. A medida assecuratória de sequestro prevista no CPP está destinada a assegurar a satisfação do efeito da condenação consistente no perdimento dos produtos e proveitos do crime, previsto no art. 91, II, "b", do CP, podendo ser decretada desde que presentes indícios veementes da proveniência ilícita dos bens, ainda que transferidos a terceiros. 3. Diferentemente do sequestro definido no CPP, a medida de sequestro do art. 4º do Decreto-Lei 3.240/41 também cumpre a função da hipoteca legal e do arresto previstos no CPP, qual seja, a de garantir a reparação do dano causado à Fazenda Pública, vítima do crime, podendo incidir até sobre os bens de origem lícita do acusado. 4. Em regra, o terceiro pode opor-se ao sequestro alegando que o bem nunca pertenceu ao acusado e que não pode configurar proveito de crime, o que se enquadra na hipótese do art. 129 do CPP e permite o levantamento imediato da medida assecuratória incidente sobre o bem equivocadamente conscrito, com o julgamento de procedência dos embargos de terceiro a qualquer tempo. 5. Na hipótese de o terceiro alegar que, apesar de o bem ter pertencido ao suspeito ou acusado e poder configurar proveito de crime, foi adquirido a título oneroso e de boa-fé, ou, quando se tratar do sequestro do art. 4º do Decreto-Lei 3.240/41, que o bem não foi adquirido do suspeito ou acusado dolosamente ou com culpa grave, os embargos somente poderão ter seu mérito apreciado após o trânsito em julgado da ação penal principal. 6. Agravo regimental provido.”
“PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. CAUTELAR DE SEQUESTRO DE BENS. DECRETO LEI Nº 3.240/41. LEGALIDADE DA MEDIDA CONSTRITIVA. 1. A apelação devolve à instância recursal originária o conhecimento de toda a matéria impugnada, embora não tenha sido objeto de julgamento, não ficando o magistrado adstrito aos fundamentos deduzidos no recurso. 2. Não ofende a regra tantum devolutum quantum appellatum, o acórdão que, adotando fundamento diverso do deduzido pelo juiz de primeiro grau, mantém a eficácia da constrição judicial que recaiu sobre bens dos recorrentes com base nas disposições do Decreto-Lei nº 3.240/41, ao invés do contido no art. 126 do Código de Processo Penal. 3. O Superior Tribunal de Justiça já se manifestou no sentido de que o sequestro de bens de pessoa indiciada ou já denunciada por crime de que resulta prejuízo para a Fazenda Pública, previsto no Decreto Lei nº 3.240/41, tem sistemática própria e não foi revogado pelo Código de Processo Penal em seus arts. 125 a 133, continuando, portanto, em pleno vigor, em face do princípio da especialidade. 4. O art. 3º do Decreto Lei nº 3.240/41 estabelece para a decretação do sequestro ou arresto de bens imóveis e móveis a observância de dois requisitos: a existência de indícios veementes da responsabilidade penal e a indicação dos bens que devam ser objeto da constrição. 6. Com efeito, o sequestro ou arresto de bens previsto na legislação especial pode alcançar, em tese, qualquer bem do indiciado ou acusado por crime que implique prejuízo à Fazenda Pública, diferentemente das idênticas providências cautelares previstas no Código de Processo Penal, que atingem somente os bens resultantes do crime ou adquiridos com o proveito da prática delituosa. 7. Tem-se, portanto, um tratamento mais rigoroso para o autor de crime que importa dano à Fazenda Pública, sendo irrelevante, na hipótese, o exame em torno da licitude da origem dos bens passíveis de constrição. 8. No que diz respeito à suposta violação do art. 133 do Código de Processo Penal, observa-se que tal questão não foi objeto de análise pelo Tribunal a quo, não estando, assim, prequestionada (Súmula nº 282/STF). Ainda que assim não fosse, os bens móveis, fungíveis e passíveis de deterioração, podem ser vendidos antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória, ex vi do art. 137, § 1º, do CPP, a fim de assegurar futura aplicação da lei penal. 9. Recuso especial conhecido e, nessa extensão, negado-lhe provimento.”
“PROCESSO PENAL – PEDIDO DE RECONSIDERAÇÃO CONHECIDO COMO AGRAVO REGIMENTAL – SEQÜESTRO – DEC. LEI 3.240/41 – INQUÉRITO INSTAURADO EM RAZÃO DE SUSPEITA DE CRIME PRATICADO CONTRA A ADMINISTRAÇÃO – MEDIDA ASSECURATÓRIA DE RESSARCIMENTO DA FAZENDA PÚBLICA. 1. Pedido de reconsideração conhecido como agravo regimental. 2. Mostra-se prescindível para a decretação do seqüestro regulado pelo Dec. Lei 3.240/41, o exame em torno da licitude da origem dos bens passíveis de constrição, sendo necessário apenas que haja indícios veementes de que os bens pertençam a pessoa acusada da prática de crime que tenha causado prejuízo à Administração Pública. Precedentes. 3. Agravo regimental não provido.”
“PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA CONEXO A CRIMES FEDERAIS. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. SÚMULA 122/STJ. CAUTELAR DE SEQUESTRO DE BENS. DECRETO-LEI Nº 3.240/41. LEGALIDADE DA MEDIDA CONSTRITIVA. AGRAVO AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO. 1. Nos termos do enunciado 122 da Súmula desta Corte, "compete à justiça federal o processo e julgamento unificado dos crimes conexos de competência federal e estadual, não se aplicando a regra do art. 78, II, a, do código de processo penal". 2. Este Superior Tribunal de Justiça já assentou que o sequestro de bens de pessoa indiciada ou já denunciada por crime de que resulta prejuízo para a Fazenda Pública, previsto no Decreto Lei nº 3.240/41, tem sistemática própria e não foi revogado pelo Código de Processo Penal. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.”
RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL PENAL. SEQUESTRO DE BENS DE PESSOAS INDICIADAS POR CRIMES DE QUE RESULTA PREJUÍZO PARA A FAZENDA PÚBLICA. CONSTRIÇÃO FUNDAMENTADA NO DECRETO-LEI N.º 3.240/41. MEDIDA ACAUTELATÓRIA QUE RECAI SOBRE TODOS OS BENS DOS ACUSADOS. POSSIBILIDADE, NO CASO CONCRETO. NECESSIDADE DE DETERMINAR OS BENS SOBRE OS QUAIS RECAEM O SEQUESTRO, LIMITANDO-O AO PREJUÍZO A SER EVENTUALMENTE RESSARCIDO AO ERÁRIO PÚBLICO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULAS N.ºS 282 E 356 DA SUPREMA CORTE. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA PARTE, DESPROVIDO. 1. A teor do art. 4.º do Decreto-Lei n.º 3.240/41, o sequestro, para a constrição de bens de pessoas indiciadas ou já denunciadas por crimes dos quais resulte prejuízo para a Fazenda Pública, pode recair sobre todo o patrimônio dos Acusados e compreender os bens em poder de terceiros, contanto que estes os tenham adquirido com dolo ou culpa grave. 2. No caso, a medida acautelatória está devidamente fundamentada, tendo em vista que as instâncias ordinárias consideraram os veementes indícios, nos autos de inquérito, da prática dos crimes de formação de quadrilha, desvio de dinheiro público, dispensa indevida de licitação e lavagem de dinheiro, além do periculum in mora, consubstanciado nos fortes vestígios de proposital confusão patrimonial entre os patrimônios dos Acusados com os de seus familiares, a ensejar sérios riscos de inviabilizar o ressarcimento, ainda que parcial, dos volumosos recursos desviados dos cofres públicos. 3. A quaestio juris, arguida no presente recurso, refere-se à necessidade de o Magistrado especificar os bens sobre os quais recaem o sequestro, tendo em vista que a finalidade da norma é o ressarcimento do prejuízo sofrido pela Fazenda Pública, sendo, portanto, esse quantum o limitador da medida constritiva. Constata-se que a matéria, no entanto, não foi apreciada, sob essa perspectiva, pelo Tribunal a quo, carecendo do indispensável prequestionamento viabilizador do recurso especial. A propósito, o que se considera, para efeitos de satisfação desse requisito, é o debate e a decisão efetiva da Corte de origem acerca da matéria federal suscitada. Incidência das Súmulas n.ºs 282 e 356 do Supremo Tribunal Federal. 4. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, desprovido.”
Assim, não socorrem àqueles que tiveram seus bens indisponibilizados com esteio no Decreto-lei nº 3.240/41 alegações de que estes foram adquiridos anteriormente à prática dos crimes investigados e com recursos de origem lícita. No entendimento do STJ, o referido decreto-lei confere especial proteção à Fazenda Pública e continua em pleno vigor, convivendo pacificamente, em nosso ordenamento jurídico, com o sequestro previsto de forma geral no CPP.
5. CONCLUSÃO
Embora se destinem ao ressarcimento do prejuízo causado pelo delito e, por conseguinte, à efetividade da tutela processual penal, os sequestros trazidos pelo CPP e pelo Decreto-lei nº 3.240/41 possuem singularidades que os diferenciam.
A cautelar patrimonial prevista no CPP exige existência de indícios veementes da proveniência ilícita dos bens. De outra banda, o sequestro previsto no Decreto-lei nº 3.240/41 recai sobre todo o patrimônio do investigado, incluindo bens adquiridos antes ou depois da infração penal investigada, com recursos de origem lícita ou ilícita.
O STJ entende que, apesar de ser cronologicamente posterior, o sequestro previsto no CPP não revogou o Decreto-lei nº 3.240/41, que constitui um regime próprio e especial, destinado ao combate à prática de crimes que resultam prejuízo à Fazenda.
6. REFERÊNCIAS
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BRASIL. Decreto-lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. 1941. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del3689Compilado.htm>.Acesso em: 20 abr. 2018.
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NORONHA, Eduardo Magalhães. Curso de direito processual penal. 19. ed. São Paulo: RT, 1989, p. 74.
LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal, volume único. 5 ed. rev., atual. e ampl. Salvador: Juspodivm, 2017, p. 1.153.
CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 362.
MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. 18. ed. São Paulo: Atlas, 2006, p. 231.
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BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Reconsideração de Despacho no Inquérito nº 200701194587 (RCDESPINQ 561), Corte Especial, Rel: Eliana Calmon, DJe data 27/08/2009.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Recurso em Mandado de Segurança nº 24.083/PR, Sexta Turma, Rel: Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, julgado em 03/08/2010, DJe 16/08/2010.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1133763/DF, Quinta Turma, Rel: Laurita Vaz, julgado em 23/08/2011, DJe 08/09/2011.
Universidade Federal do Ceará. Pós-graduanda em Direito Administrativo. Analista do Ministério Público Federal.<br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BORGES, Dayana de Moura. As características do sequestro previsto no CPP e no Decreto-lei nº 3.240/41, diferenças entre essas cautelares patrimoniais e coexistência dos institutos em face do princípio da especialidade e à luz da jurisprudência do STJ Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 03 maio 2018, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/51620/as-caracteristicas-do-sequestro-previsto-no-cpp-e-no-decreto-lei-no-3-240-41-diferencas-entre-essas-cautelares-patrimoniais-e-coexistencia-dos-institutos-em-face-do-principio-da-especialidade-e-a-luz-da-jurisprudencia-do-stj. Acesso em: 22 dez 2024.
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