RESUMO: O presente artigo disserta acerca do histórico do direito de greve até a promulgação da CRFB/88. Busca-se, mais especificamente, analisar a evolução dos movimentos paredistas no mundo e no ordenamento jurídico brasileiro.
PALAVRAS-CHAVE: Greve. Histórico.
SUMÁRIO: 1. Introdução 2. Desenvolvimento 3. Conclusão 4. Referências Bibliográficas.
1. Introdução
A greve é a cessação coletiva e voluntária da prestação de serviços pelos trabalhadores. É um direito assegurado pela Constituição, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender (art 9º da CRFB/88).
Destaca-se que o termo greve tem origem o francês greve, proveniente da Place de Grève em Paris. Acerca do tema, destaca-se o texto da Dra. Vólia Bonfim Cassar:
A expressão tem origem no francês grève, com o mesmo sentido, proveniente da Place de Grève, em Paris, na margem do Sena, lugar de embarque e desembarque de navios onde vários gravetos eram trazidos pelo rio Sena. O termo grève significa originalmente “terreno plano composto de cascalho ou areia à margem do mar ou do rio”.
Nesta praça os trabalhadores se encontravam, debatiam e deliberavam sobre as medidas a serem tomadas para interesse do grupo. Alguns empregadores também compareciam na Place de Grève quando queriam contratar mão de obra.[1]
Trata-se do instrumento máximo de pressão dos trabalhadores e sua existência é intimamente ligada ao próprio surgimento do direito do trabalho. Dessa forma, salienta-se a importância da análise detalhada da evolução histórica da greve.
2. Desenvolvimento
No contexto da Revolução Industrial, os trabalhadores eram submetidos a jornadas extenuantes de trabalho, recebiam baixos salários e laboravam em ambientes precários quanto à saúde, higiene e segurança. Ademais, era típica a exploração da mão de obra de mulheres e crianças em condições de trabalho ainda piores.
Esse contexto favoreceu a união dos trabalhadores com o escopo de alcançar melhores condições de trabalho. Logo perceberam que o principal instrumento de pressão que possuíam era exatamente sua energia de trabalho e que a paralisação das atividades seria forma de obrigar o empregador participar de uma “negociação coletiva”.
De toda forma, historicamente, a afirmação da relação de emprego como a base do sistema econômico é o marco temporal para a posterior organização dos trabalhadores e surgimento do direito do trabalho. Desse modo, não se aceita de forma majoritária, as manifestações sociais da antiguidade como fenômenos ligados ao direito do trabalho. Isso porque a base do sistema era o escravismo.
Ressalta-se que a data escolhida como dia internacional do trabalhador, trata-se de uma homenagem histórica ao dia 01 de maio de 1886, quando ocorreu a Greve Geral de Chicago nos EUA. Trabalhadores reivindicavam melhores salários e a redução da jornada de 13 para 8 horas diárias, tendo, infelizmente, ocorrido confronto e morte de manifestantes e policiais.
Outrossim, destaca-se que a Lei Chapelier de 1791 que pôs fim às corporações medievais proibia qualquer forma de agrupamento de trabalhadores. A greve em seu histórico foi proibida, chegando a ser criminalizada, passando a ser tolerada, até ser considerada um direito em regimes democráticos.
No Brasil a abolição da escravatura em 1888 foi o marco histórico do início do trabalho livre como base da economia brasileira. No país, a greve também passou pela fase da criminalização geral, mas de forma breve. Neste sentido, o Ministro Maurício Godinho Delgado dispõe que:
O Direito do Trabalho brasileiro, seu movimento sindical e o instituto da greve estão atados, historicamente, a um marco fundamental: a afirmação da relação de emprego como vínculo sociojurídico importante no sistema econômico-social do País. É que, sem relação empregatícia como instrumento relevante de conexão do trabalhador livre ao sistema produtivo, não se pode falar na emergência das condições para o próprio surgimento do ramo justrabalhista, assim como, de resto, de quaisquer de seus institutos específicos, como os sindicatos e as greves, por exemplo.
Esse marco é dado pela extinção da escravatura, em 1888, que tornou a relação empregatícia a modalidade central de vinculação do trabalho ao sistema socioeconômico.
Em torno desse período surge o primeiro diploma legal que se refere à greve. Trata-se do antigo Código Penal, de 11 de outubro de 1890 (Decreto n. 847), que tipificava o paredismo e seus atos como ilícitos criminais.
A fase da criminalização explícita da greve foi, contudo, brevíssima. Logo depois, pelo Decreto n. 1.162, de 12.12.1890, a conduta grevista deixou de ser ilícito penal, punindo a ordem jurídica apenas os atos de ameaça, constrangimento ou violência verificados em seu meio.[2]
Após, a greve foi tolerada de 1891 até 1930. Entre 1930 e 1945 o regime com inspiração corporativista era avesso a manifestações livres dos trabalhadores, até que a Constituição de 1946 reconheceu a greve como um direito, apesar de restringido. O trecho escrito pela Dra. Vólia Bonfim Cassar, faz ótima síntese deste período:
A Carta de 1934 proibiu a greve.
O Decreto nº 431/38, que também versava sobre segurança nacional, considerou como crime a greve de funcionários públicos.
O art. 139 da CF/37 considerava a greve e o lockout como recursos antissociais, nocivos ao trabalho e ao capital e incompatível com os superiores interesses de produção nacional.
O Decreto-Lei nº 1.237/39 estabelecia que a greve era passível de punições que poderiam variar na suspensão, despedida e até prisão.
O Código Penal de 1940 (arts. 200 e 201) considerava crime a paralisação temporária do trabalho, se houvesse perturbação da ordem pública, ou fosse contrário aos interesses públicos.
A CLT (art. 723, ora revogado) impunha sanções aos trabalhadores que abandonassem o serviço coletivamente e sem prévia autorização do Tribunal.
Mais tarde, o Decreto-Lei nº 9.070/46 regulamentou a matéria autorizando a greve em atividades acessórias, mas impondo muitas limitações, como nas atividades fundamentais.
A Carta de 1946 reconheceu o direito de greve, conforme lei, mudando radicalmente o paradigma. Todavia, o STF entendeu que o Decreto-Lei nº 9.070/46 tinha sido recepcionado pela Carta de 46, que proibia a greve.[3]
Já durante o regime militar o direito de greve foi também restringido. Neste ponto, vale citar novamente o Ministro Maurício Godinho Delgado:
A Lei de Greve do regime militar (n. 4330, de junho de 1964) restringia, severamente, o instituto: não só proibia movimentos que não tivessem fins estritamente trabalhistas, como vedava a estratégia ocupacional do estabelecimento nas greves. A par disso, instituía rito cujo cumprimento era considerado inviável pelos sindicalistas. Transformado o direito em mero simulacro, o diploma foi apelidado de Lei Antigreve.
Logo a seguir, pela Carta de 1967, acentuou-se a restrição aos movimentos paredistas, proibindo-os nos serviços públicos e nas denominadas atividades essenciais (art. 162). Nesse meio tempo, agravou-se o caráter autoritário do regime político, com o Ato Institucional 5, de dezembro de 1968, inviabilizando qualquer tentativa de paralisação trabalhista na sociedade brasileira.
Anos depois, com o renascimento do movimento grevista, em torno de 1977/1978, ainda nos quadros do autoritarismo militar, novas proibições foram incluídas na ordem jurídica. Citem-se, ilustrativamente: Lei n. 6.128/78 (proibição de greve estendida a empregados de sociedades de economia mista); Lei n. 6.158/78 (estendia a proibição grevista ao pessoal celetista de autarquias e órgãos da Administração Direta); Lei n. 6.620/78 (Lei de Segurança Nacional, com várias apenações relativas à prática grevista); Decreto-Lei n. 1.632/78 (enumerava as atividades essenciais, em que eram vedadas greves).[4]
3. Conclusão
Por fim, com a Constituição de 1988 a greve passou a ser considerada direito fundamental dos trabalhadores, sendo regulada pela Lei de Greve (Lei 7.783/89).
Conclui-se destacando que como qualquer outro direito previsto no ordenamento jurídico, o direito de greve deve ser exercido observando-se os ditames constitucionais e legais aplicáveis, sob pena de ser considerada ilícita (existem diversas decisões considerando, no caso concreto, as paralisações como ilegais). Ressalta-se não se tratar de restrição ao exercício do direito de greve, mas de exercício em conformidade com os direitos alheios dos empregadores, de outros trabalhadores e de toda a coletividade.
4. Referências Bibliográficas
BONFIM, Vólia. Direito do trabalho / Vólia Bomfim Cassar. – 11.ª ed. rev. e atual. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO. 2015.
DELGADO, Mauricio Godinho Curso de direito do trabalho / Mauricio Godinho Delgado. — 16. ed. rev. e ampl..— São Paulo : LTr, 2017.
[1] BONFIM, Vólia. Direito do trabalho / Vólia Bomfim Cassar. – 11.ª ed. rev. e atual. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO. 2015. p. 1250.
[2] DELGADO, Mauricio Godinho Curso de direito do trabalho / Mauricio Godinho Delgado. — 16. ed. rev. e ampl..— São Paulo : LTr, 2017. p. 1644.
[3] BONFIM, Vólia. Direito do trabalho / Vólia Bomfim Cassar. – 11.ª ed. rev. e atual. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO. 2015. p. 1251.
[4] DELGADO, Mauricio Godinho Curso de direito do trabalho / Mauricio Godinho Delgado. — 16. ed. rev. e ampl..— São Paulo : LTr, 2017. p. 1645.
Graduado em Direito pela PUC-RJ. Especialista em Direito Público pela UCP-RJ. Servidor público federal.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, José Felippe Rangel da. O histórico do direito de greve até a Constituição de 1988 Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 04 jun 2018, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/51806/o-historico-do-direito-de-greve-ate-a-constituicao-de-1988. Acesso em: 23 dez 2024.
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