ANDRÉ P. VIANA[1]
(Orientador)
RESUMO: A Súmula Vinculante nº 56 do Supremo Tribunal Federal baseada em diretrizes fundamentadas no RE 641.320, visa garantir ao sentenciado a correta execução penal, como forma de diminuir às prisões em regime prisional mais gravoso, a fim de que se evite violação a princípios constitucionais. A presente pesquisa busca apontar como método eficaz de prevenção de aprisionamentos desnecessários e irregulares ante a natureza da pena aplicada ao caso concreto, uma vez que a inclusão do apenado em regime prisional oposto, além de violar os princípios da individualização da pena e da legalidade garantidos pela Constituição Federal como direitos fundamentais do cidadão, causa ao sistema prisional alterações significativas quanto à superlotação. Diante do prejuízo ao condenado da manutenção em regime prisional diverso do determinado em lei, esse tema foi escolhido com o propósito de solucionar esse problema, apresentando de maneira clara e fundamentada em leis, principalmente na Súmula Vinculante nº56 do STF, que sua aplicabilidade é medida que se impõe. Sendo assim, serão anexados a este trabalho, dados retirados do Departamento Penitenciário Nacional a fim de evidenciar a gravidade da violação às normas supramencionadas, atribuindo maior preferência aos estados do Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo.
Palavras-Chave: Penitenciária. Súmula. Gravidade. Prisão. Semiaberto.
ABSTRACT: The Boundary Precedent 56 of the Federal Supreme Court based on directives based on RE 641,320, aims to guarantee the sentenced person the correct penal execution, as a way to reduce prisons in a more burdensome prison system, in order to avoid violation of constitutional principles. The present research seeks to point out as an effective method of preventing unnecessary and irregular imprisonment in face of the nature of the sentence applied to the concrete case, since the inclusion of the victim in an opposite prison regime, in addition to violating the principles of the individualization of punishment and legality guaranteed by the Federal Constitution as fundamental rights of the citizen, causes the prison system significant changes in terms of overcrowding. Faced with the prejudice to the prisoner of prison maintenance other than that determined by law, this topic was chosen with the purpose of solving this problem, presenting in a clear and grounded manner in laws, especially in Binding Summary 56 of the STF, that its applicability is measured which is imposed. Accordingly, data from the National Penitentiary Department will be annexed to this work, in order to highlight the seriousness of the violation of the aforementioned norms, giving greater preference to the states of Rio de Janeiro, Minas Gerais and São Paulo.
Keywords: Penitentiary. Summary. Gravity. Prison. Semi open.
SUMÁRIO: Introdução. 1. Regimes de Cumprimento de Pena Privativa de Liberdade no Brasil; 1.1 Regime Fechado; 1.2 Regime Semiaberto; 1.3 Regime Aberto; 2. Manutenção do Condenado em Regime Prisional Diverso; 2.1 Súmula Vinculante nº 56; 2.1.1 Saída Antecipada; 2.1.2. Liberdade Eletrônica Monitorada; 3. Posicionamento dos Tribunais; 4. Violação a Princípios Constitucionais; 4.1 Princípio da Individualização da Pena; 4.2. Princípio da Legalidade; 4.3. Constrangimento Ilegal; Conclusão; Referências.
O sistema prisional brasileiro possui um índice muito grande de superlotação e que a manutenção do condenado em regime prisional diverso e mais gravoso do determinado em sentença condenatória seria prejudicial e aumentaria o número de aprisionamentos.
Através de estudos, medidas podem ser adotadas com a finalidade de evitar o encarceramento e diminuir o índice de prisões, uma vez que há a possibilidade com base no RE n. 641.320, de penas alternativas à prisão, como monitoramento eletrônico e prisão domiciliar a depender do caso.
O encarceramento em massa que assola o sistema prisional brasileiro deve ser exposto para apresentar as precariedades das prisões irregulares quanto ao regime legalmente atribuído ao caso em concreto, sendo uma forma de atentar o Poder Judiciário para as ilegalidades que estão sendo realizadas no que tange a execução da pena pelo condenado, justificando a escolha por esse tema, uma vez que a violação não é apenas à norma legal prevista em Súmula Vinculante do STF, mas à norma constitucional, violando preceitos de direito fundamental do ser humano como a individualização da pena e da legalidade, onde a execução penal se tornou instrumento de livre convencimento do magistrado, deixando este de observar o previsto em lei.
Gerar na sociedade, principalmente entre os operadores do direito o desejo de justiça, não vilipendiando a dignidade daqueles que se encontram encarcerados é medida a ser alcançada através da aplicação correta dos institutos penais, mantendo intacto e sem qualquer violação os dispostos na Constituição Federal no que se refere aos princípios da legalidade e individualização da pena, oportunizando àqueles que cometeram delitos com penas passíveis de progressões ou penas alternativas, usufruir desses benefícios determinados pela Lei de Execuções Penais.
Além do mais, com a correta aplicação das disposições legais vigentes acerca do assunto ora debatido, visando prevenir o constrangimento ilegal praticado pelo Estado em face do condenado, uma vez que manter o acusado custodiado em regime prisional diverso do determinado por lei, seria imoral às nuances da dignidade da pessoa humana.
Sobre o tema, o doutrinador Márcio André Lopes Cavalcante, disserta:
Vale ressaltar que não é possível "relativizar" esse direito do condenado com base em argumentos ligados à manutenção da segurança pública. A proteção à integridade da pessoa e ao seu patrimônio contra agressões injustas está na raiz da própria ideia de Estado Constitucional. A execução de penas corporais em nome da segurança pública só se justifica se for feita com observância da estrita legalidade. Permitir que o Estado execute a pena de forma excessiva é negar não só o princípio da legalidade, mas a própria dignidade humana dos condenados (art. 1º, III, da CF/88). Por mais grave que seja o crime, a condenação não retira a humanidade da pessoa condenada. Ainda que privados de liberdade e dos direitos políticos, os condenados não se tornam simples objetos de direito (art. 5º, XLIX, da CF/88).[2]
Ainda, no ano de 2016, a até então ministra Carmen Lúcia, durante palestra ministrada no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, dissertando sobre o tema prisões no Brasil, apresentou a seguinte frase: "Todo ser humano é maior do que o seu erro.", de grande repercussão, assegurando ainda que o condenado não deixa de perder sua dignidade ao se submeter ao cumprimento da pena.
Não é de hoje que se observa grande carência de unidades prisionais destinadas a presos em regime semiaberto no Brasil, ocorre que com essa insuficiência, os condenados que arcam com essa inércia do Estado.
Por fim, há necessidade da aplicação de medidas alternativas ao aprisionamento daquele que esteja vinculado ao regime semiaberto, como forma de não só aplicar a lei, mas de beneficiar àquele que esteja cumprindo pena, garantindo assim, que sua dignidade não seja violada.
Durante a Idade Média nos mosteiros, as penas de prisão eram impostas aos monges e clérigos quando estes se tornavam faltosos perante Deus. O doutrinador Manoel Pedro Pimentel dissertou acerca do assunto em um de seus livros:
Como punição impostas aos monges e clérigos faltosos, fazendo com que se recolhessem às suas celas para se dedicarem, em silencio, à meditação e se arrependerem da falta cometida, reconciliando-se assim com Deus.[3]
No Brasil, para se determinar o regime prisional ao qual o condenado deverá cumprir a pena, devem-se levar em consideração diversos fatores, conforme lição de Rui Stoco: “o legislador estabeleceu a quantidade da pena como principal critério orientador do regime prisional”.[4]
Nos termos do artigo 32 do Código Penal, as penas se dividem em:
Art. 32 - As penas são:
I - privativas de liberdade;
II - restritivas de direitos;
III - de multa.
Nos moldes do que dispõe o artigo 5º, inciso XLVI da Constituição Federal: “Inc. XLVI- a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes: Privação ou restrição de liberdade”;
Ainda, “Inc. XLVIII- a pena será cumprida em estabelecimento distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado”.
A Lei de Execução Penal nº 7.210/84, dispõe sobre a execução das penas privativas de liberdade, sendo:
Art. 105- Transitada em julgado a sentença que aplicar pena privativa de liberdade, se o réu estiver ou vier a ser preso, o Juiz ordenará a expedição de guia de recolhimento para a execução.
Ainda,
Art. 110- o Juiz, na sentença, estabelecerá o regime no qual o condenado iniciará o cumprimento da pena privativa de liberdade, observado o disposto no artigo 33 e seus parágrafos do Código Penal.
O artigo 33 do qual a Lei de Execução Penal faz referência acima, determina qual regime prisional o condenado cumprirá de acordo com a pena aplicada na sentença penal condenatória.
Ressalta-se por oportuno, que o juiz ao aplicar a pena ao condenado deverá observar diversos critérios, objetivos e subjetivos para a somatória da pena, sendo aqueles previstos no artigo 59 do Código Penal (33, §3º CP), baseando-se na culpabilidade, nos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem como ao comportamento da vítima.
As penas se distinguem em reclusão e detenção. A primeira diz respeito àquelas que deverão ser cumpridas em regime fechado, semiaberto ou aberto. Já as penas de detenção em regime semiaberto e aberto, salvo necessidade de transferência para o regime fechado.
Vale lembrar o disposto na Lei 8.072/90, no que tange a manutenção do condenado a crimes hediondos ou equiparados em regime integralmente fechado, conforme redação do artigo 2º, §1ª:
Art. 2º- Os crimes hediondos, a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e o terrorismo são insuscetíveis de:
§ 1º- A pena por crime previsto neste artigo será cumprida integralmente em regime fechado.
Ocorre que em julgamento do HC 82.959/SP, em 23 de fevereiro de 2006, de que foi relator o Min. Marco Aurélio, O Plenário declarou inconstitucional o referido inciso, por violação ao principio da individualização da pena previsto na Constituição Federal, sendo que posteriormente foi editada nova redação ao referido inciso com a expressão “inicialmente fechado”.
Além do mais, ao dar nova redação ao §1º, do artigo 2º da Lei 8072/90, o legislador possibilitou a aplicação da progressão de regimes a sentenciados nessa espécie de crimes.
Com redação dada pela Lei 11.464/07ª progressão para os crimes hediondos e equiparados, tiveram o seguinte teor;
§ 2o A progressão de regime, no caso dos condenados aos crimes previstos neste artigo, dar-se-á após o cumprimento de 2/5 (dois quintos) da pena, se o apenado for primário, e de 3/5 (três quintos), se reincidente.
A progressão de regime para os demais crimes encontra respaldo junto a Lei de Execução Penal, mais especificamente nos moldes do artigo 112:
Art. 112- A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos um sexto da pena no regime anterior e ostentar bom comportamento carcerário, comprovado pelo diretor do estabelecimento, respeitadas as normas que vedam a progressão.
E, nos termos do §2º, do artigo 33 do Código Penal: “As penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva, segundo o mérito do condenado”.
Segundo o dicionário português, progressão significa “progresso ou avanço; desenvolvimento continuado e progressivo; que tende a progredir”[5].
Já, segundo o Conselho Nacional de Justiça, progressão de regime de cumprimento de pena é “dar a oportunidade ao preso de, gradativamente, voltar a conviver em sociedade”.[6]
Ou seja, a progressão de regime é um benefício concedido ao condenado para que este passe a cumprir o restante de sua pena em regime mais brando, após o cumprimento de determinados requisitos para sua concessão, requisitos objetivos, como a fração de pena (1/6 ou 2/5, bem como em caso de reincidência por crime hediondo 3/5) e, subjetivos (bom comportamento carcerário relatado pelo Diretor Prisional.
Por outro lado, existe a regressão de regime, ou seja, a volta do preso para regime mais severo por ter cometido alguma falta grave. A regressão encontra respaldo na Lei de Execução Penal nº 7210/84, sendo de competência do juiz de execução penal aplicar tal penalidade ao condenado, nos moldes do artigo 66, inciso III, alínea “b”.
Nos moldes do artigo 33, §1, alínea “a” do Código Penal:
Art. 33 - A pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado, semi-aberto ou aberto. A de detenção, em regime semi-aberto, ou aberto, salvo necessidade de transferência a regime fechado
§ 1º - Considera-se:
a) regime fechado a execução da pena em estabelecimento de segurança máxima ou média;
Ainda nos termos do artigo 33 do Código Penal, mais especificamente no §2, alínea “a”:
§ 2º - As penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva, segundo o mérito do condenado, observados os seguintes critérios e ressalvadas as hipóteses de transferência a regime mais rigoroso
a) o condenado a pena superior a 8 (oito) anos deverá começar a cumpri-la em regime fechado;
Para a imposição de regime inicial fechado, deve-se levar em consideração a pena aplicada ao caso em concreto, uma vez que durante a aplicação do quantum, o juiz prolator da sentença penal condenatória não poderá, em nenhuma hipótese, considerar a gravidade em abstrato do crime praticado, uma vez que não constitui medida idônea para a imposição de regime prisional mais severo, conforme dispõe a Súmula 718 do STF “A opinião do julgador sobre a gravidade em abstrato do crime não constitui motivação idônea para a imposição de regime mais severo do que o permitido segundo a pena aplicada”.
Ainda, nos termos da Súmula 719 DO STF, para a imposição de regime de cumprimento mais severo do que a pena aplicada permitir exige motivação idônea.
O STJ, durante a redação da Súmula 440, assegurou que “Fixada a pena-base no mínimo legal, é vedado o estabelecimento de regime prisional mais gravoso do que o cabível em razão da sanção imposta, com base apenas na gravidade abstrata do delito”.
Sendo assim, para a determinação do regime inicial de cumprimento de pena FECHADO, deve-se ater a critérios superiores à pena, como a real gravidade do delito e do condenado, às circunstancias judiciais favoráveis, tendo em vista o que dispõe a Súmula 269 do STJ, podendo fixar o regime semiaberto a reincidentes condenados à penas igual ou inferior à 04 (quatro) anos.
O cumprimento do regime fechado dá-se em estabelecimentos prisionais de segurança máxima ou média, por exemplo, as penitenciárias, segundo art. 87: A penitenciária destina-se ao condenado à pena de reclusão, em regime fechado[7].
Deve-se cumprir a pena de reclusão em regime semiaberto em colônia agrícola, industrial ou similar, nos moldes do artigo 91 da Lei de Execução Penal, bem como nos termos do artigo 33, §1º, alínea “b” do Código Penal.
Ainda, insta acrescentar, que a pena é crucial para a determinação do regime prisional que deverá ser executado, sendo que para o semiaberto, a pena deverá ser de superior a 04 (quatro) anos e inferior a 08 (oito) anos, segundo o paragrafo §2º, alínea “b” do artigo 33, do Código Penal.
No que tange a realização de exame criminológico no sentenciado que sobrevier condenação no regime semiaberto, a sua obrigatoriedade é inexistente, uma vez que o teor do paragrafo único do artigo 8 da Lei de Execução Penal, emprega a palavra “poderá”, tornando assim, facultativa sua consumação.
Durante a execução da pena em regime semiaberto, o condenado poderá frequentar a cursos, bem como a trabalhar, seja no próprio estabelecimento prisional ou em locais externos. Essa possibilidade de desenvolvimento pessoal e profissional do sentenciado ocorre justamente para proporcionar a ele a sensação de estar reingressando à sociedade, assegurando o retorno de sua honra e moral, preenchendo a finalidade dada a ressocialização do egresso.
O Superior Tribunal de Justiça, durante voto no Habeas Corpus nº 92.320[8], julgado em 11/03/2008, entendeu que é possível a concessão de trabalho externo ao condenado em regime semiaberto, independentemente do cumprimento de um sexto da pena ou de qualquer outro lapso temporal, após analise criteriosa, pelo Juízo da Execução, das condições pessoais do preso, podendo até mesmo essa concessão do trabalho ser deferida pelo juiz no momento da prolação da sentença penal condenatória.
Além disso, a frequência a cursos profissionalizantes também é concedida àquele que demonstrar condições pessoais.
As saídas temporárias, popularmente conhecidas como “saidinhas” não poderão ser concedidas aos condenados em regime semiaberto sem a manifestação positiva do Representante do Ministério Público, bem como avaliação do Juízo da Execução sobre tal possibilidade, sob pena de indevida delegação do exame do pleito à autoridade penitenciária, caso apenas o Departamento Penitenciário decida sobre a concessão.
Por fim, vale frisar sobre a possibilidade de progressão de regime semiaberto, que já tenho cumprido parte da pena, terá o direito de ser encaminhado ao regime aberto. Sobre o tema, o RHC 2.443 do STJ determinou: “condenado a regime semiaberto que já cumpriu mais da metade da pena em regime fechado- já tendo, portanto, direito ao aberto- não pode ser mantido em regime fechado, sob o pretexto oficial de que não há vaga no albergue.
Nos termos do artigo 36 do Código Penal, o regime aberto baseia-se na autodisciplina e senso de responsabilidade do condenado. O condenado nesse regime estará fora do estabelecimento prisional, sem vigilância, podendo trabalhar, frequentar cursos ou exercer outra atividade autorizada, permanecendo recolhido durante o período noturno e nos dias de folga.
Segundo a Lei de Execução Penal, mais especificamente no que dispõe o artigo 93, o condenado a esse regime prisional deverá ser recolhido às casas de albergado .
Ocorre que há grande escassez de casas de albergado no Brasil e, diante dessa ausência os condenados são submetidos às prisões domiciliares, uma vez que a inercia do Estado não pode ter por vitima o sentenciado.
Ressalta-se, por oportuno que o regime aberto é pouco interpretado pela sociedade, sendo que é considerada uma forma de impunidade do criminoso, uma vez que este permanece em liberdade durante a execução de sua pena.
Ocorre que com essa preocupação da sociedade, considerando que o regime aberto é uma modalidade de impunidade do condenado, o Poder Judiciário a fim de reverter essa posição, mantem os sentenciados em regime prisional diverso do determinado em sentença penal condenatória, apenas para dar resposta a sociedade de uma falha governamental.
Essa manutenção do condenado em regime diverso do determinado em lei, seria afronta não apenas a dispostos legais e constitucionais, mas também para a liberdade, dignidade da pessoa do preso e, princípios norteadores de um direito que deveria ser utilizado para assegurar a ressocialização do mesmo.
O Brasil é o terceiro País com o maior número de pessoas encarceradas, ficando atrás apenas dos Estados Unidos e da China. Segundo dados do INFOPEN, atualizados até junho de 2016, a população carcerária brasileira atinge 726.712 mil presos. No que tange a população carcerária por estado da federação, os estados de São Paulo atinge o índice de 240.061, Rio de Janeiro 50.219 e Minas Gerais 68.354 pessoas presas.
No País, ainda segundo dados do INFOPEN, atualizados até 2016, a população prisional quanto aos regimes prisionais atingiram o seguinte índice de 38%, ou seja, 276.151 pessoas condenadas em regime fechado, 15%, equivalente à 109.007 pessoas cumprindo o regime semiaberto, 6% ou 43.603 pessoas no regime aberto, além de 40%, que aguardam condenação, ou seja, 290.685 detidos.
O Estado do Rio de Janeiro possui 93.892 indivíduos em regime fechado, 25.072 em regime semiaberto e 873 em regime aberto. Já, o Estado de Minas Gerais comporta 55.231 pessoas em regime fechado, 17.442 em regime semiaberto e 3.617 cumprindo o regime aberto. E, o Estado de São Paulo atinge o índice de 146.61 pessoas cumprindo pena no regime fechado, 16.352 no regime semiaberto e sem estimativa de pessoas executando pena no regime aberto.
Quanto as prisões relacionadas ao regime semiaberto, o Brasil possui 113 estabelecimentos prisionais para tal finalidade. Sendo que no Estado do Rio de Janeiro possui 8 prisões para tal fim, no Estado de São Paulo 17 e em Minas Gerais 5.
Os 113 estabelecimentos prisionais localizados no Brasil, possui 65.580 vagas segundo informações retiradas do relatório do INFOPEN do ano de 2016, sendo que encontram-se presos no regime semiaberto 111.176 pessoas.[9]
Além do mais, no Estado do Rio de Janeiro existe um déficit de 5.014 vagas, sendo que os estabelecimentos prisionais possuem 6.748 vagas apenas. Já no Estado de São Paulo o déficit alcança 12.821, comparado ao número de vagas de 23.829. e, em Minas Gerais há 6.764 vagas e um déficit de 4.289.
Evidente a falha do Estado quanto à ausência de vagas em diferentes tipos de regimes prisionais, o que de maneira exagerada aumenta o índice de superlotação violando os princípios basilares da Lei de Execução Penal, quanto à humanização e ressocialização do preso, colocando em risco a dignidade da pessoa humana.
Existem 45.596 pessoas a mais cumprindo pena no regime semiaberto, sendo que a maioria delas cumprem essa pena em regime prisional diverso do determinado na sentença penal condenatória referente a pena aplicada ao crime cometido.
A falta de vagas no sistema prisional brasileiro quanto ao regime semiaberto está longe de ser solucionado, uma vez que a resistência do Estado em assumir o erro de que existe a necessidade de novas construções de estabelecimentos prisionais em momento algum é colocada em cheque a fim de que se resolva tal pendência.
“A ausência de vagas em estabelecimentos penais constitui omissão do Estado, e que o condenado não pode ter sua pena e regime modificados para pior em razão de tal incúria”, posicionamento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal[10].
A ausência de vagas em estabelecimento adequado evidencia a desídia do Estado-Administrador, e o ônus que dai decorre não pode ser debitado ao condenado, que tem o direito líquido e certo de resgatar sua conta penal conforme o provimento jurisdicional; a pendência deve ser solucionada a seu favor.[11]
Segundo o Ministro Celso de Mello:
O caso revela o papel lamentável do Estado, que atua como um protagonista do drama penitenciário na medida em que, por omissão, incide em frontal descumprimento de normas legais fundadas na lei de execução penal que impõem às unidades federadas a viabilização de estabelecimentos adequados à execução da pena.
Destaca-se que o objetivo principal da Lei de Execução Penal não está sendo atingido, uma vez que o cumprimento de pena relativo ao regime semiaberto está longe de alcançar a ressocialização do condenado.
A Súmula Vinculante nº 56 do STF dispõe:
Súmula Vinculante nº 56: a falta de estabelecimento penal adequado não autoriza a manutenção do condenado em regime prisional mais gravoso, devendo-se observar, nessa hipótese, os parâmetros fixados no RE 641.320/RS. Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 11/05/2016 (repercussão geral), (Informativo 825).
STF. Plenário. Aprovada em 29/06/2016.
A manutenção do condenado em regime prisional diverso, ou seja, mais gravoso para cumprimento de pena decorrente da ausência de estabelecimento prisional apropriado, constitui garantia para a sociedade, uma vez que o condenado, sujeito passivo da situação vive na vulnerabilidade de seus direitos.
O Recurso Extraordinário nº 641.320/RS, determina:
Havendo déficit de vagas, deverão ser determinados: (i) a saída antecipada de sentenciado no regime com falta de vagas; (ii) a liberdade eletronicamente monitorada ao sentenciado que sai antecipadamente ou é posto em prisão domiciliar por falta de vagas; (iii) o cumprimento de penas restritivas de direito e/ou estudo ao sentenciado que progride ao regime aberto. Até que sejam estruturadas as medidas alternativas propostas, poderá ser deferida a prisão domiciliar ao sentenciado.
Ainda, “a manutenção do condenado em regime mais gravoso seria um excesso de execução, violando o seu direito”.
A proposta dada pelo relator para diminuir os índices de manutenções de presos em regime prisional diverso do determinado em sentença penal condenatória ocorrerá nas hipóteses de aplicar medidas menos prejudiciais, mas capazes de prevenir o crime e suficientes para manter o caráter de rejeição de suas atitudes criminosas.
Para que sejam adotadas essas medidas, deve-se ter a adesão do condenado, se sujeitando às medidas impostas e devidamente fiscalizadas pelo Estado, sob a pena de sofrer regressão de regimes ou manutenção à regime mais gravoso caso descumpra o determinado.
A primeira medida proposta pelo Relator no julgamento do Recurso Extraordinário 641.320, diz respeito às saídas antecipadas daqueles que já estejam cumprindo pena no regime semiaberto, surgindo a possibilidade de antecipar sua saída.
Aos condenados em regime semiaberto deverão ser colocados em liberdade eletronicamente monitorada, já os condenados em regime aberto deverão ter suas penas substituídas por alternativas ou estudo.
Os condenados apenas serão beneficiados com a saída antecipada se preencherem os requisitos objetivos e estiverem mais próximos de cumprirem os requisitos objetivos para sua concessão, sendo assim, não há de se falar em aplicação a todo e qualquer condenado à saída temporária que estiver cumprindo pena em regime diverso do determinado em sentença penal condenatória.
Além do mais, no voto do ministro relativo ao Recurso Extraordinário, surge a possibilidade de criação de Cadastro Nacional de Presos, possibilitando a conferência e seleção dos condenados que poderão fazer jus à saída antecipada.
Sabe-se que as únicas previsões legais acerca do tema se encontram na LEP e no artigo 317 do Código de Processo Penal.
O Art. 117 da Lei 7.210/84 (Lei de Execução Penal), restringe a aplicabilidade da liberdade eletrônica à requisitos humanitários, ou seja, quando o condenado necessita de amparo, seja pela idade ou pela saúde e, até mesmo quando é o único responsável por terceiros, menores ou deficientes físicos e/ou mentais.
Existem várias considerações a serem feitas acerca da liberdade eletrônica monitorada, uma delas é sua aplicabilidade isolada, sendo que ao invés de beneficiar o condenado agiria contra os princípios da execução penal, principalmente o da RESSOCIALIZAÇÃO.
Portanto, ao se falar em aplicação do benefício de liberdade monitorada eletronicamente, deve-se aplicar medidas cumulativas, como a oportunidade de o mesmo sair para trabalhar, importante para garantir sua manutenção econômica fora do sistema prisional.
Além disso, a ausência de centrais de monitoramento desses sentenciados que cumprem pena em regime domiciliar é escassa, sendo assim, junto da apresentação do voto sobre sua aplicabilidade, houve a proposta de estruturação de centrais para acompanhamento de tal medida.
Por fim, com a elaboração de medidas alternativas ao encarceramento pelo Recurso Extraordinário 641.320, pode-se ter o benefício da liberdade monitorada como forma de evitar o aprisionamento de qualquer condenado em regime prisional diverso e mais gravoso do aplicado em sentença condenatória, possibilitando que o mesmo não apenas cumpra sua pena em prisão domiciliar, mas fique eletronicamente monitorado, obrigando-o a trabalhar e, se possível, estudar, recolhendo-se ao seu domicilio em momentos oportunos.
O desembargador Nelson Fonseca em julgamento de um HC no ano de 1991 apresentou seu posicionamento quanto à ausência de vagas no sistema prisional:
A falta de vagas ou inexistência de estabelecimento adequado para cumprimento do regime prisional inicial imposto na sentença não constitui motivo a autorizar o juiz da execução efetuar mudança para regime mais rigoroso, pois a negligencia do Poder Executivo em providenciar infraestrutura do sistema penitenciário não pode recair sobre o condenado.[12]
Em julgamento do HC 73-SP, pelo Ministro José Dantas e, do HC 87.985/SP, julgado em 2007, pelo Ministro Celso de Mello: “na falta de vaga em colônia penal agrícola admite-se excepcionalmente o recolhimento domiciliar, e que a falta de vaga no regime semiaberto justifica que se aguarde vaga no aberto”.
Além disso, “o réu condenado em regime prisional semi-aberto não pode cumprir pena em regime fechado”[13]
Ainda, em 2011, o Relator Ministro Ricardo Lewandowski decidiu:
Ementa: HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL. REGIME DE CUMPRIMENTO SEMIABERTO. AUSÊNCIA DE VAGAS. DEFICIÊNCIA DO ESTADO. DESCONTO DA PENA EM REGIME ABERTO. POSSIBILIDADE. ORDEM CONCEDIDA. I – Consignado no título executivo o regime semiaberto para o cumprimento da pena, cabe ao Estado o aparelhamento do Sistema Penitenciário para atender à determinação. II – Ante a falta de vaga em estabelecimento adequado para o cumprimento da pena em regime semiaberto, deve o recorrente aguardar a abertura da vaga em regime aberto. III – Ordem concedida[14].
Já o Ministro Marco Aurélio, em julgamento do HC 107810 em 17 de abril de 2012:
Ementa: PENA – EXECUÇÃO – REGIME. Ante a falência do sistema penitenciário a inviabilizar o cumprimento da pena no regime menos gravoso a que tem jus o reeducando, o réu, impõe-se o implemento da denominada prisão domiciliar.[15]
Recentemente:
EMENTA: DIREITO PENAL. RECLAMAÇÃO. SÚMULA VINCULANTE 56 CUMPRIMENTO DE PENA EM REGIME MAIS GRAVOSO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA VINCULANTE. LIMINAR DEFERIDA. 1. A súmula vinculante 56 teve por objetivo evitar que o condenado cumprisse pena em regime mais gravoso do que o determinado na sentença ou do que o autorizado por lei. 2. A prisão domiciliar é medida adequada a ser adotada pelo Juízo diante da constatação de que o condenado preenche os requisitos para a progressão de regime, mas está impossibilitado de fazê-lo apenas pela falta de estabelecimento adequado.[16]
E,
Considerando que é dever do Estado, imposto pelo sistema normativo, manter em seus presídios os padrões mínimos de humanidade previstos no ordenamento jurídico, é de sua responsabilidade, nos termos do art. 37, § 6º, da Constituição, a obrigação de ressarcir os danos, inclusive morais, comprovadamente causados aos detentos em decorrência da falta ou insuficiência das condições legais de encarceramento.[17]
Verifica-se que não é de hoje a preocupação com a ausência de vagas para cumprimento de pena em regime semiaberto no Brasil. Elencamos decisões e posicionamentos de Ministros em votos de Habeas Corpus desde o ano de 1991 para comprovar a deficiência do Estado em se aparelhar e aplicar corretamente a execução da pena ao condenado, sem que influencie em sua dignidade, violando princípios morais e constitucionais do cidadão.
O Brasil possui uma gama de princípios que devem ser resguardados para a correta evolução e desenvolvimento do ser humano, seja ele cumpridor de suas obrigações ou não, bem como àqueles que se encontram vulneráveis ante a prática de crimes. Ocorre que com a ocorrência de determinados crimes, sejam eles repugnantes ou não, a sociedade junto da mídia passa a enxergar o criminoso como uma figura monstruosa, esquecendo-se de que é ser humano, cidadão detentor de direitos e obrigações.
Com essa nova imagem gerada pela sociedade, o Poder Judiciário influenciado pelo repudio, aplica penas que muitas das vezes são incoerentes e desproporcionais ao crime cometido, violando assim determinados princípios constitucional e moralmente resguardados.
No caso da manutenção do condenado em regime prisional diverso do determinado em sentença penal condenatória, pode-se observar a violação aos princípios da individualização da pena, legalidade e a ocorrência do constrangimento ilegal que abaixo serão esmiuçados.
A proposta de Súmula Vinculante 57 tem a seguinte redação:
O princípio constitucional da individualização da pena impõe seja esta cumprida pelo condenado, em regime mais benéfico, aberto ou domiciliar, inexistindo vaga em estabelecimento adequado, no local da execução.
A individualização divide-se em três etapas. A primeira diz respeito a individualização legislativa, determinando qual conduta tipifica crime, sua pena deduzido em patamar mínimo e máximo, condizente com a gravidade do delito praticado como já apresentou
SILVA, Igor Luis Pereira em Princípios Penais, no ano de 2012[18]. Já a segunda etapa, conhecida como judiciária, de acordo com Luisi (1997, p. 37):
[…] tendo presente as nuanças da espécie concreta e uma variedade de fatores que são especificamente previstos na lei penal, o juiz vai fixar qual das penas é aplicável, se previstas alternativamente, e acertar seu quantitativo entre o máximo e o mínimo fixado para cada tipo realizado, e inclusive determinar o modo de sua execução.[19]
E, por fim, a individualização executória, referente ao método punitivo aplicado pelo Juiz da Vara de Execução Criminal. Nogueira (1993, p. 3):
A execução é a mais importante fase do direito punitivo, pois de nada adianta a condenação sem que haja a execução da pena imposta. Daí o objetivo da execução penal, que é justamente tornar exeqüível ou efetiva a sentença criminal, que impôs ao condenado determinada sanção pelo crime praticado.[20]
O princípio da individualização da pena impede que o condenado cumpra pena em regime prisional mais gravoso, uma vez que nos moldes do que prevê o artigo 33 do Código Penal, são distinguidas a quantidade de pena e o regime prisional equivalente a tal condenação.
Ressalta-se, por oportuno, que o desrespeito a esses artigos não viola apenas o principio da individualização da pena, mas também à dignidade da pessoa detida, uma vez que o excesso de punição é prejudicial ao objetivo final da execução penal, qual seja a ressocialização.
Além disso, tal princípio possibilita ao condenado que após o cumprimento de determinada fração de pena cumulada com o bom comportamento carcerário relatado pelo Direito Prisional, progrida de regime e/ou lhe seja concedido benefícios, como liberdade condicional, entre outros.
Durante o voto do Recurso Extraordinário 641.320, o Ministro Gilmar Mendes apresentou: Logo, assiste ao condenado o direito a ser inserido em um regime inicial compatível com o título condenatório e a progredir de regime de acordo com seus méritos.
Por fim, evidente a violação do principio da individualização da pena quanto à manutenção do condenado em regime prisional diverso do determinado em lei, uma vez que o condenado, nos termos da legislação vigente possui o direito de usufruir de garantias e benefícios concedidos a ele no decorrer do cumprimento da pena e, com a manutenção do condenado em regime oposto e mais severo daquele legalmente atribuído ao caso, o mesmo deixa de ter sua pena individualizada, mas sim agravada pela inércia do Estado em garantir o regular cumprimento e verificação de um sistema prisional apto a ressocializar.
Durante o voto do Recurso Extraordinário 641.320, o Relator Ministro Gilmar Mendes discorreu: “A manutenção do condenado em regime mais gravoso seria um excesso de execução, violando o seu direito”.
O princípio da legalidade encontra respaldo na Constituição Federal, mais precisamente nos termos do artigo 5º, inciso XXXIX: “não há crime sem lei anterior que defina, nem pena sem prévia cominação legal”, bem como nos moldes do artigo 1º do Código Penal, possuindo o mesmo teor.
A manutenção do condenado em regime prisional diverso do determinado em sentença penal condenatória viola diretamente o princípio da legalidade, uma vez que o ordenamento jurídico brasileiro, prevê em seus artigos referentes às penas, a possibilidade de progressões, regressões, quantidade de pena e regime especifico para cumprimento.
Ocorre que com a manutenção do condenado em regime mais gravoso, a legalidade prevista nos artigos acima citados é violada, haja vista a ausência de norma legal possibilitando o encaminhamento do preso à cumprimento de pena em regime mais severo.
O constrangimento ilegal possui previsão nos termos do artigo 146 do Código Penal com a seguinte redação: constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, ou depois de lhe haver reduzido, por qualquer outro meio, a capacidade de resistência, a não fazer o que a lei permite, ou a fazer o que ela não manda.
Ocorre que, no caso em apreço estamos diante de uma coação exercida por parte do Estado, onde o sujeito passivo é o condenado, ou seja, aquele que está cumprindo pena em regime prisional diverso do determinado em sentença penal condenatória.
Sabe-se que o Estado tem o dever de punir, aplicando corretamente o disposto em lei para fazer JUSTIÇA de forma proporcional ao crime cometido, uma vez que a finalidade da punição no âmbito da execução criminal é a ressocialização do preso, não retirando sua dignidade nem infringindo princípios morais e legais garantidos ao mesmo.
Verifica-se que esse Estado que possui o dever de punir de maneira humanizada àquele que cometeu qualquer ato ilícito, é o mesmo que viola preceitos constitucionais, impelido apenas pelo desejo de punição a fim de dar resposta à sociedade.
Essa matéria é pacifica no âmbito das Cortes Superiores, cujos entendimentos se resumem no seguinte:
Habeas corpus. 2. Ausência de vaga em estabelecimento prisional. Cumprimento de pena em regime mais gravoso do que o fixado na sentença. Constrangimento ilegal configurado. Superação da Súmula 691. 3. Ordem concedida.[21]
Ainda,
HABEAS CORPUS. CRIME DE ROUBO. PACIENTE PRESO EM REGIME FECHADO, MAS CONDENADO EM REGIME SEMI-ABERTO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL CONFIGURADO. NECESSIDADE DE REMOÇÃO PARA ESTABELECIMENTO PRISIONAL COMPATÍVEL COM O DETERMINADO NO DECISUM. COMARCA QUE NÃO POSSUI CASA DE ALBERGADO. PACIENTE QUE ATÉ SUA REMOÇÃO DEVE CUMPRIR SUA PENA EM PRISÃO DOMICILIAR. LIMINAR CONFIRMADA. ORDEM CONCEDIDA.[22]
O entendimento do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo não destoa do Superior Tribunal de Justiça.
Em 1996, durante julgamento de um Habeas Corpus, o relator e juiz Márcio Bártoli expôs:
Constitui constrangimento ilegal o fato de se submeter o condenado a regime prisional mais rigoroso do que o imposto na sentença em virtude da inexistência de vaga no estabelecimento designado para o cumprimento da sanção, pois a negligencia do Estado, consistente em não investir na construção dos equipamentos e serviços prisionais necessários, não pode agravar a situação do sentenciado.[23]
Diante do que foi ressaltado acerca do constrangimento ilegal, não há nenhuma legislação que possa contrariar o direito liquido e certo do sentenciado, porque o cumprimento de pena em regime prisional não contido na r. sentença constitui infringência à clausula pétrea da Constituição Federal.
Ante aos dados apresentados acima, conclui-se que a manutenção do condenado em regime prisional diverso do determinado em sentença penal condenatória, seria uma forma do Estado “culpar” o sentenciado por sua própria inércia, uma vez que a falha do Poder Judiciário, Executivo e Legislativo em face da situação do sistema prisional brasileiro, não pode ser utilizada para penalizar àquele que está vulnerável a seu poder.
Ainda, vale ressaltar, que o Brasil ocupa a posição do 3º País com a maior população carcerária e, ao encaminhar o condenado a regime mais gravoso daquele baseado em sua pena, seria uma forma de agravar a situação do sistema prisional, sendo que a superlotação já é um problema nacional de grande repercussão e pouca solução.
Consigna-se, por oportuno, que o a superlotação não é único problema que o Estado porta, no caso em apreço podemos citar a infringência do Poder no que tange a violação de normas constitucionais e legais, bem como a princípios relativos à dignidade da pessoa humana.
Sabe-se que o Código Penal é expresso quando o assunto é PENA, sendo que de forma clara apresenta quais são os regimes, as penas e quantidade, requisitos objetivos e subjetivos para aplicação da mesma, benefícios, possibilidade de progressão, bem como regressão.
Diante de previsão legal expressa referente às penas e diversidade de regimes quanto ao seu quantum, deve-se o Judiciário ater para evitar a violação do princípio da legalidade, uma vez que aplicar o que não encontra expresso em lei, viola diretamente a licitude das leis.
Ademais, determinar o cumprimento de pena em regime diverso daquele condizente ao quantum de pena aplicado ao caso, seria afrontar ao principio da individualização de pena. Sabe-se que houve declaração de inconstitucionalidade ao regime de cumprimento de pena integralmente no fechado, referente ao crime de trafico de drogas, uma vez que afrontaria a individualização da pena, sendo que o sentenciado poderia ter a possibilidade, se preenchidos os requisitos, de progredir de regime prisional.
Virar as costas para a Súmula Vinculante 56 do Supremo Tribunal Federal seria afrontar a diretamente a Justiça, uma vez que é dotada de legalidade, preservando a dignidade daquele que se encontra cumprindo pena.
Além do mais, requisitos foram apresentados no Recurso Extraordinário 641.320 do Ministro Relator Gilmar Mendes, como medidas alternativas à prisão, devendo estas, serem cumpridas a fim de diminuir o índice de prisões ilegais e descumprimento de preceitos constitucionais e legais.
Sendo assim, o presente artigo visa apresentar as medidas alternativas à prisão em regime prisional diverso, como forma de evitar o encarceramento em massa que assola o sistema prisional brasileiro, mas também como método eficaz de aplicar a lei e garantir àquele que se encontra cumprindo pena o básico para sua ressocialização, preservando a dignidade, a moral e a integridade psíquica e física do sentenciado.
Por fim, busca-se com o estudo atentar o Poder Judiciário para a correta aplicação da lei, utilizando-se da Súmula Vinculante 56 do STF como forma de garantir ao sentenciado o regime prisional proporcional e condizente ao crime praticado, deixando de agir por mera resposta à sociedade e ante a inércia na construção e manutenção de um sistema prisional indigno de ressocializar.
- Artigo Jurídico. STF concede prisão domiciliar por falta de estabelecimento penal adequado para o cumprimento da pena. Disponível em: https://artigojuridico.com.br/2017/05/09/stf-concede-prisao-domiciliar-por-falta-de-estabelecimento-penal-adequado-para-o-cumprimento-da-pena/ . Acesso em: 15 de nov. 2018.
- BECCARIA, Cesare Bonesana. Dos Delitos e das Penas. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2002.
-BRASIL. Código Penal. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del2848.htm . Acesso em 15 de nov. 2018.
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-BRASIL. Rcl 24840 MC, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, julgado em 10/08/2016, publicado em PROCESSO ELETRÔNICO DJe-170 DIVULG 12/08/2016 PUBLIC 15/08/2016.
- BRASIL. RE 641320, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 11/05/2016, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-159 DIVULG 29-07-2016 PUBLIC 01-08-2016. Acesso em: 15 de nov. 2018.
- BRASIL. STF, HC 87985/SP, 2ªT., rel. Min. Celso de Mello, j. 20-3-2007, m.v., Informativo do STF n. 460.
- BRASIL. STF - HC: 107810 PR, Relator: Min. MARCO AURÉLIO, Data de Julgamento: 17/04/2012, Primeira Turma, Data de Publicação: DJe-085 DIVULG 02-05-2012 PUBLIC 03-05-2012.
- BRASIL- STF - HC: 109244 SP, Relator: Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Data de Julgamento: 22/11/2011, Segunda Turma, Data de Publicação: DJe-232 DIVULG 06-12-2011 PUBLIC 07-12-2011.
-BRASIL. STF - HC: 110892 MG, Relator: Min. GILMAR MENDES, Data de Julgamento: 20/03/2012, Segunda Turma, Data de Publicação: DJe-097 DIVULG 17-05-2012 PUBLIC 18-05-2012.
- BRASIL. STJ, HC 4.505-SP, 6ª T., rel. Min. Adhemar Maciel, j. em 11-6-1996, v.u., DJU 5-8-1996, p.26418.
- BRASIL. Súmula Vinculante n° 56. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/menuSumario.asp?sumula=3352. Acesso em 20 de out. de 2016. Acesso em: 15 de nov. 2018.
- BRASIL. TACrimSO, Ap. 1.083.985/9, 13ªCâm., rel. Juiz Rui Stoco, j. em 17-2-1998, v.u.
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-BRASIL. Tese definida no RE 580.252, rel. min. Teori Zavascki, red. p/ o ac. min. Gilmar Mendes, P, j. 16-2-2017, DJE 204 de 11-9-2017, Tema 365.
- BRASIL. TJSP, Ag. 101.138/3, 1ª CCrim. de Férias, rel. Des. Nélson Fonseca, j. em 30-1-1991, v.u., RT 672/312.
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- DIZER O DIREITO: Súmula Vinculante nº 56 Comentada. Falta de vagas nos regimes semiaberto e aberto e cumprimento da pena, out. 2016. Disponível em:< http://www.dizerodireito.com.br/2016/08/sumula-vinculante-56-comentada.html>. Acesso em: 15 de nov. 2018.
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- PIMENTEL, Manoel Pedro. Ob. cit. P. 134. V. ainda, PIMENTEL, Manoel Pedro, Sistemas penitenciários, T 639/265-274.
Relatório INFOPEN, jun/2016- QUANTIDADE DE VAGAS E PESSOAS PRIVADAS DE LIBERDADE POR TIPO DE REGIME OU NATUREZA DA PRISÃO. p.23. Disponível em: Acesso em 26 de dez. 2018.
-SILVA, Igor Luis Pereira e. PRINCÍPIOS PENAIS. Salvador: Jus Podium, 2012.
[2] CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Súmula Vinculante nº 56 Comentada. Direito Processual penal - Execução Penal - Falta de vagas nos regimes semiaberto e aberto e cumprimento da pena, out. 2016. Disponível em:< http://www.dizerodireito.com.br/2016/08/sumula-vinculante-56-comentada.html>. Acesso em: 24 de dez. 2018.
[3] PIMENTEL, Manoel Pedro. Ob. cit. P. 134. V. ainda, PIMENTEL, Manoel Pedro, Sistemas penitenciários, T 639/265-274.
[4] TACrimSO, Ap. 1.083.985/9, 13ªCâm., rel. Juiz Rui Stoco, j. em 17-2-1998, v.u.
[5] DICIONÁRIO ONLINE DE PORTUGUÊS- Significado de Progressão. Disponível em: https://www.dicio.com.br/progressao/ . Acesso em: 24 de dez. 2018.
[6] CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA- O que é progressão de regime de cumprimento de pena? Disponível em: http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/62390-o-que-e-progressao-de-regime-de-cumprimento- Acesso em: 24 de dez. 2018.
[7] Art. 87 da LEP.
[8] DELMANTO, Celso. Código Penal Comentado. 9ª Ed.2016. Ed. Saraiva. p.208.
[9] Relatório INFOPEN, jun/2016- QUANTIDADE DE VAGAS E PESSOAS PRIVADAS DE LIBERDADE POR TIPO DE REGIME OU NATUREZA DA PRISÃO. p.23. Disponível em: Acesso em 26 de dez. 2018.
[10] STF, HC 87985/SP, 2ªT., rel. Min. Celso de Mello, j. 20-3-2007, m.v., Informativo do STF n. 460.
[11] MARCÃO, Renato. CURSO DE EXECUÇÃO PENAL. Ed. Saraiva, 7ª Edição, 2009. p.132.
[12] TJSP, Ag. 101.138/3, 1ª CCrim. de Férias, rel. Des. Nélson Fonseca, j. em 30-1-1991, v.u., RT 672/312.
[13] STJ, HC 4.505-SP, 6ª T., rel. Min. Adhemar Maciel, j. em 11-6-1996, v.u., DJU 5-8-1996, p.26418.
[14] STF - HC: 109244 SP, Relator: Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Data de Julgamento: 22/11/2011, Segunda Turma, Data de Publicação: DJe-232 DIVULG 06-12-2011 PUBLIC 07-12-2011.
[15] STF - HC: 107810 PR, Relator: Min. MARCO AURÉLIO, Data de Julgamento: 17/04/2012, Primeira Turma, Data de Publicação: DJe-085 DIVULG 02-05-2012 PUBLIC 03-05-2012.
[16] Rcl 24840 MC, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, julgado em 10/08/2016, publicado em PROCESSO ELETRÔNICO DJe-170 DIVULG 12/08/2016 PUBLIC 15/08/2016.
[17] Tese definida no RE 580.252, rel. min. Teori Zavascki, red. p/ o ac. min. Gilmar Mendes, P, j. 16-2-2017, DJE 204 de 11-9-2017, Tema 365.
[18] SILVA, Igor Luis Pereira e. Princípios Penais. Salvador: Jus Podium, 2012.
[19] LUISI, Luiz. Os Princípios Constitucionais Penais. Porto Alegre: Editora Sérgio Antonio Fabris, 1991.
[20] NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Comentários à Lei de Execução Penal. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1994.
[21] STF - HC: 110892 MG, Relator: Min. GILMAR MENDES, Data de Julgamento: 20/03/2012, Segunda Turma, Data de Publicação: DJe-097 DIVULG 17-05-2012 PUBLIC 18-05-2012.
[22] TJ-PR - HC: 3017992 PR 0301799-2, Relator: Luiz Osorio Moraes Panza, Data de Julgamento: 21/07/2005, 5ª Câmara Criminal
[23] TACrimSP, HC 256.032/0,,m10ª Câ., rel. Juiz Márcio Bártoli, j. em 8-5-1996.
Graduando do Curso de Direito pela Universidade Brasil - UNIBRASIL.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SANTOS, Guilherme Dias Dos. Violação a princípios constitucionais com a manutenção do condenado em regime prisional mais gravoso Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 06 mar 2019, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/52708/violacao-a-principios-constitucionais-com-a-manutencao-do-condenado-em-regime-prisional-mais-gravoso. Acesso em: 27 dez 2024.
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