RESUMO: O presente artigo versa sobre ambiente de trabalho e as repercussões jurídicas na Justiça do Trabalho através da insurgência das concausas e da depressão enquanto moléstia profissional em decorrência de ambientes de trabalho estressantes, de sobrecarga exaustiva, atuando o trabalho como elemento desencadeador do adoecimento Em que pese o reconhecimento da depressão como problema de saúde pública, onde em, 2020, atingirá a condição de segunda doença que mais atinge os países desenvolvidos e em desenvolvimento, como reflexo vem ganhando monta o número de ações trabalhistas visando o reconhecimento do nexo de causalidade .Nesse mister, a produção acadêmica busca apresentar o objeto no universo dos debates teóricos, legais, doutrinários e jurisprudenciais. Contribuir para informar de maneira analítica onde o ambiente do trabalho atua como gatilho para ser causa da propagação desse mal do século é o que será destacado nessas linhas.
Palavras-chave: Concausa; Depressão; Moléstia Profissional.Nexo de Causalidade.
1 INTRODUÇÃO
A carta política quando nos fundamentos e objetivos do texto constitucional revela as medidas protetivas a redução inerente aos riscos do trabalho, dispondo sobre a valorização do trabalho.
Não obstante, em que pese o suporte no âmbito internacional através das convenções e tratados – Tratado de Estocolmo, ECO 92, Declaração de BizKaia sobre o Direito ao Meio Ambiente -, o número de acidentes de trabalho alcança índices alarmantes muito embora as normas de proteção à saúde e segurança cuide de preservar no ambiente laboral.
A Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, também conhecida como Conferência de Estocolmo, iniciada em cinco de junho de 1972, marcou uma etapa muito importante na ecopolítica internacional.
Esta foi basicamente a primeira grande reunião organizada para concentrar-se as questões ambientais e a primeira atitude mundial a tentar preservar o meio ambiente, visto que a ação antrópica gera séria degradação ambiental, criando severos riscos para o bem estar e sobrevivência da humanidade (RIBEIRO, 2010).
Houve a convocação dessa Conferência visando amenizar a problemática: homem X natureza. Princípios e conceitos tornaram-se base para a evolução na área do meio ambiente a partir da Conferência de Estocolmo e desta resultaram inúmeras questões que continuam a influenciar e a motivar as relações entre os atores internacionais, colaborando para a notável evolução que eclodiu após a Conferência.
Segundo Le Prestre (2016, p. 9), a conferência foi realizada para atender quatro fatores que foram influência à época:
1. Aumento e importância da comunidade científica, que começavam a questionar sobre o futuro do planeta, as mudanças climáticas e sobre a quantidade e qualidade da água.
2. Aumento da exposição, pela mídia, de desastres ambientais (marés negras, desaparecimento de territórios selvagens, modificações na paisagem), gerando um maior questionamento da sociedade a cerca das causas e soluções para tais desastres.
3.Crescimento desenfreado da economia, e conseqüentemente das cidades, sendo que estas cresceram sem nenhum planejamento para o futuro.
4. Outros problemas ambientais, como chuvas-ácidas, poluição do Mar Báltico, grandes quantidades de metais pesados e pesticidas.
Nesse sentido, compete ao empregador adotar as medidas preventivas visando prevenir danos, preservando a saúde e a integridade dos trabalhadores. Em decorrência da inobservância dessas responsabilidades, causalidades diretas e indiretas vem formando o componente pericial que atuam como concausa no desenvolvimento da depressão, levando empresas a indenizar trabalhadores. Quando se fala em atividade pericial, o debate é direcionado para a dificuldade e exigência do judiciário do instrumento para a formação do nexo de causalidade.
Nesse mister, o referido artigo atua para evidenciar numa perspectiva multifacetada como se forma o nexo de causalidade das doenças laborais a partir das ponderações doutrinárias, legislativas e jurisprudenciais considerando o liame entre o fato e o dano na depressão. O estabelecimento ou não do nexo de concausa na justiça do trabalho tem sido um grande desafio e motivo de discussões acaloradas, angústias e frustrações em peritos, assistentes técnicos e magistrados no meio ambiente do trabalho.
1 MEIO AMBIENTE DO TRABALHO: NEXO DE CAUSALIDADE
Dita como um estado de desencorajamento, perda de humor, decepção, melancolia e angústia reproduzida por aspectos multifatoriais, a depressão ocupa o universo das relações laborais atuando o ambiente de trabalho como elemento desencadeador dos transtornos depressivos.
Lançar um olhar com o lastro de criticidade passou a ser elemento fundante do debate contemporâneo posto a presença do viés da desvalorização do trabalho, refletido em práticas abusivas, investindo, muitas, vezes, na falta de respeito a dignidade humana.
Conforme descreve Nascimento (2008, p.13), o trabalho é considerado historicamente como uma forma de castigo onde “escravos e servos, historicamente sucedidos, eram os que podiam dedicar-se ao trabalho que, nas origens, foram sempre pesados”.
Entre o lucro e o trabalhador saudável fez opção a história das relações empregatícias pelo acúmulo material e, muito embora tenha havido uma evolução dos meios de trabalho, com o surgimento de novas tecnologias, assim como o surgimento de leis protetivas ao trabalhador, não foi suficiente para elidir os problemas graves que ainda ocorrem nas relações empregatícias.
Alguns desses problemas não diferem muito daqueles que existiam no início de tudo, podendo se afirmar que persistem verdadeiras relações de escravidão, além de outros problemas surgidos – ou pelo menos justificados – pelo próprio progresso.
Trazendo isso para o contexto laboral, a depressão advém da ligação entre a moléstia resultante e o trabalho exercido, ou seja, é o vínculo demonstrativo de que a enfermidade se originou ou se desencadeou pelo trabalho.
No acidente típico, o nexo de causalidade ocorre de modo manifesto, assim como nas doenças profissionais em que a ligação é bem visível. Por outro lado, quanto às doenças do trabalho, por exemplo, deve-se ter mais cautela, visto que não é na totalidade dos casos que se determina com precisão se a moléstia se deu em virtude do labor, exigindo exames complementares, a fim de obter respostas claras, por meio de “diagnósticos diferenciais”. (OLIVEIRA, 2008, p. 239)
O nexo de causalidade atua na impossibilidade de reconhecimento da ocorrência de acidente do trabalho ou de doença ocupacional sem a comprovação de sua existência, ligando o labor ao acidente ou à enfermidade. Sendo assim, sem a constatação do referido nexo, nem ao menos se poderia cogitar a hipótese de a depressão vir a ser reconhecida como doença do trabalho equiparada a acidente do trabalho.
Atualmente, tem se utilizado uma nova forma de ligação entre doença e trabalho, trazida com a Lei n. 11.340/2006, o nexo técnico epidemiológico, previsto no artigo 21-A da Lei n. 8.213/1991.
De acordo com Garcia (2008, p 81),
esse nexo teria trazido uma série de evoluções quanto a esta questão, considerando a dificuldade de reconhecimento do nexo de causalidade para se reconhecer doenças profissionais e do trabalho. Através do nexo técnico epidemiológico, produziu-se uma listagem de doenças que, até que exista prova contrária, consideram-se originadas pelo trabalho. O estudo destas doenças foi organizado através da porcentagem de incidência de determinadas doenças em ramos específicos de atividade arrolados pela Classificação Nacional de Atividades Econômicas – CNAE. O nexo técnico epidemiológico estabelece, assim, uma presunção relativa quanto à natureza laboral da moléstia. Se a natureza é relativa, obviamente é possível que o empregador comprove a ausência de ligação entre enfermidade e trabalho, fato que pode ser discutido não somente no âmbito administrativo, mas também em ações judiciais.
O artigo 337 do Decreto 6042/2007 demonstra a relação entre o agravo e o labor elencado na CID sendo considerado pelo INSS como uma das espécies de nexo causal. No caso da depressão, a dificuldade de estabelecer o nexo de causalidade deriva da sua subjetividade e multifatoriedade, sendo que, tirando os casos de exposição a determinados agentes químicos nocivos à saúde, seria possível tentar reconhecê-la como patologia laboral apenas em caso excepcional, comprovando-se que a ela ocorreu diretamente pelas condições especiais em que o trabalho fora desenvolvido, conforme o § 2º, do artigo 20 da Lei n. 8.213/1991, o que se torna bem mais complicado e pouco admitido pelos nossos Tribunais.
Garcia(2008, p. 100) traz, exemplificativamente, alguns ramos de atividades considerados como doenças profissionais por ocasião da depressão: transporte rodoviário coletivo de passageiros, com itinerário fixo, municipal; atividades de Correio Nacional; serviços de telefonia fixa comutada; bancos múltiplos, com carteira comercial; caixas econômicas; bancos múltiplos, sem carteira comercial; planos de saúde; limpeza em prédios e em domicílios; atividades de limpeza não especificadas; Administração Pública em Geral; Justiça; Segurança e ordem pública e atividades de atendimento hospitalar.
Porém, independente do nexo epidemiológico existir ou não, o fato é que a questão é alvo de limites, visto que independente da lista é possível que um obreiro seja alvo de assédio moral desencadeando um quadro depressivo motivado pelo ambiente de trabalho, muito embora prevaleça o descarte das doenças degenerativas bem com o das moléstias ligadas a grupos etários.
Por ambiente de trabalho, o mesmo é entendido como o local de realização da atividade laboral, abrangendo as condições de trabalho, a sua organização e as relações intersubjetivas presentes em seu âmbito, insere-se no meio ambiente como um todo (art 200, inciso VIII, da CRFB/1988), o qual, por sua vez, integra o rol de direitos humanos fundamentais, inclusive por ter como objetivo o respeito à “dignidade da pessoa humana”, valor supremo que revela o “caráter único e insubstituível de cada ser humano”, figurando, ainda, como verdadeiro fundamento da República Federativa do Brasil (art 1º, inciso III, da CF/1988).
O meio ambiente, nos termos da Lei Nacional do Meio Ambiente, é o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas (art 3º, I, da Lei 6.938/81). Desse modo, o meio ambiente pode ser natural, cultural, do trabalho, entre outras espécies.
Mais especificamente, o meio ambiente do trabalho engloba a incolumidade dos trabalhadores, tanto sob o aspecto físico quanto sob os aspectos social e mental. Engloba, inclusive, a prestação de serviços externos, ou seja, fora do estabelecimento do empregador.
Segundo a doutrina majoritária até mesmo o domicílio do trabalhador pode ser considerado como meio ambiente do trabalho. Cabe destacar que não pode haver diferenciação entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador, o executado no domicílio do empregado e o realizado a distância, desde que estejam caracterizados os pressupostos da relação de emprego (art. 6º da CLT e jurisprudência do TST).
Contudo, para a depressão, é preciso sempre salientar a discussão relacionada ao nexo de causalidade entre a doença mental e trabalho, em virtude, especialmente, das diversas percepções quanto à origem da moléstia.
Alguns pesquisadores entendem que a doença decorre por questões orgânicas, outros acham que ela é gerada unicamente por razões psicogênitas e, finalmente, o entendimento que prevalece, isto é, a concepção de que a doença seja causada por vários fatores reunidos (origem multifatorial resultante de fatores biopisicossociais), ideia que favorece a ligação entre a enfermidade mental e trabalho. (TEIXEIRA, 2007, p. 38)
A concepção multifatorial, por sua vez, leva a outro raciocínio: as enfermidades precisam estar unicamente ligadas ao trabalho para serem consideradas doenças do trabalho, ou podem estar aliadas a outros fatores, os quais originam ou desencadeiam o quadro? Essa análise traz, então, a proposição da associação de causas no reconhecimento de doenças decorrentes da atividade laborativa.
Na prevalência do que é mais benéfico para o trabalhador, anda o Direito no sentido de não descartar o ambiente do trabalho como concausa a disparar o gatilho, tutelando o trabalhador dada a sua condição de parte hipossuficiente na relação laboral.
No entanto, deve buscar auxílio com prudência e com laudos médicos, uma vez que será realizada perícia médica e, tão somente, será conferido o direito à reparação se comprovado que seu vínculo com a empresa contribuiu para agravar o quadro de depressão.
Diante do exposto e, uma vez celebrada a antinomia entre a depressão ser reconhecida ou não como doença do trabalho, a jurisprudência não tem reconhecido o nexo causal entre depressão e trabalho. Uma das dificuldades assinaladas é a natureza multifatorial da depressão, o que significa que, possivelmente, não tenha sido apenas um agente causador do quadro.
Assim, em tese, poder-se-ia pensar nisso como justificador da ausência de reconhecimento da moléstia como doença do trabalho, equiparando-a ao acidente do trabalho. Contudo, dentro do tema “nexo de causalidade”, devemos ter em mente a questão da união de fatores que podem ter gerado o quadro, ou seja, a concausalidade.
Cavalieri Filho (2014, p.22) conceitua,
a concausa como “outra causa que, juntando-se à principal, concorre para o resultado”. Adverte, ainda, para o fato de que a concausa “não inicia nem interrompe o processo causal, apenas o reforça, tal como um rio menor que deságua em outro maior, aumentando-lhe o causal”48. Desta forma, perfeita se torna a aplicação do inciso I, do art. 21, da Lei 8213/1991.
Art. 21. Equiparam-se também ao acidente do trabalho, para efeitos desta Lei:
I – o acidente ligado ao trabalho que, embora não tenha sido a causa única, haja contribuído diretamente para a morte do segurado, para redução ou perda da sua capacidade para o trabalho, ou produzido lesão que exija atenção médica para a sua recuperação.
Segundo Monteiro e Bertagni (2008, p.12),
há outro preceito legal que traz circunstâncias descritas como acidente do trabalho. Trata-se do artigo 21, da Lei n. 8.213/1991, em que os acidentes se relacionam somente de forma indireta com a função laborativa. Sendo assim, o mencionado dispositivo acolhe o princípio da concausalidade, ou da equivalência das condições ou, também, da equivalência dos antecedentes.
Destarte o mister principiológico, ganha força a concausa enquanto parte da Lei dos Benefícios através do artigo 21, posto que a condição de rio menor não impede que desague contribuindo para a incapacidade muito embora o rio maior não tenha se originado exclusivamente no trabalho.
Sendo assim, nem sempre o acidente se apresenta como causa única e exclusiva da lesão ou doença. Poderá haver, então, ajuntamento de elementos que concorram para um resultado, ou seja, as concausas. Essas concausas poderão ser antecedentes, posteriores ou concomitantes em relação ao acidente.
Grosso modo, no itinerário do Direito do Trabalho e Previdenciário colabora a concausa para provocar o debate em torno da repercussão das variáveis do assédio moral e sexual que lesiona material e moralmente trabalhadores para fins de garantir regimes de metas abusivas reclamando diferenciações práticas no reconhecimento da depressão, ainda que se verifique um fator antecedente, superveniente ou concomitante no desenvolvimento da patologia, tendo em vista que a depressão é plenamente reconhecida como doença pela Classificação Internacional de Doenças.
Uma vez manifestos os conflitos dificultando a comprovação do quadro clínico laboral dado a subjetividade da depressão, ganha coro os fundamentos da dignidade humana e da proteção do trabalhador, considerados como direito fundamental do obreiro, onde na dúvida sobre a existência da origem laboral do quadro depressivo, a solução deveria ser a favor do empregado, caso não se pudesse afastar o trabalho como uma das possíveis causas do quadro (ABREU, 2007, p. 79).
Por mais que exista dificuldade na verificação do nexo causal, o que deve melhorar é o modo de avaliação para descobrir a origem da enfermidade e não simplesmente a negação de um direito, sustentando-se na tese de que a depressão não pode ser considerada doença ocupacional pela dificuldade de comprovação da ligação com o trabalho.
Inclusive, o termo utilizado é dificuldade e não impossibilidade. Ademais, a característica multifatorial da depressão não poderia ser justificada como impedimento para o reconhecimento da sua vinculação ao trabalho, porque sendo apenas uma concausa, o reconhecimento como acidente do trabalho está plenamente garantido na Lei 8.213/1991.
Observa-se, assim, forte contexto nebuloso entre as percepções teóricas e as decisões judiciais sobre o tema, onde o trabalhador não pode ficar desamparado diante da possibilidade de não atingir metas, sofrendo abusos ficando a margem da justiça e sua verdade fática.
Cumpre deixar claro que a relação do assédio moral como fonte desencadeadora de depressão, além surtir efeitos jurídicos para o empregado e o empregador, atingirá também o Estado e a sociedade, transpondo, portanto, a sua esfera meramente contratual.
Assim, conforme ensina Cavalieri Filho (2014, p. 28) a concausa é “outra causa que, juntando-se à principal, concorre para o resultado”. O autor acrescenta, ainda, que a concausa “não inicia nem interrompe o processo causal, apenas o reforça, tal como um rio menor que deságua em outro maior, aumentando-lhe o caudal”.
Dessa forma, a configuração da concausalidade prescinde da existência e efetiva comprovação da contribuição da atividade laboral para o acidente do trabalho, seja por fato preexistente, superveniente ou concomitante, mas com a presença da prática da atividade no nexo causal, mesmo que indiretamente, verificando-se que o trabalho contribuiu para o acometimento do infortúnio, ou para seu agravamento.
Assim, se as condições de trabalho a que se submetia o trabalhador, embora não tenham sido a causa única, contribuíram diretamente para a redução ou perda da sua capacidade laborativa, deve-lhe ser assegurada a indenização pelos danos sofridos.
Em casos de moléstias concausais, o que deve ser de fato levado em consideração quando da análise da responsabilidade do empregador são as atividades desenvolvidas pelo empregado, os movimentos realizados, a força física empregada, enfim, o meio ambiente do trabalho e não se ater a listas trazidas pela legislação que elencam genericamente as patologias sem ter como prever cada caso de forma específica, cuja análise cabe aos operadores do direito (ABREU, 2007).
Apesar de as normas protetivas da saúde do trabalhador estarem dispersas no ordenamento jurídico brasileiro em diversos regramentos de diferentes hierarquias normativas, o bem-estar físico e mental do trabalhador integra o direito fundamental à saúde, sendo, portanto, um direito essencial à vida humana, cabendo a todos os atores sociais efetivá-lo.
Desta feita, a Justiça do Trabalho deve evitar a rigidez clássica do positivismo jurídico, conforme ensina Bobbio (1995, p. 63): “Hoje, estamos acostumados a pensar no Direito em termos de codificação, como se ele devesse necessariamente estar encerrado num código”.Todavia, conforme o jurista, “Isto é uma atitude mental particularmente enraizada no homem comum e da qual os mais jovens que iniciam seus estudos jurídicos devem se livrar”.
A proteção constitucional em caso de acidente do trabalho decorre do artigo 201, § 10 e do artigo 7º, inciso XXVIII da Constituição Federal. A proteção previdenciária não exime a empresa de adotar as medidas de proteção coletivas e individuais previstas na CLT e nas Normas Regulamentadoras, constituindo contravenção penal o seu descumprimento. Também é dever da empresa prestar informações pormenorizadas sobre os riscos da operação a executar e do produto a manipular dado os aspectos legais que circundam as concausas e o processo de adoecimento no meio do trabalho.
2 ASPECTOS LEGAIS SOBRE A CONCAUSA E O ADOECIMENTO NO MEIO DO TRABALHO
Advertida pela OMS como doença mais incapacitante já em 2020, vem com o art. 21, I, da lei 8.213 a responsabilidade da empresa em decorrência da concausa (causa concorrente ligada direta ou indiretamente ao trabalho) para o resultado de determinada doença incapacitante ao trabalhador.
Não obstante, a Constituição Federal em seu art. 6º, recentemente alterado pela Emenda Constitucional nº 90 de 2015, já trazia disposição para referendar à Previdência Social como direito social. Por sua vez, estes se desempenham através da atuação do Estado, para dirimir a desigualdade social.
Dispõe o art. 1º da Lei 8.213 que a Previdência Social, sobre contribuição, procura assegurar a seus beneficiários proteção social, viabilizando meios imprescindíveis à sobrevivência do ser humano, devido a sua incapacidade:
Art. 1º A Previdência Social, mediante contribuição, tem por fim assegurar aos seus beneficiários meios indispensáveis de manutenção, por motivo de incapacidade, desemprego involuntário, idade avançada, tempo de serviço, encargos familiares e prisão ou morte daqueles de quem dependiam economicamente.
Segundo Martins (2016, p. 10), “previdência vem do latim prévidere, ver com antecipação as contingências sociais e procurar compô-las, ou de praevidentia, prever, antever”.
Com a chegada da Emenda 45, e consequentemente com a preocupação quanto à proteção jurídica da saúde dos trabalhadores, passou-se a ser analisada a possibilidade de se caracterizar tecnicamente a depressão como “doença” do trabalho, procurando delimitar até que ponto esta enfermidade e o trabalho interferem um no outro.
Entretanto, a primeira legislação brasileira a tratar a respeito de acidente laboral surgiu no ano de 1919, pelo Decreto-Lei 3.724 de 15 de janeiro de 1919, que veio do projeto da comissão Especial da Legislação Social da Câmara dos deputados.
A lei tinha como fundamento jurídico a teoria do risco profissional, ela visava a definir o que é acidente de trabalho, essa lei não considerava acidente de trabalho a doença profissional incomum, as que fossem geradas pelo trabalho tendo em vista, que a lei exigia que a mesma fosse exclusivamente pelo exercício do trabalho, o que fazia com que a interpretação da lei tornasse um conceito muito restrito.
Com o Decreto-Lei número 7.036/1944 que ampliou o conceito de acidente de trabalho, dando uma interpretação maior, mesmo com os casos em que aparentemente não estão relacionados com o exercício do trabalho tem um sentido muito mais amplo. Para essa lei bastava ter um nexo de causalidade entre a doença existente e a atividade laboral.
Por fim, a lei que regulamenta a matéria até os dias de hoje de acordo com a Constituição Federal de 1988, é a Lei 8.213/91[28], na qual em seu artigo 20 inciso I, relaciona as doenças ocupacionais equiparadas a acidente de trabalho, considera como doença profissional aquela produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade e constante na relação elaborada pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social, e que atualmente estão elencadas nos termos do Decreto 357/91, alterado pelo decreto 611/92.
A realidade do nosso país mostra a questão da atividade laboral em pessoas com 60 anos ou mais. Essa parcela populacional é a mais atingida pela depressão, podendo dificultar a continuação da atividade produtiva.
Na Consolidação das Leis do Trabalho, (CLT), através da portaria de nº 3.214/78, encontramos diversas normas regulamentadoras (NR), concernentes a segurança e a proteção do trabalhador.
Ela nos traz diversos mecanismos de conservação do meio ambiente e prevenção de acidentes e doenças do trabalho, através de imposição e deveres aos empregadores, bem como aos órgãos da Administração Pública.
Sendo assim, o empregado quando inserido na cadeia produtiva da empresa, passa a executar suas tarefas em um meio ambiente próprio do trabalho, considerando este como um conjunto de condições de produção em que a união do capital com o trabalho resulta na obtenção de bens e serviços.
Sob a luz do art. 200, VIII, da Constituição Federal de 1988, o empregado passa a ter direito a um meio ambiente de trabalho, que lhe proporcione uma boa qualidade de vida, uma vez que passa boa parte de seu dia sob condições de trabalho.
Logo a busca incessante por resultados imediatos, e lucros altíssimos, faz com que muitos empregadores aforem a degradação do meio ambiente de trabalho, cuja preservação é de responsabilidade das pessoas físicas e jurídicas, conforme o Art.225, §3º da Constituição Federal de 1988.
Resta claro, portanto, na visão de Martins (2011), que a relação entre mundo de trabalho e meio ambiente compõe o instrumental de concepção da Organização Internacional do Trabalho, principalmente quando se trata de tutelar a saúde do trabalhador e a sua segurança, são princípios do direito ambiental ao vinculo capital versus trabalho pela similitude dos bens jurídicos tutelados, que viabilizam os princípios do meio ambiente, do desenvolvimento sustentável, da correção no risco na fonte, da intervenção estatal obrigatória, da prevenção e entre outros fatores.
A Organização internacional do trabalho (OIT) se posiciona na defesa de imprescindíveis quesitos que englobam o direito a segurança e a salubridade, ela tem por meta, a justiça social na medida em que visa alcançar o progresso das formas de trabalho desempenhadas mundialmente. A convenção n. 155 da OIT, que explica a relação entre saúde do trabalhador e meio ambiente de trabalho, ao especificar principalmente a questão da saúde e segurança dos trabalhadores, define local de trabalho como: “todos os lugares onde os trabalhadores devem permanecer ou onde tem como comparecer, e que estejam sob o controle, direito ou indireto do empregador”.
No artigo 155 da CLT, encontramos o papel desenvolvido pela medicina do trabalho, voltada a preservar a saúde do trabalhador avaliando antes e depois o estado e a saúde bem como a elaboração de métodos de prevenção considerando os riscos e os perigos ao quais os trabalhadores estão expostos nos seus mais variados setores de trabalho.
Ainda no capítulo V da CLT, que trata da Segurança e Medicina do Trabalho, cujo nos artigos 154 a 160, disciplinam em normas gerais a matéria, cujas especificações constituem atribuição do Ministério do Trabalho, que através de seus órgãos técnicos e mediantes diversas portarias, instruções e ordens de serviço, elaboram o quadro das atividades insalubres e perigosas. Além da CLT, a Lei 7.369, de 20 de setembro de 1985, disciplina o trabalho perigoso em redes elétricas.
Logo se pode afirmar que a responsabilidade pelas condições perigosas do trabalho da qual é submetido o empregado, recai ao empregador, do qual deve ter o discernimento que o bem mais importante que há na sua empresa é a saúde de seus empregados. Portanto, para que os empregados possam produzir, é necessário um ambiente propício para o desenvolvimento de seu trabalho, na qual possa ser resguardado seu conforto físico e mental.
Com frequência, a Justiça do Trabalho tem determinado o pagamento de indenizações, com o fundamento da existência da concausa.
O nexo concausal é uma questão ainda não aclarada na responsabilidade civil, pela absoluta falta de previsão legal do seu alcance e consequências jurídicas, diferentemente do nexo causal, onde há o vínculo direto de causa e efeito que liga a execução dos serviços e a doença do trabalhador, devidamente previsto nos art. 949 e 950 do Códido Civil. No entanto esse motivo não tem impedido à responsabilização civil da empresa.
O entendimento dos Tribunais do Trabalho é no sentido de que é do empregador a obrigação de cumprir e fazer cumprir as normas de segurança e medicina do trabalho, conforme art. 157, I, CLT (Art. 157 – Cabe às empresas: I – cumprir e fazer cumprir as normas de segurança e medicina do trabalho).
3 ASPECTOS JURISPRUDENCIAIS
A fim de uma melhor compreensão do tema abordado se faz necessário a análise de casos concretos sobre a concessão do benefício auxílio-doença. Para tanto, examinar-se-á jurisprudências do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), e Tribunal Regional Federal da 4º Região (TRF4). Foram encontradas 17 decisões judiciais no TJRS e 1.658 no TRF4, que tinham relação com pedidos de auxílio doença e depressão, no período de 2015 até outubro de 2017.
De acordo com Duarte (2011, p. 16), são dois os requisitos: incapacidade para o trabalho ou atividade habitual por mais de 15 dias consecutivos e a carência. A primeira trata, em regra, de uma incapacidade temporária, que impede o segurado de exercer suas atividades laborativas. A segunda trata do período que se exige de contribuição à Previdência Social para fazer jus ao benefício.
APELAÇÃO. REEXAME NECESSÁRIO. ACIDENTE DO TRABALHO. AUXILIO-DOENÇA. PREVISÃO CONSTITUCIONAL DA PRO- TEÇÃO AO TRABALHADOR. EXAME DA LEGISLAÇÃO. AMPUTAÇÃO DE FALANGE DE QUIRODÁCTILO. TRANSTORNOS PSI- QUIÁTRICOS (DEPRESSÃO) DECORRENTE DA LESÃO. CONCAUSA. INCAPACIDADE TEMPORÁRIA. – AUXÍLIO-DOENÇA – Os benefícios acidentários estão inseridos no siste- ma constitucional de proteção ao trabalhador, constituindo-se em direito social fundamental. Compreensão do princípio constitucional da dignidade humana (art. 1º, III, CF) e do artigo 6º da Constituição Federal. Os requisitos legais do auxílio-doença estão previstos no artigo 59 da Lei nº 8.213/91. A presença da incapacidade para o trabalho por período superior a 15 (quinze) dias é requisito fundamental para a concessão do benefício, a ser constatada mediante a realização de prova pericial. A incapacidade laboral, comprovada por pericia médica, por período superior a 15 (quinze) dias autoriza a concessão ao trabalhador do auxílio-doença. Precedentes. Caso em que a perícia produzida nos autos demonstra que o autor se encontra temporariamente incapacitado para o trabalho, por estar acometido de quadro depressivo, decorrente da lesão sofrida no acidente de trabalho, que resultou a amputação de falange do 4º quirodáctilo da mão direita. Acidente que atuou como causa para o desencadeamento da depressão. – TERMO INICIAL – Demonstrada a persistência da incapacidade da parte autora após o cancelamento administrativo, o termo inicial do benefício deve observar tal marco temporal. – CORREÇÃO MONETÁRIA – A correção monetária incidente sobre as parcelas vencidas será pelo IGP-DI até 31.03.2006, e o INPC desde 01.04.2006 até a vigência da Lei nº 11.960/09, quando tanto a correção monetária quanto os juros moratórios serão atualizados uma única vez e pelos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança. – CUSTAS – ISENÇÃO – As Pessoas Jurídicas de Direito Público estão isentas do pagamento de custas processuais. Rio Grande do Sul. Tribunal de Justiça. Nona Câmara Civil. Apelação Civil nº 70051261683 – Comarca de Vacaria. Relator: Marilene Bonzanini, 14 de nov. 2012. Diário de Justiça, Porto Alegre, 27 de nov. 2012
O Tribunal Regional Federal da 4ª Região, com sede em Porto Alegre, tem jurisdição nos Estados do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Neste Tribunal os magistrados julgam recursos de ações que abarcam empresas públicas autarquias e a União Federal, assim como causas envolvendo matéria previdenciária e execuções fiscais.Desse modo, segue análise de decisões do Tribunal.
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSO CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO
POR INCAPACIDADE. COMPLEMENTAÇÃO DA PROVA PERICIAL. DESNECESSIDADE.
1. Tendo o expert respondido de modo claro e coerente a todos os quesitos formulados, sendo conclusivo quanto ao atual estado de saúde da parte requerente, bem como quanto aos períodos em que constatou a existência de incapacidade laborativa, inexiste motivo a ensejar a complementação da prova pericial. 2. O julgador formará sua convicção não apenas com base na prova pericial, mas sim a partir da composição dos dados por ela fornecidos com os demais elementos constantes dos autos. 3. A mera irresignação da parte com as conclusões do perito não fundamenta, isoladamente, pedido de nova perícia médica ou sua complementação, quando a matéria se encontra suficientemente e escla- recida.
De acordo com o julgamento do Recurso Revista 1206-85.2011.5.04.0403 julgado em 15/05/2013, pela segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Relatora Maria das Graças Silvany Dourado Laranjeira, manteve a decisão que condenou a empresa Penasul Alimentos Ltda. ao pagamento de indenização por danos morais e materiais a uma trabalhadora diagnosticada com esquizofrenia.
O caso foi considerado doença ocupacional, e a empresa foi condenada ao pagamento de indenização por danos morais na quantia de R$ 28.000,00 (vinte e oito mil reais). A patologia é conhecida como transtorno esquizoafetivo, e foi diagnosticada em 2004. Os sintomas incluem delírios, alucinações, humor expandido e depressão.
Estudos recentes mostram que o meio ambiente laboral pode ser fator originário ou desencadeante dessa e de várias outras enfermidades. De acordo com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), estima-se que surgem a cada ano mais de 160 milhões de casos de doenças relacionadas ao trabalho. No topo das enfermidades estão os transtornos mentais.
Como não é possível a norma estabelecer regras de comportamento para todas as etapas da prestação de serviços, abrangendo cada passo, gesto, variável, atitude, forma de execução ou manuseio dos equipamentos, exige-se do empregador o dever de observar uma regra genérica de diligência, uma postura de cuidado permanente, a obrigação de adotar todas as precauções para não lesar o empregado.
Neste sentido, segundo Cavalieri Filho (2014), julgado em 15/05/2013,firmou entendimento a 3ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região de Goiânia, conforme se depreende da leitura do acórdão proferido pelo Desembargador Geraldo Rodrigues do Nascimento, no Processo nº RO – 0001922-31.2011.5.18.0013 a operadora de call center que exercia suas atividades laborais, na empresa Atento Brasil S/A irá receber indenização por danos morais devido ao desenvolvimento de Síndrome de Burnout, também conhecida como a Síndrome do esgotamento profissional, ocasionada pelo forte ritmo estressante de trabalho.
A reclamada foi condenada ainda ao pagamento de horas extras, indenização por danos morais e reversão da dispensa por justa causa. A empresa inconformada com a decisão alegou que a dispensa por justa causa ocorreu devido à trabalhadora ter xingado um cliente. Já quanto à indenização por danos morais, a empresa argumenta que não é devida, pois sempre orienta os teleoperadores a desligarem o telefone quando os clientes são grosseiros e mal-educados, e que por isso eles teriam no máximo, “o dissabor de ouvir algo desagradável”.
Segundo o relator do processo, desembargador Geraldo Rodrigues do Nascimento, as provas constantes dos autos evidenciam estarem presentes todos os elementos indispensáveis à responsabilidade civil da empresa. Conforme perícia médica ficou caracterizada a relação de causa estresse laboral e efeito Síndrome de Burnout.
O perito ainda destacou que “é de conhecimento técnico científico o evidente risco psíquico para a atividade de tele atendimento”. Citou ainda a Norma Regulamentadora nº 17 do Ministério do Trabalho e Emprego, que estabelece a garantia de pausas no trabalho imediatamente após operação onde haja ocorrido ameaças, abuso verbal, agressões ou que tenha sido especialmente desgastante. Conforme relatado por depoimentos de testemunhas, a empresa não concedia esse intervalo previsto na NR-17 se as pausas legais já tivessem sido concedidas.
Ao que parece, o grande desafio para fins de caracterização é a relação de causalidade, sendo o nexo o elo de ligação, e a correlação, laço ou relação direta se causa e efeito entre o fato gerador de responsabilidade e o dano ocasionado á vítima, pois será responsável por ele que lhe tiver dado causa.
É também um dos elementos importantes na perquirição indenizatória, pois é através dele que poderemos chegar ao responsável pelo dano; entretanto, para responsabilizar, a agente necessariamente há de haver uma ligação de causa e efeito entre a conduta do ofensor e o resultado danoso. Assim, o comportamento doloso ou culposo deve ser oriundo do dano que o resultado final da causa e o efeito.
Silva (2011, p. 7), cita que num estudo referente ao nexo de causalidade “é preciso que esteja certo que, sem este fato o dano não teria ocorrido. Assim, não basta que uma pessoa tenha contravindo a certas regras; é preciso que sem esta contravenção, o dano não ocorreria”.
A doutrina propôs três teorias que buscam amenizar a questão. A primeira é da equivalência das condições, Cavalieri Filho (2014), ensina que condição é todo antecedente que não pode ser eliminado mentalmente sem que venha a ausentar-se o efeito conditio sine qua non, por essa teoria, “causa será toda condição que haja contribuído para o resultado”, ou seja, todas as condições têm o mesmo valor, a mesma relevância, todas se equivalem, sem haver necessidade de provar a causa que mais contribui para o resultado final.
Essa teoria é insatisfatória, uma vez que poderia se chegar a uma cadeia infinita de nexo causal, e embora tenha surgido para beneficiar a vitima, foi abandonada por inadequação.
A segunda teoria, a da Causalidade adequada, foi desenvolvida pela doutrina francesa, dentre os antecedentes do dano, há que destacar aquele que está em condições de necessariamente tê-lo produzido. Numa cadeia de condições, cumpre analisar qual foi à causa que mais contribuiu para causar a lesão.
As concausas podem ocorrer por fatos preexistentes, supervenientes ou concomitantes àqueles que desencadearam o implemento do nexo de causalidade. Em determinados casos o trabalho é o único fator que desencadeia a doença; em outros, o trabalho é tão somente um fator contributivo; pode ser ainda que o trabalho apenas agrave uma patologia preexistente ou determine a precocidade de uma doença latente.
Em que pese a importância doutrinária das teorias do nexo causal ou concausal, não há fórmula infalível que se aplique a todas a situações, mormente em tema tão singular e complexo, como é o caso das indenizações por acidente do trabalho e doenças ocupacionais.
Segundo Abreu (2007), são apenas técnicas auxiliares sedimentadas pela doutrina, que indicam possíveis roteiros de solução das controvérsias quanto ao nexo causal. A realidade, contudo, é muito mais rica e diversificada do que qualquer esquema classificatório e cada caso concreto tem especificidades que somente a inteligência do julgador será capaz de perceber e encontrar o caminho mais justo para dirimir a controvérsia.
O jurista Cavalieri Filho (2014, p. 88) pontuou: “A doutrina atual tem preferido falar, em lugar de concorrência de culpas, em concorrência de causas ou de responsabilidade, porque a questão é mais concorrência de causa do que de culpa.
É ponto pacífico atualmente que a chamada culpa exclusiva da vítima impede a reparação dos danos pela inexistência do nexo causal. Desse modo, pode-se afirmar também que há um nexo causal atenuado ou parcial quando a doença decorrer de fatores causais laborais e extralaborais.
Dentro deste panorama, restando comprovado efetivamente o abuso, no meio ambiente laboral, este ato deve ser considerado ilícito, com repercussões no âmbito civil e penal.
A Carta Maior do nosso ordenamento jurídico serve de fundamento para esta tese, pois no seu artigo 5º, inciso X constitui como "invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação".
Neste mesmo sentido, o Código Civil Brasileiro, determina no art. 186 que “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito, ou causa prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano".
Portanto, atualmente, a responsabilidade objetiva do empregador possui fundamentação nas disposições do inciso III, do artigo 932, do Código Civil, em que o empregador é responsável civilmente pelos atos de seus empregados, prepostos e serviçais, em razão ou no exercício de seu trabalho.
A fim de confirmar este posicionamento, o Código Civil de 2002, no artigo 933, estabelece a responsabilidade civil, independente de culpa por atos dos terceiros. Fixada a atual responsabilidade do empregador, importa tecer algumas considerações acerca do direito a saúde mental no ambiente de trabalho.
Deve-se ressaltar que os Direitos Fundamentais possuem plena aplicabilidade nas relações privadas, sendo igualmente dever das Empresas proporcionar o melhor ambiente de trabalho, sob pena de serem responsabilizadas civilmente, arcando com a devida reparação pecuniária
A depressão é um grave problema de saúde na atualidade, com repercussões na seara previdenciária, ou seja, mais do que um problema pessoal do trabalhador, ou uma responsabilidade corporativa, a depressão deve ser tratada como um problema social. Apesar do crescente interesse doutrinário acerca do assédio moral, ainda há muito espaço para o estudo da matéria, principalmente levando-se em consideração a quantidade de estudos realizados na área no direito estrangeiro.
Provar a existência de um transtorno mental, bem como sua relação com o trabalho, não é uma tarefa fácil, haja vista inexistir consenso estabelecido que reconheça a relação direta entre depressão e trabalho. Parte dessa dificuldade situa-se justamente na origem da doença, que pode ter sua gênese em fatores genéticos, psicossociais e/ou biológicos
Sendo assim, o estudo dessa relação deve considerar diversos fatores, como a personalidade do trabalhador, a capacidade de resiliência, as condições de trabalho e as formas como o sujeito enfrenta o estresse (AMBRÓSIO, 2013).
Contudo, o crescente número de transtornos físicos e mentais associados ao trabalho demonstra que ainda não foi possível alcançar a atenção ideal à integridade física e psíquica do trabalhador. Resta claro que o ambiente laboral é capaz de influenciar de forma decisiva na saúde do indivíduo, que, na maioria das vezes, passa a maior parte de suas vidas nesse local.
4CONCLUSÃO
Diante desse contexto, em que transtornos mentais relacionados ao trabalho possuem grande recorrência, torna-se relevante debater a efetiva proteção do trabalhador que adoece e recorre ao Judiciário em busca de uma tutela indenizatória.
Nota-se que a saúde dos trabalhadores deve ser preservada, sendo necessário o devido respeito e cuidado por parte dos Empregadores. Observou-se que o processo saúde-doença é potencializado pelas condições de trabalho, sendo este um determinante social da saúde.
Aspectos como pressões excessivas, cobranças de metas, agressões morais, ameaças de terceirização, perseguições, demissões, exercício de atividades mecânicas e sem criatividade são causas comuns de problemas psíquicos.
Não obstante, ainda há obstáculos que dificultam o reconhecimento e o tratamento que o tema merece. O maior deles é o nexo causal traduzido pela dificuldade de se vincular a doença desenvolvida pelo trabalhador com o seu ambiente de trabalho.
Isso pode ser ilustrado pela depressão ocupacional que é considerada uma doença de origem multicausal que pode ter origem genética ou em virtude de qualquer outro determinante social, dificultando a afirmação por parte de especialistas da origem laboral do transtorno.
Ainda que exista essa subjetividade inerente ao tema, a relação saúde-trabalho é latente. A associação entre os ambientes de trabalho e o bem-estar psíquico do trabalhador é apontada pela literatura desde tempos remotos, o que se justifica pelo tempo que o trabalhador dispõe para o labor, além de essa atividade estar na esfera da obrigação que muitas vezes não é exercida com criatividade e liberdade, mas como fonte de estresse e pressões infindáveis.
A discussão na esfera judicial também enfrenta esse subjetivismo. A grande pergunta para a justiça é se há ou não relação de causalidade entre o trabalho e o transtorno mental. A possibilidade de outras causas que não o trabalho acaba sendo um argumento fácil para aqueles que não acreditam nessa relação ou que a analisam com olhos preconceituosos.
O assédio moral também foi observado como condição capaz de afetar a saúde psíquica do trabalhador que acaba ficando acuado diante das repetidas investidas de superiores em humilhar e constranger através de comentários sobre a produtividade do trabalhador, sua aparência e até sua orientação sexual.
É preciso dar um basta em certas condutas. O trabalhador não pode ser encarado como um brinquedo em exposição, o conceito de dignidade da pessoa humana deve ser preservado nos ambientes de trabalho, cabendo ao Estado combater os abusos de forma eficaz e não somente através da justiça.
No panorama da proteção conferida pela justiça, verificou-se que os tribunais têm concedido indenização por dano moral ou material aos trabalhadores, o que apenas resta prejudicado, na maioria das vezes, quando o nexo causal não é identificado pelo juiz, seguindo ou não a perícia judicial, observando também as outras provas do processo.
Observou-se que há grande relevância na prova pericial para o enfrentamento da questão do nexo causal, sendo muito comum que os julgadores sigam a opinião do perito quanto à associação entre o trabalho e a doença. Entretanto, devemos frisar o caso especial que abordamos em que o juiz ao contrário do perito reconheceu o nexo causal pelas demais provas nos autos, caso emblemático e de bom alvitre ressaltar.
Desse modo, pode-se inferir que o ordenamento jurídico disciplina a saúde do trabalhador através das leis e que cabe aos julgadores o papel de tutelar os direitos daqueles que buscam uma reparação na justiça, principalmente, diante de um quadro em que não se vislumbram Políticas Públicas específicas voltadas para saúde mental do trabalhador.
Não se deve admitir que, com a quantidade de dispositivos legais existentes no Brasil, ainda existam Empresas que insistam em não os cumprir, agindo com descaso e pondo em risco a saúde da força de trabalho responsável por seu lucro. Mais ainda, que trabalhadores deixem de denunciar essas mazelas, seja na justiça ou nos órgãos administrativos de proteção à saúde do trabalhador.
Claro que existem aqueles que precisam se omitir porque ainda possuem vínculo empregatício com a Empresa, o que é lastimável devido às mínimas opções de combate no atual sistema, apenas denúncias anônimas nos órgãos administrativos, sem se colocar em risco o emprego.
Do exposto, verifica-se que a forma como o ordenamento jurídico pode proteger os trabalhadores vítimas de danos nos ambientes do trabalho é através da aplicação da lei com a tutela judicial de reparação de danos, não havendo escassez de leis quanto ao tema de saúde do trabalhador na esfera da reparação.
Nesse cenário, conclui-se que, nos termos da Política Nacional as ações de Saúde do Trabalhador na rede de serviços devem ser assumidas pelo Sistema como um todo, tendo como porta de entrada a rede básica de saúde e como retaguarda técnica os Centros de Referência em Saúde do Trabalhador e os níveis mais complexos desse Sistema.
Pretende-se, dessa forma, que as ações atinjam todos os trabalhadores do País, cumprindo o preceito constitucional e as determinações da Lei Orgânica da Saúde (LOS) n.º 8.080/1990. A preparação de um material de apoio para a atuação dos profissionais responsáveis pela atenção aos trabalhadores no sistema de saúde tem sido uma demanda de todos aqueles que se dedicam ao campo da Saúde do Trabalhador.
Nessa concepção, trabalhadores são todos os homens e mulheres que exercem atividades para sustento próprio e/ou de seus dependentes, qualquer que seja sua forma de inserção no mercado de trabalho, nos setores formais ou informais da economia.
Estão incluídos nesse grupo os indivíduos que trabalharam ou trabalham como empregados assalariados, trabalhadores domésticos, trabalhadores avulsos, trabalhadores agrícolas, autônomos, servidores públicos, trabalhadores cooperativados e empregadores – particularmente, os proprietários de micro e pequenas unidades de produção.
São também considerados trabalhadores aqueles que exercem atividades não remuneradas – habitualmente, em ajuda a membro da unidade domiciliar que tem uma atividade econômica, os aprendizes e estagiários e aqueles temporária ou definitivamente afastados do mercado de trabalho por doença, aposentadoria ou desemprego.
Entre os determinantes da saúde do trabalhador estão compreendidos os condicionantes sociais, econômicos, tecnológicos e organizacionais responsáveis pelas condições de vida e os fatores de risco ocupacionais – físicos, químicos, biológicos, mecânicos e aqueles decorrentes da organização laboral – presentes nos processos de trabalho.
Assim, as ações de saúde do trabalhador têm como foco as mudanças nos processos de trabalho que contemplem as relações saúde-trabalho em toda a sua complexidade, por meio de uma atuação multiprofissional, interdisciplinar e intersetorial.
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aluna do curso Bacharel em Direito da Faculdade imaculada Conceição do Recife.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SANTOS, Denise Patrício dos. Depressão e concausa no ambiente de trabalho: aspectos legais, doutrinários e jurisprudenciais Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 31 dez 2018, 05:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/52543/depressao-e-concausa-no-ambiente-de-trabalho-aspectos-legais-doutrinarios-e-jurisprudenciais. Acesso em: 06 out 2024.
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