LUCIANA ZANOTELLI
(Orientadora)
RESUMO: Conforme recente decisão do Supremo Tribunal Federal no julgamento do HC 126.292, a Suprema Corte mudou a jurisprudência antes assentada e assim permitido a prisão a partir da decisão de segunda instância. Com isto o que ocorreu veio para revolucionar o sistema jurídico brasileiro, para assim diminuir a impunidade daqueles que usam de preceitos legais através de variados recursos para procrastinar a condenação. A luz dessa conjuntura existe duas correntes, uma a favor e outro contra. O primeiro posicionamento sobre o tema, uma corrente e favorável a condenação, uma vez que, não fere princípio constitucional ao contrário, com a condenação em segunda instância o direito repercute com mais intensidade alcançando assim a justiça com eficácia plena, alcançando assim a celeridade processual e efetividade das leis bem como das penas impostas. Pode-se arrolar tantas outras medidas de cunho preventivo deveria ser inconstitucional como a prisão em flagrante, a prisão preventiva, e temporária, uma vez que o acusado está preso sem um devido julgamento. A segunda corrente entende que a decisão do Supremo Tribunal Federal afronta o princípio da presunção de inocência.
Palavras Chave: Supremo Tribunal Federal. Presunção de Inocência. Segunda Instância.
ABSTRACT: According to the recent decision of the Supreme Court in the judgment of HC 126,292, the Supreme Court changed the jurisprudence before settled and thus allowed the arrest from the second instance decision. With this what occurred came to revolutionize the Brazilian legal system, so as to diminish the impunity of those who use legal precepts through various resources to procrastinate the condemnation. The light of this conjuncture there are two chains, one in favor and one against. The first position on the subject, a current and favorable condemnation, since it does not hurt constitutional principle on the contrary, with the conviction in second instance the right resonates with more intensity thus achieving justice with full efficacy , thus achieving the procedural speed and effectiveness of the laws as well as the imposed penalties. So many other preventive measures should be arable to be unconstitutional, such as prison in the Act, preventive and temporary imprisonment, once the accused is imprisoned without a proper trial. The second current understands that the decision of the Supreme Federal Court affronts the principle of presumption of innocence.
Keywords: Supreme Court. Presumption of Innocence. Second Instance.
1 INTRODUÇÃO
De início, para se tratar do tema proposto, qual seja a possibilidade jurídica da prisão em segunda instância, é necessário ressaltar que, com a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, ocorreu um grande crescimento da proteção normativa aos direitos humanos, onde o direito à liberdade passou a prevalecer sobre os demais, só podendo ser restringida quando fundamentadamente comprovada a necessidade de tal medida.
Nessa toada, entende-se que a prisão deve ser uma medida adotada apenas após se obter a certeza da responsabilidade penal do acusado, devendo prevalecer à liberdade como regra, em razão do princípio da presunção de inocência, evitando-se assim as penas arbitrárias vindas do Estado, bem como da sociedade. Isso porque o princípio da presunção de inocência é uma das mais importantes garantias da Constituição da República. Trata-se, portanto, de uma prerrogativa constitucional conferida ao acusado de não ser considerado culpado até a sentença penal condenatória transitada em julgado, impedindo qualquer prévia e antecipada manifestação judicial de caráter punitivo.
Nesse sentido, frisa-se que Supremo Tribunal Federal, em 05 de fevereiro de 2009, concedeu a liberdade para um acusado de homicídio, por meio do julgamento do Habeas Corpus 84.078/MG. A corte entendeu que o réu, condenado pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais, por tentativa de homicídio qualificado, poderia recorrer dessa sentença, aos tribunais superiores, em liberdade, tendo tal decisão fundamento no já mencionado princípio da presunção de inocência.
Tal entendimento, no entanto, fora mudado recentemente. Isso porque o Supremo Tribunal Federal, em julgamento realizado pelo Plenário, em 17 de fevereiro de 2016, denegou, por maioria, o HC 126.292. Neste julgamento, a maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal inclinou-se para o entendimento de que o início da execução penal, depois da confirmação da sentença no âmbito de segundo grau, não afronta ao princípio da presunção da inocência. Com isso, a aquela Corte entendeu que, com a manutenção da sentença penal, pelo órgão colegiado em segunda instância, encerra a possibilidade de apreciação de fatos e provas que amparam a culpa do réu, sendo assim, não há que se falar em dúvida quanto a autoria e materialidade dos fatos já julgados, uma vez que os recursos cabíveis se prestam a analisar tão somente afronta à Lei Federal ou ao texto constitucional, não sendo, portanto analisado o mérito.
Há porém discussão, quanto à constitucionalidade de tal antecipação, uma vez que a Constituição Federal preceitua que prevalece a presunção de inocência até quando não houver mais possibilidade de recurso. Desse modo, se ainda existe recurso pendente de julgamento, a decisão anterior não transitou em julgado e, desse modo, não há como se punir o réu, em virtude da presunção de inocência.
Como isso, surgem as diversas interpretações de que o Supremo Tribunal Federal, ao negar a ordem no HC 126.292, agiu com derrotabilidade de uma norma jurídica constitucional, demonstrando um aclame pelo ativismo judicial, em razão de omissão ou ineficácia social da lei e das políticas públicas; ou ainda de mudanças de paradigma no direito constitucional, ao passo que existem também interpretações que aclamam a decisão proferida pela Excelsa Corte, uma vez que consideram necessária à garantia da ordem social.
O presente estudo possui, portanto a seguinte temática: a possibilidade jurídica da prisão em segunda instância. Considerando a amplitude do tema, a delimitação incidiu na análise da decisão do Supremo Tribunal Federal no julgamento do HC 126.292, quando a Suprema Corte mudou a jurisprudência antes assentada no país, e, assim permitiu a antecipação do cumprimento de prisão a partir da decisão de segunda instância.
Ante o exposto, o objetivo geral do presente estudo consiste em abordar e analisara aplicação da decisão do Supremo Tribunal Federal no HC 126.292, o qual alterou entendimento anterior trazido no Habeas Corpus 84.078 /MG, que considerava viável a execução da pena de prisão somente após o trânsito em julgado de sentença penal condenatória, e sua relação com o princípio da presunção de inocência. Por seu turno, os objetivos específicos buscam: Destacar os aspectos jurídicos da presunção de inocência; ressaltar sobre as espécies de prisão no ordenamento jurídico pátrio e; explanar sobre as recentes decisões do Supremo Tribunal Federal quanto à aceitabilidade (ou não) da prisão em segunda instância.
O estudo está baseado no método dialético, uma vez que analisa o fenômeno ligado à liberdade e à presunção de inocência, face às mudanças culturais, sociais e jurídicas ocorridas no Brasil, para assim poder verificar a viabilidade ou não, juridicamente falando, da antecipação do cumprimento de pena em segundo grau.
Para o bom desenvolvimento da presente pesquisa o trabalho foi dividido em dois itens, subdivididos em sub-itens, sendo que em primeiro lugar se passa a analisar o processo penal à luz do princípio constitucional da presunção de inocência, em segundo lugar passou-se a tratar da possibilidade jurídica do cumprimento da pena após a decisão condenatória em segunda instância, item este subdivido em 4 sub-itens, que tratam da prisão-pena e presunção da inocência, do direito de se recorrer em liberdade versus excesso de recursos como pressuposto da impunidade, do entendimento do Supremo Tribunal Federal quanto à prisão em segunda instância – evolução jurisprudencial e, por fim sobre a prisão em segunda instância: uma análise crítica à luz da presunção de inocência.
O princípio da presunção de inocência teve sua primeira aparição no final do século XVIII, período pelo qual o mundo passava por uma grande mudança no campo filosófico, religioso e cultural, período este que ficou conhecido como fase iluminista, ocorrida durante a Revolução Liberal.
Seu conceito é bem explicitado por, Dalabrida, o qual expõe:
Estabelece a Constituição da República Federativa do Brasil que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença pena condenatória” (art. 5º, LVII), bem como que “Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte” (art. 5º, § 2º), de modo que seja em decorrência de disposição constitucional expressa ou em virtude da norma de encerramento do elenco de direitos e garantias, certo é afirmar que o Princípio da Presunção de Inocência foi convolado em verdadeiro direito fundamental constitucionalmente garantido (DALABRIDA, 2017, p. 72).
Com a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, ocorreu um grande crescimento da proteção normativa aos direitos humanos, onde o direito à liberdade passou a receber especial tratamento e proteção, só podendo ser restringida quando fundamentadamente comprovada a necessidade de tal medida.
Tal princípio foi fruto de intensa evolução histórica. A primeira aparição da gênese da presunção de inocência se deu por intermédio da Carta Magna inglesa de 1215, que estabelecia que nenhuma pessoa poderia ser presa ou sofrer processo se não for nos termos da legislação inglesa previamente estatuída. (CANOTILHO, 2010).
Nota-se que o princípio da presunção de inocência tem então, sua primeira aparição justamente no primeiro documento ocidental que buscou restringir o poder absoluto dos monarcas, garantindo um mínimo de direitos ao povo.
Após alguns séculos, com fundamento nas ideias do Iluminismo, calcadas na ruptura com governos autoritários e monárquicos, no campo das grandes revoluções (Francesa e das Colônias Inglesas na América do Norte), em especial, no ano de 1789, o referido princípio foi consagrado pela Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão, na França, onde previa em seu art. 9º, que:
Art. 9 - Todo homem é considerado inocente, até ao momento em que, reconhecido como culpado, se julgar indispensável a sua prisão: todo o rigor desnecessário, empregado para efetuar, deve ser severamente reprimido pela lei (Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão,1789).
É importante destacar que a elevação do princípio pela Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão coincide com a evolução do Direito Penal e sua concepção mais humanista, dada a partir das ideias de Beccaria.
O pensador tratava a questão penal de forma diversa da praticada à época, pregando que era necessário respeitar-se a anterioridade da lei, bem como que as penas não deveriam ser infamantes, uma vez que seu objetivo não deveria ser o fazer sofrer o corpo do apenado. (BECCARIA, 2012)
O princípio cuida, como toda a garantia penal, portanto, de proteger os cidadãos de possíveis arbitrariedades estatais no cumprimento da lei penal. Desse modo, a prisão deve ser uma medida adotada apenas após se obter a certeza da responsabilidade penal do acusado, devendo prevalecer à liberdade como regra, em razão do princípio da presunção de inocência, evitando-se assim as penas arbitrárias vindas do Estado, bem como da sociedade.
Assim, entende-se que o princípio da presunção de inocência é uma das mais importantes garantias da Constituição da República. Trata-se, portanto, de uma prerrogativa constitucional conferida ao acusado de não ser considerado culpado até a sentença penal condenatória transitada em julgado, impedindo qualquer prévia e antecipada manifestação judicial de caráter punitivo.
A prisão, mesmo que após sentença condenatória não transitada em julgado, só pode (ao menos em tese) ser decretada e justificada, quando adotada em caráter excepcional, em casos de extrema necessidade, nos quais restar evidente que a liberdade do acusado puder comprometer o regular desenvolvimento do processo.
Tal assertiva denota do fato de que com a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, ocorreu um grande crescimento da proteção normativa aos direitos humanos, de tal forma que o direito à liberdade passou a prevalecer sobre os demais, só podendo ser restringido quando fundamentadamente comprovada a necessidade de tal medida.
O Superior Tribunal de Justiça, a despeito de recente decisão do Supremo Tribunal Federal a ser tratada mais adiante, também tem se manifestado no sentido de garantir a presunção de inocência até o trânsito em julgado da sentença condenatória.
Em sentido amplo é o que fica patente na decisão do Ministro Marco Aurélio, o qual comprova que alguns ministros do STF se posicionam no sentido de garantir a presunção de inocência até trânsito em julgado:
PRISÃO PREVENTIVA FUNDAMENTOS INSUBSISTÊNCIA.PRISÃO PREVENTIVA – EXCESSO DE PRAZO – CONFIGURAÇÃO. 1. A Assessoria prestou as seguintes informações: O paciente foi condenado a onze anos, três meses e dez dias de reclusão, em regime inicial fechado, e ao pagamento de um mil, cento e vinte e sete dias-multa, ante a prática do crime previsto no artigo 33, cabeça (tráfico de drogas), da Lei nº 11.343/2016, combinado com o artigo 14, inciso II, do Código Penal, em concurso material com o artigo 35 da Lei de Drogas (associação para o tráfico). O Juízo da 1ª Vara Federal de Barretos/SP negou a ele o direito de recorrer em liberdade. Contra esse pronunciamento, a defesa impetrou habeas no Tribunal Regional Federal da 3ª Região, pleiteando o reconhecimento do direito de recorrer solto. Sustentou estar o paciente sofrendo constrangimento ilegal devido ao excesso de prazo da prisão e da conclusão do julgamento da apelação interposta em 13 de abril de 2012. A juíza Cecilia Mello, relatora, assentou a incompetência para julgar o pedido, remetendo o processo ao Superior Tribunal de Justiça, em virtude de o ato coator ser da própria lavra, ante a relatoria da apelação criminal. No Superior Tribunal de Justiça, o habeas corpus foi autuado sob o nº 281.803/SP. A ministra Marilza Maynard, desembargadora convocada, relatora, indeferiu a liminar. Consignou que o acolhimento da medida acauteladora demandaria o exame da idoneidade e razoabilidade da fundamentação adotada pelas instâncias ordinárias, o que se daria somente a partir de aprofundada análise do caso pelo Colegiado. Neste habeas, o impetrante destaca a existência de excepcionalidade capaz de superar o óbice do Verbete nº 691 da Súmula do Supremo, consubstanciado no constrangimento ilegal verificado pelo excesso de prazo na formação da culpa e no cumprimento antecipado da pena. Afirma ter respondido ao processo em liberdade durante toda instrução criminal, tendo sido preso no local de trabalho pouco antes da sentença condenatória. Frisa as condições favoráveis: primariedade, residência fixa, trabalho lícito e bons antecedentes. Sustenta estar sendo acusado por delito de tipificação impossível, porquanto fora denunciado por tentativa de tráfico de drogas. Ressalta estar recolhido cautelarmente há quase dois anos, estando a apelação pendente de julgamento há mais de um ano e meio, não subsistindo os requisitos autorizadores da manutenção da custódia. Afirma que a gravidade do crime, sem culpa formada, não serve a justificar a prisão, impondo-lhe cumprimento antecipado da pena. Requer, em âmbito liminar, a concessão da liberdade provisória até o julgamento deste habeas. No mérito, pleiteia a confirmação da providência até o exame definitivo da ação penal. O processo encontra-se instruído para apreciação da medida acauteladora. 2. É dado constatar que a prisão preventiva foi fundamentada na gravidade da imputação, partindo-se da óptica de haver participantes em crimes considerada, inclusive, associação. Em síntese, olvidou-se o princípio da não culpabilidade. Mais do que isso, na data de hoje, o paciente está preso, preventivamente, há 2 anos, 6 meses e 25 dias. 3. Defiro a liminar pleiteada. Expeçam alvará de soltura a ser cumprido com as cautelas próprias: caso não se encontre sob custódia do Estado por motivo diverso do retratado no Processo nº 0007606-90.2011.403.6138, do Juízo da 1ª Vara Federal de Barretos/SP, presente a custódia provisória. Advirtam-no da necessidade de permanecer no distrito da culpa, atendendo aos chamamentos judiciais e adotando a postura que se aguarda do cidadão integrado à sociedade. 4. Colham o parecer da Procuradoria Geral da República. 5. Publiquem. Brasília – residência –, 19 de junho de 2017, às 16h10.Ministro MARCO AURÉLIORelator67(STF - HC: 120235 SP, Relator: Min. MARCO AURÉLIO, Data de Julgamento: 19/06/2017, Data de Publicação: DJe-124 DIVULG 25/06/2017 PUBLIC 27/06/2017).
Na decisão supra demonstra a preocupação do julgador com os excessos de prazo de prisão preventiva sendo no caso concreto, o paciente ficou preso preventivamente, há mais de 2 anos e meio. Tal situação resta como incompatível com o princípio da presunção da inocência.
Ora, o direito de recorrer em liberdade, mesmo que após decisão em segunda instância, além de encontrar proteção na Constituição, e ter sido pacificado em Tribunais Superiores, encontra-se amparado ainda em tratados internacionais de direitos humanos, como o Pacto de San Jose da Costa Rica. Em tais diplomas legais, entre outros, a presunção de inocência prevalece, enquanto a sentença condenatória não houver transitado em julgado.
Após análise da decisão do Supremo Tribunal Federal, explicitada no tópico anterior, necessário se faz constatar que, em análise as jurisprudências dos Tribunais Estaduais, vê-se que há algumas divergências, quanto à decretação e manutenção da prisão ou a permissão que o réu recorra de sentença em liberdade.
Observa-se que sua decretação, assim como sua manutenção encontram-se de acordo com seus pressupostos de admissibilidade, a fim de se evitar afronta aos princípios constitucionais. Sob um outro enfoque, o direito de se recorrer em liberdade pode gerar impunidade. Isso porque a já conhecida morosidade no judiciário, a qual acaba afetando à efetividade da justiça e a aplicação da lei penal.
Existe até uma Sumula, de n° 697, do Supremo Tribunal Federal quanto à questão, a qual estabelece que:
Súmula – 697- A proibição de liberdade provisória nos processos por crimes hediondos não veda o relaxamento da prisão processual por excesso de prazo.
Eis o que afirma Oliveira, a respeito:
O aumento populacional, a conscientização por parte dos cidadãos de seus direitos, a ênfase que se deu na Constituição Brasileira de 1988 sobre os direitos das pessoas, o que lhe valeu o nome de Constituição cidadã, a evolução tecnológica porque passa o mundo, tudo isto concorreu para a procura da justiça em uma escala, sem precedentes. É como se estivéssemos em plena corrida do ouro, como aconteceu nos velhos tempos. Acrescente-se, a migração do contingente populacional do campo para a cidade, em decorrência da industrialização do país, o que continuou em escala crescente nas décadas posteriores, principalmente, na década de 80, ocasionando o abarrotamento dos fóruns e tribunais, gerando, assim, uma crescente demora na prestação jurisdicional. O acúmulo de processos não para. Há que se encontrar um meio de pelo menos amenizar o problema. A esperança, a crença, enfim, tudo que possa aliviar o sofrimento do ser humano, está, depositado, em parte, na justiça. (OLIVEIRA, 2013, p. 11.)
Nota-se que o aumento populacional e da consequente procura ao judiciário influencia na lentidão da justiça, em especial a criminal. Não obstante, entre outras diversas hipóteses para a morosidade do judiciário se destaca o complexo sistema recursal. Os recursos geram impunidade e trazem afronta à efetividade da prestação jurisdicional.
Para ilustrar, o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal recebem, cotidianamente, um significativo volume de recursos, visto que os advogados criminalistas, além da esperança de reforma da decisão anterior, utilizarão da possibilidade de delongar o desfecho da ação penal e, consequentemente, beneficiar-se do instituto da prescrição (FREITAS, 2016). Observa-se que as partes poderão dispor de um rol extensivo de recursos que sobrecarrega o poder Judiciário, divorciando o fato da celeridade processual.Os recursos além de inviabilizarem a própria efetividade da justiça, também poderão ensejar em liberdade do recluso, ensejando em não aplicação da lei penal e consequente impunidade.
Os Tribunais Superiores buscam analisar atentamente cada caso concreto, com o fim de evitar afronta ao princípio da presunção de inocência. O Supremo Tribunal Federal, a esse respeito se pronunciou, conforme se verá no próximo tópico.
Muito embora a atual Constituição Federal do Brasil esteja em vigor desde 1988, só a partir do ano de 2009, o STF com o julgamento do HC 84078/MG, pacificou a aplicação do princípio da presunção inocência, insculpido no art. 5º, LVII da CF/88, em termos de considerar que ao acusado de um ato criminoso só possa ser reconhecido como culpado depois de sentença transitada em julgado evitando, portanto, que essa pessoa venha cumprir uma execução provisória da pena, na qual se essa execução não se enquadre nos pressupostos e fundamentos das prisões cautelares expressos no art. 312 do CPP, nada mais seria do que uma antecipação da pena, visto que estaria desconsiderando o princípio da não culpabilidade.
Não obstante a esse entendimento acertado do STF, não raro vemos decisões dadas por juízes nas instâncias de primeiro ou segundo grau, que mitigam o princípio da presunção de inocência. Em grande parte, isso acontece por falta de especificidade ou definição dos termos abstratos presentes nos fundamentos das prisões cautelares, a exemplo, do termo “garantia da ordem pública”, que alguns juízes usam de sua discricionariedade para interpretar termos vagos e imprecisos como este.
Destaca-se que no Supremo Tribunal Federal, em 05 de fevereiro de 2009, concedeu a liberdade para um acusado de homicídio, por meio do julgamento do Habeas Corpus 84.078/MG. Baseados na letra formal da lei, os Ministros do Supremo Tribunal Federal deferiram o pedido do condenado para recorrer a tribunais superiores em liberdade, baseado em princípios constitucionais já citados anteriormente:
HABEAS CORPUS. INCONSTITUCIONALIDADE DA CHAMADA "EXECUÇÃO ANTECIPADA DA PENA". ART. 5º, LVII, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. ART. 1º, III, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. 1. O art. 637 do CPP estabelece que "[o] recurso extraordinário não tem efeito suspensivo, e uma vez arrazoados pelo recorrido os autos do traslado, os originais baixarão à primeira instância para a execução da sentença". A Lei de Execução Penal condicionou a execução da pena privativa de liberdade ao trânsito em julgado da sentença condenatória. A Constituição do Brasil de 1988 definiu, em seu art. 5º, inciso LVII, que "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória". 2. Daí que os preceitos veiculados pela Lei n. 7.210 /84, além de adequados à ordem constitucional vigente, sobrepõem-se, temporal e materialmente, ao disposto no art. 637 do CPP. 3. A prisão antes do trânsito em julgado da condenação somente pode ser decretada a título cautelar. 4. A ampla defesa, não se à pode visualizar de modo restrito. Engloba todas as fases processuais, inclusive as recursais de natureza extraordinária. Por isso a execução da sentença após o julgamento do recurso de apelação significa, também, restrição do direito de defesa, caracterizando desequilíbrio entre a pretensão estatal de aplicar a pena e o direito, do acusado, de elidir essa pretensão. 5. Prisão temporária, restrição dos efeitos da interposição de recursos em matéria penal e punição exemplar, sem qualquer contemplação, nos "crimes hediondos" exprimem muito bem o sentimento que EVANDRO LINS sintetizou na seguinte assertiva: "Na realidade, quem está desejando punir demais, no fundo, no fundo, está querendo fazer o mal, se equipara um pouco ao próprio delinquente". 6. A antecipação da execução penal, ademais de incompatível com o texto da Constituição, apenas poderia ser justificada em nome da conveniência dos magistrados --- não do processo penal. HABEAS CORPUS HC 84078 MG (STF) Min. EROS GRAU.
Naquele período, a corte entendeu que o réu, condenado pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais, por tentativa de homicídio qualificado, poderia recorrer dessa sentença, aos tribunais superiores, em liberdade. A decisão do Supremo Tribunal Federal foi de encontro à Súmula 267, do Superior Tribunal de Justiça. Eis o teor da súmula, ipsis litteris:
Súmula 267 -A interposição de recurso, sem efeito suspensivo, contra decisão condenatória não obsta a expedição de mandado de prisão.
O entendimento que se destacou foi a de que a prisão do réu, impetrante do Habeas Corpus, antes da sentença transitada em julgado, é contrária à máxima estampada na carta constitucional cujo teor consiste em que não haverá culpados sem que haja o trânsito em julgado, explicitado no artigo 5º, LVII do supracitado diploma legal. Já, por seu turno, a tese aceita por parte minoritária dos ministros foi a de que, em casos parecidos, os recursos conduzidos aos tribunais superiores não poderiam ter efeito suspensivo.
Frisa-se os ensinamentos da Ministra do STF, Ellen Gracie, na sessão de 05/02/2009. HC 84078, a qual afirma que é inaceitável aguardar a aplicação da pena apenas após trânsito em julgado, afirmando que se assim o fosse não haveria presos no país:
[....] Aguardar, como se pretende, que a prisão só ocorra depois do trânsito em julgado, é algo inconcebível, com todo o respeito. A prevalecer essa tese nenhuma prisão poderia haver no Brasil, mesmo após a condenação pelo juiz ser confirmada por Tribunal de segundo grau, único competente, volto a frisar, para reexaminar a autoria, a materialidade, e a prova dos fatos. Esta análise não podem fazê-lo, nem o Superior Tribunal de Justiça, nem o Supremo Tribunal Federal, tanto que os recursos especial e extraordinário são desprovidos de efeito suspensivo. Não creio, não creio, Senhores Ministros, que a extrema violência que impera no Brasil, e a sensação de impunidade que a morosidade da justiça provoca na sociedade brasileira, estejam a recomendar interpretação diversa da que esta Corte firmou no julgamento do HC 72.366. Nesta linha, vale lembrar mais uma vez - [sobre] o precedente que estaríamos quebrando – aspalavras do Ministro Francisco Rezek na apreciação de um outro HC, o 71026. Disse Sua Excelência, naquela ocasião: “Há países onde se pode conviver, sem consequências desastrosas, com a tese segundo a qual a pessoa não deveria ser presa senão depois do trânsito em julgado de decisão condenatória. São países onde o trânsito em julgado ocorre com rapidez, porque não conhecem nada semelhante à espantosa e extravagante prodigalidade recursiva. [...] (HC 84078/MG julgado pelo STF).
Evidencia-se no voto dado pela Ministra Ellen Gracie, que esta usa como argumentos, o fato de existir uma morosidade nas decisões judiciais tomadas no país, em relação a decisões mais rápidas tomadas em outras partes do mundo. Entende-se que tal argumento é insuficiente para que seja colocado de lado um princípio constitucional, tão importante, como é o princípio da presunção da inocência; e inclusive a magistrada afirma que dificilmente se constata os requisitos do art. 312 do CPP, para que daí se decrete a execução provisória da pena. Apoiando o voto da Ministra, no mesmo julgado, se pronuncia o Ministro Joaquim Barbosa:
Nós estamos é criando, Ministro Peluso, um sistema penal de faz-de-conta. Nós sabemos que, se tivermos que aguardar o esgotamento do recurso especial e extraordinário, o processo jamais chega ao seu fim. Jamais chega, todos sabemos disso! (HC 84078/MG pelo STF).Embora a interpretação da Constituição nos pareça obvio, na realidade, observamos que por em prática todos os seus preceitos é algo dificílimo, basta que para isto observemos os vários julgados feitos nos s tribunais, e as consequências dessas decisões que estão espalhadas por diversas penitenciárias no país, diante deste fato, prestemos atenção nas palavras do Ministro Gilmar Mendes, que foi o relator do supracitado julgado acima: [...] Apesar dessa inefetividade o Brasil tem um índice bastante alto de presos. São 440.000 presos - dados de 2017 –, dos quais 189.000 presos provisórios, muitos deles há mais de dois, há mais de três anos, como se tem encontrado nesses mutirões do Conselho Nacional de Justiça.Se nós formos olhar por Estado a situação é ainda mais grave. Nós vamos encontrar alguns Estados com 80% dos presos nesses estágio provisório. Nos mutirões realizados pelo Conselho Nacional de Justiça, encontraram-se presos, por exemplo, no Estado do Piauí – números muito expressivos – que estavam há mais de 3 anos presos provisoriamente sem denúncia apresentada. No Estado do Piauí há até uma singularidade. O secretário de segurança, ou a Secretaria de Segurança do Estado do Piauí, concebeu um tal “inquérito de capa preta”, que significa que a polícia diz para a Justiça que não deve soltar aquela pessoa. É um mundo de horrores a Justiça Criminal brasileira, muitas vezes com aconivência da Justiça e do Ministério Público. Portanto, também eu, pedindo todas as vênias ao magnífico voto do Ministro Menezes Direito, do Ministro Joaquim Barbosa, da Ministra Cármen Lúcia e ao excelente voto da Ministra Ellen Gracie, acompanho o Relator e todos aqueles que se manifestaram também nesse sentido, para deferir a ordem. (HC 84078/MG julgado no STF).
Diante do exposto, observamos que até o julgamento do HC84078/MG, os direitos constitucionais das pessoas que respondiam processos e que estavam presas e recorriam de condenações de primeiro ou segundo grau, estavam sendo sistematicamente desrespeitadas.
Isto porque, se o réu já se encontrava preso e não preenche-se os requisitos do art. 312 do CPP, não haveria motivo para que esperassem presas depois de ter recorrido da mencionada sentença, tal fato feria, para os ministros em decisão naquele período, o princípio constitucional da presunção de inocência.
Por evidente, houve votos contrários naquela decisão. Os julgadores que entenderam pela não concessão do Habeas Corpus (quatro ministros) argumentaram, ainda, que a Convenção Americana de Direitos Humanos, cujo documento legal tem o Brasil por signatário, não assevera incondicional direito do réu em recorrer em liberdade, em todas as instâncias. Nesta senda, ao pronunciar o derradeiro voto do julgamento, que desacolheu o majoritário do Relator (Ministro Eros Grau), Gilmar Mendes frisou que a Justiça brasileira é ineficiente. No entanto, o entendimento da incondicional proteção à presunção de inocência prevaleceu naquele julgado.
Mas a decisão paradigma mudou, conforme se vê no próximo tópico.
O Supremo Tribunal Federal recentemente mudou o seu posicionamento quanto à prisão após confirmação da condenação em segunda instancia. Em 17 de fevereiro de 2016, no julgamento HC 126.292 a Suprema Corte mudou seu entendimento anterior (HC 84.078/MG), passando a considerar possível a execução provisória da pena após a decisão prolatada em segunda instância.
A justificativa maior da mudança de paradigma decisório consistiu no fato de que, para trazer à efetividade da lei penal, era necessário combater alguns mecanismos de impunidade, entre os quais a não aplicação da lei penal mesmo após confirmação da penalidade em segunda instancia judicial.
Nesta toada, o Supremo Tribunal Federal buscou aplicar uns dos princípios constitucionais elencados na Constituição Federal, o qual consiste na celeridade processual. Dessa forma, o legislador quis assegurar a sociedade uma tutela jurisdicional efetiva, adequada bem como tempestiva. Assegurando assim um processo célere com razoável duração da lide. Para tanto, os ministros buscaram respeitar, salvo melhor juízo, os demais princípios do contraditório e da ampla defesa.
Nos dizeres de Humberto Theodoro Júnior, tal garantia:
Trata-se de uma aproximação com o ideal do processo justo que entre os constitucionalistas contemporâneos funciona como um aprimoramento da garantia do devido processo legal. Para merecer essa nomen iuris, a prestação jurisdicional, além de atender aos requisitos tradicionais – juiz natural, forma legal, contraditório e julgamento segundo a lei – têm de proporcionar à parte um resultado compatível com a efetividade e a presteza (THEODORO JÚNIOR, 2016, p. 12).
É claramente possível de perceber que a intenção da Suprema Corte foi diminuir ou até mesmo extinguir a morosidade do processo no sistema judiciário brasileiro, como inibir os inúmeros recursos com fins unicamente protelatórios. Buscaram com isso uma mais concreta efetividade da justiça, a partir do real cumprimento da sentença já prolatada em segunda instância.
Em seu voto, o ministro Zavascki enfatizou que:
A execução da pena na pendência de recursos de natureza extraordinária não compromete o núcleo essencial do pressuposto da não culpabilidade, na medida em que o acusado foi tratado como inocente no curso de todo o processo ordinário criminal, observados os direitos e as garantias a ele inerentes, bem como respeitadas as regras probatórias e o modelo acusatório atual. Não é incompatível com a garantia constitucional autorizar, a partir daí, ainda que cabíveis ou pendentes de julgamento de recursos extraordinários, a produção dos efeitos próprios da responsabilização criminal reconhecida pelas instâncias ordinárias.
Nesse diapasão, a maioria dos ministros do Supremo votaram com relator, o ministro Teori Zavascki, para manutenção da condenação já em segunda instância, de tal forma que os julgadores entenderam que tal decisão não fere os demais princípios como da ampla defesa e a presunção de inocência.
Visto também que caso o réu seja condenado no juízo ad quo, e no ad quem, automaticamente, não será considerado inocente em igual peso que outrora (antes da condenação), mas inocente afastando assim o princípio da não culpabilidade. Isso porque a culpa lato sensu já está concretizada e provada, tratando assim desde já com a execução provisória da pena.
Recentemente, em 05 de outubro de 2016, o Supremo Tribunal Federal, em duas ações protocoladas pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e pelo Partido Ecológico Nacional (PEN), decidiu novamente em favor das prisões de condenados em segunda instância. A decisão da Suprema Corte foi bastante apertada, com cinco votos contra e seis votos a favor, o que demonstra que a situação ainda gera dissensos mesmo naquela corte. (STF, 2016).
Nesta ação, mais recente, teve o seguinte placar: Além da presidente do STF (Carmem Lúcia), foram favoráveis os ministros Gilmar Mendes, Luiz Fux, Teori Zavascki, Roberto Barroso e Edson Fachin. Por sua vez, os ministros Celso de Mello, Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli, Rosa Weber, Marco Aurélio (relator) foram contra a decisão (STF, 2016).
3.4 A PRISÃO EM SEGUNDA INSTÂNCIA: UMA ANÁLISE CRÍTICA À LUZ DA PRESUNÇÃO DA INOCÊNCIA
Os defensores da nova decisão afirmam que houve uma promoção da efetividade à justiça. Diante disso, o princípio da efetividade busca de maneira simples dizer o direito material pleiteado, sempre de maneira justa, ou seja, buscando dar o direito a quem tem a razão no caso concreto, principalmente quando se tratar de direito processual penal, está estritamente interligado com o bem mais preciso que é a liberdade do indivíduo.
Alexandre de Morais aduz que (2016, p. 61), “os direitos e garantias fundamentais consagrados pela Constituição Federal não são ilimitados, uma vez que encontram seus limites nos demais direitos igualmente consagrados pela Carta Magna (princípio da relatividade) ”.
Conforme magistério de André de Oliveira Morais:
A aplicação imediata das sentenças penais incriminadoras em alguns países distingue-se. Exemplificando, em Portugal, apesar da relevância da presunção de inocência, vige o princípio da “execução imediata” das sentenças condenatórias, o Tribunal constitucional entende que não é necessária a definitividade para a execução de um julgado condenatório e, nos EUA, o princípio da presunção de inocência faz parte do devido processo legal que consta da Constituição, contudo há profundo respeito às primeiras instâncias e o direito à fiança é bastante restrito. E assim, pode-se dizer que a aplicação da presunção de inocência não importa no exaurimento de todas as instâncias, como mostram os julgados das cortes superiores e os Tribunais nos países mencionados. (MORAIS, 2016, p. 3)
Com isto pode-se perceber a importância de tal princípio para o ordenamento jurídico pátrio, quando posto ao lado da decisão do Supremo Tribunal Federal, uma vez que está tentando de maneira clara e justa a aplicação da lei com eficiência, e menos equívocos.
Para Willian Garcez, o qual defende a decisão do Supremo Tribunal Federal:
Parece-nos, s. M. J., que o princípio continua íntegro, o que ocorreu, na espécie, foi “nova interpretação quanto ao momento terminativo da presunção da inocência”. Antes da decisão proferida no HC 126.292, tinha-se o entendimento de que a presunção da inocência vigorava até o “trânsito em julgado da sentença penal condenatória”, agora, passou-se a ter o entendimento de que a presunção da inocência vigora até a “confirmação da sentença condenatória em segundo grau”.
Dizer que determinado instituto foi “relativizado”, significa dizer que, em determinadas situações, ele “poderá não ser observado”, o que não nos parece ser o caso, pois, como referimos, a presunção da inocência, impreterivelmente, continuará a ser observada, sem exceção, em todo e qualquer caso. O que se alterou com a decisão proferida no HC 126.292foi o “momento em que se exaure essa presunção (GARCEZ, 2016 ,p. 1).
Outros já alegam que possibilitou a efetividade da justiça. Diante disso, pode-se dizer que o princípio da efetividade é aquele encarregado de analisar cada caso concreto, diante da ocorrência de processo, e assim busca o direito das partes de maneira clara e justa, sem dilações pois sua aplicabilidade encontra-se em dizer e dar o direito aquém tem a razão no caso concreto, com a devida urgência na prestação jurisdicional, visando aplicar a efetividade no processo (SANTOS, 2012).
Ainda é salutar trazer a lição de Vladimir Freitas, in verbis:
Nos tratados e nas Cortes Internacionais é dito que toda pessoa se presume inocente até prova de sua culpa em um tribunal. Nesta mesma interpretação segue a Declaração Universal de Direitos Humanos, de 1948, a Convenção Europeia dos Direitos Humanos, 1950, o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos da ONU, de 1966, o Pacto de San José da Costa Rica e o Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional, de 2002. Mas em nenhum deles se afirma que esta presunção exige o esgotamento de todas as instâncias. Interpretando tais dispositivos na realidade forense internacional, a regra não é aguardar o esgotamento de todas as instâncias.” (FREITAS, 2016)
Conforme se vê, essa efetividade não prejudica a presunção de inocência. Isso porque o princípio em tela não significa que o réu tenha o direito de recorrer todas as instâncias para, só após decisão transitada em julgada da última corte, ser definitivamente preso.
Se observa que que os réus utilizam de todos os meios e estratégias possíveis para adiar o resultado das ações em que ficam paralisadas, enquanto levam a vida normalmente, como se nada tivesse ocorrido e nenhum crime praticado. Esses, ao invocar a lentidão dos tribunais e a confusão da legislação processual pátria, bem como o tratamento afável dado a quem já foi condenado pelas instâncias inferiores, buscam transformar a presunção de inocência em estado de impunidade. Com isso, é forçoso que se faça uma política capaz de tornar duradouro o sistema penal o quanto a lei assim o determina. Esse é o encargo estatal, o qual deve agenciar construções de concretização dos direitos fundamentais, sendo esta uma das principais táticas no combate da criminalidade cada vez mais crescente (BONFIM, 2014).
Anderson Furlan leciona:
Aplicação de princípio da inocência absoluto, por interpretação extensiva, felizmente superada pela histórica decisão do Supremo, leva ao desequilíbrio social. Imagine-se, a título de argumento, que a República tivesse mais dois tribunais na sua Constituição, o Tribunal Final e o Tribunal Definitivo, somente como respeitosos exemplos. O processo penal não terminaria em quatro gerações. Não haveria presos definitivos. O sistema judicial, além dos inafastáveis anseios humanísticos, deve considerar a experiência histórica, razões de ordem prática e funcionalidade equilibrada do sistema penal. [...] O direito de defesa do acusado é tão amplo no direito penal que vai além do trânsito em julgado da sentença condenatória, pois permite revisões criminais e habeas corpus a qualquer tempo. Em outras palavras, é possível até mesmo a superação da culpa definitiva. O sistema penal não tem segurança jurídica absoluta e definitividade de culpa, quando para favorecer o acusado, resultando a necessidade de soluções intermediárias, inclusive prisão, sob pena do direito não ter qualquer efetividade (FURLAN, 2016, p. 4).
Com tudo isso, pode-se aqui dispor com segurança da constitucionalidade da referida decisão uma vez que Supremo Tribunal Federal, deve como base princípios elencados na lei maior, demonstrando assim que nenhum princípio é maior que o outro, e tem que adequá-lo ao caso concreto e ao anseio da sociedade, uma vez que o direito a lei tem que acompanha a evolução da sociedade, e sempre buscando efetividade da lei para assim não torna letra morta.
Por outro enfoque, surgem as diversas interpretações de que o Supremo Tribunal Federal, ao denegar a ordem no HC 126.292, agiu com derrotabilidade de uma norma jurídica constitucional, demonstrando um aclame pelo ativismo judicial, em razão de omissão ou ineficácia social da lei e das políticas públicas; ou ainda de mudanças de paradigma no direito constitucional sob a ótica histórica.
A finalidade da nova decisão, é altamente improcedente que além de ir em contra mão as princípios dispostos no (art. 5 LVII )da marga carta que tratar do princípio da presunção de inocência, que “Ninguém será considerado culpado até transito em julgado de sentença penal condenatória” que também foi ratificado pela Convenção Americana sobre Direitos Humanos, mais conhecido como Pacto de São José da Costa Rica, que estabeleceu no art. 8º, I, o Princípio da Presunção de Inocência. (BASTOS, 2017)
Tal decisão, de acordo com Lopes Júnior (2016) vai contra diversos tratados internacionais no qual o Brasil é signatários, bem como artigo 283 do código de processo penal.
A possibilidade de aplicação das medidas cautelares no processo penal, que restringem a liberdade do acusado, deve atender aos requisitos previstos em lei, de outra forma, só deverá ser levado à prisão, após o trânsito em julgado de sentença penal condenatória, isto é, quando se esgotar em todas as possibilidades de defesa asseguradas ao réu, para não ferir o princípio constitucional da Presunção de Inocência.
Segundo Vitor RaazBottura, o Supremo Tribunal Federal usurpou uma função do legislativo, a saber:
Primeiramente, espera-se realmente que o STF volte atrás do posicionamento tomado na decisão do HC 126.292/SP. Os excelentíssimos ministros, com a devida vênia, usurparam as atribuições legislativas, atropelaram regras constitucionais e legais, de forma que esvaziaram a presunção de inocência e o direito de defesa, contribuindo sobremaneira para uma cruzada punitivista, valendo-se do populismo penal midiáticopara dar “satisfação” a população. Passar por cima dos textos constitucional e legal nunca será solução para uma sociedade democrática e civilizada, pois não sabemos o que poderá ocorrer no dia de amanhã, uma vez que os limites estabelecidos ao poder estatal (Estado como um todo) decorrem da lei (BOTTURA, 2016, p. 4).
É necessário frisar que, o Princípio da Presunção de Inocência por fazer parte do rol dos direitos e garantias fundamentais assegurados pela Constituição Federal Brasileira, é também considerado cláusula pétrea, não podendo assim ser objeto de modificação e nem ter uma interpretação literal do seu significado (BONAVIDES, 2013).
Ainda, é de notória compreensão que o objetivo primordial desse princípio é sem dúvida afastar possíveis injustiças, cometidas quando da privação da liberdade do condenado em processo que não chegou ainda ao trânsito em julgado, ou seja, o fim do percurso a ser trilhado para a aplicação da sanção penal, pois toda decisão antes de transitar em julgado é passível de reforma ou anulação, e nesse ponto residiria o prejuízo irreparável do condenado que teve sua liberdade restringida antes de esgotar todos os recursos e medidas previstas no texto constitucional, como forma de garantir a ampla defesa do condenado, preservando assim o respeito à dignidade da pessoa humana, que é no Estado Democrático e de Direito uma preocupação recorrente (CARVALHO, 2015).
Diante disso é sabido que os princípios e garantias consagrados na Magna Carta não podem jamais serem ignorados e maculado pela Suprema Corte. O Supremo adotou posicionamento dos princípios da vedação ao retrocesso, onde o mesmo tem por obrigação de renovar, mas sempre visando o não retrocesso.
A PROIBIÇÃO DO RETROCESSO SOCIAL COMO OBSTÁCULO CONSTITUCIONAL À FRUSTRAÇÃO E AO INADIMPLEMENTO, PELO PODER PÚBLICO, DE DIREITOS PRESTACIONAIS. – O princípio da proibição do retrocesso impede, em tema de direitos fundamentais de caráter social, que sejam desconstituídas as conquistas já alcançadas pelo cidadão ou pela formação social em que ele vive. – A cláusula que veda o retrocesso em matéria de direitos a prestações positivas do Estado (como o direito à educação, o direito à saúde ou o direito à segurança pública, v.g.) traduz, no processo de efetivação desses direitos fundamentais individuais ou coletivos, obstáculo a que os níveis de concretização de tais prerrogativas, uma vez atingidos, venham a ser ulteriormente reduzidos ou suprimidos pelo Estado. Doutrina. Em consequência desse princípio, o Estado, após haver reconhecido os direitos prestacionais, assume o dever não só de torná-los efetivos, mas, também, se obriga, sob pena de transgressão ao texto constitucional, a preservá-los, abstendo-se de frustrar – mediante supressão total ou parcial – os direitos sociais já concretizados. ” (ARE-639337- Relator (a): Min. CELSO DE MELLO).
Percebe-se que o Supremo Tribunal Federal tem que se manter fiel aos princípios constitucionais da Magna Carta, bem como os seus julgados, e posicionamentos já pacificados no ordenamento jurídico pátrio, pois tais mudanças de paradigma geram uma insegurança jurídica terrível, ao próprio sistema judiciário e a população em geral. Visto que o ordenamento tem que progredir e jamais retroceder como já era entendimento da corte.
4 CONCLUSÃO
Em sede de conclusão, frisa-se que a presunção de inocência do acusado (baseada no princípio do in dubio pro reo) impõe o ônus da prova à acusação, ou seja, o representante do Ministério Público, durante o curso da ação penal, deve reunir as provas de todos os elementos do crime, da inexistência de excludentes de ilicitude e culpabilidade, para afastar a presunção e auxiliar na formação da culpa e no convencimento do julgador, sendo que a defesa tem ampla possibilidade de ação.
Conforme frisado no presente estudo, no sistema penitenciário reina o caos. Considerando tal situação, a presunção de inocência possui um caráter mais humanitário, na medida em que busca salvaguardar o cidadão (presumivelmente inocente) das infaustas prisões brasileiras.
Neste contexto surge a decisão do Supremo Tribunal Federal no HC 84.078-7MG e sua relação com o princípio da presunção de inocência. Este julgamento trouxe o entendimento de que a possibilidade de prisão do condenado, antes do trânsito em julgado, ofende ao princípio constitucional da presunção de inocência.
Tal posicionamento não se solidificou, haja vista a decisão recentemente prolatada, em 17 de fevereiro de 2016, no HC 126.292, a qual entendeu que a sentença penal condenatória, confirmada em segundo grau, permite a execução provisória da pena aplicada. Com essa alteração, surgiram divergências doutrinárias. A esse respeito, duas correntes distintas se destacaram.
A primeira corrente entendeu que o Supremo Tribunal Federal trouxe uma acertada decisão visto que buscou proporcionar dignidade maior ao Poder Judiciário para assim adequar lei conforme a evolução da sociedade, pois esse mecanismo estava a cometer erros incalculáveis, uma vez que o réu era condenado e permanecia como se nenhum crime tivesse praticado. Em muitos casos o condenado passava anos recorrendo e o crime no qual estava condenado vinha a prescrever.
Já segunda corrente entende que é gritante e preocupante o rumo que a presente decisão do Supremo pode toma, uma vez que, é profundamente inconstitucional o posicionamento do Supremo, bem como o citado entendimento é uma a afronta aos princípios Constituição, uma vez que a presente corte tem o dever de zelar e proteger os direitos da pessoa humana direitos esses albergados na Constituição, mesmo que tais princípios ou decisões var contra a vontade da maioria até porque a corte mencionada deveria ser o guardião da lei maior.
REFERÊNCIAS
BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. 21 ed. São Paulo: Saraiva, 2017..
BECCARIA, Césare. Dos delitos e das penas. São Paulo: Martins Fontes, 2012.
BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 13 ed. São Paulo: Malheiros, 2013.
BONFIM, Edilson Mougenot. Curso de processo penal. 2 ed. rev. aum. e atual. São Paulo: Saraiva, 2014.
BOTTURA, Vitor Raatz. Apesar de atropelada, presunção de inocência não foi eliminada pelo STF. Disponível em <http://www.conjur.com.br/2016-jul-06/vitor-bottura-presuncao-inocencia-nao-foi-eliminada-stf >Acesso em 31 de abril de 2019.
BRASIL. Código de Processo Penal. Disponível em < www.planalto.gov.br > Acesso em 7 de junho de 2019.
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CANOTILHO, Jose Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da Constituição. 2 ed. Coimbra: Almedina, 2010.
CARVALHO, Luis Gustavo Grandinetti Castanho de. Processo Penal Constituição: Princípios constitucionais do processo penal. 3 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2015.
DALABRIDA, Sidney Eloy. Prisão preventiva: uma análise à luz do garantismo penal. Curitiba: Juruá, 2017.
FREITAS, Vladimir Passos de Freitas. Pactos não dizem que se presume inocência até último recurso. . Disponível em:<http://www.conjur.com.br/2009-fev-08/pactos-nao-dizem-presuncao-inocencia-vale-ultimo-recurso>. Acesso em: 11 de maio de 2019
FURLAN, Anderson. Esperar trânsito em julgado para prender levou a protelação e impunidade. Disponível em < https://www.conjur.com.br/2016-jun-20/jacomo-gimenes-esperar-transito-julgado-levou-protelacao-impunidade> Acesso em 23 de maio de 2019.
GARCEZ, William. A presunção de inocência na visão do STF: O julgamento do HC 126.292. Disponível em < https://delegadowilliamgarcez.jusbrasil.com.br /artigos/308531136/a-presuncao-de-inocencia-na-visao-do-stf-o-julgamento-do-hc-126292>Acesso em 23 de maio de 2019.
LOPES JÚNIOR, Aury. Direito processual penal. São Paulo: Saraiva, 2016.
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SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ARE-639337- Relator (a): Min. CELSO DE MELLO. Disponível em < www.stf.jus.br > Acesso em 7 de junho de 2019.
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Supremo Tribunal Federal. STF - HC: 120235 SP, Relator: Min. MARCO
AURÉLIO, Data de Julgamento: 19/06/2017, Data de Publicação: DJe-124 DIVULG 25/06/2017 PUBLIC 27/06/2017
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. São Paulo: Saraiva, 2016.
Acadêmico do curso de Direito pela Faculdade Serra do Carmo-TO.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: NAZARENO, Argus. Análise do princípio da presunção de inocência em sede de prisão em segunda instância Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 11 jun 2019, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/53030/analise-do-principio-da-presuncao-de-inocencia-em-sede-de-prisao-em-segunda-instancia. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Nathalia Sousa França
Por: RODRIGO PRESTES POLETTO
Por: LEONARDO RODRIGUES ARRUDA COELHO
Por: Gabrielle Malaquias Rocha
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