Resumo: O artigo apresenta a questão de como a Teoria do Direito Vido de Eugen Ehrlich de 1912, apesar de fortes críticas tem se alinhado ao Neoconstitucionalismo na regulação da atividade extrajudicial. A problemática se estende na oscilante absorção de valores morais e políticos na regulação da atividade extrajudicial, com efeitos controverso e tendentes a desestabilizar o sistema.
Palavras-chaves: Direito Vivo – Extrajudicial – Neoconstitucionalismo.
Abstract: The article presents how Eugen Ehrlich's Theory of Living Law of 1912, despite strong criticism, has been aligned with Neoconstitutionalism in the regulation of extrajudicial. The problem extends to the oscillating absorption of moral and political values in the regulation of extrajudicial with controversial effects and tending to destabilize the system.
Keywords: Extrajudicial – Living Law - Neo-constitutionalism.
Sumário: 1. Introdução - 2. O Debate inacabado entre Eugen Ehrlich e Hans Kelsen – 3. Neoconstitucionalismo – 4. Direito Vivo e o Neoconstitucionalismo e seus reflexos na regulamentação no extrajudicial - 5. Conclusões - 6. Bibliografia.
O controvertido pensamento de Eugen Ehrlich em sua obra Fundamentos da Sociologia do Direito trouxe àquela época uma doutrina inovadora e permeada de preconceitos de aplicabilidade do direito. A pensamento do Filósofo consistia que o desenvolvimento do direito não estava no ato de legislar nem na jurisprudência ou na aplicação do direito, mas na própria sociedade.
Vale destacar que a experiencia de Eugen Ehrlich com a cultura jurídica se deu na Bucovina, onde a lei Austríaca e os costumes locais nitidamente contrastantes pareciam coexistir, o fez questionar as noções hierárquicas do direito, defendidas por teóricos como Hans Kelsen.
Eugen Ehrlich entendeu que as teorias jurídicas que reconheciam as leis com a soma de estatutos e julgamentos refletiam uma visão inadequada da realidade jurídica de uma comunidade. Com isso definiu que normas sociais realmente governam a vida de uma sociedade, que sob certas condições, podem legitimamente ser consideradas, pela consciência popular e por advogados, como leis, contrariando a estrutura jurídica de Hans Kelsen.
Com isso, Hans Kelsen diverge de Eugen Ehrlich, pois entende que motivo pelo qual as normas jurídicas são observadas não é objeto de uma dogmática ou teoria do direito e nem sequer decorre de fatos sociais. Ao contrário, toda e qualquer norma jurídica só é válida se imposta e aplicada pela autoridade estatal. Dessa forma, o direito não pode ser considerado um fenômeno social, mas um conjunto de proposições jurídicas válidas, possuindo, portanto, um caráter exclusivamente normativo e contra fático.
Dessa forma, a visão de Eugen Ehrlich é uma descrição empírica-antropocêntrica do direito, na qual sustenta uma descrição causal dos fatos. A ideia central nos seus escritos está relacionada à constatação de que o direito depende de um reconhecimento social, pois toda e qualquer associação humana necessita de normas de conduta. Nesse sentido, o direito é uma norma social de conduta não restrita aos textos e às prescrições legais.
Vale destacar que o Neoconstitucionalismo se aproxima em alguns aspectos da Teoria do Direito Vivo de Eugen Ehrlich, já que absorção de valores morais e políticos como premissas de julgados e regulação da administração pública, em especial do extrajudicial traz a possibilidade de criação de normas com perspectivas ideológica de determinado momento social, trazendo, com isso, a incontroversa instabilidade do sistema.
De acordo com o pensamento de Eugen Ehrlich a principal função da lei está no fato de criar ordem entre e nas associações com a sociedade. Com isso, entende que as normas podem ser criadas pelas pessoas para regular e coordenar suas próprias ações, quase sempre sem interferência do Estado. O Filósofo denomina “fatos da lei”.
Por outro lado, Hans Kelsen explica que o fenômeno da lei pode se dar por duas diferentes perspectivas. De um lado a lei pode ser atribuída como norma, cuja regra estabelece uma forma de “dever ou não dever”. De outro lado, a lei pode ser tirada como uma parte da realidade social, como um fato de regular ocorrência, que nessa perspectiva a lei ganha a forma de “ser ou estar”
Essas duas perspectivas correspondem diferentes disciplinas jurídicas, respectivamente, a “normativa” ciência da lei que por uma regra de dedução estabelece as regras válidas, e a “explicativa” sociológica da lei que estabelece indutivamente uma regularidade que tenta encontrar uma explicação causal. [1]
Com isso, Hans Kelsen critica Eugen Ehrlich por tentar combinar o que ele considera perspectivas incompatíveis, ou seja parece vacilar entre uma empírica concepção de lei, na qual lei é um fato, que está sujeita as regras de causalidade, e por outro lado a concepção normativa da lei que evade de uma observação empírica e causal.
Por seu turno Eugen Ehrlich fundamenta seu posicionamento no sentido de que a abstração precede a norma legal, e cita como exemplo que antes de uma Constituição o Estado já existia, e traz analogia similar a outros institutos jurídicos. No mais, aceita em seu trabalho a diferenciação em normas legais e extralegais, porém concluir ao final de que lei é uma questão de percepção social.[2]
Eugen Ehrlich também atento de que práticas sociais podem ser opressivas, com por exemplo dominação, relações matrimoniais e escravidão não são sempre resolvidas internamente. Nesses casos a lei normativa é indispensável, porém de forma complementar.[3]
Vale destacar que o trabalho de Eugen Ehrlich não traz respostas a questões importantes do direito e a vida prática atual, como quando uma norma deve predominar, ou como proceder quando for balizar o caso concreto. Kelsen elucida que essa perspectiva faz perder a guia das condutas como um todo. Com isso, a sociologia de Eugen Ehrlich perde conceituação em diferenciar lei e poder e entre diferentes tipos de normas, legais ou não legais, oficiais ou não oficiais.
É oportuno lembrar que a sociologia do direito foi rejeitada por Kelsen, uma vez que a prática regular social não teria o condão de servir como norma, mas sim de um certo modo como dominação ou doutrinação.
Na perspectiva positivista, as normas têm sua origem na sociedade e pode muito bem como Eugen Ehrlich sustenta constituir uma pré-condição empírica da existência da lei no senso de que a norma legal possivelmente deve o seu conteúdo e sua aceitabilidade a outras normas não legais.[4] A crítica está que a sociologia como uma ciência empírica não possui uma tipologia de normas.
Por fim, as Fundamentos da Sociologia do Direito de Eugen Ehrlich deve ser interpretado como uma soma valiosa a lei criada pelo Estado, seja para permitir a liberdade dos indivíduos em se relacionarem, como por exemplo um contrato, o acordo coletivo, testamento, dentre outros, porém não como fonte normativa de direito. Ademais, pode ainda servir como fonte de inspiração do Estado para criar a lei.
A Constituição Federal do Brasil por sua característica dirigente permite que sua interpretação ganhe contornos ideológicos, que por sua vez fez que Neoconstitucionalismo ganhasse cada vez mais forma no cenário nacional. Muitas vezes por forca dessa corrente doutrinária a lei é interpretada de forma ampliativa na busca do bem.
O Neoconstitucionalismo é um fenômeno que aplica à supremacia da constituição, em relação a todo o ordenamento jurídico, para que confira substratos necessários à concretização dos direitos fundamentais. É nesse sentido que o Neoconstitucionalismo promoveu influxos em toda ordem jurídica que passou da fase de codificação para a da descodificação, e com isso fortaleceu o ativismo jurídico.
Ressalta-se que o direito positivo esteve no centro do ordenamento jurídico, contudo atualmente a Constituição Federal de 1988 passou a ser o núcleo do sistema jurídico, servindo como filtro axiológico para a interpretação do direito
Dessa forma, com a força normativa da constituição todo o sistema jurídico positivado passou a ser lido a partir da constituição, dentre elas as relativas a regulação da atividade extrajudicial.
A técnica da ponderação também influencia sobremaneira o sistema jurídico positivado, ao passo que a autonomia normativa deixou de prevalecer sobre direito fundamental, como a igualdade material entre os contraentes. Ocorre que a técnica de ponderação tem sido utilizada como uma nova forma de positivação do direito, em especial pelo Poder Judiciário, o que é seguido muitas vezes pelo administrador público na condução da atividade administrativa.
Essa interpretação dos direitos constitucionais em matéria da regulação dos serviços extrajudiciais ganha relevância uma vez que nem sempre a Administração Pública faz a leitura e positiva o direito, invadindo sistemas estranhos ao direito, como a economia e política, o que vai de encontro a visão a proteção aos direitos fundamentais consagrados pela Constituição Federal.
Vale ressalta-se que não raras as vezes sob a justificativa de justiça social a própria administração pública transforma direitos fundamentais e direitos menores, como por exemplo ser conivente ao parcelamento do solo em desacordo com projetos aprovados e o Estatuto da Cidade[1]. Esse permissivo ou conivência pública fere o direito a uma moradia adequada, já que torna equipamentos e espaços públicos obsoletos.[5]
É oportuno salientar que a premissa de que todo o ato praticado pela Administração Pública está incutido de interesse público pode não ser verdadeira, uma vez que o Neoconstitucionalismo autoriza tomada de decisões de conteúdo ideológico afronta a estabilidade das instituições.
Vale destacar que o conteúdo ideológico aplicado na interpretação do direito seja pela administração pública ou pelo particular voltam ao bem, porém sem regras claras criam a instabilidade, afugentam investimentos, inibe a economia, priva a circulação de riquezas e a inovação. Em outras palavras todo empreendedor observa o ambiente, jurídico, econômico, político e trabalha seus lucros com base em equações matemáticas, e se há um risco do ambiente se alterar repentinamente isso é colocado na equação dos lucros, o denominado custo de oportunidade.
Por fim, quanto maior for conteúdo abstrato das políticas públicas mais existirá a possibilidade de arbitrariedades, e consequentemente por via reflexa, quebra dos direitos fundamentais ora utilizados como o próprio fundamento. Nesse caso a regulamentação da atividade notarial e registral deve ser na medida do mínimo possível, a fim de permitir a inovação, investimentos, estabilidade, equidade, igualdade para com isso promover a defesa das instituições democráticas.
É cediço que o momento atual do direito brasileiro entrará para história. O Supremo Tribunal Federal tem cada vez mais interpretando e positivando o sistema jurídico nacional sob a rubrica da prática do bem.
Não é diferente na regulação da atividade do extrajudicial, especialmente quando se trata da autonomia administrativa do notário e registrador, que na prática sua autonomia existe apenas no texto escrito.
Não se desconhece o julgado emblemático do Superior Tribunal de Justiça RMS 7730/RS[2], na qual reconhece que a independência funcional dos notários e registradores não é ampla, ou seja, permite uma ingerência administrativa e financeira nos serviços notariais e registrais, possibilitando inclusive a alteração contábil, inferindo no planejamento financeiro da serventia. De certo modo tal inferência impacta no planejamento e inovação, uma vez que cria um ambiente de surpresas e incertezas.
Nesse sentido, o caso recente e emblemático é a proibição dos notários e registradores fazerem um planejamento tributário, ou seja, a elisão fiscal nos termos da legislação em vigor, mesmo havendo o estrito cumprimento da lei.
Recentemente a Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo, após mais de uma década sem realizar correições ordinárias nas serventias da capital passou a mudar o entendimento acerca da contabilidade das serventias extrajudiciais. Com isso, deixou de lado a preocupação com o serviço público, ou seja, elaboração de indicadores de satisfação dos usuários, instalações das serventias, sistemas informáticos, dentre outras, e passou a incorporar a função de auditores fiscais.
Nota-se que falta de comunicação entre os sistemas e suas respectivas simbioses traz ambiente repleto de incertezas e inseguranças. Com isso, a parte híbrida em direito público e privado que é a essência do extrajudicial fica cada vez mais desestimulada.
A Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo foi além de sua função reguladora, contrariando até mesmo o posicionamento da Secretaria da Receita Federal acerca de elisão fiscal, sob o argumento da moralidade administrativa, como se os notários e registradores fossem os profanadores do sistema.
É oportuno trazer à baila o Processo Administrativo número 2019/8117[3], o qual foi introduzido novo parecer, o qual obsta a locação de bens móveis a pessoa jurídica a qual o titular seja sócio ou tenha parentes[4]
Ocorre que em caso análogo a Secretaria da Receita Federal do Brasil autorizou a dedutibilidade nos termos da Consulta número 328 – Cosit[5], quando a propriedade imobiliária for de pessoa jurídica em que o sócio seja o titular da própria serventia.
De certa forma ao criticar o Direito Vivo de Eugen Ehrlich, Kelsen concluiu que referida teoria traz uma confusão sistêmica, pois não se sabe dizer o que é certo ou errado, lícito ou ilícito. Portanto, não deve um sistema o outro, sob pena de criar uma antinomia sistêmica, o que tolhe as liberdades individuais.
Da mesma forma são as isenções fiscais outorgadas por meio de ato ou decisão administrativa. Ressalta-se que diversos Estados da Federação possuem incluídos nas custas cartoriais fundos de diversas naturezas, e as isenções criam um efeito em cascata, fazendo com que não ocorram os repasses aos entes públicos, prejudicando a coletividade de forma indireta.
Em outras palavras, o efeito nefasto da gratuidade repercute em toda sociedade, e a liberdade em prol de conteúdos ideológicos, os órgãos reguladores têm outorgado isenções fiscais em desacordo §2º artigo 108 do Código Tributário Nacional, ou de decisão jurisdicional que a sustente.
É oportuno destacar que a ambiguidade e a possível usurpação de funções sob o pálio da moralidade administrativa não coadunam com o sistema, seja jurídico, econômico ou político. Mais do que um sistema orientador ou regulamentador mais se assemelha a uma sanção inibidora da livre iniciativa.
Dentre diversos outros casos de positivação do direito, há um caso de 2014 que determinou a isenção fiscal na emissão de cartas de sentença pelo notariado paulista apenas por decisão administrativa[6], ou seja, o administrador público com base no Neoconstitucionalismo incute um permissivo amplo e discricionário, o que pode não raras vezes causar arbitrariedades. Veja que a fundamentação foi de conteúdo ideológico, saber: “Vale dizer, não concordo que se prestigie somente o incremento no lucro dos notários. Parece-me que, ao assumir os bônus decorrentes da delegação de atribuição, as serventias devem arcar, da mesma forma, com os ônus.”
Nota-se que a emissão das cartas de sentença judiciais se deu para desafogar o Poder Judiciário e não o substituir de suas funções. Assim, trata-se de uma opção dada ao usuário, razão pela qual novamente toda a sociedade ricos e pobres pagam pela gratuidade, uma vez que se deixa de recolher os fundos devidos aos atos praticados sob o manto da gratuidade.
Não se discute a discricionariedade na concessão do benefício da assistência judiciária gratuita, mas sim a transferência desse ônus ao particular, uma vez que quando do planejamento administrativo as instalações, funcionários, localização da serventia são realizados com o cenário posto no certame, pois como é sabido não pode repassar o custo das gratuidades no seu preço final.
Constatada essa realidade, questões externas parecem estar influindo no sistema do direito, o qual se encontra extremamente permissivo às influências políticas e econômicas. Com isso, não se deve trabalhar um sistema aberto, mas sim fechado para que ele se opere dentro dele próprio, já que a análise se inicia no ambiente e depois se analisa o justo e injusto.
Acerca do justo e injusto é importante anotar as lições de Aristóteles, que há cerca de 2.500 anos já ensinava com lidar com o justo e injusto. De acordo com o Filósofo a justiça é o estado que torna os indivíduos predispostos a realizar atos justos e que os faz agir justamente e desejar aqueles atos. Por outro lado, a injustiça é desejar praticar atos injustos. Essa é a premissa elementar que o filósofo se utiliza para definir o justo[6].
Com isso, observa primeiramente a virtude da Justiça, sob um aspecto legal. A justiça é vista subjetivamente pela moral de cada um fazendo com que os indivíduos cumpram o que está na lei, sendo essa a sua primeira função, que segundo o Aristóteles seria a virtude suprema.
Dessa forma a justiça e a injustiça são relacionadas com o cumprimento e o não-cumprimento respectivo da lei. Logo o homem justo é aquele que se conforma à lei e respeita a igualdade, e o injusto aquele que contraria a lei e a igualdade.
Nunca é demais lembrar que para construção do direito positivo Aristóteles foi fundamental, sendo seguido por diversos filósofos durante a história. Aristóteles no livro da Retórica assentara célebre lição: “melhor é que todas as coisas estejam reguladas pela lei do que deixá-las ao arbítrio dos juízes”. São Tomás de Aquino ensinou também que “é mais fácil encontrar uns poucos sábios que bastem para instituir leis justas do que os muitos que se requereriam para julgar retamente cada caso particular”[7].
Por fim, o ativismo regulatório pode tomar proporções de arbitrariedades, já que nas condições postas não é possível exercer a mediania ou a prudência ao bem, mesmo em sentido abstrato, mas sim a estrita observância sob pena de responsabilização administrativa do notário ou registrador incutindo a sanção com regra da atividade.
A liberdade é o princípio orientador e fundamentador de toda a estrutura jurídica, econômica e social de um Estado Democrático de Direito. Nesse contexto, pode-se afirmar que o respeito à dignidade se expressa pelo respeito à liberdade.
A realização da liberdade como autodeterminação parte dessa condição de igualdade, e trata-se de um direito imprescritível, pois compreende o direito à propriedade, livre iniciativa, liberdade de consciência religiosa e liberdade de expressão, entre outros.
Contudo, os notários e registradores são submetidos a um excessivo conjunto de regramentos que os torna desiguais a outros pretensos legitimados da atividade notarial e registral. Na essência do artigo 236 da Constituição Federal, e do artigo 21 da Lei 8.935/94 a autonomia administrativa e financeira é reduzida a um escrito sem efetividade ou validade, ou só quando conveniente.
No entanto havendo condutas de dolosas ou culposas em reiterados descumprimentos da lei deve haver intervenção estatal. Porém ao criar normativos de conteúdos ideológicos, sempre com arrimos em princípios de conteúdo aberto, os notários são tratados de forma cada vez mais desigual
Veja por exemplo, o Imposto Sobre Serviços – ISS, a tributação é feita como pessoa jurídica, diferentemente dos advogados, que não raras as vezes as bancas advocatícias com altos faturamentos são tributados como pessoa física, ou seja, um valor fixo e não baseado no faturamento, Imposto de Renda de Pessoa Física – IRPF é tratado com a maior alíquota sem possibilidade de opção a regimes tributários que propiciam uma maior eficiência do capital, como o lucro presumido.
Como se não bastasse a tributação sempre quedando para pagamento de maior alíquota ou base de cálculo, o notário e registrador agora não pode mais praticar a elisão fiscal, mesmo com amparo de decisões da Secretaria da Receita Federal do Brasil. Portanto, as liberdades de notários e registradores são cada vez mais tolhidas, chegando ao ponto de desestimular e frustrar todas as narrativas de defesa das instituições democráticas até então feitas pelos delegatários.
Nunca é demais lembrar que a atividade extrajudicial passa por um momento de estresse, onde diversos entes da atividade econômica e política pretendem a desestabilização, especialmente para retirar suas competências até então construídas pela história.
É oportuno salientar que os pretensos legitimados diariamente tentam absorver as competências notariais e registrais sob a alegação de serviços burocráticos, porém se isso algum dia ocorrer nada trará de benefício a sociedade, apenas a alteração dos legitimados. Em outras palavras, os registros de propriedade, lavratura de instrumentos com força de escritura pública, nascimentos, cadastro de bons pagadores (protesto invertido), dentre outras continuarão a serem feitos, porém sem controle e imparcialidade.
Vale lembrar que seria o maior de todos os equívocos entender que se houver perda de competências a novos legitimados esses seriam submetidos a toda essa estrutura de regramentos administrativos, tributários, penais, civis, aos quais os delegatários são atualmente submetidos.
Portanto, em um momento de constantes ameaças sobreposição de sistemas, seja o econômico sobre o direito ou vice e versa, o extrajudicial precisa ser fortalecido, a fim de poder fazer frente a essas ameaças, sob pálio da liberdade e igualdade.
No tocante ao Neoconstitucionalismo a absorção de valores morais e políticos é uma de suas características de aplicabilidade. Entretanto, sua função não deve sumarizada, mas sim ampliada para garantir liberdades, livre iniciativa, solidariedade, inovação e justiça.
Por fim, a Teoria de Direito Vivo de Eugen Ehrlich de que a regra social faz a norma, portanto sem a higidez estrutural de Kelsen se faz presente de certa forma no extrajudicial. No cenário atual a delegação do artigo 236 da Constituição Federal é o contrato administrativo mais violado pelo Estado, e o que mais lhe traz benefícios de todas as espécies, portanto, há clara característica sancionadora na regulamentação.
[1] CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO PROCESSO Nº 2011/97225 (364/2011-E) Autor do Parecer: Roberto Maia Filho Corregedor: Maurício da Costa Carvalho Vidigal Data do Parecer: 14/10/2011 Data da Decisão: 19/10/2011
Data da Publicação: 03/11/2011 EMENTA: REGISTRO DE IMÓVEIS. Averbação de desmembramento de imóvel em novas unidades cujas áreas de superfície são inferiores a 125 m2 - Aprovação pelo órgão público municipal competente - Suficiência para reconhecimento da legalidade formal do empreendimento, no âmbito da qualificação registral - Circunstância que torna prejudicada a apreciação, nesta via, da questão relativa à lei municipal restritiva editada posteriormente, bem como da proibição imposta pelo artigo 4º, II, da Lei n° 6.766/79 - Afastamento deste óbice para a averbação. Dado provimento ao recurso.
[2] CONSTITUCIONAL. INTERPRETAÇÃO DO ART. 236, PAR. 1º, DA CF, E DA LEI 8.935, DE 18.11.1994, ARTS. 22, 28 E 37.
1. O novo sistema nacional de serviços notariais e registrais imposto pela Lei 8.935, de 18.11.1994, com base no art. 236, par. 1º, da CF, não outorgou plena autonomia aos servidores dos chamados ofícios extrajudiciais em relação ao Poder Judiciário, pelo que continuam submetidos a ampla fiscalização e controle dos seus serviços pelo referido Poder.
2. Os procedimentos notariais e registrais continuam a ser serviços públicos delegados, com fiscalização em todos os aspectos pelo Poder Judiciário.
3. O texto da carta maior impõe que os serviços notariais e de registro sejam executados em regime de caráter privado, porém, por delegação do Poder Público, sem que tenha implicado na ampla transformação pretendida pelos impetrantes, isto e, de terem se transmudados em serviços públicos concedidos pela União Federal, a serem prestados por agentes puramente privados, sem subordinação a controles de fiscalização e responsabilidades perante o Poder Judiciário.
4. A razão desse entendimento está sustentada nos argumentos seguintes:
a) Vinculo-me a corrente doutrinária que defende a necessidade de se interpretar qualquer dispositivo constitucional de forma sistêmica, a fim de se evitar a valorização isolada da norma em destaque e, consequentemente, a sua possível incompatibilidade com os princípios regedores do ordenamento jurídico construído sob o comando da carta maior para a entidade ou entidades jurídicas reguladas.
b) Influenciado por tais posições, o meu primeiro posicionamento é o de fixar o conceito técnico-jurídico da expressão “delegação do poder público”, que constitui o tema central do debate, haja vista que é o modo institucional como os serviços notariais e de registro são, hoje, exercidos no país.
c) O conceito de delegação de serviço público, após algumas variações, está hoje pacificado como sendo a possibilidade de o Poder Público conferir a outra pessoa, quer pública ou privada, atribuições que originariamente lhe competem por determinação legal.
d) Por a autoridade delegante ter a competência originária, exclusiva ou concorrente, do exercício das atribuições fixadas por lei, no momento em que delega, por para tanto estar autorizado, também, por norma jurídica positiva, estabelece-se uma subordinação entre as pessoas envolvidas no sistema hierárquico entre o transferidor da execução do serviço e quem o vai executar, em outras palavras, entre o delegante e o delegado.
e) O dispositivo constitucional em comento, no caso o art. 236, da CF, ao determinar que os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, porém, por delegação do Poder Público, não descaracterizou a natureza publica de tais serviços, nem restringiu a forma de sua fiscalização, notadamente porque no par. 1º, de forma expressa, está dito que “lei regulara as atividades, disciplinara a responsabilidade civil e criminal dos notários, dos oficiais de registro e de seus prepostos, e definira a fiscalização de seus atos pelo poder judiciário.
f) A seguir, o legislador constituinte, numa demonstração inequívoca de que não se afastou do conceito tradicional de delegação de serviço público, portanto, respeitando, em toda a sua plenitude, o princípio da subordinação hierárquica a existir entre delegante e delegado, dispôs, ainda, que “a lei federal estabelecera normas gerais para fixação de emolumentos relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e do registro”, bem como que “o ingresso na atividade notarial e de registro depende de concurso público de provas e títulos, não se permitindo que qualquer serventia fique vaga, sem abertura de concurso de provimento ou de remoção por mais de seis meses”.
g) É evidente que a prestação de serviços notariais e de registro público no Brasil, após a CF/1988, não tomou as características preconizadas pelos impetrantes, isto e, de que passaram a se submeter ao regime de concessão de serviço público, onde o poder fiscalizador e limitado, apenas, aos atos notariais, jamais a gestão interna da entidade que a exerce em regime absolutamente privado, por ter deixado de ser uma serventia publica da justiça.<grifo>
h) Não importa, com as minhas homenagens ao patrono dos impetrantes, em face do profundo trabalho jurídico desenvolvido, não só na petição inicial, como na do recurso, a interpretação que os impetrantes assentaram a respeito do texto constitucional em discussão.
i) O fato, por si só de no art. 236, “caput”, da CF, estar inserida a expressão de que os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, não conduz ao entendimento posto no recurso, pois, logo a seguir, está a determinação nuclear de que tais serviços, por continuarem a ser públicos, necessitam de delegação do poder público para quem vai exerce-los, pelo que deverão executa-los de acordo como a lei determinar e só poderão receber tal delegação os que forem, pelo próprio poder público, julgados aptos
pela via do concurso público.
j) A natureza publica dos serviços notariais e de registro não sofreu qualquer desconfiguração com a CF/1988. Em razão de tais serviços estarem situados em tal patamar, isto é, como públicos, a eles são aplicados o entendimento de que cabe ao estado o poder indeclinável de regulamentá-los e controlá-los exigindo sempre sua atualização e eficiência, de par com o exato cumprimento das condições impostas para sua prestação ao público.
5. Nego provimento ao recurso” (RMS nº 7730/RS, Relator Ministro José Delgado, in DJ 27/10/1997).
[3] PROCESSO Nº 2019/8117 - SÃO PAULO - VANDA MARIA DE OLIVEIRA PENNA ANTUNES DA CRUZ. –
(296/2019-E)
PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR - Oficial do 16º Registro de Imóveis da Comarca da Capital - Locação de móveis e equipamentos de empresa de que são sócios os filhos da titular da delegação que, por sua vez, é usufrutuária de parte das cotas sociais - Imputação da existência de confusão patrimonial que poderia redundar na obtenção de benefício fiscal indevido e na caracterização de conduta atentatória às instituições notariais e de registro, o que ensejou a aplicação da pena de multa - Doação dos móveis para a locadora atingida pela prescrição – Valor da locação que não se comprovou superar o preço de mercado - Precedente da Corregedoria Permanente em que reconhecida a regularidade da locação de bens pertencentes a parente do titular da delegação - Inexistência de dolo ou culpa -Recurso provido, com observações sobre a locação de bens destinados à prestação do serviço público e sobre a competência da Corregedoria Geral da Justiça e das Corregedorias Permanentes para a fiscalização que inclui a regularidade do cumprimento das obrigações fiscais pelos responsáveis pelas delegações -Proposta de edição de orientação, com natureza normativa, relativa ao lançamento da locação de mobiliários e equipamentos no Livro Diário da Receita e da Despesa.
[4] DECISÃO: Aprovo o parecer do MM. Juiz Assessor da Corregedoria, por seus fundamentos que adoto, e dou provimento ao recurso para julgar o procedimento disciplinar improcedente, o que faço mantendo as determinações feitas na r. decisão recorrida sobre a locação de mobiliários e equipamentos e de comunicações às Receitas Federal e Estadual. Determino, com força normativa e vinculante para os titulares de delegações dos Serviços Extrajudiciais de Notas e de Registro do Estado de São Paulo, que para efeito de escrituração do Livro Registro Diário da Receita e da Despesa:
I) é autorizada a locação de mobiliários e equipamentos, contratada com pessoas físicas e jurídicas, vedada a participação do responsável pela prestação dos serviços extrajudiciais de notas e de registro como sócio da pessoa jurídica, ou como destinatário da renda da locação mediante usufruto de cotas sociais, ou por outro meio;
II) os bens locados devem ser destinados à prestação do serviço público delegado e compatíveis com essa finalidade, podendo incluir os destinados ao conforto e comodidade dos usuários do serviço como, por exemplo, aparelhos para filtro e refrigeração de água e preparo de café e chá, televisão e outros equivalentes;
III) a locação deverá observar o preço de mercado e as regras e costumes aplicáveis, com alteração periódica do valor pela depreciação dos bens locados em razão de tempo e deterioração pelo uso;
IV) devem ser exigidos e arquivados os recibos e comprovantes fiscais emitidos pelo locador, observada a regularidade desses comprovantes em todos os seus aspectos;
V) devem ser declarados e arquivados, em classificador próprio, os comprovantes de lançamento e recolhimento do ITCMD - Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos nas hipóteses em que incidir em razão de prévia doação a terceiro, pelo responsável pela prestação do serviço público, dos bens que posteriormente locar.
Os responsáveis interinamente pelas unidades vagas dos serviços extrajudiciais e de registro permanecem sujeitos às demais normas que vedam a contratação de despesas que possam onerar a renda da delegação, salvo se necessárias e previamente autorizadas pelo Juiz Corregedor Permanente, sendo proibida, em qualquer hipótese, a locação de bens de quaisquer natureza que sejam de sua propriedade, ou de propriedade de seus cônjuges, companheiros e parentes até o terceiro grau, ou de empresas de que esses sejam sócios.
Alerto que se pretender utilizar livro único deverá o responsável para a delegação atentar que para efeito de imposto de renda a Receita Federal não autoriza deduções com a amplitude prevista no item 57 do Capítulo XIII do Tomo II das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça, e que nessa hipótese deverão ser observadas as regras incidentes para a escrituração de livro fiscal, observado o subitem 61.1 do Capítulo XIII do Tomo II das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça:
“61.1. É facultativa a utilização do Livro Registro Diário da Receita e da Despesa também para fins de recolhimento do Imposto de Renda (IR), ressalvada nesta hipótese a obrigação de o delegatário indicar quais as despesas não dedutíveis para essa última finalidade e também o saldo mensal específico para fins de imposto de renda.”
Intime-se e publique-se no DJe, com o parecer, para ciência e observação.
São Paulo, 10 de junho de 2019.
(a) GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO
Corregedor Geral da Justiça
[5] Assunto: Imposto sobre a Renda de Pessoa Física – IRPF RENDIMENTO DO TRABALHO NÃO ASSALARIADO. TITULARES DE SERVIÇOS NOTARIAIS E DE REGISTRO. LIVRO-CAIXA.
DESPESAS DEDUTÍVEIS.
O valor do aluguel pago pelos contribuintes que percebam rendimentos do trabalho não assalariado, a empresas das quais sejam sócios, pode ser deduzido da base de cálculo do IRPF, contanto que seja condizente com os valores praticados pelo mercado, seja necessário à percepção das receitas e à manutenção da fonte produtora, e que esteja devidamente escriturado em livro-caixa e comprovado mediante documentação hábil e idônea. <grifo>
Dispositivos Legais: Decreto nº 3.000, de 26 de março de 1999 – Regulamento do Imposto sobre a Renda (RIR/1999), arts. 45, inciso IV; 75, inciso III; 83, e Regulamento do Imposto sobre a Renda (RIR/2018), aprovado pelo Decreto nº 9.580, de 22 de novembro de 2018, arts. 38, inciso IV; 68, inciso III; 76.
[6] DICOGE 5.1 PROCESSO Nº 2014/95686 – SÃO PAULO – 13º TABELIÃO DE NOTAS DA COMARCA DA CAPITAL Parecer (228/2014-E) TABELIONATO DE NOTAS – FORMAÇÃO EXTRAJUDICIAL DE CARTA DE SENTENÇA – PROVIMENTO CG 31/2013 – EXTENSÃO DA ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA, CONCEDIDA NO PROCESSO – POSSIBILIDADE.
NOTAS:
[1] HERTOGH, MARC, Living Law, Reconsidering Eugen Ehrlich, Portland, OR, p. 130
[2] HERTOGH, MARC, Living Law, Reconsidering Eugen Ehrlich, Portland, OR, p. 136
[3] HERTOGH, MARC, Living Law, Reconsidering Eugen Ehrlich, Portland, OR, p. 140
[4] HERTOGH, MARC, Living Law, Reconsidering Eugen Ehrlich, Portland, OR, p. 149
[5]www.irib.org.br/noticias/detalhes/cgj-sp-parcelamento-do-solo-urbano desmembramento-area-inferior-a-125m-possibilidade (consulta realizada em 22/06/2019)
[6] ARISTÓTELES, Ética a Nicómaco, Tradução e notas: Edson Bini, 4ª ed. São Paulo, Edipro, 2014, pag. 179.
[7] OS DIREITOS HUMANOS DO NEOCONSTITUCIONALISMO: DIREITO NATURAL DA PÓS-MODERNIDADE? Ricardo Dip– Tribunal de Justiça de São Paulo / Centro de Estudos de Direito Natural “José Pedro Galvão de Sousa” http://www.aquinate.com.br/textos/os-direitos-humanos-do-neoconstitucionalismo-direito-natural-da-pos-modernidade, p. 12 (consulta realizada em 22/06/2019)
Mestrando em Direito Civil pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Pós-Graduado em Direito Civil pela Faculdade Autônoma de Direito – Fadisp, Direito Empresarial pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e em Direito Registral e Notarial pela Escola Paulista da Magistratura do Estado de São Paulo. Registrador Civil e Tabelião de Notas em Aparecida de Goiânia, Estado de Goiás. [email protected]
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, Rodrigo Barbosa Oliveira e. O direito vivo de Eugen Ehrlich e o neoconstitucionalismo com seus impactos na atividade extrajudicial Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 24 jul 2019, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/51663/o-direito-vivo-de-eugen-ehrlich-e-o-neoconstitucionalismo-com-seus-impactos-na-atividade-extrajudicial. Acesso em: 23 dez 2024.
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