Resumo: O presente estudo tem o objetivo de fomentar o debate a respeito da aquisição, uso e disseminação de bebidas alcoólicas aos povos indígenas, visto que o artigo 58, inciso III, da Lei n. º 6001/1973 proíbe as mencionadas práticas. A pesquisa procurou distinguir a definição de álcool, alcoolismo e processo de alcoolização, destacando-se aspectos que relacionam entre si e os resultados distintos que apresentam. A partir da abordagem acerca das bebidas alcoólicas nas sociedades indígenas, permitiu-se verificar o consumo em diferentes contextos sociais e culturais. Analisa-se através da história do Brasil, os direitos indígenas que vieram por meio da Constituição Federal de 1988, Estatuto do Índio, Convenção 169 da OIT e pela Declaração das Nações Unidas sobre Direitos dos Povos indígenas, compreendendo os Princípios da Igualdade e da Dignidade da Pessoa Humana, como ponto central da presente pesquisa. Busca-se com este estudo a efetivação de garantia de direitos aos povos indígenas, verificando se o artigo 58, inciso III, da Lei n.º 6001/1973 é uma norma que discrimina as pessoas indígenas no Estado Democrático de Direito.
Palavras-chave: Bebidas alcoólicas. Indígenas. Igualdade.
Abstract: The present study has the objective of fomenting the debate regarding the acquisition, use and dissemination of alcoholic beverages to the indian people, since article 58, item III, of Law no. No 6001/1973 prohibits such practices. Initially, the origin of alcohol and the emergence of indian people are analyzed through a brief study of the first contacts. The research sought to distinguish the definition of alcohol, alcoholism and alcoholization process, highlighting aspects that relate to each other and the distinct results they present. From the approach on alcoholic beverages in indian societies, it was possible to verify consumption in different social and cultural contexts. Through the history of Brazil, we analyze the indigenous rights that came through the Federal Constitution of 1988, the Indian Statute, ILO’s (International Labour Organization) Convention 169 and the United Nations Declaration on the Rights of Indian People, including the Principles of Equality and Dignity of the Human Person, as the central point of the present research. This study seeks to guarantee the rights of indigenous peoples, checking if since Article 58, item III, of Law n. º 6001/1973 is a norm that discriminates against indigenous people in the Democratic State of Law.
Keywords: Alcoholic beverages. Indian people. Equality.
Sumário: Introdução. 1 - Bebidas alcoólicas nas Sociedades Indígenas. 1.1 -Alcoolização Indígena: um olhar antropológico. 1.2 - Bebidas fermentadas Indígenas e seu uso. 1.3 - Bebidas destiladas na atualidade Indígena. 2 - Aspectos gerais da cultura Indígena e o Direito. 2.1 - Do Direito Indígena. 2.2 - A Carta Magna e o tratamento dado aos Indígenas. 2.2.1 - Direito à alteridade. 2.2.2 - Princípio da Igualdade e o respeito à diferença. 2.2.3 - Princípio da Dignidade da Pessoa Humana. 2.2.4 - Do Estatuto do Índio e a FUNAI. 2.2.5 - Críticas ao Estatuto do Índio. 2.2.6 - Convenção 169 da OIT. 2.2.7 - Declaração das Nações Unidas sobre Direitos dos Povos Indígenas. 2.3 Do multiculturalismo. 2.4 - Do relativismo cultural e universalismo. 3 - Do Artigo 58, inciso III, da Lei nº 6001/1973. 3.1 - Entendimento favorável. 3.2 - Entendimento contrário. 4 - Medidas acautelares. 4.1 - Prevenção. Considerações finais não conclusivas. Referências.
Introdução
O cenário atual do Brasil é bem diferente de anos atrás, eis que nos dias de hoje a inteiração social de povos indígenas que eram praticamente/totalmente isolados se faz presente, buscando-se interagirem com os nacionais, mantendo, dentro do possível, a preservação de suas culturas. Importante mencionar que a cultura dos não-índios é uma grande atração para os indígenas, e por conseqüência, ao se interagirem, adotam práticas que não são politicamente corretas. Á guisa de exemplo, observar-se que é o que ocorre com o consumo das bebidas destiladas, objeto do presente estudo.
É sobremodo importante dizer que os povos indígenas fabricam suas próprias bebidas, e que dentro da tradição de cada grupo étnico estes possuem seus estilos tradicionalistas de beberem. Ocorre que, nos dias de hoje foge ao modo tradicional de consumir bebidas alcoólicas trazendo para suas comunidades, consequências negativas.
Devido aos problemas de ordem pública e judicial advindas do consumo excessivo do álcool, foi-se criado o artigo 58, inciso III, do Estatuto do índio, visando coibir a aquisição, o uso e disseminação de bebidas alcoólicas aos povos indígenas, sendo esta uma infração.
Nesse enfoque, o referido estudo tem por objetivo patentear, relatar e analisar a grande discussão sobre o uso de bebidas alcoólicas nas aldeias indígenas, visto que o artigo 58, inciso III, da Lei n. º 6001/1973 proíbe as mencionadas práticas. Neste passo, apresentou-se os parâmetros constitucionais acerca do Princípio da Igualdade e da Dignidade da Pessoa Humana, além de tratados internacionais que tem por finalidade legal, visando garantir e promover a proteção dos direitos aos povos indígenas.
Assim, o estudo é de suma importância, sendo de grande relevância, pois além de expor a realidade, esta pesquisa visa “dar voz” àqueles que a maioria das vezes não possui em uma sociedade egocêntrica, sendo um sinal alternativo de atingir princípios que anelam uma sociedade democrática de direito. Além disso, teve por objetivo estimular uma reflexão jurídica sobre o tema: de um lado o Estatuto do Índio, de outro a Constituição Federal de 1988 e os tratados internacionais
O presente estudo objetivava-se em pesquisa de campo com os povos indígenas não inteirados, sendo estes o ponto central do estudo, visto que os outros já inteirados com a cultura nacional fazem uso, caso queiram, de nossas bebidas, dentre elas os destilados. Por ser um assunto extremamente polêmico, seria necessária autorização da presidência da FUNAÍ e do Conselho de ética como segurança para ingressar em terras indígenas para fins de pesquisas cientifica, no entanto, por tais motivos, a priori não foi possível.
Trata-se, assim, de um estudo bibliográfico de natureza qualitativa, que usou como ferramenta as leis, artigos científicos, jurisprudências, bem como livros que abordam sobre o assunto.
1 Bebidas alcoólicas nas sociedades Indígenas
1.1 Alcoolização Indígena: um olhar antropológico
Em primeiro momento, mister se faz ressaltar que com o passar dos anos houve a inteiração do indígena na sociedade brasileira, passando estes a ocuparem muitos cargos e espaços políticos, tais como: militares, professores, enfermeiros, padres, desportistas, Vereadores, músicos etc., diferentemente de anos atrás, ao qual se tinha a visão do índio nu, nas florestas, com arco e flecha em mãos.
Necessário é lembrar também sobre a existência das bebidas fermentadas, que desde sempre são consumidas pela maioria dos povos indígenas do Brasil, sendo esta uma tradição cultural. Registre-se que as bebidas fermentadas são muito utilizadas nas festas, rituais e nos mutirões. Neste sentido, SOUZA (2013, p. 121) diz:
As bebidas alcoólicas são absolutamente presentes na vida social dos povos indígenas. São consumidas nas atividades produtivas, nas festas de santo, nos rituais xamânicos, nas reuniões, nas celebrações e no lazer. Assumem o papel de meios de acesso ao sobrenatural, de presentes aos seres de ‘outro mundo’, de veículo de reciprocidade e agente motivador nos trabalhos de roça, de veículos de feitiços, de causa de doenças no caso da cachaça, de agentes etiológicos e terapêuticos nas sessões de cura.
Cumpre refletir, todavia que o mundo dos brancos é para os índios uma grande atração, principalmente as bebidas destiladas. Ante esta realidade, discute-se com muita frequência que as bebidas destiladas são o fator principal da extinção de vários grupos indígenas. Há, porém, quem defenda o consumo das bebidas alcoólicas pelos indígenas, alegando que o direito à alteridade dos indígenas, indica que estes têm os mesmos direitos que os não indígenas, sendo ilícita a limitação de determinados direitos, aniquilando a estes o livre arbítrio de decidir o que consideram certo ou errado. Entrementes, neste ínterim, resta plenamente cabível reconhecer como se dá o uso das bebidas, as diferentes atitudes e os diversos estilos de beber (SOUZA, 2013, p. 82).
1.2 Bebidas fermentadas Indígenas e seu uso
As primeiras fabricações e o uso de bebidas fermentadas são desconhecidos antropologicamente, sabe-se que quando os europeus chegaram ao território brasileiro, os índios possuíam suas próprias bebidas, que eram feitas para ritualizar a vida social. Pesquisas feitas afirmam que o uso de bebidas fermentadas é tão antigo quanto a existência de ritos religiosos. Os ingredientes empregados, o modo de preparar e a forma como ingerem é distinta de um grupo étnico para outro. O ingrediente mais utilizado para fins rituais é o tabaco, porém existem inúmeros substâncias que são utilizadas para a fabricação das bebidas fermentadas, dependendo da região e do grupo estudado.[1]
As razões para consumirem bebidas fermentadas, bem como os efeitos almejados fazem partes de uma manifestação social (inter e intragrupal) dos povos indígenas, podendo estar “ligadas ao sagrado, ao divertimento, à reciprocidade e , em certos casos, à política. Muitas festas são cíclicas, marcando épocas específicas do calendário anual, como a colheita de certas frutas, a mudança das estações etc. (SOUZA, 2013, p.32).” Importante destacar que “além de contribuir para a sociabilidade e o divertimento, as bebidas fermentadas são usadas em ritos que favorecem a expressão simbólica da própria sociedade, de sua manifestação ante o divino e da consciência coletiva (SOUZA, 2013, p. 32).”
Necessário trazer à baila a função primordial das mulheres a respeito da fabricação das bebidas fermentadas, em que na maioria das aldeias indígenas, “estas são produzidas exclusivamente pelas mulheres, que fornecem o trabalho agrícola ou de coleta necessário, fabricam e decoram os recipientes apropriados ao preparo das bebidas e, em última análise, influenciam decisivamente sobre sua utilização (FERNANDES, 2004, p. 103)”.
Uma das bebidas fermentadas mais conhecida é a chicha, que é feita de mandioca, milho ou frutas vermelhas, fabricada pelos povos indígenas dos Estados andinos e da América latina, desde o período do Império Inca. Á guisa de exemplo, os Siona, um grupo tukano da Colômbia, organizam suas festas para tomar chicha durante dois ou três dias seguidos, como parte de seus processos políticos e sociais. A chicha entre esse grupo étnico é consumida através de uma festa para criar consenso comunitário quando há conflito de interesses, no caso, por exemplo, de escolher um novo líder, construir relações amigáveis com outros grupos étnicos ou para se fazer trabalhos e celebrações comunais.[2]Não obstante isso, a chicha pode ser produzida em festas de grupos familiares, como descreve PINTO (2009, p. 115):
A chicha de macaxeira fermentada é consumida coletivamente em duas ocasiões: ou a bebida é consumida como pagamento de um trabalho coletivo para um grupo doméstico (abertura, coivara, plantação ou limpeza de roças, limpeza dos caminhos e terreiros, colocação do telhado), ou ela é oferecida em festas: aniversários (dos mais jovens), casamentos, datas comemorativas (Natal, Ano-Novo etc.) sem que necessariamente os que a estão consumindo tenham trabalhado para o grupo doméstico que a produziu. Em ambos os casos as pessoas não comparecem sem que o dono da chicha venha convidar os participantes para sua casa.
Nota-se, que devido ao contato com os não-índios,muitos povos indígenas não consomem ou fabricam mais suas próprias bebidas, como é o caso da cultura Paiter Suruí, em que “as bebidas fermentadas, chicha, feitas de cará, batata doce, mandioca ou milho, já não são consumidos como antigamente, por motivos de religiosidades (MENDES, 2017, p. 62).”
Tradicionalmente, dentre as comunidades indígenas brasileiras, é comum a fabricação do cauim, bebida preparada através da mastigação de raízes e do milho por mulheres indígenas, de preferência as mais novas e que fossem virgens. Para melhor entendimento, José de Anchieta (1988, p. 338), descreve:
São muito dados ao vinho, o qual fazem das raízes da mandioca quecomem, e de milho e outras frutas. Este vinho fazem as mulheres, e depois de cozidas as raízes ou o milho, o mastigam porque com isso dizem que lhe dão mais gosto e o fazem ferver mais. Deste enchem muitos e grandes potes, que somente servem disso e depois de ferver dois dias o bebem quase quente, porque assim não lhes faz tanto mal nem os embebeda tanto, ainda que muitos deles, principalmente os velhos, por muito que bebam, de maravilha perdem o siso, ficam somente quentes e alegres.
Como se pode observar, o cauim é uma bebida fermentada com um alto teor alcoólico, semelhante a chicha, equiparado por Lima (1990, 312-313) como se fosse um “pão líquido” ou uma “sopa pré-digerida e fermentada por bactérias e leveduras”. No período de descobrimento do Brasil, o cauim era utilizado “quando matam algum prisioneiro para comer, quando deliberam sobre a guerra, em suma quando se juntam por prazer ou para tratar de negócios importantes (ABBEVILLE, 1975, p. 237)”. Ao contrário disso, apesar do cauim ser utilizado nos dias de hoje, o contexto festivo mudou-se, onde bebem apenas para ficarem alegres.
Ademais, outra bebida fermentada produzida pelos índios é o caxiri, que assim como o cauim, só pode ser feito por mulheres e sua matéria-prima é a mandioca. O caxiri tradicionalmente é consumido por muitas pessoas, principalmente nas festas de troca, de alianças políticas ou matrimoniais, durante derrubada ou plantio das roças, quando o pajé quer ter acesso ao mundo sobrenatural, etc. Interessante mencionar, que o consumo do caxiri nos povos indígenas do Uaçá, além dos rituais xamânicos, é feito nas “festas dos santos, assembleias políticas, festividades do Dia do Índio e competições esportivas (denominada ‘olimpíadas’) (SOUZA, 2013, p. 113)”. Cabe ressaltar que o preparo do caxiri leva de dois a três dias, e que tanto no presente quanto em tempos passados, as festas duram dias e somente encerram quando a bebida se esgota (SOUZA, 2013, p. 82).
Forçoso é perceber que inúmeras são as bebidas produzidas e consumidas pelos povos indígenas, eis que a matéria-prima de utilização para produção destes líquidos são diversas (tubérculos, raízes, frutos, sementes, folhas etc.). Assim, assentando sobre o assunto, SOUZA (2013, p. 33) narra:
Como, quando e quanto bebem são aspectos característicos de estilo de beber adotado em cada grupo étnico. O consumo tradicional de bebidas fermentadas está não só associado a atividades construtivas para o grupo social, como também expressa sensações e valores particulares.
1.3 Bebidas destiladas na atualidade Indígena
As bebidas destiladas foram introduzidas no meio indígena há mais de três séculos, sendo a cachaça a primeira substância ativamente utilizada pelos colonizadores, como meio de escravidão. Além da cachaça, outras substâncias passaram a ser ingeridas devido ao contato interétnico, tais como perfumes, desodorantes e álcool de farmácia (SOUZA, 2013, p. 82).
Uma das principais consequências com o contato das bebidas destiladas foi à desvalorização da cultura de determinados povos indígenas, sendo a facilitação da compra do álcool maior do que produzir durante dias suas próprias bebidas. Com isso, perdem sua própria tradição, como narra Yab-alapixah Suruí:
Não sabemos ao certo como vai ser o nosso futuro, deveríamos preservar esse conhecimento, preservar nossa língua. Mas não, preferimos viver como os yara ey e assim abandonamos nosso alimento tradicional, esquecemos de yatir, da bebida sem fermentação. Há tempos que não bebo yatir. Mesmo morrendo de desejo, não bebo porque não tem para beber. Eu fui criado com alimento tradicional, minha mãe, além do leite do peito, me dava nosso alimento. Por isso quero muito a comida de Paiter, mas, como não tem, tenho que me alimentar da comida do yara(PAPPIANI e LACERDA, 2016, p. 107).
Em tempos remotos, o uso de bebidas alcoólicas contribuía de forma positiva os povos indígenas, contudo, nos dias de hoje acontece o oposto, uma vez que foge do hábito tradicional. Sendo assim, deve ser analisado o consumo excessivo do álcool como uma problematização social/coletiva, e não individual.
Nesse viés, o uso de bebidas alcoólicas pelos povos indígenas no âmbito social, geram vários problemas de ordem pública e judicial, além de criar “uma imagem negativa para os povos indígenas, já que ‘alcoólatra’ é um adjetivo empregado pela sociedade brasileira para caracterizar o índio e justificar sua exclusão social (SOUZA, 2013, p.34)”.
Por sua vez, os nãos índios para justificar as consequências trazidas pelos índios bêbados questionam os direitos e os programas sociais que são destinados aos povos indígenas, alegando que eles não merecem usufruir de direitos e muito menos serem respeitados(SOUZA, 2013, p.34).Indubitável é que a introdução das bebidas destiladas trouxe um motivo a mais para menosprezar a imagem social dos povos indígenas. De outro lado, é de ser relevado que a problematização da embriaguez foi ocasionada pelos próprios nãos índios, sendo inicialmente apresentada pelos europeus no período de colonização, e desde então problematização referente ao álcool surge no meio social.
Portanto, é necessário utilizar o conceito alcoolização ao invés de alcoolismo, para impedir a ideia de que alcoolista é o culpado, seja por irresponsabilidade, fraqueza mental ou biológica, devendo ser considerado o campo histórico-político que envolve a comunidade (SOUZA, 2013, p.35)”. Importante ressaltar que “a crítica à embriaguez não é nova: desde a antiguidade mais remota as sociedades buscam controlar a liberdade comportamental possibilitada pelos inebriantes etílicos (FERNANDES, 2004, p. 13)”. Contudo, as críticas sempre existirão, e para explicar o evento coletivo de alcoolização, necessário é questionar os fatores determinantes para o consumo abusivo do álcool.
2 Aspectos gerais da cultura Indígena e o Direito
2.1 Do Direito Indígena
O surgimento dos direitos indígenas deu-se quando “agindo pelo seu livre arbítrio, o homem desceu ao nível dos seres baixos e embrutecidos e provocou a dizimação de semelhantes seus, na busca pelo poder, riqueza e glória” (MARTINS (2005, p. 26). No período em que os europeus chegaram ao Brasil, no ano de 1500, acreditando haverem chegado às Índias, encontraram inúmeros índios de diferentes etnias. A partir desse momento é que decorreu o processo de colonização, que foi marcado por genocídio, escravidão, roubo, prostituição, e outros meios horripilantes e escachados de derruir os direitos do ser humano (MARTINS, 2005, p. 26).
Várias tragédias ocasionadas pelos colonizadores aconteceram na vida dos povos originários dessas terras: escravidão, guerras, doenças, massacres, genocídios, etnocídios e outros males que por pouco não eliminaram por completo os seus habitantes. Não que esses povos não conhecessem guerra, doença e outros males. A diferença é que nos anos da colonização portuguesa eles faziam parte de um projeto ambicioso de dominação cultural, econômica, política e militar do mundo, ou seja, um projeto político dos europeus, que os povos indígenas não conheciam e não podiam adivinhar qual fosse. (LUCIANO, 2006, p.17).
Indubitável é que o inicio da história do Brasil foi marcada por comportamentos inumanos, onde para os portugueses, os índios não eram considerados seres humanos, inclusive, ‘’alguns religiosos europeus, por exemplo, duvidavam que os índios tivessem alma. Outros não acreditavam que os nativos pertencessem à natureza humana, pois, segundo eles, os indígenas mais pareciam animais selvagens (LUCIANO, 2006, p. 34)”.
Estima-se que quando os portugueses desembarcaram nas costas brasileiras havia aqui aproximadamente 2 a 2,3 milhões de índios[3], e que devido a exploração e colonização, foram aos poucos desaparecendo, devido a violência imediata contra eles praticados, como também à violência mediata no despojamento de suas terras[4].
Após muitas discussões entre os conquistadores, teólogos e juristas, constataram que os ameríndios não eram animais, e assim, passaram a serem considerados seres humanos, porém inferiores, por não saberem viver por si próprios, segundo os portugueses[5]. Nesta feita, no ano de 1570 decretou-se terminantemente que os índios não poderiam ser levados a cativeiros, embora, no ano de 1587 aparece uma lei que limita a liberdade dos Índios.[6]
Diversamente disso, em 1595 foram proibidas todas as guerras aos povos indígenas sem provisão régia (bandeiras), declarando-se ilegítimos os capturados e mantidos em cativeiros de tais guerras. No ano de 1605 a 1608, os indígenas são considerados pessoas livres, e em 1609 os índios são equiparados aos colonos, deixando a condição de selvagens. E foi a partir daí que começaram a surgir à necessidade de protegê-los e tutorá-los, sendo os jesuítas declarados oficialmente os curadores dos Índios. Diante disso, o Governador D. Diogo de Mendonça, que resistia às leis, foi forçado a se demitir, após a ocorrência de tais feitos considerados históricos (MARTINS, 1880, p. 39).
Desse momento em diante, o Brasil passou por muitas altercações acerca dos direitos aos povos indígenas, mas o mais recente processo de redemocratização do País surgiu no inicio da década de 1980, cujo marco foi à promulgação da Constituição Federal de 1988. Os Índios passaram a serem considerados sujeitos de direitos e de cidadania, onde foi garantido o direito de continuar perenizando seus antigos modos de vida, suas culturas, suas civilizações, seus valores, garantindo igualmente o direito de acesso a outras culturas, às tecnologias e aos valores do mundo como um todo (LUCIANO, 2006, p. 36).
2.2 A Carta Magna e o tratamento dado aos Indígenas
Frise-se outra vez, que o marco inicial para garantir os direitos aos povos indígenas foi a Constituição Federal de 1988,onde passou a reconhecera sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, além de o direito dos índios, suas comunidades e organizações, ingressarem, em juízo, em defesa dos seus interesses (art. 232, CF/88). Assim, o artigo 231,da Constituição Federal de 1988, foi um grande avanço:
Art. 231.São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.
Além do mais, os parágrafos 1º e 2º do mesmo artigo expõem a noção de terras indígenas:
§ 1º São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.
§ 2º As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes.
Ora, indubitável é que os povos indígenas têm direitos ante as terras que tradicionalmente apoderam-se, sendo indispensável um reconhecimento oficial acerca desse assunto, eis que são de natureza originária. Nesse enfoque, tal reconhecimento se faz com a finalidade meramente declaratória, assegurando aquilo que é de direito.
A respeito dos dispositivos constitucionais, em Ação Popular o Ministro Ayres Britto ensina:
Os arts. 231 e 232 da CF são de finalidade nitidamente fraternal ou solidária, própria de uma quadra constitucional que se volta para a efetivação de um novo tipo de igualdade: a igualdade civil-moral de minorias, tendo em vista o proto valor da integração comunitária. Era constitucional compensatória de desvantagens historicamente acumuladas, a se viabilizar por mecanismos oficiais de ações afirmativas. No caso, os índios a desfrutar de um espaço fundiário que lhes assegure meios dignos de subsistência econômica para mais eficazmente poderem preservar sua identidade somática, lingüística e cultural. Processo de uma aculturação que não se dilui no convívio com os não índios, pois a aculturação de que trata a Constituição não é perda de identidade étnica, mas somatório de mundividências. Uma soma, e não uma subtração. Ganho, e não perda. Relações interétnicas de mútuo proveito, a caracterizar ganhos culturais incessantemente cumulativos. Concretização constitucional do valor da inclusão comunitária pela via da identidade étnica.[7]
Assim, a Carta Magna passou a dedicar artigos exclusivos para tratar dos direitos indígenas, distribuídos em diferentes capítulos.Desta sorte, foi entregue ao Ministério Público o poder de atuarem defesa dos direitos indígenas (art. 129, V, CF/88); à União a legislar privativamente sobre populações indígenas (art. 22, XIV, CF/88) e aos juízes federais a competência para processar e julgar as causas sobre direitos indígenas (art. 109, XI, CF/88). Ademais, a Lei Maior determina ao Estado o dever de proteger as manifestações das culturas populares,até mesmo as indígenas (art. 215,§1º, CF/88).
Ex positis[8],é notório verificar que a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 concedeu à população indígena os direitos considerados mais fundamentais, preservando as diversidades existentes, além disso, “assegura espaço para uma integração entre os povos e a sociedade envolvente em condições de igualdade, pois que se funda na garantia do direito à diferença (LEITÃO, 1993, p. 228)” [9], embora seja ainda um grande desafio a efetivação de tais direitos, eis que se busca incansavelmente a concretização destes no Estado Democrático de Direito.
2.2.1 Direito à alteridade
O direito à alteridade adveio com a Constituição Federal de 1988 e com a Convenção 169 da OIT, que reconheceu aos povos indígenas o direito de serem diferentes. Portanto, o termo “alteridade significa ser outro, colocar-se ou constituir-se como outro” (MARTINS, 2005, p.124).
Neste raciocínio, Aracy Lopes da Silva (2000, p. 18) clarifica o entendimento:
[...] as sociedades indígenas compartilham de um conjunto de traços e elementos básicos, que são comuns a todas elas e as diferenciam de sociedades de outro tipo. A lógica e o modelo societal compartilhado pelos grupos indígenas são diferentes do nosso. [...] o que faz com que uma sociedade seja indígena e o que diferencia uma das outras? É o modo de viver, de organizar as relações entre as pessoas e destas com o meio em que vivem e com o sobrenatural que faz com que uma sociedade seja indígena. Sociedades indígenas são sociedades igualitárias, não estratificadas em classes sociais e sem distinções entre possuidores dos meios de produção e possuidores de força de trabalho. São sociedades que se reproduzem a partir da posse coletiva da terra e dos recursos ela existentes e da socialização do conhecimento básico indispensável à sobrevivência física e ao equilíbrio sócio-cultural dos seus membros.
Pelo óbvio, não seria necessário à existência deste direito se não fosse à apoderação de terras indígenas e a violação de direitos humanos à estes povos, causadas pelo período de colonização até os dias de hoje, que por meio de imposição busca-se igualar estes aos não-índios, não levando em consideração a os costumes, a cultura e a tradição dos povos indígenas. Nota-se queno decorrer do processo de colonização, até nos dias de hoje “não se ouve a voz dos índios; eles perderam a palavra. Ou melhor, a sociedade evolvente faz questão de não ouvir a sua voz, ou tenta, de várias formas calar essa voz e também impedir que ela seja ouvida” (MARTINS, 2005, p. 127).
Logo, o direito à alteridade ou diferença, assegura que os índios têm os mesmos direitos que os não-índios. Cumpre registrar que, por estarem no território brasileiro antes da chegada dos portugueses, os povos indígenas constituíram a sua sobrevivência cultural e física por meio das terras que ocuparam. Portanto, por entender-se que as terras fazem parte dos próprios indígenas, foi-se garantido á eles o direito de posse dessas terras (art. 231, caput, CF/88).
Assim, “a alteridade ultrapassa o reconhecimento do outro como sujeito, para alcançá-lo como ser único, livre e responsável, ao qual se deve respeitar em sua diferença e autonomia” (REIS et al, 2017, p.74).
2.2.2 Princípio da igualdade e o respeito à diferença
Primeiramente, oportuno se toma lembrar o que estabelece o artigo 2° da Declaração Universal dos Direitos Humanos, que diz:
Art. 2º. Todas as pessoas tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidas nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição.
Nota-se ainda, que a Constituição Federal de 1988, em seu art. 5º, caput, também diz que “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes” (grifo nosso).
Verifica-se que tais dispositivos estão associados aos ideais de que o legislador deve criar tratamentos igualitários as pessoas que encontram-se em situações idênticas, por meio de leis, atos normativos e medidas provisórias; e, na aplicabilidade normativa, não deve haver desigualdades, sendo irrelevante a religião, raça, sexo, classe social, convicções políticas ou filosóficas.[10]
Alexandre de Moraes (2012, p. 36) narra:
A desigualdade da lei se produz quando a norma distingue de forma não razoável ou arbitrária um tratamento específico a pessoas diversas. Para que as diferenciações normativas possam ser consideradas não discriminatórias, torna-se indispensável que exista uma justificativa objetiva e razoável.
Nesse sentido, qual seria o motivo para não tratar os povos indígenas de forma igual ás demais pessoas (não-índios)? Questionamento este que levaria um sábio a não obter resposta. Porém, se o motivo de não conceder tal direito for por estes serem diferentes, devido a sua cultura, língua, costumes etc., o critério discriminante justificativo deveria valer para estrangeiros que habitam no Brasil, e também para determinados Estados brasileiros, tais como Bahia, Rio Grande do Sul, Minas Gerais, dentre outros, que apresentam culturas, sotaques e tradições diferentes de outros Estados do País. Pois bem, é bem verdade que os povos indígenas são iguais a qualquer indivíduo de uma sociedade, conquanto, deve-se fazer jus ao direito de igualdade, assegurado a todos os brasileiros, e, além disso, o direito de não serem discriminados por sua identidade étnica.
Deve ser garantido ao índio a opção de fazer parte da sociedade envolvente ou permanecer com seus costumes, crenças e tradições. Nas duas hipóteses, devem ser assegurados seus direitos à liberdade, a uma vida digna e independente. Seus direitos devem ser consolidados em normas que expressem seu modo-de-ser, de pensar, seu posicionamento perante o mundo em que vivem. E que o principio da igualdade, expresso na Constituição Federal de 1988, seja disseminado em todas as regras concernentes às comunidades indígenas e não se desvirtue. Que não se trilhe caminho conducente a qualquer forma de discriminação (MARTINS, 2005, p. 61).
O descumprimento do princípio da igualdade se fez e faz presente na história do Brasil. O tratamento desigual também aconteceu com os negros, mulheres, homossexuais, pessoas com deficiência, com estrangeiros imigrantes e com os índios.
Para os índios, “todos os seres vivos estão em situação igual, pois são filhos de uma mesma mãe, a mãe-terra. Dessa ciência, emerge o respeito por ela, [...] sem que haja agressão, pois é a terra a grande mantenedora da força espiritual do povo indígena” (MARTINS, 2005, p. 223).
Não se pode olvidar, que se trata do caráter discriminatório e não do protetivo (direito à alteridade) aos povos indígenas. Portanto, todas as pessoas têm o mesmo valor intrínseco. Neste viés, todos têm direito a igual respeito e consideração. Tem direito a igualdade formal, de não serem discriminadas na lei ou pela lei, e tem também o direito ao reconhecimento, conservar sua identidade, mesmo quando seja a minoria, e é neste âmbito que não se pode discriminar em favor de alguém para reparar determinadas injustiças.
Por fim, outro não é o escólio da sábia Professora Mestre Matilde Mendes, que tece considerações no mesmo sentido:
Cada povo indígena possui diferença no modo de viver e estar no mundo com conhecimentos específicos e diferenciados e isso os torna únicos, mas ao mesmo tempo com plenos direitos de acesso a outros conhecimentos. É no tecer da teia da interculturalidade que se aproximam mundos e diminuem os preconceitos, no movimento da dialética (2017, p. 45).
2.2.3 Princípio da Dignidade da Pessoa Humana
O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana é um preceito constitucional que está explicito na Constituição Federal de 1988,no art. 1º, onde diz que a República Federativa do Brasil, constituída em Estado Democrático de Direito, tem como um de seus fundamentos a dignidade da pessoa humana. Frisa-se que é um dos elementos inevitáveis para a legitimidade de quaisquer atos do Estado brasileiro, sendo o ponto norteador para guiar sentenças no sistema jurídico brasileiro.
Em voto, o Ministro Ricardo Lewandowski teceu suas considerações iniciais em um julgado, abordando os preceitos fundamentais que regem a nossa Carta Política vigente, dentre eles o da dignidade da pessoa humana, in verbis:
A nossa Constituição arrola, dentre os fundamentos da República, a dignidade da pessoa humana e o pluralismo político, na acepção ampla da palavra, destacando, em meio aos objetivos que o Estado brasileiro deve perseguir, a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, assim como a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade ou quaisquer outras formas de discriminação. (grifo nosso)[11]
Segundo Flávia Piovesan[12], “o valor da dignidade humana impõe-se como núcleo básico e informador do ordenamento jurídico brasileiro, como critério e parâmetro de valoração a orientar a interpretação e compreensão do sistema constitucional instaurado em 1988”.
Assim, importa dizer que o princípio da dignidade da pessoa humana está inserido dentro de um Estado Democrático de Direito, sendo o elemento fundamental do nosso sistema constitucional e organizacional, que tem como objetivo garantir o exercício dos direitos sociais e individuais, como a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade, a justiça como valores fundamentais de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida na ordem interna e internacional, com solução pacífica das controvérsias, conforme o preâmbulo da Constituição da República Federativa do Brasil que explica perfeitamente os anseios da sociedade e também a busca da segurança jurídica (MORAES, 2003, p. 50).
Cumpre obtemperar, todavia que o princípio da dignidade da pessoa humana é o ponto de partida para censurar violações que afrontam a dignidade e a vida do ser humano, devendo ser universal e valer-se de fundamento para quaisquer relações humanas, inclusive aos povos indígenas.
Neste entendimento, Rui Barbosa:
A regra da igualdade não consiste senão em quinho ar desigualmente aos desiguais, na medida em que se desigualam. Nesta desigualdade social, proporcionada à desigualdade natural, é que se acha a verdadeira lei da igualdade. O mais são desvarios da inveja, do orgulho, ou da loucura. Tratar com desigualdade a iguais, ou a desiguais com igualdade, seria desigualdade flagrante, e não igualdade real. Os apetites humanos conceberam inverter a norma universal da criação, pretendendo, não dar a cada um, na razão do que vale, mas atribuir o mesmo a todos, como se todos se equivalessem (apud KURY, 1999, p.26).
No entanto, oportuno lembrar, que durante todo período histórico, desde o descobrimento do Brasil, os índios brasileiros foram vítimas de intensas violações em seus direitos fundamentais, barbaridades cometidas pelos colonizadores, seja pela invasão de seus territórios, quanto ao genocídio, tortura, escravidão, estupro etc. Apesar do período de colonização ter passado, há de ser ressaltado que não é diferente nos dias de hoje, porém não com a frequência da época, eis que normas protetivas e defensivas surgiram. Mas, insta destacar que a discriminação e a desigualdade aturada pelos índios sobrevêm pelo motivo destes serem diferentes, e não serem reconhecidos por grande parcela da sociedade, mesmo sendo um País democrático e pluralista.
Para melhor compreensão sobre o que se trata a dignidade humana voltada aos índios, sábias são as palavras de Tatiana Azambuja Ujacow Martins (2005):
Dignidade humana significa ter saúde, educação, de acordo com o seu processo educacional, não lhe sendo imposto um padrão de educação que oprime o seu modo de ser, pois nega sua educação tradicional, reprime a cosmovisão que é ínsita em sua existência. É ter o seu espaço de terra, não com objetivos comerciais, mas como local onde ele reproduz sua espiritualidade e de onde pode tirar alimento para matar a fome de seu filho. É poder participar da sociedade envolvente em igualdade de condições e oportunidades, se assim o desejar, sem discriminação, sem restrições, em que a palavra integração não se traduza por abandono de sua cultura, mas que se consubstancie em troca de experiências. É poder viver de acordo com o que eles acreditam, é ter qualidade de vida, dentro dos parâmetros que eles elegeram. É tanto poder permanecer dentro de sua forma tradicional de viver, no cultivo da terra, como poder estudar, trabalhar, exercer uma profissão, sem perder sua identidade. É poder ser índio, e, principalmente, poder permanecer vivo (p. 223).
Neste sentido deve-se dizer que o princípio da dignidade da pessoa humana é o mais fundamental dentre todos os princípios jurídicos, deve ser o objetivo suprassumo do Estado, pois quando “concretiza o direito que assegura a proteção à pessoa, tendo o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana como farol norteador de suas diretrizes, está certamente trilhando o caminho que leva à realização da verdadeira justiça” (MARTINS,2005, p. 95).
2.2.4 Do Estatuto do Índio e a FUNAI
No Brasil, no ano de 1907, ocorria a exterminação em massa de índios; neste mesmo ano, o diretor do Museu Paulista, Herman Von Ihering, publicou um artigo apoiando o extermínio destes, gerando uma enorme revolta social. Além disso, tais notícias sobre o massacre de índios no Brasil gerou repercussão e aversão internacional, levando o Governo Federal a instituir o primeiro órgão governamental para gerir as relações com os povos indígenas. Refere-se ao Serviço de Proteção aos Índios e Localização de Trabalhadores Nacionais (SPILTN), criado em 1910 e vinculado ao Ministério da Agricultura e Comércio, com o objetivo de transformar o índio em trabalhador nacional, além da catequese e civilização dos mesmos (MARTINS, 2005, p. 77).
A organização do SPI era de responsabilidade do tenente-coronel Cândido Mariano da Silva Rondon, e “costuma-se afirmar que a pacificação foi conseguida por ele, exatamente por não usar nenhum subterfúgio nem manobra duvidosa, porque entendeu perfeitamente que a violência indígena era defensiva e de revanche, pela invasão colonial (SOUZA, 2013, p.73)”.
Rondon não concordava que a SPILTN tinha que ser subordinado ao Ministério da Agricultura e Comércio, pois dizia que “o SPI, não é um problema agropecuário, de colonização, como a muita gente perecerá. É sim um problema de caráter político e social, de alta relevância, nacional, como reparação histórica à injustiça da política medieval”.[13]
Como diretor do SPI, Cândido Rondon, visava garantir aos povos indígenas a posse das terras que estes ocupavam, concebendo o amplo desenvolvimento natural do silvícola, ou seja, assegurando a vitaliciedade dos povos indígenas. Dessarte, estabeleceu propostas na SPI que destinavam, sobretudo, à assistência, defesa e proteção dos índios, por meio dos seguintes princípios humanísticos:
a) Garantir a posse dos territórios indígenas;
b) Proteger o índio em seu próprio território, não havendo intervenção de terceiros em sua organização da vida tribal, e seu deslocamento;
c) Garantir a autonomia indígena, preservando sua cultura original;
d) Proibir o desmembramento da família indígena, sob qualquer situação;
e) Assegurar seus direitos de cidadão, respeitando sua condição de índio;
f) Punir os crimes contra índios.[14]
Muitos consideravam esses fundamentos um absurdo, uma afronta a sociedade. Entretanto, por óbvio, foi um grande avanço para a época tais diretrizes, pois “de todo esse trabalho, resultava-se que o índio tornasse um melhor índio e não um mísero ente sem classificação social (RIBEIRO, 1996, p. 161)”.
O cenário mudou a partir do ano de 1964, onde no Brasil se instalou o regime militar, onde foram registrados diversos atos de tortura e massacre a índios, e houve grande repercussão internacional e nacional a respeito de tais atos. Logo, a fim de corrigir seus erros e redimir a história brasileira, foi criada por meio da Lei nº 5.371, de 05 de dezembro de 1967, a Fundação Nacional do Índio – FUNAI (MARTINS, 2005, p.82).
A FUNAI está vinculada ao Ministério da Justiça, sendo a coordenadora e executora das políticas indigenistas do Governo Federal, tendo por finalidade a proteção e promoção dos direitos indígenas do País. Sua atuação visa o reconhecimento da organização social, costumes, línguas, crenças e tradições dos povos indígenas, buscando a plena autonomia e autodeterminação desses povos no Estado Democrático de Direito.[15] Necessário ressaltar, que Ministério Público faz esse papel da FUNAÍ em zelar pelos direitos dos povos indígenas, e que por força do artigo 232, da Carta Magna, os indígenas podem pleitear direitos até mesmo contra a FUNAÍ.
Preconiza o artigo 232 da Constituição Federativa do Brasil de 1988 dizendo que: “Os índios, suas comunidades e organizações são partes legítimas para ingressar em juízo em defesa de seus direitos e interesses, intervindo o Ministério Público em todos os atos do processo”.
Ainda preocupado com a imagem no exterior, devidos às denuncias de violação de direito humanos, o governo elaborou, aprovou e divulgou a Lei nº 6.001, de 19 de dezembro de 1973, denominada “Estatuto do Índio”.[16]
De acordo com Sílvio Coelho dos Santos (1985, p. 19):
O fator decisivo para a elaboração, a aprovação e a divulgação da Lei nº 6.001 era a preocupação do governo com a sua imagem no exterior, então grandemente afetada por denúncias de violação de direitos humanos. Em função da divulgação pela imprensa nacional de massacre de índios, o governo enfrentava desde 1967 uma campanha sistemática no exterior de acusações de omissão ou mesmo comprometimento em práticas etnocidas.
O Estatuto do Índio trouxe o conceito de “índio” e “comunidade indígena”, que assim dispõe:
Art. 3º. Para os efeitos de lei, ficam estabelecidas as definições a seguir discriminadas:
I - Índio ou Silvícola - É todo indivíduo de origem e ascendência pré-colombiana que se identifica e é identificado como pertencente a um grupo étnico cujas características culturais o distinguem da sociedade nacional;
II - Comunidade Indígena ou Grupo Tribal - É um conjunto de famílias ou comunidades índias, quer vivendo em estado de completo isolamento em relação aos outros setores da comunhão nacional, quer em contatos intermitentes ou permanentes, sem, contudo estarem neles integrados.
Verifica-se, pois, que a definição que o Estatuto traz, é feita sob três critérios: “genealógico, referindo-se a origem e ascendência pré-colombiana; cultural, ao mencionar as características que distinguem da sociedade nacional; e, por último, pertença étnica, que identifica como pertencente a um grupo étnico”.[17] A respeito dos estágios de integração, o art. 4º, I, II e III, classifica-os em isolados, em vias de integração ou integrados.
Helder Girão Barreto (2014, p. 34) relata que “nesta perspectiva, portanto, o índio é visto como um “ser inferior” que deve ser e precisa ser “integrado à comunhão nacional”. Completada a integração, não será mais considerado índio e, portanto, não merecerá mais qualquer forma de tutela especial”.
2.2.5 Críticas ao Estatuto do Índio
O texto legal do Estatuto do índio, apesar de garantir e proteger os direitos dos povos indígenas, acarretou diversas críticas. Primeiramente, percebe-se que “o Estatuto veio regulamentar a legislação brasileira sobre índios; porém, estes não participaram da elaboração desse Estatuto. É uma legislação do não-índio para o índio” (MARTINS, 2005, p. 84).
Ora, face às considerações aduzidas, importa assim dizer que o Estatuto distingue o índio em três categorias: “isolados”, “em vias de inteiração” e “inteirados”; e, mister se faz ressaltar que o Estatuto protege apenas o indígena “não inteirado”, fato este que ocasiona inúmeras críticas. Nesse diapasão, tecendo comentários acerca do assunto, Helder Girão Barreto (2014) menciona:
Nesta perspectiva, portanto, o índio é visto como um “ser inferior” que deve ser e precisa ser “integrado a comunhão nacional”. Completada a integração, não será mais considerado “inferior”, mas também não será mais considerado índio e, portanto, não merecerá mais qualquer forma de tutela especial. (p. 34).
A antropóloga Manuela Carneiro da Cunha também expressa suas críticas quanto às definições contidas no Estatuto do Índio:
A lei confunde índio e silvícola, como se todo índio fosse habitante da selva, desconsiderando a possibilidade, se não o fato, de que existem índios sobrevivendo nas periferias das pequenas e grandes cidades. Aliás, nosso imaginário – e, por que não dizer, nosso entendimento – está repleto dessa correlação: índio é aquele ser que vive na selva, anda nu, é feroz, primitivo... ou, ao contrário, está em um museu vivo, é o “bom selvagem”...[18]
Logo, imaginar o índio com um ser “funcionalmente inadaptado”, estando em evolução e que deve ser conservado “ao lado de museus e dos jardins zoológicos”[19]; ou, como “uma criança sofrendo de uma doença terminal”[20], a qual o Estado deva tutelar, ainda que seja para evitar perdas ou proteger para que tenha uma morte considerada boa, lamentavelmente ainda parece ser a opinião da maioria: alguns por desconhecer a realidade, outros por ilídimo disposição (BARRETO, 2014, p. 38).
A respeito da dificuldade em distinguir a classificação do art. 4º, incisos I, II e III, LOBO (1996, p. 17) descreve:
O próprio caput do art. 4º diz, “os índios são considerados”, o que equivale a dizer que nas circunstâncias dos incisos I, II e III do art. 4º todos são índios indistintamente. As definições de "em vias de integração” e “integrados” são pouco satisfatórias e a desta última dá margem a interpretações prejudiciais. Isso porque, juridicamente, integrado quer dizer tão-somente emancipado que, por sua vez, não implica deixar de ser silvícola e deixar a selva, dispersando-se na massa populacional urbana. O Estatuto não especifica o que sejam “incorporados à comunhão nacional”, suscitando dúvidas se isto equivale a um modo de relacionar-se com a sociedade nacional, que é o nosso ponto de vista, ou a ela pertencer. Neste último caso, não faria sentido a ressalva: “Ainda que conservem usos, costumes e tradições características da sua cultura”, eis que através destes elementos, como já dissemos, o vínculo étnico se estabelece por identificação com uma sociedade indígena.
Ademais, foi nessa indecisão que o Relator Ministro Sebastião Reis Júnior do Superior Tribunal de Justiça encontrou dificuldades ao aplicar tal legislação em um Recurso Especial (Nº 1.334.726 – RS):
Cumpre ressaltar que, no tocante ao crime previsto no artigo 58, III, do Estatuto do índio ('propiciar, por qualquer meio, a aquisição, o uso e a disseminação de bebidas alcoólicas, nos grupos tribais ou entre índios não integrados'), conforme o próprio tipo esclarece, se aplica, tão somente, ao indígena 'não integrado'. Assim, para que a análise da competência se desse sob a ótica da referida espécie delitiva, mister que, para além de meras conjecturas, se houvesse juntado elementos a demonstrar os aspectos culturais e concernentes à aludida integração dos índios vítimas do crime. Na hipótese dos autos, contudo, a tese invocada vem desprovida de qualquer demonstração, ainda que indiciária, pelo recorrente, restando obstaculizado o debate no ponto. [21]
Sendo assim, “o Estatuto não especifica o que sejam “incorporados à comunhão nacional”, suscitando dúvidas se isto equivale a um modo de relacionar-se com a sociedade nacional, que é o nosso ponto de vista, ou a ela pertencer” (LOBO, 1996, p. 17). Nessa óptica, não há lógica no texto do art. 4º, inciso III, do Estatuto do índio, ao dizer: “Ainda que conservem usos, costumes e tradições características da sua cultura”, visto que por meio desses elementos é que identifica os pertencentes de uma sociedade indígena.
Nos dias de hoje, inúmeras são as críticas, inclusive de líderes indigenistas, á respeito do Estatuto do índio, e um dos principais motivos é pelo fato da lei estar em vigor desde 1973, não sendo condizente com a Constituição Federal de 1988 (promulgada posteriormente ao Estatuto do índio). Oportuno se toma dizer que desde a década de 1990 tramita um novo projeto do Estatuto dos Povos indígenas e até o presente momento não foi aprovada, por óbvio, também não foi publicada e promulgada.
2.2.6 Convenção 169 da OIT
A Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre Povos Indígenas e Tribais em Estados Independentes foi adotada em Genebra, em 27 de junho de 1989. O Brasil, por meio do Decreto Legislativo no 143, de 20 de junho de 2002, aprovou o texto da convenção nº 169, entrando em vigor no dia 19 de abril de 2004, sendo considerado um fato histórico para o País, ao reconhecer direitos dos povos indígenas via legislação internacional.[22]
É uma norma internacional que foi concebida logo após a promulgação da Constituição Federal de 1988, logo, suas disposições estão em sintonias com a Lei Maior. Por se tratar de uma norma internacional, está hierarquicamente abaixo da Constituição e acima das demais eis ordinárias, como por exemplo, o Estatuto do Índio.
Os principais princípios que a Convenção 169 traz, são: á respeito da consulta e participação dos povos interessados; o direito dos povos indígenas de defender suas próprias prioridades de desenvolvimento na medida em que afetem suas vidas, crenças, costumes, valores espirituais, instituições e territórios; aborda ainda a respeito dos direitos territoriais e recursos naturais, fortalecendo a ideia sobre as terras que tradicionalmente ocupam; e também tratamentos aos índios no processo penal.
Dentre os dispositivos da Convenção 169 da OIT, destaca-se o artigo segundo, in verbis:
Artigo 3o
1. Os povos indígenas e tribais deverão gozar plenamente dos direitos humanos e liberdades fundamentais, sem obstáculos nem discriminação. As disposições desta Convenção serão aplicadas sem discriminação aos homens e mulheres desses povos.
2. Não deverá ser empregada nenhuma forma de força ou de coerção que viole os direitos humanos e as liberdades fundamentais dos povos interessados, inclusive os direitos contidos na presente Convenção.
À luz, resta induvidoso que a Convenção 169 da OIT é considerada um instrumento inovador, no âmbito internacional, uma vez que visa proteger os povos que sofriam com violações de direitos humanos, ao qual viviam em situações degradantes de trabalho;garantem assim, direitos aos povos indígenas e tribais. Importa dizer, que uma das coisas mais importantes que a Convenção 169 da OIT traz é o respeito à diversidade, pelas tradições e costumes, desde que não sejam discordantes aos direitos fundamentais definidos pelo sistema jurídico nacional e nem com os direitos humanos reconhecidos internacionalmente (art. 8º). Por esta forma, a Convenção 169 da OIT repudia e proíbe explicitamente a violação dos direitos humanos aos povos indígenas, priorizando assim, a valorização e reconhecimento dos direitos indígenas.
2.2.7 Declaração das Nações Unidas sobre Direitos dos Povos indígenas
Composta por 46 artigos, a Declaração das Nações Unidas sobre Direitos dos Povos indígenas foi adotada em 13 de setembro de 2007, onde durante a sessão da Assembleia Geral da ONU, 143 países votaram a favor do texto, quatro votaram contra (Estados Unidos, Canadá, Nova Zelândia e Austrália) e 11 nações se abstiveram de votar. O Brasil, juntamente com a maioria dos países do mundo, votou favorável á adoção da Declaração.[23]
Cumpre analisar, que a Declaração é um documento que embora registra o comprometimento dos Estados estarem tomando medidas com o propósito de ajudar e garantir que os direitos indígenas sejam respeitados, este é um instrumento relativo, ou seja, não existe obrigatoriedade acerca de sua aplicação. É o que a socióloga Azelene Kaingáng (2008, p. 21) diz:
A declaração é, em primeiro lugar, um instrumento não vinculante aos países, ou seja, ela é uma declaração de princípios, aspirações e de compromissos políticos cujos países signatários devem envidar todos os esforços para sua implementação. A obrigatoriedade é muito relativa quando se trata de instrumento aceito de forma voluntária. Nenhum país é pressionado a aceitar, portanto, conclui-se que haja um compromisso e uma disposição de determinado país em implementar a declaração ainda que não exista obrigatoriedade legal de sua aplicação. Esta é, por exemplo, a situação do Brasil diante da recém adotada declaração das nações unidas sobre os direitos dos povos indígenas.
Durante anos, povos, organizações e lideranças indígenas de diversos lugares do mundo buscaram reconhecer a igualdade dos povos indígenas com as demais pessoas (não-índios), almejando garantir o direito á diferença, mesmo não sendo respeitados, mas que fossem considerados como tais.Dentre os artigos da Declaração é importante ressaltar:
Artigo 1
Os indígenas têm direito, como povos ou como pessoas, ao desfrute pleno de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais reconhecidos pela Carta das Nações Unidas, pela Declaração Universal de Direitos Humanos e o direito internacional relativo aos direitos humanos.
Artigo 2
Os povos e as pessoas indígenas são livres e iguais a todos os demais povos e pessoas e têm o direito a não ser objeto de nenhuma discriminação no exercício de seus direitos fundado, em particular, em sua origem ou identidade indígena.
Por conseguinte, o texto da Declaração traz aos índios o direito a dignidade e a diversidade de suas culturas, realidades e necessidades indígenas, e como se pode notar, não se traz novos direitos, apenas reforça os direitos fundamentais universais. De modo geral, a Declaração das Nações Unidas sobre os direitos dos Povos Indígenas reconhece a autodeterminação (art. 3º e 4º) e garante aos mesmos o direito de promoverem, desenvolverem e manterem seus costumes, tradições, espiritualidade, procedimentos, práticas ou sistemas de leis, desde que respeitem as normas internacionais de direitos humanos (art. 34).
Declara ainda, a obrigação Estatal de consultar os povos indígenas, por meio de representantes por eles eleitos, a respeito de aplicação de medidas legislativas que afetem os seus direitos, devendo inclusive, estes participarem de quaisquer tomadas de decisões, além do Estado ter o dever de cooperar de boa-fé com os interessados (art. 18 e 19). Em suma, a Declaração condena a discriminação contra os povos indígenas, garantindo a participação destes em todos os assuntos relacionados a eles, tendo ainda o direito de manterem a sua identidade cultural.
2.3 Do multiculturalismo
A Carta Magna de 1988 ao assegurar e proteger a liberdade e igualdade dos cidadãos brasileiros, sem declarar raça, sexo e religião, dá importância à diversidade étnica e o pluralismo cultural.[24] Assim, o ponto chave do multiculturalismo é a diferença, saber respeitar os indivíduos de uma sociedade e os grupos, comunidades, culturas ou nações que estes pertencem. SANTOS (2009, p.167) abordando o estudo do multiculturalismo, descreve:
[...] ao longo da modernidade, o predomínio de uma igualdade formal, onde se reconheceu muito mais a necessidade de todos participarem igualitariamente da vida política do que propriamente um reconhecimento acerca da necessidade de todos sermos considerados iguais apesar de pertencermos a grupos, comunidades ou outras culturas ou nações diversas.
Roque de Barros Laraia (2002. p. 101) complementa dizendo que:
(...) cada sistema cultural está sempre em mudança. Entender esta dinâmica é importante para (...) evitar comportamentos preconceituosos. (...) é fundamental para a humanidade a compreensão das diferenças entre os povos de culturas diferentes, é necessário saber entender as diferenças que ocorrem dentro do mesmo sistema. Este é o único procedimento que prepara o homem para enfrentar serenamente este constante e admirável mundo novo do porvir.
SANTOS (2003, p.28)declara que o termo multiculturalismo se designa a descrever as diferenças culturais existentes, uma vez que traz a ideia de pluralidade.Por sua vez, indica a existência de várias culturas no mundo, a probabilidade de coexistência de culturas distintas em um único Estado-nação, e a possibilidade de culturas se interinfluenciarem tanto dentro quanto fora do Estado-nação, não obstante isso, quando é entendido com um projeto político, tenciona o reconhecimento das diversas culturas existentes, possibilitando a inter-relação das multiculturas.
Ao analisar o multiculturalismo dentro de uma política de reconhecimento, Charles Taylor (1993, p.44) apresenta dois entendimentos: o primeiro, retrata sobre a desvalorização da minoria, que é desprezada pela maioria que divide o mesmo espaço geográfico, e o segundo, concentra-se na ideia de que a democracia moderna não exige aos indivíduos e aos povos o abandono de suas identidades.
O que seria esse projeto político em que o multiculturalismo deve ser entendido? Santos menciona em sua obra que o projeto político busca a “defesa da diferença cultural, da identidade coletiva, da autonomia e da autodeterminação” (SANTOS, 2003, p.43). Por conseguinte, para que esse projeto tenha eficácia, é necessário assumir a luta pela igualdade de direitos e acessos a recursos primordiais ao exercício da cidadania e a busca pela justiça.
Ela (a defesa do multiculturalismo) pode tomar a forma de defesa e promoção de quadros normativos alternativos, locais ou tradicionais, de formas locais e comunais de resolução de conflitos ou de exigência de integração plena, como cidadãos, no espaço do Estado-nação e de acesso, sem discriminação, à justiça oficial, estatal. Ganha sentido mais preciso, assim, a ideia de “cidadania multicultural” como espaço privilegiado de luta pela articulação e potencialização mútuas do reconhecimento e da redistribuição (SANTOS, 2003, p. 43).
Ora, são rotineiras e constantes as desigualdades e diferenças que se fazem presentes em uma sociedade, onde os indivíduos ou grupos pertencentes têm muita condescendência, ou até mesmo conivência, porque sempre aceitaram tudo com absoluta passividade, resistindo, não indo á luta para que houvesse mudança no contexto social. O Brasil é um País livre, em que se assegura o pluralismo, Marcus Vinicius Reis afirma que o multiculturalismo é pluralista, pois aceita vários pensamentos sobre um mesmo assunto, ou seja, há diálogo entre as culturas, se dividindo em relativista e universalista, conforme narra:
O multiculturalismo é pluralista, como já se pode observar, pois aceita diversos pensamentos sobre um mesmo tema, abolindo o pensamento único. Há o diálogo entre culturas diversas para a convivência pacífica e com resultados positivos a ambas. O problema reside no fato de que o multiculturalismo pode ser abordado de forma relativista e de forma universalista (2004, p. 10).
Neste ínterim, o multiculturalismo deve ser entendido como a busca pela promoção da igualdade de direitos e do acesso aos recursos existentes para vindicar a opressão que sofrem minorias, como os negros e os povos indígenas. Para isto, deve haver diálogo entre as diversificadas culturas, para que ambas consiga viver pacificamente em um mesmo território, apresentando resultados positivos, pois“o estabelecimento de um modo de vida justo para sociedades culturalmente diferentes deve, antes de tudo, preservar a diferença”.[25] E mais: “as sociedades culturalmente diferentes devem compreender que todo o progresso social só é possível por uma associação entre culturas”.[26]
2.4 Do relativismo cultural e universalismo
O relativismo cultural é uma teoria que consiste na ideia de que é necessário entender a diversidade cultural e respeitá-la, considerando que todo sistema cultural tem uma coerência interna própria. Registre-se que essa concepção é vista como um instrumento metodológico essencial para que o pesquisador realize, em culturas distintas da sua, um trabalho antropológico sério, compreendendo que os traços culturais têm um significado e compõem o sistema cultural daquela sociedade ou grupo social (PINEZI, 2010, p. 03).
Entende-se, que a teoria do relativismo cultural visa concentrar seus estudos sobre cultura, podendo ser tudo relativo, pois cada grupo, sociedade ou nação possui sua própria cultura, cada qual na sua maneira de adaptação com os membros às quais pertencem, possuem ainda suas normas, valores e sua atividade social. Conquanto, a teoria supramencionada não aceita a existência de normas universais, muito menos que outra cultura modifique as demais culturas, metamorfoseando-as, pois, a cultura de uma sociedade deve ser enxergada como algo imutável.
Ocorre “a abordagem relativista quando não se estabelecem critérios mínimos para o diálogo entre culturas, isto é, tudo é aceito e tudo é correto. O julgamento interno é mais importante do que o julgamento externo (da sociedade internacional) (REIS, 2004, p.10)”.
Mas, impede, além disso, frisar que dentro de uma própria cultura, pode haver opiniões diversas acerca da tradição adotada e a prática cultural, sendo passível de “crítica interna”, ou seja, quando um grupo é oprimido e excluído pela prática cultural (BARRETO, 1998, p. 379). A guisa de exemplo, cita-se o exemplo da índia Muwaji Suruwahá, da etnia Suruwahá, que sua filha nasceu com paralisia cerebral, e que deveria submeter-se ao sacrifício, pelo fato de não ter nascida saudável, sendo esta uma prática cultural de seu povo, porém, não permitiu o sacrifício de sua filha. Em razão disso, abandonou a aldeia com seus filhos e uma sobrinha, que por ser órfã, seria vitimada pelo infanticídio (MUNDIM, 2009).
Como já mencionado, o multiculturalismo também pode ser universalista, em que o sujeito é livre para exercer sua autonomia dentro de uma sociedade, respeitando os direitos humanos. Para esta categoria, assegura-se a identidade cultural do ser humano, em que a tradição e o direito a ser diferente, devem ter um limite, limite este, que são os direitos humanos.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, designa direitos que são fundamentais, sendo o direito à vida um deles. Desta feita, surge o processo de universalização dos direitos humanos, a fim de garantir e proteger a dignidade da pessoa humana, por meio da elaboração de tratados, convenções e órgãos para fiscalizar o cumprimento desses direitos (SANTOS, 2011, p. 08).
Assim, importa dizer que “o universalismo implica que há um conjunto de valores que o indivíduo acredita serem universais, ou seja: valores independentes das culturas que constituem o tecido social, portanto universais, compartilhados por toda a humanidade” (CANEN, 2007, p. 97). Dentre os conjuntos de valores considerados universais, há o direito á diversidade cultural, onde Paulo Bonavides (1999, p. 488) cita:
O direito à diversidade cultural é uma garantia concedida a determinados grupos culturalmente diferenciados de que suas tradições, crenças, e costumes possam ser preservados e protegidos frente a movimentos de interculturalidade, ou seja, ninguém pode ser obrigado a abster-se de possuir suas próprias tradições, crenças e costumes, ou mesmo de ser obrigado a aderir às tradições, crenças e costumes de outros grupos.
Neste sentido, cumpre observar que o multiculturalismo é um grande desafio, eis que envolve a relação com o outro, em que se questiona a identidade do outro e a sua própria identidade. Sob a ótica sociológica e antropológica, deve-se haver diálogo intercultural para solução dos problemas sociais, onde as partes possam respeitar o ser humano dentro de uma concepção universal. Até porque, “nenhuma cultura, tradição, ideologia ou religião pode, hoje em dia, falar pelo conjunto da humanidade, muito menos resolver seus problemas. São necessários o diálogo e a interação com vistas à fecundação mútua (PANIKKAR, 2004, p. 206-207)”.
3 Do Artigo 58, inciso III, da Lei nº 6001/1973
A Lei nº 6.001 de 1973, denominada Estatuto do índio, que pode ser considerada um marco regulatório para a questão do uso do álcool por indígenas, instituiu em seu artigo 58, inciso III, crime contra os Índios e a cultura indígena, que assim impõe:
Art. 58. Constituem crimes contra os índios e a cultura indígena:
[...]
III - propiciar, por qualquer meio, a aquisição, o uso e a disseminação de bebidas alcoólicas, nos grupos tribais ou entre índios não integrados. Pena - detenção de seis meses a dois anos.
Parágrafo único. As penas estatuídas neste artigo são agravadas de um terço, quando o crime for praticado por funcionário ou empregado do órgão de assistência ao índio.
Em conformidade com o dispositivo, forçoso é perceber que este visa coibir e penalizar aqueles que fornecem bebidas alcoólicas para uso, consumo e disseminação aos povos indígenas não inteirados. Logo, aos indígenas que estão inteirados na sociedade nacional, podem livremente fazerem usos de bebidas destiladas.
Por conseguinte, o dispositivo trouxe grande discussão, pois há aqueles que defendam a aplicabilidade da norma, outros são contrários, por acreditarem estar violando Princípios da Constituição Federal e tratados internacionais.
3.1 Entendimento favorável
Muitos são favoráveis a respeito da norma repressiva imposta pelo artigo 58, inciso III, do Estatuto do Índio, por considerarem as bebidas alcoólicas a principal causa de extermínio dos povos indígenas. Um dos principais motivos para a criação da norma que proíbe a aquisição, uso e disseminação de bebidas alcoólicas aos povos indígenas é o fato de garimpeiros se utilizarem do álcool como meio para usurpar os índios e adentrar em suas terras. Neste sentido, nota-se que o consumo excessivo do álcool por alguns povos indígenas está relacionado devido a inteiração com a sociedade envolvente.
A respeito do consumo de bebidas destiladas aos povos indígenas, “reconhece que seu consumo, direta ou indiretamente, relaciona-se a um conjunto de agravos que constituem as principais causas de morbimortalidade tanto para a população em geral, como para os grupos étnicos em particular (SOUZA, 2013. p. 13)”.
Essa realidade também acontece nos Estados Unidos, onde quatro de dez mortes dos povos indígenas estão relacionadas ao consumo do álcool, sendo as principais causas: acidentes, homicídio, suicídio e cirrose hepática. Assim, 38% das mortes dos povos indígenas americanos são provocadas pelo abuso de álcool (SOUZA, 2013, p. 13).
Ora, face às considerações aduzidas, nota-se que “os efeitos negativos são prioritariamente em relação às bebidas compradas nas cidades (cachaça, conhaque, vinho, cerveja, uísque) (SOUZA, 2013, p. 118).” Por consequência, muitos grupos indígenas já se dissiparam devido ao consumo exorbitante de bebidas destiladas, trazendo efeitos negativos para as aldeias.
Os índios estão bebendo outras substancias e o fazem, frequentemente, em novos contextos sociais. Estas mudanças trazem consequências altamente negativas para as comunidades, na forma de violência geral e familiar, desnutrição danos à saúde das crianças – em casos de síndrome alcoólica fetal, atropelamentos nas estradas etc (SOUZA, 2013, p. 34).
Como observa-se na referida citação, outro problema referente ao consumo excessivo do álcool é devido a preocupação de ser um hábito ancestral a ingestão de bebidas destiladas, as mulheres grávidas correm riscos em seu período gestacional, pois “a ingestão de álcool por mulheres em idade fértil tem elevado consideravelmente o risco de crianças nascerem com a Síndrome Alcoólica Fetal – SAF”.[27]
Assim, devido as consequências trazidas aos povos indígenas pelo consumo excessivo de bebidas destiladas, tais como: homicídios, doenças como cirrose ou intoxicação, violência geral e familiar, acidentes, e outros, o entendimento concordacionista acredita que deve haver essa medida repressiva do poder Estatal para punir aqueles que propicia o álcool, substância responsável pela destruição de povos e comunidades indígenas.
3.2 Entendimento contrário
Com a extinção de vários grupos indígenas, a lei fora criada, pois os legisladores acreditam que com o contato do álcool, a bebida destilada provoca nas aldeias o aumento da violência, uma vez que o consumo excessivo do álcool pode acarretar brigas internas, acidentes, problemas psicológicos e até morte.
Os argumentos trazidos à baila pelos legisladores não são totalmente aceitos por parte da doutrina, uma vez que acreditam que as bebidas destiladas não é a causa principal do extermínio nas aldeias indígenas. Neste raciocínio, Maximiliano Loiola Ponte de Souza, em seu livro diz que:
Os homicídios, as agressões intrafamiliares e os acidentes não são consequências necessárias do consumo do álcool, mas sim comportamentos possíveis, considerados mais ou menos estimulados e/ou aceitos por diferentes sociedades, realizados por sujeitos específicos (SOUZA, 2013, p.12).
FERNANDES (2002,p. 56), complementa:
O alcoolismo indígena, tal como ocorre entre outras etnias, é uma decorrência do contexto social em que as bebidas são consumidas; desta forma vemos que as sociedades nativas impunham limites claros ao consumo de bebidas alcoólicas, limites que configuravam um controle social da embriaguez, controle este quase que completamente perdido com o processo da conquista. Mais do que a mudança do tipo de bebida, é no contexto social e em suas transformações que deveremos buscar as respostas para as questões que são colocadas pela documentação histórica.
Seguindo o cerne da questão, há de se perceber perfeitamente pelo entendimento dos que são contrários à lei, que não é lógico proibir a aquisição, uso e disseminação de bebidas alcoólicas nas aldeias indígenas, em face à pranteada inconstitucionalidade de tirar a autonomia de uma determinada etnia. Segundo Mariano (1999, pp. 22-23), “o problema que se identifica no uso das bebidas alcoólicas está associado ao abuso no consumo, seja crônico, seja agudo, produzindo, por sua vez, danos nas diversas áreas, tanto individual quanto socialmente” e não na proibição das bebidas.
É de ser relevado que lideranças indígenas não apóiam o dispositivo legal, conforme SOUZA (2013, p. 183) narra:
É importante ressaltar que esse dispositivo legal não goza de popularidade mesmo entre lideranças indígenas, principalmente porque costuma ser associado ao regime tutelar, historicamente adotado pelo Estado brasileiro, considerado anacrônico por atribuir ao índio a condição de juridicamente incapaz.
Além de tudo isso, o artigo 58, inciso III, do Estatuto do Índio trouxe um enorme problema social, pois “por ser uma lei de caráter repressivo, favorece o desenvolvimento de um rendoso mercado negro de venda de bebidas alcoólicas, considerando preços exorbitantes observados em determinadas regiões indígenas” (SOUZA, 2013, p. 183). Logo, “além de não diminuir o uso indiscriminado de bebidas alcoólicas tem estimulado sobremaneira, o comércio clandestino da bebida, vendida disfarçada em garrafas de refrigerantes (BURATTO, 2013, p. 706)”.
Não se pode perder de vista, que o Estatuto do Índio fora promulgado em 1973, anos antes da Constituição Federal de 1988, e devido á isso, os defensores da corrente contrária acredita que este dispositivo, assim como todo o Estatuto do Índio deve ser modificado, pois viola Princípios da Igualdade e da Dignidade da Pessoa Humana, contrariando e violando a Lei Maior, pois defendem o direito de autodeterminação, ou seja, sendo os povos ou comunidades indígenas em um Estado Democrático de Direito livres para decidirem o que é melhor para eles. Assim, entende-se que o artigo 58, III, da Lei 6.0001 de 1973 deve ser extinto, buscando outras formas de intimidar o consumo do álcool, tais como a utilização das medidas de políticas públicas.
4 Medidas acautelares
4.1 Prevenção
Com o processo de inteiração dos povos indígenas à sociedade nacional, os povos indígenas enxergam as bebidas destiladas como um atraimento, visto que quando não eram inteirados,em sua maioria possuíam suas próprias bebidas e as consumiam como parte de rituais. Devido a isso, o alcoolismo começou a fazer parte da vida dos povos indígenas, assim, deve se buscar meios para combater este male.
Nesse sentido, importante ressaltar que ações preventivas quanto ao uso do álcool seriam efetivas quando fossem capazes de diminuir os danos relacionados ao seu consumo, limitando o acesso da população a esta substância.[28]
Um aspecto a ser destacado é que na prevenção de agravos à saúde relacionados ao uso do álcool tem-se como intento principal evitar a intoxicação alcoólica aguda, e não a dependência ao álcool, pois o risco de problemas decorrentes de um único episódio de intoxicação é mais alto entre aqueles que o fazem infrequentemente do que aqueles que bebem com mais frequência (SOUZA, 2013, p. 183).
Desta forma, busca-se com a prevenção, diminuir as possibilidades de as pessoas utilizarem o álcool, evitando assim, possível intoxicação.“O aumento do preço das bebidas alcoólicas seria eficaz ao diminuir as chances de consumo, sobretudo entre aqueles com menos poder aquisitivo, como os mais jovens e os com graves problemas de dependência” segundo Maximiliano Loiola Ponte de Souza (2013, p. 182).
O autor narra em sua obra meios preventivos que acredita serem eficazes para diminuição do consumo:
Delimitação da localização dos pontos de venda (proibição do comércio de bebidas alcoólicas em locais próximos a escolas ou em eventos com grande aglomeração de pessoas); diminuição da densidade dos pontos de venda (o que, pela lei da oferta e procura, tenderia fazer com que os preços aumentassem); estabelecimento de idade mínima para a compra de bebidas; restrição dos dias e horários de venda (não comercializando álcool após determinada hora, como adotado em algumas cidades);instituição de serviços responsáveis de vendas de bebidas (treinamento para não servir pessoas alcoolizadas, com responsabilização legal para quem o fizesse) (SOUZA, 2013, p. 182).
Certamente as medidas de fiscalização e punição trazidas à baila atingiriam a sociedade como um todo, o que geraria grande repercussão e revolta por parte daqueles que consomem bebidas alcoólicas. Inobstante isso, nota-se que há a necessidade de identificar os fatores que colaboram para o consumo excessivo do álcool e procurar meios de prevenção.
“A prevenção do abuso de álcool é uma questão de educação e saúde comunitária e deve, portanto, se basear nas necessidades de cada comunidade e te sua participação em todas as fases de implementação de programas (SOUZA, 2013, p. 40). ” Portanto, as possíveis soluções para a prevenção do problema devem ser a busca pelo bem-estar social sustentável, com a consolidação de uma identidade positiva, e não somente ligadas à questão da síndrome de dependência nos indivíduos. Assim, se a problemática do abuso do álcool é o motivo de vários fatores indiretos, os meios para solucionar e buscara sua prevenção devem envolver estes fatores, podendo atingir resultados diretos, ou seja, auxiliando na diminuição do consumo de bebidas alcoólicas (SOUZA, 2013, p. 41).
Claro está, portanto, que o consumo excessivo de álcool traz danos irreparáveis aos povos indígenas e que devido a isso, para converter tal situação, é necessário construir programas de prevenção juntamente com os povos indígenas, como menciona SOUZA (2013, p. 35):
É necessário construir programas de prevenção em parceria com os índios, buscando identificar com eles os fatores coletivos e específicos ao grupo que contribuem para o consumo excessivo de álcool. É necessário indagar sobre os fatores múltiplos que convergem para determinar o fenômeno coletivo de alcoolização entre os povos indígenas do Brasil.
Neste ínterim, deve-se obter estratégicas de prevenção, colocando-as em prática, por meio de políticas públicas (campanhas educativas, normas, conscientização etc.). A intenção das medidas preventivas é o reconhecimento dos males que o consumo abusivo do álcool traz para o indivíduo, visando solucionar ou diminuir a problematização do alcoolismo.
Considerações finais não conclusivas
Versa a pesquisa sobre um assunto pouco abordado, eis que a discussão sobre o consumo de bebidas alcoólicas aos povos indígenas gera abordagens de diversas áreas, seja antropologia, constitucional, penal, direitos humanos, etc., e que quando conglomeram, causam polêmica.
Apesar da FUNAÍ estar à frente dos povos indígenas isolados, garantindo e viabilizando direitos, quando se diz respeito à liberação das bebidas alcoólicas aos índios, deve ser feito um plebiscito popular com esses povos, consultando-os, para assim verificar a opinião da maioria e obter uma resposta concreta, que não seja apenas especulações, e se, as comunidades indígenas decidirem dar um novo rumo para suas vidas, deve sim, a lei ser alterada ou extinta para garantir aos povos indígenas o direito a igualdade em um Estado Democrático de Direito.
Não se pode esquecer, que o dispositivo estudado é direcionado apenas aos povos indígenas isolados, ou seja, aqueles que não estão inteirados na sociedade nacional. Ocorre que alguns doutrinadores acreditam que o artigo é discriminatório, devendo essa discriminação ser combatida, pois inferioriza os povos indígenas e viola o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana e o Princípio da Igualdade, além de ser uma afronta ao que preconiza nossa Lei Maior.
Defendem o que estabelece o artigo segundo da Declaração das Nações Unidas Sobre o Direito dos Povos Indígenas que diz: “Os povos indígenas são livres e iguais a todas as demais pessoas e têm o direito a não ser objeto de nenhuma discriminação no exercício de seus direitos fundado, em particular, em sua origem ou identidade indígena”.
Os apoiadores do entendimento contrário ao dispositivo entendem que o deslinde da questão não deve ser o álcool em si, pois se for analisar a fundamentação da lei, notará que seu foco está equivocado, uma vez que se o motivo da proibição do álcool é para evitar a extinção de um grupo étnico, já que se acredita ser este o fator de tal extermínio, deveria proibir também índios homossexuais nas aldeias indígenas, já que estes não vão conseguir procriar. Seguem no raciocínio de que assim deverá proibir também o açúcar nas aldeias indígenas, já que diabetes é uma das doenças que mais causam morte aos índios, sendo o açúcar o fator principal.
Desta forma, pelo posicionamento contrário a lei, há muitas indagações, dentre elas o principal questionamento é: Se o direito a igualdade é para todos,é correto ter um dispositivo que garante apenas a vitaliciedade dos povos indígenas?
De fato, como se pode notar no presente estudo, as bebidas alcoólicas causam efeitos drásticos seja aos povos indígenas ou aos não-índios. O que se questiona, todavia, é o direito a igualdade, ou seja, os povos indígenas poderem exercer os seus direitos, inclusive o de autodeterminação.
Embora haja quem seja contrário ao art. 58, inciso III, do Estatuto do índio, há quem se posiciona adepto a tal norma, enfatizando o direito a alteridade e os danos que as bebidas destiladas trazem às comunidades indígenas. O consumo das bebidas alcoólicas dentro das comunidades é feito por adultos, jovens, adolescentes, mulheres e até mesmo crianças, causando um conjunto de danos irreparáveis, tais como: violência, danos à saúde, mortes, riscos de gravidez, dentre outros, sendo este motivo preocupante.
Na defesa do dispositivo, narram que os povos indígenas possuem suas próprias bebidas, e quando fazem o consumo de bebidas destiladas, causam desestruturação na organização de suas comunidades e atitudes inadequadas perante as manifestações culturais. Ao passo que, devido a isso, apóiam a proibição da aquisição, uso e disseminação de bebidas alcoólicas aos povos indígenas, e ainda, a pena instituída pelo artigo.
Verifica-se, pois, que tanto o entendimento favorável a aplicação da lei, quanto o entendimento contrário, possuem suas fundamentações. Em vista disso, seria desarrazoado se posicionar sobre um tema que se desconhece a vontade alheia (povos indígenas). Assim, não há como terminar este estudo com um ponto final, ao invés disso, ouso-me a concluir com reticências há quem irá lê-lo adiante, eis que variam os posicionamentos de cada indivíduo.
Por ser um assunto pouco discutido, houve-se muitas dificuldades para concluir tal pesquisa, logo, a pretensão é aprofundar mais sobre o assunto em uma dissertação de mestrado ou tese de doutorado, com as devidas autorizações dos órgãos competentes, pois o presente estudo é muito relevante para nossa sociedade, e principalmente para as comunidades indígenas.
Cumpre destacar, que a interculturalidade é a principal fundamentação do estudo, eis que apesar dos conflitos de interesses capitalistas existentes que são contrários a sustentabilidade do planeta terra, deve se buscar harmonizar as relações entre as culturas, almejando uma qualidade de vida às futuras gerações. Assim, deve haver comunicação entre as culturas, trocar experiências e conhecimentos, fazer descobertas que sejam importantes para ciência e criar laços de solidariedade entre as etnias.
Neste passo entrego o estudo feito, na certeza de que foi uma realização particular se aprofundar sobre a cultura indígena, uma vez que tive o privilégio de poucas vezes que visitei aldeias indígenas conhecer de perto a realidade e constatar que os índios são seres humanos como quaisquer outros, e que infelizmente não possuem voz em uma sociedade que é considerada intolerante. Quanto a decisão de adquirir, usar ou disseminar bebidas alcoólicas, é uma decisão que cabe aos povos indígenas, devendo ser consultados, e ao que cabe ser feito é a utilização de políticas pública, a fim de informar os danos que o consumo abusivo de bebidas alcoólicas trazem para a humanidade, em especial, aos povos indígenas, a quem ofereço este estudo.
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[1] SOUZA, Maximiliano Loiola Ponte de. Processos de Alcoolização Indígena no Brasil: perspectivas plurais. Rio de Janeiro: Editora FIOCRUZ, 2013, p.31-32.
[2] SOUZA, Maximiliano Loiola Ponte de. Processos de Alcoolização Indígena no Brasil: perspectivas plurais. Rio de Janeiro: Editora FIOCRUZ, 2013, p.32.
[3] Há quem calcula em torno de 4 milhões o número de indígenas.
[4] LOBO, Luiz Felipe Bruno. Direito indigenista brasileiro: subsídios à sua doutrina. São Paulo: LTr, 1996, p. 44.
[5] MARTINS, Tatiana Azambuja Ujacow. Direito ao pão novo: O princípio da Dignidade Humana e a efetivação do direito indígena. São Paulo: Editora Pilares, 2005, p. 68.
[6] MARTINS, J. P. Oliveira. O Brasil e as colônias portuguesas. Lisboa : Livraria BERTRAND, 1880, p. 39.
[7] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Popular n. 3.388. Relator: Ministro Ayres Britto. Roraima, 19 de março de 2009. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/publicacaoPublicacaoTematica/anexo/constituicao.pdf> Acesso em: 20 out. 2017.
[8]Ex positis: Diante do exposto.
[10] MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 28. Ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 35-36.
[11] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Popular n. 3.388. Relator: Ministro Ayres Britto. Roraima, 19 de março de 2009. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/publicacaoPublicacaoTematica/anexo/constituicao.pdf> Acesso em: 20 out. 2017.
[12] PIOVESAN, Flávia. Temas de direitos humanos. São Paulo: Max Limonad, 1988, p. 35.
[13] Atas da 5ª sessão do CNPI, em 19-04-1949, anexo V, Relatório de 1949/50, p. 3-4. In: SANTOS, Sílvio Coelho dos (org.). Sociedades indígenas e o Direito: uma questão de direitos humanos. Florianópolis: UFSC, 1985. p. 24.
[14] MARCONI. Marina de Andrade; PRESSOTO, Zélia Maria Neves. Antropologia: Uma introdução. São Paulo: Atlas, 1986, p. 243.
[15] FUNAI. Disponível em: <http://www.funai.gov.br/index.php/quem-somos>. Acessado em: 11 de outubro de 2017.
[16] SANTOS, Sílvio Coelho dos et. Al. (Orgs.). Sociedades indígenas e o Direito: Uma questão de direitos humanos – Ensaios. Florianópolis, Ed. Da UFSC; CNPq, 1985, p. 19-21.
[17] BARRETO, Heder Girão. Direitos indígenas: vetores constitucionais. 1ª ed. Curitiba: Juruá, 2014, p. 33.
[18] CUNHA, Manuela Carneiro da. (Org). Os Direitos dos Índios: ensaios e documentos. Rio de Janeiro: Brasiliense, 1987. p. 14-15.
[19] RIBEIRO, Darcy. Os índios e a civilização. São Paulo: companhia das letras. 1996, p. 214.
[20]GOMES, Mércio Pereira. Os índios e o Brasil: ensaio sobre um holocausto e sobre uma nova possibilidade de convivência. 2. Ed. Petrópolis: Vozes, 1991, p.133.
[21]BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 1.334.726. Relator: Ministro Sebastião Reis Júnior. Brasília, 13 de dezembro de 2000. Disponível em: <https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/195419635/recurso-especial-resp-1334726-rs-2012-0155147-0?ref=juris-tabs>. Acesso em: 20 de outubro de 2017.
[22]TAURINO, Viviane Aparecida França. O crime de infanticídio nas comunidades indígenas à luz do ordenamento jurídico brasileiro. Cacoal/RO: UNIR, 2015.
[23]O.N.U. Declaração das Nações Unidas sobre os Povos Indígenas: perguntas e respostas. 2. ed. – Rio de Janeiro: UNIC; Brasília: UNESCO, 2009, p. 59.
[24] D'ADESKY, Jacques. Pluralismo étnico e multiculturalismo. Afro-Ásia, 2017, p. 01.
[25] BULOS, Uadi Lammego. Constituição Federal anotada. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 1252.
[26] BARBOSA, Marco Antonio. Direito Antropológico e Terras indígenas no Brasil. São Paulo: Editora Plêiade, 2001, p. 22.
[27] BURATTO, Lúcia Gouvêa; COSTA, Maria da Piedade Resende da. Alcoolismo e deficiência: formação de professores e agentes de saúde indígenas para prevenção da síndrome alcoólica fetal. Londrina, 2013, p. 701.
[28] DUAILIBI, S. G LARANJEIRA. Políticas Públicas relacionadas às bebidas alcoólicas. Revista de Saúde Pública, 2007, p. 839-848.
Coordenador e Docente Superior de curso de graduação em Direito no Centro Universitário FAEMA - UNIFAEMA. Mestre em Direito pelo Programa de Pós-graduação em Direito da Universidade de Marília – UNIMAR (2022). Especialista em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pelo Complexo Educacional Damásio de Jesus (2019) e em Docência do Ensino Superior pela Faculdade de Ciências Biomédicas de Cacoal (2018). Bacharel em Direito pela Faculdades Integradas de Cacoal (2017). Autor de diversos artigos científicos publicados em revistas jurídica de abrangência nacional e internacional. Foi assessor da Corregedoria Geral da Prefeitura Municipal de Cacoal/RO, foi Assessor de Assuntos políticos do Sistema Autônomo de Água e Esgoto – SAAE de Cacoal. Palestrante. Pesquisador. Autor de livro.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PERSCH, Hudson Carlos Avancini. A proibição de aquisição, uso e disseminação de bebidas alcoólicas aos povos indígenas: o artigo 58, inciso III, da Lei n.º 6001/1973 no Estado Democrático de Direito Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 05 jun 2019, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/53003/a-proibicao-de-aquisicao-uso-e-disseminacao-de-bebidas-alcoolicas-aos-povos-indigenas-o-artigo-58-inciso-iii-da-lei-n-o-6001-1973-no-estado-democratico-de-direito. Acesso em: 23 dez 2024.
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