RESUMO: Diante da entrada em vigor da Lei n. 13.647, de 13 de julho de 2017, que alterou sensivelmente as regras relativas a descentralização produtiva no tocante ao instituto da Terceirização, tornou-se necessário analisar as alterações e o impacto na doutrina. Neste sentido, o objetivo do presente artigo é analisar brevemente as mudanças, o alcance, assim como a repercussão da terceirização nas relações de trabalho, utilizando-se, para isso, das normas em vigor, das doutrinas acerca deste tema demasiadamente controvertido. Outrossim, será feita a reflexão acerca da sua compatibilidade com a Constituição da República Federativa do Brasil assim como das normas internacionais sobre os Direitos Humanos, Econômicos, Sociais e Culturais, inclusive os Direitos Humanos Trabalhistas, os documentos internacionais como as Convenções e Declarações Internacionais do Trabalho (OIT) ratificados pelo Brasil. Após breve reflexão, serão oferecidos os impactos das novas regras da terceirização sob a ótica dos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da valorização do trabalho e do emprego, do bem-estar individual e social, da não discriminação, dentre outros.
Palavras chave: Terceirização. Dignidade da pessoa humana, Convenções e Declarações Internacionais do Trabalho (OIT).
ABSTRACT: Before the entry into force of Law no. 13,647 of July 13, 2017, which significantly altered the rules regarding productive decentralization regarding the Outsourcing Institute, it became necessary to analyze the changes and the impact on doctrine. In this sense, the purpose of the present article is to briefly analyze the changes, the scope, as well as the repercussion of outsourcing in the labor relations, using, for that, of the norms in force, of the doctrines about this subject too controversial. In addition, consideration will be given to its compatibility with the Constitution of the Federative Republic of Brazil as well as international norms on Human, Economic, Social and Cultural Rights, including Human Rights Labor, international documents such as International Conventions and Declarations. (ILO) ratified by Brazil. After a brief reflection, the impacts of the new outsourcing rules will be offered from the point of view of the constitutional principles of human dignity, of valuing work and employment, of individual and social well-being, of non-discrimination, among others.
Key Words: Outsourcing. Dignity of the human person, International Labor Conventions and Declarations (ILO).
INTRODUÇÃO
Com a aprovação das Leis n. 13.429, de 31 de março de 2017, assim como da Lei n. 13.467, de 13 de julho de 2017, vieram à tona grandes impactos no cenário jurídico brasileiro, alterando significativamente as regras do trabalho terceirizado. Dentre as inovações trazidas destacam-se o fim das horas in itinere; a desnecessidade do pagamento do tempo em que o trabalhador fica no trabalho para descanso, estudo, alimentação, troca de uniforme e outras atividades, pois estas não mais se incluem na jornada de trabalho; o tabelamento dos valores da indenização por danos morais, agora chamado de dano extrapatrimonial, com base no salário mínimo. Porém a mudança a ser tratada nesta pesquisa vai além destas mudanças citadas anteriormente, pois afetará diretamente a relação de trabalho e emprego. Isso se deve ao fato da amplitude trazida pela Reforma Trabalhista, que possibilitou contratação de terceirizados de forma indiscriminada.
O marco inicial que possibilitou a contratação de terceirizados para desempenhar atividades-fim aconteceu por meio da aprovação do Projeto de Lei 4.330/2004 e tornou-se a Lei Nº 13.429 de 31 de março de 2017, que alterou os dispositivos da Lei N. 6.019, de 3 de janeiro de 1974. O intuito, segundo o governo era de atualizar a norma e acompanhar o desenvolvimento das relações de trabalho surgidas ao longo do tempo, porém corre-se o risco de iniciar o fenômeno da pejotização[1] no Brasil, que poderá trazer enormes prejuízos ao trabalhador.
Outrossim, o presente artigo traz uma dimensão da terceirização na iniciativa privada, comparando as alterações com o que dizem os tratados internacionais, assim como aos princípios balizadores do trabalho constantes na Constituição Federal de 1988.
São tratados alguns pontos nos quais há uma colisão entre o que se espera em uma relação com contrato de emprego ou trabalho, assim como as consequências que as Leis que tratam da terceirização poderão trazer, sobretudo quando se fala no possível fim do contrato de trabalho por tempo indeterminado, redução de salários e direitos, precarização do trabalho, aumento da jornada, fragilização da organização sindical dentre outras.
Neste sentido, o objetivo da pesquisa foi analisar brevemente as mudanças, o alcance, assim como a repercussão da terceirização nas relações de trabalho, utilizando a pesquisa bibliográfica das normas em vigor, das doutrinas acerca deste tema demasiadamente controvertido, bem como da Carta Magna de 1988.
1 A Contextualização da Terceirização no Brasil
No mundo, após a queda do pensamento liberal, iniciou-se o chamado Estado Social, no século XIX que deu início ao surgimento dos direitos constitucionais de 2ª dimensão onde o capital e o trabalho passaram a ocupar o mesmo patamar, ou seja, deu-se ao trabalho e sobretudo ao trabalhador a proteção necessária para que deixasse de ser a parte explorada. No Brasil, após a entrada em vigor da Constituição de 1988, que sucedeu a Ditadura Militar, o legislador, pensando em proteger a classe menos privilegiada, faz diversas promessas com cunho social, ou seja, inicia-se o Estado do Bem-estar-social, porém é válido lembrar que o mundo já caminhava em sentido contrário, ou seja, nas grandes potências do mundo já havia um retorno a um estado neoliberal.
A Carta Magna de 1934 passou a tratar os direitos dos trabalhadores, o sistema de garantias e o valor do trabalho humano de forma especial, consagrando alguns direitos como o da isonomia, quando preceitua que homens e mulheres são iguais perante a lei, do direito fundamental da dignidade da pessoa humana, dos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, assim como reconhece o trabalho como um direito social. Em se tratando dos princípios, indica a prevalência dos direitos humanos, assim como protege amplamente o salário quando proíbe a sua irredutibilidade tornando crime sua retenção, assim como dá garantia a um salário nunca inferior ao mínimo. (Brasil, 1934).
Os trabalhadores, apesar de possuírem alguns direitos, eram vistos muito mais sob o ponto de vista produtivo, manejado pelos empresários como melhor lhes convinha. Com a edição da Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de Maio de 1943 Consolidação da Leis Trabalhistas, assim como da Constituição Federal de 1934, criou-se entre os empregados e empregadores uma relação bilateral onde os dois lados fossem dotados de direitos e obrigações, ou seja, a CLT trouxe consigo alguns princípios de proteção do trabalhador pelo fato de ser hipossuficiente em relação ao empregador. (Rooco, 2017). O trabalhador deixa de ser a parte explorada e passa a ter maior importância na relação juslaboral, ou seja, torna-se um sujeito de direito.
Portanto, o instituto da terceirização no Brasil nos dias atuais será tratado com base no contexto apresentado em confronto com as normas internacionais do trabalho, assim como a mínimo exigido pela CF/88 na proteção dos princípios conquistados pelo trabalhador.
1.1 Ruptura ao Estado Social e início da terceirização no Brasil
Segundo Leite (2017) a terceirização pode ser definida como a contratação de serviços por meio de empresa intermediária (interposta), onde há a figura da prestadora, que possui os trabalhadores e os disponibiliza a uma tomadora de serviço e complementa, ao dizer que a palavra terceirizar advém da palavra inglesa outsourcing, síntese da frase outside resource using (que significa uso de recursos externos). Para Lima (2018, p. 55), a terceirização, com interesse econômico-empresarial possui alguns pontos positivos como a abertura de oportunidades de emprego, a melhoria na qualidade do serviço, o aumento da lucratividade em virtude da maior produtividade, assim como permite que as tomadoras terceirizando o serviços foquem no seu objeto principal.
No Brasil, a despeito da ausência de lei que tratasse especificamente sobre a terceirização, o instituto fora manejado, conforme Leite (2017, p. 340), com fundamento em alguns dos seguintes diplomas legais:
Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de Maio de 1943 Consolidação da Leis Trabalhistas, sobretudo no art. 455, caput que preceitua: “Nos contratos de sub-empreitada responderá o sub-empreiteiro pelas obrigações derivadas do contrato de trabalho que celebrar, cabendo, todavia, aos empregados o direito de reclamação contra o empreiteiro principal pelo inadimplemento daquelas obrigações por parte do primeiro”;
Parágrafo único. Ao empreiteiro principal fica ressalvado, nos termos da lei civil, ação regressiva contra o sub-empreiteiro e a retenção de importâncias a este devidas, para a garantia das obrigações previstas neste artigo.
Lei n. 6.019, de 3 de janeiro de 1974 que dispõe sobre o trabalho temporário nas empresas urbanas e dá outras providências, institui o trabalho temporário nas empresas urbanas como “aquele prestado por pessoa física a uma empresa, para atender à necessidade transitória de substituição de seu pessoal regular e permanente ou a acréscimo extraordinário de serviços”(art. 2º);
Lei n. 7.102, de 20 de junho de 1983, que dispõe sobre segurança para estabelecimentos financeiros, estabelece normas para constituição e funcionamento das empresas particulares que exploram serviços de vigilância e de transporte de valores, e dá outras providências.
O instituto da terceirização no Brasil era tratado com fundamento na jurisprudência do TST, sumulado no supramencionado enunciado 33, nos termos da Súmula 331 do TST, ou seja, não existia um diploma legal para balizar tal pratica.
Neste mesmo raciocínio e em razão da não existência no ordenamento jurídico de lei específica que tratasse da terceirização, por meio do o enunciado 256 da Súmula do TST, era admitida a terceirização nos casos da Lei 6019/74 e 7102/83 conforme segue:
Salvo os casos de trabalho temporário e de serviço de vigilância, previstos nas Leis nºs 6.019, de 03.01.1974, e 7.102, de 20.06.1983, é ilegal a contratação de trabalhadores por empresa interposta, formando-se o vínculo empregatício diretamente com o tomador dos serviços. (Enunciado da Súmula N. 256 do TST - cancelada)
Utilizando-se do enunciado da Súmula supracitada, o TST só admitia a possibilidade de terceirização em duas situações, porém a corte maior trabalhista após solicitação do Ministério do Trabalho e Emprego fez uma ampla revisão cancelando a Súmula 256 e editando a de n. 331:
CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEGALIDADE (nova redação do item IV e inseridos os itens V e VI à redação) - Res. 174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e 31.05.2011
I - A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974).
II - A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da Administração Pública direta, indireta ou fundacional (art. 37, II, da CF/1988).
III - Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.
IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial.
V - Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida respnsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada.
VI – A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorrentes da condenação referentes ao período da prestação laboral. (Enunciado da Súmula N. 331 do TST)
O assunto acerca da terceirização - tratado anteriormente por Súmulas do TST - tomou corpo no Brasil em 2015 devido ao momento de grande crise econômica onde a inflação oficial chegou a casa de 10,67%, e tornou a figura do empregado um vilão, atribuindo a ele um alto custo, tanto salarial como os relacionados aos encargos, o que já é sabido e que impediria a atividade empresarial de crescer frente a concorrência local, assim como no mercado internacional.
Somadas a instabilidade econômica, a concorrência, o desenvolvimento tecnológico, o desafio de combater o desemprego e o subemprego, com vistas a se adaptar às novas formas de organização da produção, culminou-se na necessidade de flexibilização das relações de trabalho, dando origem a uma reforma trabalhista ampla, principalmente com relação à terceirização.
Conforme DELGADO (2011, p. 99) “(...), essa renovação tecnológica intensa eliminava as antes impermeáveis barreiras do espaço e do tempo, extremando a competição capitalista no plano das diversas regiões do globo”.
Porém, para o ramo empresarial, grande interessado no aumento de atividades abarcadas pela terceirização, a importância está na agregação de valores na medida em que incorpora bens e serviços de terceiros que possuem expertise na área, ou seja, quem realizará o serviço em tese teria mais capacidade que a tomadora. Desta forma, a produtividade tende a aumentar quando cada prestadora de serviço especializada realiza o que sabe fazer de melhor, assim o faz com melhor qualidade.
Pode-se dizer também que é uma forma de flexibilização do trabalho, pois mediante a transferência de parte da produção a terceiro, uma organização empresarial consegue concentrar-se nas atividades essenciais, buscando maior lucratividade, potencializando o planejamento e otimização operacional, com o fim de aumentar a lucratividade, não se dispersando em serviços múltiplos, como por exemplo cuidar da frota de carros, da limpeza, da alimentação e etc.
Pelo exposto anteriormente tem-se a ideia que a terceirização trará mais eficiência em razão da contratação de pessoas com melhor qualificação, que acarretará na modernização, trazendo maior competitividade. Com o aumento da produtividade, por exemplo, a tomadora poderá lucrar mais e consequentemente aumentar seu valor de mercado, tornando-se mais eficiente e competitiva.
Com relação à economia, tem-se a ideia que haverá uma redução nos custos da atividade, porém não com relação ao salário que se paga ao terceirizado - pois a prestadora de serviço também precisa auferir lucro neste tipo de negócio - mas no sentido de melhorar sua mão-de-obra contratando pessoas qualificadas para desempenharem atividades importantes, mesmo as tidas como atividades-fim, incluídas pela Lei nº 13.467/2017 (Brasil, 2017).
1.2 Lei n.º 13.429 de 2017, a chamada Lei da Terceirização
Diante do caos e da instabilidade política, o Brasil foi tomado por um sentimento de que eram necessárias várias reformas, dentre elas a Tributária, a do Direito Penal, da Previdência, assim como a Trabalhista, única a sair do papel.
Deste modo, o então presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, coloca em pauta a votação do Projeto de Lei n. 4302/98, aprovado no dia 22 de março de 2017 e convertida em Lei sob o n. 13.429/2017, que traz diversas alterações, das quais serão elencadas aqui as mais relevantes.
Possibilidade de prestação de serviços terceirizados para o desempenho de atividades determinadas e especificas, ou seja, não deixa claro se haveria a autorização ou não de trabalhadores para o desempenho de atividade-fim (Art. 4º-A); redução de requisitos para o funcionamento da empresa terceirizada (prova da inscrição no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica, registro na Junta Comercial e Capital Social de acordo com o número de empregados (Art. 4º - B; a possibilidade da quarteirização, ou seja, a terceirizada poderá subcontratar outra empresa (Inciso 1ª do Art. 4º - A); a falta do tratamento adequado acerca da isonomia de direitos como atendimento médico, ambulatorial e de refeição destinado aos seus empregados entre os trabalhadores da terceirizada e da empresa tomadora (§ 4º do art 5º - A); falta de restrição com relação a quem pode ser contratante de serviços terceirizados (Art 5º - A) (Brasil, 2017).
Porém, ainda não se sabia, sobretudo antes da aprovação da Lei 13647/2017 se seria possível utilizar-se do instituto da terceirização na atividade-fim, sendo que ainda gerava dúvida era com relação ao conceito de atividade-fim que era encontrado por via de exclusão, ou seja, seria considerado atividade-fim aquilo que não for determinado ou fixado como atividade-meio.
1.3 Lei 13.467/2017 a terceirização trabalhista “sem peias”
A expressão "sem peias" utilizada pelo Eminente Ministro do TST Maurício Godinho Delgado releva que a Lei 13.467, sancionada em 31.3.2017 modificou ainda mais o instituto da terceirização no Brasil (Godinho, 2017).
Vale destacar, porém, que após a entrada em vigor das Leis 13.429/2017 e Lei 13.467/2017 passou a regular tanto a terceirização do trabalho temporário, questão que merece maior destaque foi tratado por meio da inclusão do § 1ª do Art. 4º - C da CLT:
Art. 4º-C - § 1º Contratante e contratada poderão estabelecer, se assim entenderem, que os empregados da contratada farão jus a salário equivalente ao pago aos empregados da contratante, além de outros direitos não previstos neste artigo. (g.n.) (BRASIL, 2017)
Segundo a redação não há mais que se falar em isonomia salarial entre os trabalhadores com vínculo direto com a tomadora e os terceirizados, pois a expressão “se assim entenderem” deixa claro que não há mais obrigatoriedade de remunerar as duas categorias com o mesmo salário. Em breve trabalhadores que desempenhando o mesmo trabalho, com a mesma eficiência, no mesmo local, receberão salário diferente.
Outro ponto fulcral inserido pela Lei n 13.467/2017 foi a autorização de contratação de terceirizados para o desempenho de atividades-fim pela tomadora de forma indiscriminada e irrestrita, declarado constitucional pelo STF, por meio da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental - ADPF n. 324 cujo relator foi o Ministro Luís Roberto Barroso.
Outro ponto importante é o fato da Terceirizada não ser mais obrigada a ter registro no Ministério do Trabalho e Emprego, ou seja, basta ter o Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica - CNPJ e o registro na junta comercial, assim como o capital social que deve ser proporcional ao número de empregados.
Um ponto relativamente positivo foi a proibição imposta ao empregador que dispensa o trabalhador para contratá-lo como pessoa jurídica pelo prazo de 18 meses, conforme o texto do Art. 5º- C da CLT:
Não pode figurar como contratada, nos termos do art. 4º-A desta Lei, a pessoa jurídica cujos titulares ou sócios tenham, nos últimos dezoito meses, prestado serviços à contratante na qualidade de empregado ou trabalhador sem vínculo empregatício, exceto se os referidos titulares ou sócios forem aposentados.(Brasil, 2017)
Após a apresentação do caminho percorrido pela terceirização no Brasil, desde a época em que era proibida, momento em que a jurisprudência passou a autorizar de forma tímida, normas legais e suas alterações, iniciaremos o ponto mais importante deste artigo, o qual, trataremos dos impactos e suas consequências.
Trataremos, contudo, da terceirização à luz da Constituição Federal de 1988, das Normas e Tratados Internacionais de Direitos Humanos e da Organização Internacional do Trabalho.
2 A Constituição Federal, os tratados internacionais e princípios constitucionais
2.1 Tratados internacionais afetados pela terceirização
Paralelamente aos parâmetros constitucionais encontram-se os de ordem internacional decorrentes de Convenções Internacionais da Organização Internacional do Trabalho - OIT e Declarações Internacionais de Direitos Humanos subscritas pelo Brasil destaca-se a Declarações e Convenções da Organização das Nações Unidas - ONU sobre direitos humanos, econômicos, sociais, culturais, inclusive os de caráter trabalhista.
A Constituição da Organização Internacional do Trabalho (OIT), aprovada em 1948, tem o seguinte preâmbulo.
(...) Considerando que existem condições de trabalho que implicam, para grande parte das pessoas, a injustiça, a miséria e as privações, o que gera um descontentamento tal que a paz e a harmonia universais são postas em risco, e considerando que é urgente melhorar essas condições(...)
(...) à afirmação do princípio “a trabalho igual, salário igual”(...). (OIT, 1948)
É oportuno, porém, ressaltar que em 1998 a OIT sintetizou, conforme a declaração de 1988 os princípios basilares do Direito do Trabalho, por meio de oito de suas convenções internacionais, sendo que apenas a de número 87 não foi ratificada pelo Brasil. Em 1999 a OIT firmou a “Agenda do Trabalho Decente” onde foram tratados os assuntos pilares dos direitos fundamentais, do emprego, da proteção e do diálogo social.
De pronto, é evidente que a terceirização do trabalho segui este terrível caminho, onde a harmonia entre as pessoas dentro do ambiente de trabalho tenderá a diminuir progressivamente, e isso se dará em razão, também, da desigualdade entre o trabalhador da tomadora e o terceirizado no tocante ao salário, o que irá de encontro ao inciso XXIII do art. 7ª da CF, que diz, (...) a “igual remuneração por igual trabalho(...), pois é evidente que haverá uma diferença considerável entre os dois salários.
Utilizando-se do que diz a Convenção Internacional do Trabalho n. 111, que trata da discriminação entre homens e mulheres, porém trazendo para a dinâmica do trabalho terceirizado, haverá uma evidente discriminação entre trabalhadores também do mesmo sexo:
Para os fins da presente convenção:
a) o termo "remuneração" compreende o salário ou o tratamento ordinário, de base, ou mínimo, e todas as outras vantagens, pagas direta ou indiretamente, em espécie ou " in natura " pelo empregador ao trabalhador em razão do emprego deste último;
b) a expressão "igualdade de remuneração para a mão-de-obra masculina e a mão-de-obra feminina por um trabalho de igual valor", se refere às taxas de remuneração fixas sem discriminação fundada no sexo. (OIT, 1960)
O que a terceirização faz é diferenciar as pessoas, assim como rotular aquele que é terceirizado do que não é, ou seja, pessoas que trabalham uma ao lado da outra e possuem similaridade com relação ao trabalho serão tratados de forma diferente começando pelo tratamento, salário, passando pela parte da saúde e segurança do trabalho. Portanto, o reflexo de todo esse desrespeito ao trabalhador o desvaloriza afetando sua saúde e segurança, indo de encontro aos seus direitos humanos.
Quanto a valorização do trabalho e do emprego a questão remuneratória está longe de ser equitativa. Vejamos o que o art. 23 do Tratado Universal de Direitos do Homem diz: “Quem trabalha tem direito a uma remuneração equitativa e satisfatória, que lhe permita e à sua família uma existência conforme com a dignidade humana, e completada, se possível, por todos os outros meios de proteção social.”
Outrossim, utilizando-se desse tema, já sabatinado pelo STF por meio do julgamento do RE. N. 466.343, portanto fazendo parte da jurisprudência, lembramos o que disse o Eminente Ministro Gilmar Mendes:
“O Supremo Tribunal Federal acaba de proferir uma decisão história. O Brasil adere agora ao entendimento já adotado em diversos países no sentido da supralegalidade dos tratados internacionais sobre direitos humanos na ordem jurídica interna”. (PEREZ, 2014)
Reconheceu-se o status supralegal - acima de todas as normas legais e abaixo apenas da Constituição Federal - aos Tratados Internacionais dos Direitos Humanos, por meio da decisão que recepciona no ordenamento jurídico brasileiro. Um exemplo disso foi o Pacto de São José da Costa Rica, que por ter sido recepcionado pelo ordenamento jurídico brasileiro fez com que a prisão civil do depositário infiel deixasse de ser aplicada no Brasil.
Utilizando-se das palavras proferidas pelo Ministro do STF, Sepulveda Pertence, quando do julgamento do ADI-MC n. 1.675, que também entende que as normas concernentes aos direitos humanos compreendem os direitos e garantias constitucionais e consequentemente fazem parte do rol de normas supralegais:
(...) Duas decisões do Supremo Tribunal, contudo – malgrado para concluir pela hierarquia infraconstitucional dos tratados nelas considerados – permitem antever, a contrário sensu, com relação às convenções pré-constitucionais atinentes a direitos e garantias fundamentais uma clara abertura à tendência contemplativa de atribuir status constitucional às normas internacionais de outorga e proteção dos direitos humanos(...) onde se repeliu a revogação do Pacto de São José das leis permissivas da prisão civil do depositário infiel(...)
(...) Donde ser lícito inferir – como, de resto, ficou explicito em alguns votos – que, ao contrário- as convenções sobre direitos fundamentais incorporados ao direito brasileiro antes da Constituição de 1988 foram por ela constitucionalizados(...)
(…) “parece inquestionável - e sobre isso não houve controvérsia na Adin 1480 - que os direitos sociais dos trabalhadores, enunciados no artigo 7º da Constituição, se compreendem entre os direitos e garantias constitucionais incluídos no âmbito normativo do artigo 5º, parágrafo 2º, de modo a reconhecer alçada constitucional às convenções internacionais anteriormente codificadas no Brasil” (STF, Ministro Sepulveda Pertence, 1997)
Por meio deste raciocínio do Eminente Ministro, pelo fato dos enunciados no artigo 7º da Constituição, se compreendem entre os direitos e garantias constitucionais incluídos no âmbito normativo do artigo 5º, os mesmos não poderiam tratar a terceirização com tanta discriminação e descaso, chocando com direitos construídos por décadas, com vistas a proteger o trabalhador, parte hipossuficiente e atacando seus direitos humanos, nem tampouco tirar direitos consagrados pelos tratados internacionais, aos quais o Brasil é signatário.
Com relação a Norma Internacional especificamente no Tratado Universal de Direitos do Homem em seu preambulo diz “dignidade inerente a todos os membros da família humana e dos seus direitos iguais e inalienáveis constitui o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo”, assim como no art. 1ª que diz “todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos”.
As normas para o trabalho terceirizado estão também na contramão do art. 1ª, I da Convenção n. 122, que trata da proteção e criação do emprego, aprovada e ratificada pelo Brasil:
Com vista a estimular o crescimento e desenvolvimento econômico, elevar os níveis de vida, corresponder às necessidades de mão-de-obra e resolver o problema do desemprego e do subemprego, cada Membro deverá declarar e aplicar, como objetivo essencial, uma política ativa com vista a promover o pleno emprego, produtivo e livremente escolhido.(OIT, 1964)
Por certo, no Brasil os maiores desafios são a criação do próprio emprego, bandeira defendida pelo legislador para justificar a reforma trabalhista, contudo, o resultado não foi como o esperado. Segundo dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), por meio da pesquisa Pnad Contínua o número de empregados com carteira assinada somou 32,8 milhões, redução de 483 mil pessoas em relação ao mesmo trimestre do ano passado, e de 351 mil pessoas no confronto com o trimestre de dezembro a fevereiro (Brito, 2018). Porém, mesmo que sejam criados novos postos de trabalho, não se pode perder de vista que paralelamente a eles, deve-se atender precipuamente as normas e garantam a segurança, saúde e que não haja discriminação.
2.2 Princípios constitucionais do trabalho afetados pela terceirização
Os princípios de proteção da pessoa humana e do trabalho são parte importante da Constituição Federativa do Brasil, pois, o legislador de forma muito inteligente fez constar na Carta Maior diversos dispositivos que assegurassem constitucionalmente alguns direitos do trabalhador.
Para o tópico serão utilizados os Princípios Constitucionais do Trabalho e Princípios de Direito Individual e Coletivo do Trabalho do eminente Ministro do Tribunal Superior do Trabalho, Maurício Godinho Delgado, sobretudo os que se relacionam com o instituto da terceirização no Brasil. Isso não quer dizer que os outros não sejam importantes. (Delgado, 2017)
2.3 Princípio da dignidade da pessoa humana
Este princípio é inerente a pessoal humana e traduz o seu valor diante da sociedade, independentemente dos bens materiais que possui. São qualidades da pessoa, que são intangíveis, ou seja, abrange sua personalidade, sua individualidade, sua honra, liberdade, segurança, bem-estar social, intimidade dentre outros.
É o princípio fundamental do Direito Contemporâneo e inerente a um país democrático. Este princípio abre o texto constitucional, porém é encontrado em diversos momentos para expressar outras formas de dignidade da pessoa humana.
Iniciando no art. 1º, I que perpassa pelo art. 3º, art.170, assim como pelo art. 193 onde incorpora a dignidade da pessoa humana no núcleo entendido tanto como um fundamento, um princípio, assim como um objetivo, ou seja, vai de uma visão individualista a uma social, comunitária e que afirma ainda mais a dignidade da pessoa humana como o centro (Brasil,1988.)
Portando, as normas referentes a terceirização vigentes no ordenamento jurídico brasileiro atacam essa dignidade não só na pessoa em si, mas quando inserida em um meio social, ou seja, não mais se isola o homem como um ser estritamente individual, mas social.
2.4 Princípio da centralidade da pessoa humana na vida socioeconômica e na ordem jurídica
Neste princípio a centralidade da relação de trabalho estará na pessoa e não na empresa e no capital. Vale dizer que o homem, na sua simplicidade independente de sua riqueza, é importante. O documento internacional denominado Declaração da Filadélfia afasta definitivamente a ideia de que o trabalho é uma mercadoria. Para a OIT a centralidade não é e nem pode ser o trabalho ou a mercadoria pura e simplesmente, mas sim o homem, que com a seu esforço contribui para o desenvolvimento.
A reforma trabalhista, que busca resolver um problema econômico do país, precariza o trabalho e sobretudo o trabalhador, partes mais importantes da relação de emprego e trabalho.
2.5 Princípio da valorização do trabalho e do emprego
A valorização do trabalho e do emprego é um princípio inerente ao estado democrático de direito, pois faz com que o ser humano afirme-se como pessoa humana, ou seja, sai do plano individual e parte para o social e sobretudo o familiar.
Este não está ligado ao acúmulo de riqueza, mas sobretudo está ligado umbilicalmente ao fato de garantir o mínimo social.
Conforme o art. 3º, pode-se dizer que a erradicação da pobreza perpassa necessariamente pela condição de que todos precisam trabalhar para garantir o mínimo social.
Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; II - garantir o desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais, ou seja, o que os artigos 6º e 7º da CF/88 (BRASIL, 1988).
Porém, sabe-se que não basta trabalhar, mas sim ter oportunidade de crescer na empresa e galgar novas funções, cargos e desafios, contudo, algo que tornar-se-á mais raro em razão da grande rotatividade de terceirizados.
Com menos intervencionismo do Estado-Social, o indivíduo estará à mercê das grandes empresas que visam apenas o lucro, ou seja, não se preocupam com o cidadão e sua dignidade.
2.6 Princípio da não discriminação
Este princípio diz respeito a necessidade de tratamento de todos os trabalhadores que desempenham mesma função, no mesmo local, para o mesmo empregador, ressalvadas as especificidades previstas em lei, deste que não ofenda a CF/88.
Todavia, a expressão “poderão estabelecer, se assim entenderem, que os empregados da contratada farão jus a salário equivalente ao pago aos empregados da contratante” do novel texto legal, em seu art. 4°-C deixa claro que acabou a obrigatoriedade do trabalhador terceirizado receber o mesmo salário do empregado da empresa tomadora (Brasil, 2017).
Portanto, o texto dá liberdade ao empregador para estabelecer critério remuneratório diverso, violando a isonomia salarial, a despeito de laborarem sob as mesmas condições.
2.7 Princípio da vedação do retrocesso social
O presente princípio faz com que o Estado proíba ou crie meios para que normas e institutos que estingam direitos sejam abolidas. Contudo, o Legislador ao elaborar e aprovar a Lei n. 13.467/2017 não observou este princípio constitucional.(Brasil, 2017).
Esta vedação tem no seu pano de fundo o Direito Internacional, normas, leis, tratados e etc, todos de caráter internacional, mais especificamente o Direito Internacional do Trabalho.
Segundo REIS (2010, p. 126) as condições mínimas de trabalho firmadas pelo plano internacional inserem-se no quadro de prerrogativas da pessoa humana por força de sua dignidade própria, integrando o rol de direitos humanos, em sua dimensão econômica e social.
Pode-se concluir que o Brasil deve pautar-se no que diz as normas internacionais de direito do trabalho, porém é um princípio que precisa de um olhar mais fino, ou seja, está dentro de outros princípios como o da dignidade da pessoa humana; da valorização do trabalho e do emprega; do bem-estar individual e social; da justiça social; da subordinação da propriedade à sua função socioambiental.
O presente princípio está presente nas Convenções da OIT de números: 11, 87, 98, 135, 141 e 151) e deveriam sem atendidas pelo Brasil.
2.8 Princípio da irredutibilidade salarial
O presente princípio advém do próprio texto constitucional, art. 7º, VI, e traz a dimensão de que o salário é intangível, pois possui caráter alimentar e tem o objetivo de atender o trabalhador nas necessidades essenciais como moradia, saúde, transporte, alimentação, educação e assim por diante. Porém este princípio não pertence apenas ao Direito do Trabalho, mas a todo um universo jurídico externo à relação de trabalho.
Com a utilização cada dia mais frequente do instituto da terceirização, haverá uma queda no salário ocasionada pela inserção de trabalhadores terceirizados no ambiente das empresas, baixando ainda mais a média de salários e fazendo com que toda o valor do trabalho seja mitigado.
2.9 Princípio da indisponibilidade dos direitos trabalhistas
Utilizando-se do texto em sua literalidade, conforme abaixo, o art. 444 da CLT com vistas ao sentido etimológico da palavra renúncia seria quando uma pessoa ou parte da relação de trabalho abre mão de algo que teoricamente é sua de direito, contudo, dentro da norma juslaboral essa palavra assume um papel muito maior, pois por diversas vezes mesmo que o trabalhador ou empregado abra mão há que se falar em renúncia de direitos indisponíveis, pois nesses casos não caberá a ele fazer.
2.10 Princípio da Continuidade da Relação de Emprego
Os contratos de trabalho, em regra são em regra por tempo indeterminado, contudo, desde o fim da estabilidade decenal por meio da Lei 5.107 de setembro de 1966, que criou o regime do FGTS – Fundo de Garantia por Tempo de Serviço - esta realidade tem sido alterada, pois o direito dos trabalhadores com mais de 10 anos não poderem ser dispensados, salvo por justa causa, passou a ser mitigado (Brasil, 1966).
Porém o empregador manteve-se cauteloso com relação a dispensa sem justa causa, diante das consequências previstas na CF em seu artigo art. 7º, I, XXI da CF/88.
Assim sendo, a nova regulamentação da Lei N. 6019/72 traz a possibilidade de contratação de trabalhadores terceirizados indiscriminadamente, inclusive na atividade-fim, onde corre-se o risco de haver um grande número de dispensas em razão da possibilidade de contratação por meio de uma tomadora de serviço (Brasil,1972).
3 DESCENTRALIZAÇÃO PRODUTIVA
A descentralização da produção por meio do instituto da trouxe para a relação de trabalho, sobretudo para o trabalhador situações graves com vistas a sua dignidade, ou seja, afetando diretamente a vida do trabalhador (Brasil, 2017).
Em evento na ANAMATRA, o ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST) Maurício Godinho Delgado teceu os seguintes comentários acerca do Projeto de Lei nº 4.330/2004, que regulamenta terceirização no Brasil e de suas ameaças ao Direito e a Justiça do Trabalho.
"Eu nunca vi um projeto de precarização do trabalho como esse, de tamanha perversidade, que pisa nas pessoas e desrespeita quem vive do trabalho(...)
(...) É como se o brasileiro fosse o problema do Brasil. Trata-se de uma visão retrógrada, com saudade do século XIX e inveja da realidade asiática. É como se o trabalhador fosse uma matéria-prima que tem de ser mais barata, opinou. (...) o projeto de lei também vai de encontro com os princípios da Constituição Federal, que colocou o Direito do Trabalho como o ápice do Estado Democrático de Direito. A Constituição Federal será mentirosa se a CLT for vazia. (...) a proposta legislativa inverte também a própria lógica da terceirização, que é a de ser uma exceção, conforme prevê a Súmula 331 do TST, que permite a prática apenas na atividade meio da empresa. A terceirização, ao reverso do que o projeto faz, tem de ser restrita. E ela já é uma epidemia.
(...) O projeto vai afetar o bom funcionamento da economia, pois 60% do PIB brasileiro deriva da renda das pessoas físicas e das famílias. Não é só salário, é renda. (...) o próprio sistema de saúde pública será afetado, pois as empresas de terceirização, em regra, têm menos cuidados com a saúde a segurança do trabalhador.
(...) O desafio é muito grande, mas tenho convicção de que podemos sim convencer a sociedade política de que se trata de um equívoco grave e que vai na antítese do trabalho do Parlamento brasileiro. (JUSBRASIL, 2013)
Algumas consequências negativas imediatas surgirão, como por exemplo: A elevação da rotatividade de mão de obra, onde o trabalhador não mais terá uma identificação com uma empresa específica, causando assim uma queda na sua autoestima pelo medo de perder o trabalho.
Esvazia-se o poder que o trabalhador tinha de mobilizar-se por meio do seu sindicato, que diga-se de passagem dentro de uma empresa que eminentemente utiliza-se de trabalhadores terceirizados fica totalmente diluído.
Em parte do voto do RE 958252 a Eminente Ministra do STF Rosa Weber no foi bastante clara em afirmar que para que possam manter o mesmo nível salarial os trabalhadores precisaram trabalhar mais tempo, e sem poder descansar passarão a produzir menos e com menor qualidade, indo contra os objetivos da terceirização, expandindo a condição de precariedade.
"Na atual tendência observada pela economia brasileira, a liberalização da terceirização em atividades-fim, longe de interferir na curva de emprego, tenderá a nivelar por baixo nosso mercado de trabalho, expandindo a condição de precariedade hoje presente nos 26,4% de postos de trabalho terceirizados para a totalidade dos empregos formais" (BARBIÉRI e OLIVEIRA, 2018)
Caso não possam trabalhar por mais tempo, por certo que terão uma redução salarial, diminuindo assim as suas condições de vida, afetando o mínimo existencial, ou seja, desvalorização do trabalho, salário baixo, desemprego temporário farão com que mais pessoas entre em condições de miserabilidade.
Surgirão outras consequências como o aumento de acidentes de trabalho em razão do aumento da jornada de trabalho, falta de treinamento, pois a empresa prestadora de serviço não se preocupará em treinar os trabalhadores para disponibilizá-los a tomadora. Tudo isso gerará um adoecimento que refletirá diretamente na Previdência Social, que precisarão emitir frequentes licenças e aposentadorias precoces.
Outrossim, muitas pessoas passarão a ficar aquém da linha da pobreza fazendo com que também o IDH (Índice do Desenvolvimento Humano) da população diminua demasiadamente, afetando diretamente o crescimento do país.
Quanto à possibilidade de terceirização da atividade-fim da empresa, fica difícil visualizar como isso poderia acontecer. Pode-se pensar nesta possibilidade abstratamente, porém na prática quando se tratar de atividade principal da empresa, dificilmente não haverá a existência dos requisitos da pessoalidade e da subordinação em todas as suas formas, tão comuns em uma relação de emprego.
No tocante a isonomia salarial, surgirá uma discrepância entre o salário dos trabalhadores da empresa e os trabalhadores terceirizados, pois esses com toda certeza terão menores salários, mesmo que em alguns casos tenham um desempenho ainda melhor.
Sem falar na possibilidade de subcontratação que vai dificultar ainda mais a verificação pelo juízo trabalhista de quem é a responsabilidade pelas verbas, pois haverá um efeito cascata entre empresas.
CONCLUSÃO
Contudo, após a entrada em vigor da reforma trabalhista – Lei 13.467/2017 os princípios constitucionais do trabalho passaram a correr grande risco, dada a diminuição do intervencionismo do Estado-Social. Poder-se dizer a CLT criou um princípio muito perigoso, que poderia se chamado de Princípio da Proteção ao Empregador, diante da retirada de diversos direitos do trabalhador com vistas a atacar a sua dignidade, assim como a garantia do mínimo social existencial. Essa reforma trabalhista tão ampla, feita a toque de caixa, é uma resposta à crise sim, porém com o viés capitalista voltado para o empresariado, pois partiu de uma reforma pontual de mais ou menos dez artigos passou a mais de cem, literalmente do dia para a noite.
É notório que o país enfrenta grande crise, mas proveniente da falta de ética, da demasiada corrupção institucional, o que acarreta em uma economia frágil que trás como pano de fundo o alto índice de desemprego, contudo, não se pode demonizar o trabalhador, que além de ser a parte frágil do sistema é aquele que com o seu trabalho gera lucro e desenvolvimento ao país.
O último golpe dado pelo judiciário contra o trabalhador foi sem sombra de dúvida a declaração de constitucionalidade da terceirização da atividade-fim.
Para os ministros que defedem terceirização irrestrita estão os argumentos como o princípio constitucional da livre iniciativa, de que atividade-meio e atividade-fim se confundem, assim como a afirmação de que o Brasil não pode ficar aquém do mundo globalizado, ou seja, e liberar a terceirização não significa precarizar as relações de trabalho nem desproteger os trabalhadores, e ao final jogam ao judiciário a árdua missão de combater os eventuais abusos ou fraudes.
Evidentemente a terceirização indiscriminada não se coaduna com os princípios constitucionais do trabalho, com os Tratados Internacionais do Trabalho e dos Direitos Humanos, e para confirmar esse pensamento serão utilizados algumas reflexões daqueles Ministros do STF que foram contra a constitucionalidade da atividade-fim - que se posicionaram contra, no sentido de que a livre iniciativa não pode ficar acima de outros princípios, como o da valorização do trabalho, assim como a necessidade de o Estado Democrático de direito ter a responsabilidade de assentar na sólida proteção do trabalhador, assim como em razão de ter no Brasil uma escassez de trabalho, é mais importante será mantê-los.
REFERÊNCIAS
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[1] Contratação de serviços pessoais, exercidos por pessoas físicas, de modo subordinado, não eventual e oneroso, realizada por meio de pessoa jurídica constituída especialmente para esse fim, na tentativa de disfarçar eventuais relações.
pós-graduado em Gestão Pública pela UCDB. Graduado em Matemática pela Uniderp. Graduando em Direito pelas Faculdades Integradas de Paranaíba-MS. Servidor Público do Tribunal Regional do Trabalho da 24ª Região.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CHEBEL, Roberto Chagas. Descentralização produtiva: contexto histórico da terceirização no Brasil e suas consequências Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 07 mar 2019, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/52711/descentralizacao-produtiva-contexto-historico-da-terceirizacao-no-brasil-e-suas-consequencias. Acesso em: 23 dez 2024.
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Por: PATRICIA GONZAGA DE SIQUEIRA
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