Resumo: O presente artigo destina-se a examinar a possibilidade de identificação da figura da Constituição do Trabalho no ordenamento pátrio, a partir do reconhecimento do peculiar tratamento que conferido à regulação jurídica do labor humano.
Sumário: 1 Introdução. 2 A Constituição Econômica. 3 As bases da Ordem Econômica na Constituição de 1988: valorização do trabalho humano e livre iniciativa. 3.1 Livre iniciativa e liberdade de empresa. 3.2 O conteúdo jurídico da liberdade de empresa. 3.3 Finalidades da Ordem Econômica. 3.3.1 Dignidade humana. 3.3.2 Justiça social. 3.4 O princípio da livre concorrência. 4 A Constituição do Trabalho. 4.1 A valorização do trabalho humano. 4.2 O “bloco de constitucionalidade” do direito do trabalho. 5 Conclusões. Referências bibliográficas.
1 INTRODUÇÃO
A análise da relação entre as figuras da Constituição Econômica e da Constituição do Trabalho consiste em uma das mais instigantes temáticas da atualidade no Ocidente.
É possível afirmar que, em certa medida, as disposições constitucionais sobre o trabalho integram a noção de Constituição Econômica, como adiante se verificará. Não obstante, o regramento contido nesta não é capaz de abranger toda a riqueza e singularidade[1] do que se poderia denominar de estatuto jurídico do trabalho humano, pelo que se justifica a abordagem isolada da Constituição do Trabalho.
O presente trabalho dedica-se precisamente a estudar essas duas parcelas do ordenamento jurídico, a principiar pela Constituição Econômica.
2 A CONSTITUIÇÃO ECONÔMICA
O aparecimento de monopólios e oligopólios, a formação de cartéis, os reiterados abusos do poder econômico cometidos por entidades detentoras de elevada concentração de capital, os desequilíbrios do sistema financeiro, bem como o estado de preocupante fragilização social verificados no início do século XX conduziram à inserção nos ordenamentos jurídicos de normas voltadas ao direcionamento da economia.
As Constituições, por consubstanciar o compromisso político fundamental de uma sociedade[2], exerceram, neste contexto, papel extremamente relevante. As Cartas Magnas editadas a partir desse período, passaram a assumir a responsabilidade de regular o funcionamento da economia, tendo em vista a promoção do bem-estar geral[3].
Surge, então, a noção de Constituição Econômica, compreendida como “o conjunto de preceitos e instituições jurídicas que, garantindo os elementos definidores de um determinado sistema económico, instituem uma determinada forma de organização e funcionamento da economia e constituem, por isso mesmo, uma determinada ordem económica; ou, de outro modo, aquelas normas ou instituições jurídicas que, dentro de um determinado sistema e forma económicos, que garantem e (ou) instauram, realizam uma determinada ordem económica concreta”[4].
É possível, acompanhando-se VITAL MOREIRA, distinguir a Constituição Econômica estatutária da denominada de programática ou diretiva. A primeira contém as “disposições que escoram um determinado sistema económico, expresso ao nível do estatuto das relações de produção que o caracterizam”. A segunda, a seu turno, pretende-se protagonista de uma nova ordem coisas, abrangendo “aquelas disposições em que se manifestam os fins da política económica, pretendendo à configuração da ordem económica e à actuação sobre a estrutura económica existente”[5].
Instituidoras do Estado Social de Direito, as Constituições contemporâneas não abandonaram o capitalismo[6], mas impuseram limites e condicionamentos para a atuação no mercado[7]. A liberdade de empresa persiste, pois, como valor fundamental da sociedade, admitindo-se — e, mesmo, exigindo-se — restrições ao seu exercício.
Exemplificativamente, a atual Constituição da Itália reconhece-a em seu art. 41[8], vinculando-a ao interesse social e admitindo a edição de leis voltadas à coordenação da atuação econômica pública e privada, tendo em vista os fins sociais, enquanto a Constituição espanhola de 1978 assegura-a em seus artigos 9º, item 2[9], e 38[10]. A seu turno, a Constituição de Portugal, em sua atual redação, consagra-a nos artigos 61[11] e 86[12].
Seguindo esta linha, também a Constituição brasileira de 1988 resguarda a liberdade de empresa, conforme se verificará adiante, em tópico específico.
Traçados os aspectos fundamentais em torno da noção de Constituição Econômica, cumpre, agora, examinar o perfil de Ordem Econômica[13] delineado pela Carta de 1988, a começar pelos elementos por ela reputados como lastreadores do desenvolvimento de toda atividade econômica no país.
3 AS BASES DA ORDEM ECONÔMICA NA CONSTITUIÇÃO DE 1988: VALORIZAÇÃO DO TRABALHO HUMANO E LIVRE INICIATIVA
A Constituição Federal de 1988, em seu Título VII, procede à regulação da Ordem Econômica. O art. 170 inicia o Título, enunciando as bases, as finalidades e os princípios da Ordem Econômica, in verbis:
Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
I - soberania nacional;
II - propriedade privada;
III - função social da propriedade;
IV - livre concorrência;
V - defesa do consumidor;
VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação;
VII - redução das desigualdades regionais e sociais;
VIII - busca do pleno emprego;
IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País.
Conforme se depreende da redação do dispositivo, o constituinte elegeu a valorização do trabalho humano e a livre iniciativa como fatores fundamentais à estrutura de toda atividade econômica nacional.
A análise da valorização do trabalho humano deve ser desenvolvida no contexto de exame da Constituição do Trabalho, razão pela qual avança-se, desde já, ao estudo da livre iniciativa.
3.1 LIVRE INICIATIVA E LIBERDADE DE EMPRESA
O valor social da livre iniciativa[14] está consagrado no ordenamento constitucional pátrio no art. 1º, inciso IV, como fundamento da República Federativa do Brasil, estando a livre iniciativa instituída, no art. 170, caput, como elemento fundamental da Ordem Econômica. Trata-se de dimensão da autonomia privada[15].
A compreensão da configuração jurídica da livre iniciativa exige a apresentação, ainda que breve, do processo histórico de sua consagração no Ocidente e de sua evolução.
A tutela da livre iniciativa atendeu aos anseios da recém-formada classe burguesa, condutora das Revoluções Liberais que marcaram o século XVIII. No contexto de ruptura com o Antigo Regime, a noção de liberdade tornou-se verdadeiro fator definidor do projeto ideológico, político e econômico que então se implantava.
Precisamente por isto, já nos primeiros artigos da Declaração de Direitos da Virgínia[16] (precursora da Declaração de Independência dos Estados Unidos da América) e da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão[17] a liberdade é alçada à posição de valor fundamental.
A postura política que então se assumia — e que viria a se manter durante longo período — era a de não intervenção do Estado nas ações dos particulares. A função estatal era, basicamente, garantir a segurança necessária para o livre exercício dos direitos civis e políticos.
Com o decurso do tempo, todavia, a ampla consagração da liberdade de atuação no mercado permitiu o surgimento de estruturas empresariais diferenciadas, caracterizadas pela alta concentração de capital. Evoluía-se, então, do capitalismo atomista ao capitalismo de grupo[18]. Nesta nova realidade, assegurar a livre iniciativa passou a significar também a repressão a atos de abuso de poder econômico que impedissem o efetivo acesso dos particulares à atuação no mercado[19].
ANDRÉ RAMOS TAVARES leciona que a livre iniciativa “(...) há de ser, realmente, entendida em seu sentido amplo, compreendendo não apenas a liberdade econômica, ou liberdade de desenvolvimento de empresas, mas englobando e assumindo todas as demais formas de organização econômicas, individuais ou coletivas, como a cooperativa (art. 5º, XVIII, e art. 174, §§ 3º e 4º), e a própria liberdade contratual e comercial”[20].
No mesmo sentido, EROS GRAU sustenta que a livre iniciativa não se identifica com a liberdade de desenvolvimento da empresa e, para além disso, abrange não apenas as formas de produção de caráter individual, como também as de índole coletiva. A livre iniciativa, assim, não é somente livre iniciativa do particular no desenvolvimento de empresa, alcançando a “iniciativa cooperativa (art. 5º, XVIII e, também, art. 174, §§ 3º e 4º), a iniciativa autogestionária e a iniciativa pública”[21] (grifos no original).
A livre iniciativa, na concepção apresentada por GRAU, pode ser visualizada sob dupla perspectiva: liberdade de comércio e indústria e liberdade de concorrência. Na primeira perspectiva, pode assumir os seguintes sentidos: faculdade de criar e explorar uma atividade econômica a título privado e não sujeição a qualquer restrição estatal senão as decorrentes da lei[22]. A segunda perspectiva sob a qual é possível visualizar a livre iniciativa, por identificar-se, no entendimento de EROS GRAU, à liberdade de concorrência, será abordada adiante.
Registre-se, ainda, que a livre iniciativa, na estrutura econômica engendrada pela Constituição de 1988, somente pode ser considerada legitimamente exercida quando voltada à realização da dignidade humana e à promoção de justiça social, finalidades a que inelutavelmente se vincula toda a atividade econômica nacional[23]. Afigura-se, assim, que a “livre iniciativa indica a questão do acesso ao mercado tanto do capital quanto do trabalho, no sentido da promoção de uma sociedade livre e pluralista”[24].
Tal compreensão é reafirmada no posicionamento jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal, assentando-se a idéia de que, no ordenamento pátrio, a garantia da livre iniciativa simplesmente não pode ser implementada desconsiderando-se os demais elementos consagrados na Carta Magna como conformadores da Ordem Econômica[25].
Destarte, a proclamação da livre iniciativa como um dos elementos basilares da ordem econômica brasileira não ocorre de maneira absoluta, mas, ao revés, acompanhada do reconhecimento da valorização do trabalho humano como fator que lhe é igualmente fundante e da vinculação à promoção da dignidade humana e da justiça social. Eventuais limitações à liberdade de empresa devem, pois, necessariamente buscar seu fundamento de legitimidade em tais elementos.
Compreendida a livre iniciativa, impende, agora, estudar a vertente da liberdade de empresa, o que se realizará adiante.
3.2 O CONTEÚDO JURÍDICO DA LIBERDADE DE EMPRESA
Nomeadamente no Título VII, que dispõe acerca da “Ordem Econômica e Financeira”, a Constituição reiterou a proteção à livre iniciativa, consagrando-a também, na dimensão relativa à liberdade de empresa, conforme se verifica a partir da redação do art. 170 e de seu parágrafo único, a seguir transcritos:
Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
[...]
Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei.
Sinteticamente, a liberdade de empresa consiste na faculdade de dar início e desenvolver um conjunto de atividades de natureza econômica no mercado e, ainda, de encerrar tais atividades[26]. Se é assim, inserem-se em seu âmbito de abrangência todas as condutas necessárias para viabilizar o ingresso no mercado, de acordo com os requisitos legais. Todos os atos, pois, indispensáveis para o efetivo princípio das relações negociais incluídas nas finalidades da empresa estão garantidos sob o manto da liberdade de empresa[27].
Para além dos comportamentos e relações jurídicas preliminares, a liberdade de empresa abarca, também, toda a atuação empresarial desenvolvida no curso da exploração da atividade econômica. Isto envolve, exemplificativamente, aspectos relativos à alocação de bens e capitais, a decisões quanto a intensificação ou redução de ações em certos setores, ampliação ou deslocamento de unidades produtivas.
Consectário lógico, ainda, da consagração da liberdade de empresa é a tutela das condutas necessárias ao encerramento — total ou parcial — das atividades da empresa. Não é plausível que o sujeito ou a entidade seja, de fato, livre para empreender em dada área se nela somente lhe é facultado o ingresso, vedando-se sua saída. Assim, os atos relativos à dissolução da empresa ou à finalização das atividades de dado departamento estão, também, salvaguardados pela liberdade de empresa.
Refletindo acerca do conteúdo essencial da liberdade de empresa, MANUEL ARAGÓN REYES pondera: “En cuanto al acceso, el reducto de libertad infranqueable probablemente es mínimo: no prohibición absoluta y no imposición forzosa. En cuanto al abandono, también, esse reducto sería mínimo: no imposición de continuar. En cuanto al ejercicio, el ámbito absoluto de libertad sería mayor: el empresario ha de gozar de un mínimo, pero suficiente, reducto infranqueable de autonomia de dirección de su empresa, autonomia sin la cual no sería empresa privada, sino empresa pública (...)”[28].
Eis o delineamento geral do conteúdo jurídico da liberdade de empresa. Observe-se, por sua amplitude, que o exercício desta inevitavelmente provoca conseqüências no campo das relações de trabalho. Partindo-se, então, de suas facetas relativas ao início, ao desenvolvimento e ao encerramento de atividades, é possível aplicar este arcabouço teórico aos contratos de trabalho, no que se poderia denominar de dimensão laboral da liberdade de empresa.
Relativamente à primeira faceta, as implicações no Direito do Trabalho referem-se às decisões da empresa sobre “cuantos trabajadores necesita, quiénes van a ser contratados y qué modalidades contractuales se van a utilizar”[29]. A mais evidente limitação à liberdade de empresa, neste campo, é a vedação à adoção de critérios discriminatórios para a seleção de trabalhadores[30]. O fato de o empregador possuir a faculdade de escolher com quem contratar não lhe autoriza, por óbvio, a violar o princípio constitucional da igualdade, valendo-se de distinções objetivamente injustificáveis.
A segunda faceta, consoante a lição de FREDERICO DURÁN LÓPEZ, pode ser visualizada sob duas perspectivas[31]. A primeira refere-se à utilização de mão-de-obra diretamente vinculada ao tomador ou intermediada por terceiro. É lícito, aqui ao empregador, obedecidos os ditames legais e jurisprudenciais, não utilizar empregados seus para a realização de certas atividades específicas. A segunda perspectiva diz respeito ao modo de exploração da mão-de-obra, abrangendo, exemplificativamente, jornada, produtividade e local de trabalho.
Finalmente, o aspecto da liberdade de empresa relativo ao afastamento do exercício de atividades econômicas corresponde, no campo das relações laborais, ao encerramento de contratos de trabalho[32]. No Direito brasileiro, o melhor entendimento é no sentido de esta liberdade não abranger a despedida arbitrária, mas somente a motivada[33].
Compreendida a configuração jurídica da liberdade de empresa, é possível, agora, avançar para a abordagem das finalidades da Ordem Econômica.
3.3 FINALIDADES DA ORDEM ECONÔMICA
Consoante se depreende da leitura do art. 170, caput, da Carta Magna, o constituinte consagrou como finalidades da Ordem Econômica a realização da dignidade humana e de justiça social. Cada um desses objetivos será isoladamente examinado a seguir.
3.3.1 DIGNIDADE HUMANA
A adequada compreensão do significado do princípio da dignidade da pessoa humana para o direito somente é possível mediante a incursão nas reflexões éticas formuladas por IMMANUEL KANT.
Um dos aspectos fundamentais da obra do filósofo é, sem dúvida, a investigação moral por ele empreendida. Com efeito, KANT preocupa-se em justificar a atuação moral do ser humano por meio de um postulado apriorístico, inerente à própria racionalidade humana e de necessária observância como regra de conduta. A tal preceito, KANT denomina de imperativo categórico[34].
Tal imperativo pode ser explicitado através da seguinte sentença: “Age de tal modo que a máxima da tua vontade possa valer sempre ao mesmo tempo como princípio de uma legislação universal”[35].
Consoante se infere da máxima acima declinada, o filósofo não dirige sua atenção a enunciar comportamentos concretos que atenderiam à conduta ética, mas objetiva estabelecer uma regra abstrata determinante da atuação moral do homem. Assim, conforme lecionam EDUARDO BITTAR e GUILHERME ALMEIDA, no pensamento kantiano, o “agir moral é o agir de acordo com o dever; o agir de acordo com o dever é fazer de sua lei subjetiva um princípio de legislação universal, a ser inscrita em toda a natureza. Daí decorre que o sumo bem só pode ser algo que independa completamente de qualquer desejo exterior a si, de modo que consistirá no máximo cumprimento do dever pelo dever, do qual decorre a suma beatitude e a suma felicidade, como simples mérito de estar conforme ao dever e pelo dever”[36].
Nos “Fundamentos da Metafísica dos Costumes”, encontra-se a explicitação do imperativo categórico sob uma perspectiva do reconhecimento do valor humano. Tem-se, então, a enunciação do preceito que KANT denomina de imperativo prático, através da seguinte máxima: “age de tal modo que possas usar a humanidade, tanto em tua pessoa como na pessoa de qualquer outro, sempre como um fim ao mesmo tempo e nunca somente como um meio”[37].
O homem, assevera KANT, deve ser sempre um fim em si mesmo, não sendo franqueado, a quem quer que seja, reduzir uma pessoa à mera condição de meio para consecução de outras finalidades. O ser humano, ressalte-se, não possui preço, não pode ser substituído por qualquer equivalente, mas, ao revés, é inestimável, detentor, portanto, de dignidade.
A noção de dignidade humana, amplamente difundida na modernidade a partir das reflexões de KANT, encontra-se consagrada em diversas Constituições contemporâneas[38], figurando como verdadeiro lastro dos respectivos ordenamentos jurídicos.
Na atual Constituição brasileira, o princípio da dignidade da pessoa humana está consagrado no art. 1º, inciso III[39], como fundamento da República Federativa do Brasil, assim como no art. 170, caput, estando, aqui, alçado à condição de finalidade da Ordem Econômica.
Trata-se de princípio de elevada carga de indeterminação semântica. Ao discorrer acerca do seu conteúdo, ROBERT ALEXY reconhece que, podendo seu conceito ser expresso através de um plexo de condições concretas que devem estar presentes - ou que necessariamente devem ser repudiadas - a fim de que se assegure existência digna, pessoas diferentes indicariam conjuntos diversos de tais condições[40]. Não obstante, prossegue o autor, esses diferentes feixes de condições apontadas não serão absolutamente distintos, guardando, entre si, um grau mínimo de afinidade ou consenso. Não é difícil perceber, por exemplo, que, qualquer que seja a concepção adotada, condutas vexatórias, humilhantes haverão de ser tidas como violadoras da dignidade humana. Para além disso, diversos princípios materiais exsurgem como consectário da garantia do aludido princípio, tais como “aqueles que têm como objetivo a proteção dos aspectos mais íntimos dos seres humanos e aqueles que conferem ao indivíduo um direito prima facie à sua auto-representação em face dos outros indivíduos”[41].
De outra parte, lastreado em diversos posicionamentos doutrinários e na jurisprudência do Tribunal Constitucional Federal, ALEXY sustenta que a liberdade consiste em elemento essencial à noção de dignidade humana[42]. Liberdade, aqui, assume a idéia de ausência de coerção sobre o ser humano em suas decisões. Não é possível, nesse sentido, sequer cogitar-se de dignidade humana, se não houver a garantia de livre desenvolvimento do indivíduo e auto-determinação. Salienta ALEXY, todavia, que a Corte Suprema Alemã não esposa uma compreensão individualista dessa liberdade, mas, antes, afirma “não ser uma liberdade ilimitada, mas uma liberdade de um ‘indivíduo referido e vinculado a uma comunidade’” [43].
Da lição do doutrinador alemão é possível extrair que o conteúdo do princípio da dignidade humana expressa, ao menos, três aspectos básicos: a) a vedação a condutas humilhantes ou degradantes; b) a garantia de autonomia do ser humano em suas escolhas, liberdade esta que se há de coadunar com a idéia de convivência em sociedade; c) diversos princípios materiais decorrem do princípio da dignidade humana, como condição para sua realização, dentre os quais é possível assinalar aqueles atinentes à própria personalidade dos sujeitos[44].
Posicionamento muito próximo é encontrado na doutrina pátria, presente na obra de INGO WOLFGANG SARLET, para o qual “(...) temos por dignidade da pessoa humana a qualidade intrínseca e distintiva reconhecida em cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos., mediante o devido respeito aos demais seres que integram a rede da vida”[45].
Podem-se divisar, no conceito de SARLET, os componentes básicos, acima assinalados, que concorrem na conformação do conteúdo jurídico da dignidade humana.
No mesmo sentido, ressaltando os contornos basilares, apontados por ALEXY, do princípio em comento, PABLO STOLZE e RODOLFO PAMPLONA asseveram que a “noção jurídica de dignidade traduz um valor fundamental de respeito à existência humana, segundo as suas possibilidades e expectativas, patrimoniais e afetivas, indispensáveis à sua realização pessoal e à busca da felicidade. Mais do que garantir a simples sobrevivência, este princípio assegura o direito de se viver plenamente, sem quaisquer intervenções espúrias — estatais ou particulares — na realização desta finalidade” (grifos no original)[46].
Na Ordem Econômica brasileira, a dignidade humana assume a qualidade de verdadeira condicionante do exercício da atividade econômica[47]. Qualquer que seja ela, estará vinculada à finalidade, insculpida no caput do art. 170, de promoção da existência humana digna.
Discorrendo acerca da ampla dimensão adquirida pelo princípio da dignidade humana no ordenamento jurídico, bem como de suas implicações na esfera dos direitos fundamentais de segunda dimensão[48], MARCUS MOURA FERREIRA aduz que os “direitos civis e políticos jamais terão o mínimo de efetividade se não forem antes atendidos pressupostos econômicos e sociais, capazes de satisfazer as necessidades elementares de alimentação, educação, saúde, trabalho, previdência e outras tantas que o desenvolvimento das condições históricas incorpora gradualmente à condição humana. Os direitos econômicos e sociais dão conteúdo material e expressão de realidade aos direitos básicos de liberdade. Somam-se todos eles em interação dialógica e convergente, completam-se no conjunto dos direitos fundamentais da pessoa”[49].
Neste diapasão, é forçoso concluir que a atuação dos agentes econômicos em desacordo com a orientação de garantia da existência humana digna revela-se como conduta eivada de flagrante inconstitucionalidade[50].
3.3.2 JUSTIÇA SOCIAL
Impõe, ainda, a Constituição Federal de 1988 como finalidade da Ordem Econômica a justiça social. Sua consagração no texto constitucional, contudo, não se resume a este dispositivo, tratando-se de objetivo fundamental da República Federativa do Brasil[51], bem como de objetivo da Ordem Social[52].
A realização de justiça social traduz a pretensão de distribuição mais equânime das riquezas entre os agentes sociais, relacionando-se com o objetivo constitucional de reduzir desigualdades entre classes e entre regiões do País[53].
Em face disto, diversos direitos sociais foram previstos no texto constitucional, com o fito de viabilizar a promoção da justiça social. Ademais, constitui-se em importante elemento orientador da interpretação das normas constitucionais de caráter econômico, as quais devem ser aplicadas tendo-se sempre em conta sua realização[54].
O conteúdo do conceito indeterminado em apreço não se esgota, todavia, na orientação de minimização de desigualdades. Isto porque a ideia de justiça social, que perpassa o texto constitucional, está intimamente relacionada à ideia de solidariedade.
Solidária, afiança EROS ROBERTO GRAU, é a “sociedade que não inimiza os homens entre si, que se realiza no retorno, tanto quanto historicamente viável, à Geselschaft - a energia que vem da densidade populacional fraternizando e não afastando os homens uns dos outros”[55].
A noção, assim, ultrapassa a concepção de prevalência dos interesses sociais sobre os individuais, podendo ser compreendida como verdadeiro compromisso de interdependência recíproca entre os seres humanos[56].
A tal ponto sobressai a importância da ideia de justiça social que é possível considerar, como o faz JOSÉ AFONSO DA SILVA, que a instalação de um regime democrático que a realize consubstancia-se na tarefa fundamental do Estado Democrático de Direito[57].
Registre-se, por fim, que, assim como ocorre com a dignidade humana, toda atividade econômica nacional deve estar voltada para a concretização da justiça social, ressaltando-se, com isso, a finalidade comunitarista de que devem estar imbuídos os agentes econômicos em sua atuação.
Examinadas as finalidades da Ordem Econômica brasileira, deve-se proceder ao estudo da livre concorrência, a fim de atender aos propósitos deste trabalho. É o que se empreenderá no tópico adiante.
3.4 O PRINCÍPIO DA LIVRE CONCORRÊNCIA
A concorrência pode ser definida como a “situação do regime de iniciativa privada em que as empresas competem entre si, sem que nenhuma delas goze da supremacia em virtude de privilégios jurídicos, força econômica ou posse exclusiva de certos recursos”[58].
O princípio da livre concorrência, constitucionalmente consagrado, consiste, segundo lição de ANDRÉ RAMOS TAVARES, “na abertura jurídica concedida aos particulares para competirem entre si, em segmento lícito, objetivando o êxito econômico pelas leis de mercado e a contribuição para o desenvolvimento nacional e a justiça social”[59].
EROS GRAU, a seu tempo, partindo da premissa de que a livre concorrência identifica-se a uma das perspectivas da livre iniciativa, aduz que aquela pode ser desdobrada em três sentidos, a saber: faculdade de conquistar a clientela, vedada a utilização de práticas de concorrência desleal; proibição de formas de atuação capazes de obstar a concorrência; neutralidade estatal em face da concorrência em igualdade de condições.
Cogita-se, aqui, de princípio que possui verdadeiro caráter instrumental relativamente ao princípio da livre iniciativa. Com efeito, para a garantia do livre acesso ao mercado, preconizada por este, faz-se necessária, no contexto de concentração econômica próprio do atual estágio de capitalismo de grupo, a repressão a investidas empresariais aptas a determinar a própria configuração de certo setor da economia, possíveis, a princípio, acaso se admitisse a livre iniciativa em seus termos extremos. Reside, inclusive, precisamente neste aspecto uma das mais relevantes justificativas para a afirmação histórica da necessidade de intervenção estatal no âmbito econômico, a fim de assegurar a própria manutenção do modo capitalista de produção[60]. O livre acesso ao mercado, afinal, jamais será efetivamente alcançado se não houver livre disputa de clientela.
Nesse sentido, pondera MANOEL JORGE E SILVA NETO que “a liberdade absoluta induzirá inexoravelmente à redução ou mesmo extinção da competitividade no sistema econômico”[61].
O tratamento constitucional da matéria é complementado através do art. 173, a seguir transcrito ipsis litteris:
Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei.
(...)
§ 2º - As empresas públicas e as sociedades de economia mista não poderão gozar de privilégios fiscais não extensivos às do setor privado.
§ 4º - A lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros.
§ 5º - A lei, sem prejuízo da responsabilidade individual dos dirigentes da pessoa jurídica, estabelecerá a responsabilidade desta, sujeitando-a às punições compatíveis com sua natureza, nos atos praticados contra a ordem econômica e financeira e contra a economia popular.
Como se observa, a Lex Legum regulamentou a configuração jurídica das empresas estatais que desenvolvam atividade econômica de maneira a vedar indevidas vantagens concorrenciais decorrentes de eventuais privilégios de ordem civil, comercial, trabalhista ou fiscal, reafirmando, assim, a consagração da livre concorrência.
Ademais, depreende-se dos dispositivos acima transcritos que a Lei Maior reconheceu a existência do poder econômico como inerente ao modelo capitalista adotado. É repudiado, todavia, pela ordem constitucional pátria, o exercício abusivo deste poder. Nesta linha de entendimento, JOSÉ AFONSO DA SILVA ressalta: “Este [o poder econômico] não é, pois, condenado pelo regime constitucional. Não raro esse poder econômico é exercido de maneira anti-social. Cabe, então, ao Estado, intervir para coibir o abuso”[62].
Verifica-se, assim, que, no presente momento histórico, a regulação da concorrência confirma-se como elemento necessário à própria continuidade do sistema capitalista e, para além disso, desponta como mecanismo de realização de políticas públicas.
Refletindo a importância da regulação da concorrência na dinâmica econômica contemporânea, diversos diplomas normativos foram editados no Brasil visando à repressão do abuso de poder econômico e garantia do equilíbrio dos agentes econômicos. São eles: a Lei n.º 8.137/90, a qual regula crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo, a Lei n.º 8.176/91, que estabelece crimes contra a ordem econômica, a Lei n.º 8.884/94, denominada de Lei Antitruste, que estabelecia sanções administrativas decorrentes da adoção de condutas violadoras da livre concorrência e, por fim, a Lei n.º 12.529/11, que revogou quase integralmente aquela, reestruturando o sistema brasileiro de defesa da concorrência.
Analisada a Constituição Econômica, é possível, agora, avançar ao exame da Constituição do Trabalho. É o que se fará a seguir.
4 A CONSTITUIÇÃO DO TRABALHO
O trabalho[63] é um elemento indispensável à formação, manutenção e desenvolvimento das organizações sociais[64]. E é assim porque, para além de configurar-se como meio de efetivação da dignidade humana, o labor representa um acréscimo de utilidade social[65].
Conquanto a Revolução Industrial e o pensamento liberal hajam sido marcos no processo de valorização do trabalho[66], seguramente é no âmbito dos Estados Sociais que o labor encontra especial tutela jurídica. Pode-se, mesmo, visualizá-lo como ponto nevrálgico dos Estados Sociais[67].
A proliferação, no Ocidente, das disposições constitucionais a respeito do trabalho humano permitiu falar-se, ao lado de uma Constituição Econômica, da Constituição do Trabalho.
Acompanhando a lição de EDILTON MEIRELES, compreende-se a “(...) constituição do trabalho como o conjunto de regras e princípios constitucionais relativos ao trabalho. Não limitamos o seu objeto às relações de trabalho, pois, mais do que isso, a Constituição busca tratar do trabalho humano, ainda que não assalariado ou que não seja produto de uma relação jurídica”[68].
Reitere-se que, neste trabalho, opta-se pela análise da Constituição do Trabalho em tópico apartado da Constituição Econômica por entender-se que, embora sejam inegáveis as repercussões econômicas, o peculiar tratamento que deve ser dedicado à regulação do labor humano, em razão de, no Direito do Trabalho, a pessoa estar necessariamente implicada na atividade desenvolvida, é motivo suficiente para justificar a abordagem individualizada, afastando-se qualquer interpretação equivocada do trabalho como simples mercadoria[69].
Apresentada a noção de Constituição do Trabalho, importa, agora, analisar sua configuração no ordenamento brasileiro, a principiar por aquele que consubstancia seu mais importante traço: o princípio da valorização do trabalho humano.
4.1 A VALORIZAÇÃO DO TRABALHO HUMANO
As Constituições ocidentais contemporâneas conferiram especial tratamento ao trabalho humano. Conforme se afirmou supra, a proteção ao labor consiste em ponto nuclear dos Estados Sociais.
Nessa linha, a Constituição da Itália declara ser a república italiana fundada no trabalho[70], resguardando o direito ao trabalho, assim como os meios para efetivá-lo, e instituindo a obrigação de exercício de uma atividade que concorra para o progresso — material ou espiritual — da sociedade, isto é, o dever ao trabalho[71].
Ademais, explicita a vinculação estatal à proteção do trabalho, ao desenvolvimento profissional, ao incentivo a normas coletivas e organizações internacionais dirigidas à garantia de direitos aos obreiros, bem como ao amparo de trabalhadores italianos em território estrangeiro[72]. Orienta, ainda, a noção de salário justo e a limitação à jornada de trabalho[73], garantindo, também, a possibilidade de estabelecimento da participação dos trabalhadores na gestão da empresa[74].
Por sua vez, a Constituição portuguesa garante o direito ao trabalho, devendo o Estado adotar medidas que viabilizem sua efetivação[75]. Assegura, ainda, um rol de direitos, tendo em vista a elevação da condição social do trabalhador[76].
A seu turno, a Carta Política espanhola garante o direito ao trabalho, impondo, concomitantemente, o dever ao trabalho, reconhecendo o labor como meio de desenvolvimento da personalidade humana, e, em decorrência, veda a discriminação e assegura a remuneração justa[77]. Vincula, ainda, o Estado à criação e à implementação de políticas públicas tendentes ao pleno emprego e ao progresso social e econômico[78].
No Brasil, a orientação constitucional de valorização do trabalho não encontra lastro apenas no art. 170, caput, estando consagrada no art. 1º, inciso IV[79], como fundamento da República Federativa do Brasil, bem como no art. 193[80], qualificada como elemento basilar da Ordem Social.
Há que se observar, inicialmente, que o caput do art. 170 não menciona valorização do trabalho e da livre iniciativa, nem refere apenas o trabalho humano como fundamento da ordem econômica. O constituinte optou por explicitar que a estrutura da ordem econômica deve fundar-se na livre iniciativa e na valorização do trabalho realizado pelo homem.
Isso significa que a Carta Magna destinou especial proteção ao labor humano[81]. Este não deve ser visto como mero fator de produção, mas como fator de realização e satisfação pessoal daquele que o empreende. Trata-se de verdadeira “fonte de realização material, moral e espiritual do trabalhador”[82].
Importa distinguir, acompanhando a doutrina de EDILTON MEIRELES, as noções de valor social do trabalho e de valorização do trabalho humano, ambas consagradas na carta constitucional pátria. O primeiro diz respeito ao trabalho considerado em “si próprio”[83], de modo objetivo. A segunda refere-se à projeção da personalidade do homem-trabalhador, correspondendo, portanto, a uma dimensão subjetiva[84].
Para além da compatibilização entre a proteção dos trabalhadores e a dinâmica da economia de mercado, o reconhecimento do valor social do trabalho e a valorização do trabalho humano despontam como princípios imbuídos de particular potencial transformador[85]. Sua concretização é elemento essencial ao modelo de capitalismo constitucionalmente adotado, bem como veículo de realização de diversos outros postulados constitucionais, tais como a justiça social e garantia de existência digna. Lastreados na previsão constitucional, todos os trabalhadores têm direito de ver reconhecida a importância do seu labor no desenvolvimento nacional e, mais do que isso, têm direito à promoção de melhores condições de trabalho e existência, além da observância das garantias constitucionais e legais incidentes sobre as relações de trabalho. Malgrado todos os Poderes Públicos devam orientar sua atuação respectiva à realização deste princípio, é inegável o destacado papel desempenhado pelo Judiciário Trabalhista em sua concretização.
O tratamento anti-isonômico, o não pagamento das verbas trabalhistas, a prática de assédio moral[86], o desrespeito às normas de segurança e saúde do trabalho — enfim, a violação a direitos laborais específicos ou inespecíficos, na conhecida lição de PALOMEQUE LOPEZ[87] — são exemplos de manifestações de desvalorização do trabalho humano, em relação às quais a Carta Política orienta-se claramente no sentido da reprovação.
Por fim, cumpre registrar que é possível, com espeque no pensamento de RICARDO ANTÔNIO LUCAS CAMARGO, extrair quatro desdobramentos a partir do princípio da valorização do trabalho humano, a saber: o afastamento de interpretações que atentem contra a importância reconhecida ao labor como fonte de subsistência e desenvolvimento, a desconsideração de propostas hermenêuticas que visualizem o pagamento das parcelas trabalhistas como filantropia, o banimento de interpretações que redundem na elevação da desigualdade social[88] e a obstaculização de políticas e atos que impliquem aumento do desemprego[89].
Examinada a configuração jurídica do valor social do trabalho e da valorização do trabalho humano, importa seguir adiante, a fim de sistematizar as normas trabalhistas constantes no texto constitucional. É o que se fará a seguir.
4.2 O “BLOCO DE CONSTITUCIONALIDADE” DO DIREITO DO TRABALHO
A expressão “bloco de constitucionalidade” do Direito do Trabalho é utilizada por EDILTON MEIRELES para designar o conjunto de regras constitucionais disciplinadoras do labor humano[90].
Em perspectiva sistemática, classifica o autor as normas em seis grupos, que serão adiante abordados.
O primeiro grupo[91] refere-se às normas relativas às liberdades públicas, a exemplo da liberdade de eleição de profissão[92], da liberdade sindical[93] e do direito de greve[94].
O segundo grupo[95]. diz respeito aos direitos do cidadão relacionados ao trabalho, abrangendo, exemplificativamente, as normas consagradoras da igualdade formal e da material[96], o direito ao trabalho[97] e o acesso democrático a empregos públicos[98].
A terceira[99] categoria corresponde às normas assecuratórias de direitos aos trabalhadores subordinados, como o décimo terceiro salário, o FGTS e o aviso prévio proporcional ao tempo de serviço.
Num quarto bloco[100], situam-se os direitos de defesa, isto é, aqueles obstativos da atuação de terceiros voltados a inviabilizar o exercício de direitos ou interesses dos trabalhadores. São exemplos a garantia de ampla substituição processual pelos sindicatos[101], o dissídio coletivo[102] e o reconhecimento da legitimidade de entes sindicais para propositura de ações constitucionais[103].
O quinto grupo[104] diz respeito às normas regulamentadoras da política socioeconômica nacional, as quais podem ser divididas nas seguintes subcategorias: proteção do emprego (como a imposição de busca do pleno emprego[105] e a proteção do obreiro em face de desemprego decorrente da automação[106]), seguridade social (a exemplo do direito à aposentadoria[107]), política agrícola (como a proteção à moradia do trabalhador rural[108] e a densificação da função social da propriedade imóvel rural em função, também, do respeito ao bem-estar dos trabalhadores[109]), formação e qualificação profissional (como o direito à profissionalização e à educação voltada ao pleno desenvolvimento da pessoa[110]), proteção tributária (a exemplo da proibição de estabelecimento de imposto sobre o patrimônio relacionado aos fins essenciais dos entes sindicais[111]), política assistencial (como o auxílio à integração no mercado de trabalho[112]), proteção aos obreiros de baixa renda (como a assistência gratuita aos filhos menores em creches e pré-escolas[113] e o pagamento do salário-família[114]), garantias ao menor, à mulher, ao deficiente e à maternidade e paternidade (encontram-se nesta subcategoria a vedação ao trabalho infantil[115], normas de proteção ao trabalhador deficiente[116], bem como a licença-maternidade[117]), proteção da higiene, saúde e segurança (situam-se aqui as normas de proteção ao meio ambiente de trabalho[118]).
O último grupo[119] refere-se às regras de organização do Estado, de que são exemplos a definição da competência da União para legislar sobre Direito do Trabalho[120] e a garantia de participação de trabalhadores e patrões nas composições colegiadas de órgãos voltados ao debate e à decisão acerca de seus interesses profissionais ou previdenciários[121].
Verifica-se, a partir da enunciação desses dispositivos, que o constituinte decidiu dedicar importante parcela da Carta Magna à fixação de normas de proteção ao labor humano. Todavia, a realidade social da maioria da população brasileira parece indicar que as promessas de 1988 não encontram espaço no mundo dos fatos. Precisamente esta inquietação impõe o exame, a seguir, da tese da constitucionalização simbólica.
5 CONCLUSÕES
No presente trabalhou, examinou-se o que se pode denominar de Constituição do Trabalho, constatando-se a elevada estatura constitucional conferida ao princípio da valorização do trabalho humano e o reconhecimento da existência de um plexo de dispositivos relacionados à proteção do trabalhador e à promoção de sua dignidade.
Nessa ordem de ideias, o papel desempenhado pelo Poder Judiciário assume elevada importância, uma vez que não lhe é dado compactuar com eventuais movimentos de atribuição de caráter meramente simbólico a dispositivos constitucionais. Incumbe-lhe, isto sim, observar a força normativa da Constituição.
Isso significa que integra a missão reservada ao Poder Judiciário afastar funções meramente simbólicas atribuídas a dispositivos constitucionais, efetivando os conteúdos axiológicos presentes na Carta de 1988.
Tal postura aplica-se, naturalmente, também à denominada Constituição do Trabalho, devendo Judiciário (e especialmente o ramo especializado da Justiça do Trabalho) buscar a realização da prodigiosa rede de proteção ao labor humano tecida pela Carta Magna.
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[1] “Siempre habrá, pues, uns tensión, um equilibrio más o menos estable en la definición de la relación de trabajo asalariado, entre de una parte la idea de canbio de trabajo por dinero, que remite a las categorías de pensamiento del derecho de obligaciones, y de outra la idea de subordinación de la persona, que reenvía a las categorias de pensamiento del derecho de personas. (...) Tal proceso se ha llevado a cabo según formas diferentes en los distintos países, pero ha conducido en todas partes a definir una relación de trabajo asalariado, cuyo carácter jurídico no puede reducirse ni a una lógica puramente contractual y mercantil, ni a una lógica estatutaria y personal. Pero la combinación que así se há realizado no tiene nada de estable. Por el contrario, todo indica que la misma se halla hoy profundamente en entredicho por las transformaciones que no cesan de afectar a la relación de trabajo” (SUPIOT, Alain. Crítica del Derecho del Trabajo. Madrid: MTSS, 1996, p. 49-50). Imperioso destacar, ainda, a lição de HÉCTOR-HUGO BARBAGELATA: “(...) é óbvio que o Direito do Trabalho não faz parte do Direito Econômico, pois seu objeto não é simplesmente regular as relações de trabalho, mas dar proteção ao trabalho e ao trabalhador, o que não significa que não tenha conseqüências econômicas, mas que as considerações dessa natureza devem estar sujeitas à conquista de seus próprios fins” (O particularismo do Direito do Trabalho. Revisão técnica Irany Ferrari. Tradução de Edilson Alkmin Cunha. São Paulo: LTr, 1996, p. 18).
[2] Na conhecida lição de CARL SCHMITT, a “Constitución es una decisión consciente que la unidad política, a través del titular del poder constituyente, adopta por sí misma y se da a sí misma” (grifos no original) (Teoría de la Constitución. Madrid: Alianza Editorial, 2011, p. 58).
[3] Acerca da omissão das Constituições Liberais quanto à regulação da economia, pondera EROS GRAU: “As Constituições liberais não necessitavam, no seu nível (delas, Constituições liberais), dispor, explicitamente, normas que compusessem uma ordem econômica constitucional. A ordem econômica existente no mundo do ser não merecia reparos. Assim, bastava o que definido, constitucionalmente, em relação à propriedade privada e à liberdade contratual, ao quanto, não obstante, acrescentava-se umas poucas disposições veiculadas no nível infraconstitucional, confirmadoras do capitalismo concorrencial, para que se tivesse composta a normatividade da ordem econômica liberal” (grifo no original) (GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988. 14 ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 71). No mesmo sentido é a observação de CARL SCHMITT: “Las ‘viejas Constituciones’ no eran en modo alguno Constituciones que desconocieran ‘la relación del Estado con los movimentos sociales’; eran Constituciones del Estado burgués de Derecho, y contenían por eso la decisión a favor de principios de la libertad burguesa (...)” (Op. cit., p. 68)
[4] MOREIRA, Vital. Economia e Constituição: para o conceito de Constituição Económica. Coimbra, s. ed., Separata do Boletim de Ciências Económicas n.º 17, 1974, p. 35. De modo sintético, CANOTILHO define-a como “conjunto de disposições constitucionais, regras e princípios que dizem respeito à conformação da ordem fundamental da economia“ (CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7. ed., Coimbra: Almedina, 2006, p. 345). Ao seu turno, salientando o papel do Estado na economia, MARTIN BASSOLS COMA conceitua-a como “ordenación jurídica de las estructuras y relaciones económicas en las que no solo están implicados los ciudadanos, sino también, y de manera creciente, el proprio Estado en su función de protagonista del desarollo de la vida económica” (Constitución y Sistema Económico. 2 ed. Madri: Tecnos, 1988, p. 17).
[5] Op. cit., p. 123-124. Impende destacar a relevância histórica da Constituição de Weimar, que viria a influenciar a posterior configuração do constitucionalismo europeu, sendo, inclusive, decisiva para o reconhecimento de novas áreas do Direito: “La cultura jurídica de la época desarroló una importante reflexión teórica sbre este material constitucional al proprio tiempo que sistematizo y desarroló nuevas ramas del Derecho — como el Derecho Económico, el Derecho del Trabajo, y el Derecho Social — que implicaban una superación de los fundamentos tradicionales del Derecho Privado y revelaban que la Constitución no debe limitarse a regular las relaciones entre el Estado y los ciudadanos, sino también justificar las relaciones entre los ciudadanos y los poderes económicos privados o de hecho” (COMA, Martin Bassols. Op. cit., p. 30).
[6] O caso português merece uma observação. Ao ser promulgada, em 1976, a atual Constituição portuguesa possuía uma série de referências à transição para uma sociedade de índole socialista, “sem classes”. A redação originária foi alterada em 1982, na Primeira Revisão Constitucional, excluindo-se do corpo do texto tais intenções.
[7] Valiosa a ponderação de VITAL MOREIRA, no sentido de que a Constituição Econômica “não é concebida como constituição da economia, mas sim como constituição de uma ideia de economia. Embora se afaste a concepção de uma decisão livre sobre a forma económica, e se acentue o peso material da estrutura económica, não se abandona contudo a concepção de uma conformação consciente do processo económico com elemento constituinte do conceito de CE” (Op. cit., p. 27).
[8] Art. 41. L'iniziativa economica privata è libera. Non può svolgersi in contrasto con l'utilità sociale o in modo da recare danno alla sicurezza, alla libertà, alla dignità umana. La legge determina i programmi e i controlli opportuni perché l'attività economica pubblica e privata possa essere indirizzata e coordinata a fini sociali.
[9] Artículo 9 [...] 2. Corresponde a los poderes públicos promover las condiciones para que la libertad y la igualdad del individuo y de los grupos en que se integra sean reales y efectivas; remover los obstáculos que impidan o dificulten su plenitud y facilitar la participación de todos los ciudadanos en la vida política, económica, cultural y social.
[10] Artículo 38 Se reconoce la libertad de empresa en el marco de la economía de mercado. Los poderes públicos garantizan y protegen su ejercicio y la defensa de la productividad, de acuerdo con las exigencias de la economía general y, en su caso, de la planificación.
[11] Artigo 61.º Iniciativa privada, cooperativa e autogestionária 1. A iniciativa económica privada exerce-se livremente nos quadros definidos pela Constituição e pela lei e tendo em conta o interesse geral.
[12] Artigo 86.º Empresas privadas 1. O Estado incentiva a actividade empresarial, em particular das pequenas e médias empresas, e fiscaliza o cumprimento das respectivas obrigações legais, em especial por parte das empresas que prossigam actividades de interesse económico geral.
2. O Estado só pode intervir na gestão de empresas privadas a título transitório, nos casos expressamente previstos na lei e, em regra, mediante prévia decisão judicial.
3. A lei pode definir sectores básicos nos quais seja vedada a actividade às empresas privadas e a outras entidades da mesma natureza.
[13] Vale esclarecer que a “ordem econômica, parcela da ordem jurídica (mundo do dever-ser), não é senão o conjunto de normas que institucionaliza uma determinada ordem econômica (mundo do ser)” (GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988. 14 ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 70).
[14] A completa enunciação (valor social da livre iniciativa) do princípio consagrado no art. 1º, IV, para a qual frequentemente a doutrina não atenta, é que leva EROS ROBERTO GRAU a afirmar que: “Isso significa que a livre iniciativa não é tomada, enquanto fundamento da República Federativa do Brasil, como expressão individualista, mas sim no quanto expressa de socialmente valioso” (grifo no original) (GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988 (Interpretação e crítica). 9. ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 184).
[15] Oportuna a ponderação de PIETRO PERLINGIERI: “Não é possível, portanto, um discurso unitário sobre a autonomia privada: a unidade é axiológica, porque unitário é o ordenamento centrado no valor da pessoa, mas é justamente essa conformação do ordenamento que impõe um tratamento diversificado para atos e atividades que em modo diferenciado tocam essa valor e regulamentam situações ora existenciais, ora patrimoniais, ora umas e outras juntas. A necessidade da máxima aderência às particularidades de cada fattispecie (...) modula a resposta que o sistema dos valores fundamentais do ordenamento oferece a cada uma delas” (Perfis do Direito Civil: Introdução ao Direito Civil Constitucional. Tradução de Maria Cristina de Cicco. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 277).
[16] Artigo 1° - Todos os homens nascem igualmente livres e independentes, têm direitos certos, essenciais e naturais dos quais não podem, por nenhum contrato, privar nem despojar sua posteridade: tais são o direito de gozar a vida e a liberdade com os meios de adquirir e possuir propriedades, de procurar obter a felicidade e a segurança.
[17] Art.1.º Os homens nascem e são livres e iguais em direitos. As destinações sociais só podem fundamentar-se na utilidade comum.
[...]
Art. 4.º A liberdade consiste em poder fazer tudo que não prejudique o próximo: assim, o exercício dos direitos naturais de cada homem não tem por limites senão aqueles que asseguram aos outros membros da sociedade o gozo dos mesmos direitos. Estes limites apenas podem ser determinados pela lei.
Art. 5.º A lei não proíbe senão as ações nocivas à sociedade. Tudo que não é vedado pela lei não pode ser obstado e ninguém pode ser constrangido a fazer o que ela não ordene.
[18] SILVA NETO, Manoel Jorge e. Direito Constitucional Econômico. São Paulo: LTr, 2001, p. 24. Pondera, a seu turno, EDILTON MEIRELES que, ao “mesmo tempo em que a empresa cresce em complexidade, ela perde na sua totalidade (ou exaustividade) e na sua auto-suficiência, pois sua capacidade de controlar diretamente os recursos estratégicos essenciais para sua sobrevivência se coloca cada vez mais distante do seu engrandecimento. É preciso, então, descentralizar, flexiilizar. O grupo econômico surge, assim, como o ‘modelo-tipo de empresa flexível contemporânea’” (Grupo econômico trabalhista. São Paulo: LTr, 2002, p. 39).
[19] Nesse sentido: NUSDEO, Ana Maria de Oliveira. Defesa da concorrência e globalização econômica (O Controle da Concentração de Empresas). São Paulo: Malheiros, 2002, p. 234-235.
[20] TAVARES, André Ramos. Direito Constitucional Econômico. 3. ed. rev. atual. Rio de Janeiro: Forense, 2011, p. 235. Acerca das projeções decorrentes do preceito em apreço, cumpre destacar que, no âmbito da doutrina do liberalismo econômica, ele “implica a total garantia da propriedade privada, o direito de o empresário investir seu capital no ramo que considerar mais favorável e fabricar e distribuir os bem produzidos em sua empresa da forma que achar mais conveniente à realização dos lucros” (SANDRONI, Paulo. Novíssimo Dicionário de Economia. São Paulo: Editora Best Seller, 1999, p. 352).
[21] GRAU, Eros Roberto. Op. cit., p. 186-187.
[22] Ibid., p. 188.
[23] Neste sentido, assevera EDVALDO BRITO que, “considerando-se que a iniciativa econômica do particular instrumentaliza-se na autonomia privada, poderemos concluir que a Constituição, a rigor, contém princípios básicos pertinentes e que se resumem nos três seguintes: 1.º) livre iniciativa ou liberdade de iniciativa; 2.º) subordinação da livre iniciativa ao desenvolvimento econômico e ao fim social, ou seja, ao bem comum ou ao bem-estar social; 3.º) subordinação da livre iniciativa a um plano ou a um programa” (grifos no original) (Reflexos jurídicos da atuação do estado no domínio econômico: Desenvolvimento econômico. Bem-estar social. São Paulo: Saraiva, 1982, p. 109).
[24] NUSDEO, Ana Maria de Oliveira. Defesa da concorrência e globalização econômica (O Controle da Concentração de Empresas). São Paulo: Malheiros, 2002, p. 236.
[25] Nesse sentido: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI N. 7.844/92, DO ESTADO DE SÃO PAULO. MEIA ENTRADA ASSEGURADA AOS ESTUDANTES REGULARMENTE MATRICULADOS EM ESTABELECIMENTOS DE ENSINO. INGRESSO EM CASAS DE DIVERSÃO, ESPORTE, CULTURA E LAZER. COMPETÊNCIA CONCORRENTE ENTRE A UNIÃO, ESTADOS-MEMBROS E O DISTRITO FEDERAL PARA LEGISLAR SOBRE DIREITO ECONÔMICO. CONSTITUCIONALIDADE. LIVRE INICIATIVA E ORDEM ECONÔMICA. MERCADO. INTERVENÇÃO DO ESTADO NA ECONOMIA. ARTIGOS 1º, 3º, 170, 205, 208, 215 e 217, § 3º, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. 1. É certo que a ordem econômica na Constituição de 1.988 define opção por um sistema no qual joga um papel primordial a livre iniciativa. Essa circunstância não legitima, no entanto, a assertiva de que o Estado só intervirá na economia em situações excepcionais. 2. Mais do que simples instrumento de governo, a nossa Constituição enuncia diretrizes, programas e fins a serem realizados pelo Estado e pela sociedade. Postula um plano de ação global normativo para o Estado e para a sociedade, informado pelos preceitos veiculados pelos seus artigos 1º, 3º e 170. 3. A livre iniciativa é expressão de liberdade titulada não apenas pela empresa, mas também pelo trabalho. Por isso a Constituição, ao contemplá-la, cogita também da "iniciativa do Estado"; não a privilegia, portanto, como bem pertinente apenas à empresa. 4. Se de um lado a Constituição assegura a livre iniciativa, de outro determina ao Estado a adoção de todas as providências tendentes a garantir o efetivo exercício do direito à educação, à cultura e ao desporto [artigos 23, inciso V, 205, 208, 215 e 217 § 3º, da Constituição]. Na composição entre esses princípios e regras há de ser preservado o interesse da coletividade, interesse público primário. 5. O direito ao acesso à cultura, ao esporte e ao lazer, são meios de complementar a formação dos estudantes. 6. Ação direta de inconstitucionalidade julgada improcedente. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Tribunal Pleno. ADI 1950 / SP. Relator(a): Min. EROS GRAU. Julgamento: 03/11/2005. Publicação: DJ 02-06-2006 PP-00004.
[26] MARTIN BASSOLS COMA define-a como a “libertad que se reconoce a los ciudadanos para afectar o destinar bienes de cualquier tipo (principalmente de capital) para la realización de actividades económicas para la producción e intercambio de bienes y servicios conforme a las pautas o modelos de organización típicas del mundo económico contemporáneo con vistas a la obtención de un beneficio o ganância” (Constitución y Sistema Económico. 2 ed. Madri: Tecnos, 1988, p. 137).
[27] Ao ser concretizada, a liberdade de empresa pode colidir com outros direitos constitucionalmente consagrados, com particulares repercussões no tocante ao direito de greve. A temática foi analisada em FERNANDEZ, Leandro. O direito de greve como restrição à liberdade de empresa. Revista de Direito do Trabalho. Ano 38, v. 145, jan./mar. 2012, p. 247-275. Na oportunidade, propôs-se uma reformulação do conceito de greve, na iniciativa privada, visualizando-a como o “direito, titularizado por trabalhadores e sindicato, de, atuando de maneira coordenada, criar restrições ao exercício da liberdade de empresa, visando à consecução de interesses da categoria” (grifos no original) (Op. cit., p. 268).
[28] REYES, Manuel Aragón. El contenido esencial del derecho constitucional a la libertad de empresa in Libertad de empresa y relaciones laborales en España. Madri: Instituto de Estudios Económicos, 2005, p. 55.
[29] LÓPEZ, Frederico Duran. Contenidos laborales del derecho constitucional a la libertad de empresa in Libertad de empresa y relaciones laborales en España. Madri: Instituto de Estudios Económicos, 2005, p. 59.
[30] Ibidem, p. 60.
[31] Ibidem, p. 61.
[32] “[...] la libertad de empresa compreende, como decíamos, la libertad de abandonar total o parcialmente el mercado, reduciendo o suprimiendo las actividades productivas desarrolladas, o prescindiendo de trabajadores que para dicho desarrollo se habían contratado. Em estos casos, no siempre se trata de abandonar o mercado, sino que puede tratarse simplemente de reducir el número de trabajadores contratados, como consecuencia de reorganizaciones productivas, mejoras tecnológicas, aumentos de productividad, etc” (Ibidem, p. 64).
[33] Neste sentido, meditando acerca do art. 7º, inciso I, da Constituição de 1988, EDILTON MEIRELES esclarece: “[...] a primeira lição que se extrai é que é direito do trabalhador a proteção contra a despedida arbitrária ou sem justa causa. Logo, se a lei busca proteger o trabalhador contra a despedida arbitrária ou sem justa causa, assegurando-lhe esse direito social, constitucional e fundamental, é porque ela não tem como jurídica a despedida imotivada. A despedida injusta, arbitrária ou sem justa causa, portanto, ao menos a partir da Constituição Federal de 1988, passou a ser ato antijurídico, não protegido pela legislação” (Abuso do Direito na Relação de Emprego. São Paulo: LTr, 2004, p. 198). A Consolidação das Leis do Trabalho, convém ressaltar, define a despedida arbitrária como aquela que não se lastreia em “em motivo disciplinar, técnico, econômico ou financeiro”.
[34] ALMEIDA, Guilherme Assis de; BITTAR, Eduardo C. B. Curso de Filosofia do Direito. São Paulo: Atlas, 2007, p. 289.
[35] KANT, Immanuel. Crítica da razão prática. Lisboa, Portugal: Edições 70, 1994, p. 42.
[36] ALMEIDA, Guilherme Assis de; BITTAR, Eduardo C. B. Op. cit., p. 289.
[37] KANT, Immanuel. Fundamentos da metafísica dos costumes. Tradução de Lourival de Queiroz Henkel. São Paulo: Ediouro, 1997, p. 79.
[38] Exemplificativamente, a atual Constituição portuguesa dispõe, em seu art. 1º: “Portugal é uma República soberana, baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade popular e empenhada na construção de uma sociedade livre, justa e solidária”. Da mesma maneira, a Constituição espanhola consagra, em seu art. 10, 1, a dignidade humana, nos seguintes termos: “La dignidad de la persona, los derechos inviolables que le son inherentes, el libre desarrollo de la personalidad, el respeto a la ley y a los derechos de los demás son fundamento del orden político y de la paz social”. Destaque-se, ainda, a proteção à dignidade humana na Lei Fundamental da Alemanha (Grundgesetz). Sobre o tema, aduz KONRAD HESSE que o “novo ordenamento jurídico baseia-se, já desde o artigo 1º GG, no princípio supremo, absoluto e intangível da inviolabilidade da dignidade humana (art. 1.1 GG) e no reconhecimento dos direitos invioláveis e inalienáveis do homem (art. 1.2 GG).” (HESSE, Konrad. Temas Fundamentais do Direito Constitucional. Textos selecionados e traduzidos por Carlos dos Santos Almeida, Gilmar Ferreira Mendes e Inocêncio Mártires Coelho. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 29).
[39] Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
(...)
III – a dignidade da pessoa humana;
[40] ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. Trad. Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 355.
[41] Ibid., p. 359.
[42] Ibid., p. 356.
[43] Ibid., p. 357.
[44] EDILTON MEIRELES assevera que o trabalho é um dos elementos que concorrem para a efetivação da dignidade humana, in verbis: “(...) inúmeros direitos fundamentais, e até a vida com dignidade, dependem do trabalho, pois sem a renda que lhes é proporcionada, numa sociedade capitalista, dificilmente o indivíduo alcança satisfatoriamente a realização dos seus direito mínimos. O trabalho, portanto, está a serviço da dignidade humana” (A Constituição do trabalho: o trabalho na constituição da Alemanha, Brasil, Espanha, França, Itália e Portugal. São Paulo: LTr, 2012, p. 31).
[45] SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituição Federal de 1988. 8. ed. rev. atual. e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010, p. 70.
[46] GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil. vol. IV: contratos, tomo 1: teoria geral. 2 ed. rev., atual. e reform. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 29.
[47] Sustenta VITAL MOREIRA que a Constituição Econômica pressupõe “um espírito econômico, segundo o qual a economia é posta ao serviço do homem, ao qual, qualquer que seja a sua posição no processo económico — capitalista, empresário, trabalhador, consumidor — cabe, em virtude de sua dignidade e do seu sentido criador, o primeiro lugar” (Economia e Constituição: para o conceito de Constituição Económica. Coimbra, s. ed., Separata do Boletim de Ciências Económicas n.º 17, 1974, p. 25). Obtempera, a seu turno, VIDAL SERRANO NUNES JR. que “(...) toda e qualquer atividade econômica só pode validamente desenvolvida em consonância com tal princípio de conformação, o que implica a vedação ex vi constitutionis de toda e qualquer atividade econômica que vulnere a dignidade da pessoa humana” (A cidadania social na Constituição de 1988: estratégias de positivação e exigibilidade judicial dos direitos sociais. São Paulo: Editora Verbatim, 2009, p. 163).
[48] Quanto à conveniência no emprego da expressão “geração” ou “dimensão”, relativamente aos direitos fundamentais, aduz PAULO BONAVIDES: “o vocábulo ‘dimensão’ substitui, com vantagem lógica e qualitativa, o termo ‘geração’, caso este último venha a induzir apenas sucessão cronológica e, portanto, suposta caducidade dos direitos das gerações antecedentes, o que não é verdade.” (BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 14. ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 571-572).
[49] FERREIRA, Marcus Moura. O direito ao trabalho no conjunto mais amplo dos direitos humanos. Aspectos de sua proteção jurídica no direito constitucional brasileiro. Revista do Tribunal Superior do Trabalho. Brasília, vol. 66, nº. 3, jul./set. 2000, p. 57.
[50] GRAU, Eros Roberto. Op. cit., p. 181
[51] Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;
(...)
[52] Art. 193. A ordem social tem como base o primado do trabalho, e como objetivo o bem-estar e a justiça sociais.
[53] Art. 3º (...)
(...)
III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;
Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
(...)
VII - redução das desigualdades regionais e sociais;
[54] SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 27. ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 789.
[55] GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988 (Interpretação e crítica). 9. ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 200. “A única base sobre a qual uma sociedade pode viver é o fortalecimento de seu caráter comunitário, que exige reafirmar seu passado, reconhecer os limites dos recursos e a prioridade das necessidades sobre os desejos e compartilhar uma concepção da equidade que dê às pessoas a sensação de justiça e de integração na sociedade” (CORTINA, Adela. Ética sem moral. Tradução de Marcos Marcionilo. São Paulo: Martins Fontes, 2010, p. 142).
[56] “Desde logo, a comunidade económica não é uma estrutura de relações entre coisas ou processos técnico-naturais; uma comunidade económica só pode existir entre pessoas, entre os sujeitos económicos — capitalistas, empresários, trabalhadores, consumidores. A existência de uma tal relação só existe, contudo, quando a interdependência dos vários sujeitos económicos tenha atingido tal densidade (Dicht), quand o processo de socialização na satisfação das necessidades sociais tenha atingido um tal grau, que exista uma verdadeira solidariedade entre os membros de uma economia nacional” (grifos no original) (MOREIRA, Vital. Economia e Constituição: para o conceito de Constituição Económica. Coimbra, s. ed., Separata do Boletim de Ciências Económicas n.º 17, 1974, p. 24).
[57] SILVA, José Afonso da. Op. cit., p. 122.
[58] SANDRONI, Paulo. Novíssimo Dicionário de Economia. São Paulo: Editora Best Seller, 1999, p. 118/119.
[59] TAVARES, André Ramos. Direito Constitucional Econômico. 3. ed. rev. atual. Rio de Janeiro: Forense, 2011, p. 256.
[60] Discorrendo acerca da crise do liberalismo, EDVALDO BRITO observa, com lucidez, que as configurações assumidas pelo Estado após a I Guerra Mundial são fonte da “(...) reação contra o Estado do liberalismo econômico, determinada por diversos fatos que em síntese podem ser exemplificados: no desmentido oposto pelos fatos às premissas do liberalismo econômico; nos desequilíbrios contínuos gerados pela livre concorrência, ao invés do equilíbrio automático da oferta e da procura; a inexistência da garantia da justa renda, do justo preço, do justo lucro, do justo salário diante da concentração de capitais e do capitalismo de grupos; e, aproveitando-se das facilidades que lhes eram dadas pelo regime de iniciativa privada, sem o devido controle por via de qualquer regulamentação, os fortes oprimiam os fracos. Tudo isto resultou em se defender, em lugar da liberdade que oprimia, a intervenção que libertaria.” (BRITO, Edvaldo. Reflexos jurídicos da atuação do estado no domínio econômico: Desenvolvimento econômico. Bem-estar social. São Paulo: Saraiva, 1982, p. 19). A seu tempo, referindo-se ao processo histórico de consagração dos direitos difusos, MÁRCIO MAFRA LEAL aduz que “outro sério questionamento a respeito da preponderância da lógica do mercado dizia respeito à visão de curto prazo na obtenção de resultados e de eficiência, característica do interesse econômico, porém deletéria de outros valores que, em longo prazo, acabariam por eliminar as vantagens econômicas já obtidas.” (. Ações coletivas: História, teoria e prática. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1998, p. 99).
[61] SILVA NETO, Manoel Jorge e. Curso de Direito Constitucional. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, p. 607. WALDO FAZZIO JÚNIOR, a seu tempo, observa que: “A densificação da livre iniciativa só pode configurar-se em toda sua extensão num mercado em que se observa a livre concorrência, até porque a liberdade de atuação no mercado decorre do equilíbrio entre os que nele interagem.” (FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Manual de Direito Comercial. 10 ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 99).
[62] SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 27. ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 795
[63] A respeito do alcance da expressão “trabalho”, leciona EDILTON MEIRELES: “Quando o homem realiza uma atividade em que é considerada em si mesma e em seu resultado (utilidade passível de apropriação por outrem), temos a atividade-trabalho” (A Constituição do trabalho: o trabalho na constituição da Alemanha, Brasil, Espanha, França, Itália e Portugal. São Paulo: LTr, 2012, p. 22).
[64] Neste sentido obtempera JORGE LUIZ SOUTO MAIOR: “Assim, sem trabalho o homem não se realiza e sem um sistema equilibrado de divisão do trabalho a sociedade não se forma, ou tende à extinção. Os aspectos econômicos que envolvem o trabalho, portanto, apesar de relevantes, perdem sentido e deixam de ser importantes quando se imagina se imagina que o preço do sucesso econômico possa ser a própria extinção da sociedade, com a desvalorização do trabalho” (grifos no original) (O Direito do Trabalho como instrumento de justiça social. São Paulo: LTr, 2000, p. 103).
[65] “O trabalho é, conforme a experiência, um valor moral aceito pelas sociedades contemporâneas e possui em si dupla função: primeiro, é uma das formas de se revelar e atingir o ideal de dignidade humana, além de promover a inserção social; segundo, é elemento econômico indispensável, direta ou indiretamente, para que haja crescimento” (BOCORNY, Leonar Raupp. A valorização do trabalho humano do Estado Democrático de Direito. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2003, p. 71).
[66] “O valor trabalho, porém, acabou por se impor por conta da revolução industrial. Isso porque, por razões aparentemente opostas, o novo sistema econômico percebeu que era importante difundir a ideologia da valorização do trabalho para obter a mão-de-obra necessária à produção da riqueza e, ao mesmo tempo, percebeu mais tarde que era necessário que a classe trabalhadora se tornasse consumidora da produção. O trabalho, então começa a ser enaltecido, seja, inicialmente e de forma maquiavélica, para exploração do labor humano, seja, num segundo momento, para assegurar o mercado consumidor” (MEIRELES, Edilton. Op. cit., p. 26).
[67] Precisamente por isso, GONZALO MAESTRO BUELGA considera a Constituição do Trabalho como núcleo da Constituição material do Estado Social: “En nuestra opinión, la constitución del trabajo, especialmente en el Estado social, viene determinada por este. Más aún, cuando el Estado social articula su definición y actuación sobre la integración del conflicto social, la constitución del trabajo constituye el núcleo de su constitución material” (La constitución del trabajo en el Estado Social. Granada: Comares, 2002, p. 06).
[68] MEIRELES, Edilton. Op. cit., p. 19.
[69] Neste sentido: BARBAGELATA , Héctor-Hugo. O particularismo do Direito do Trabalho. Revisão técnica Irany Ferrari. Tradução de Edilson Alkmin Cunha. São Paulo: LTr, 1996, p. 18.
[70] Art. 1
L'Italia è una Repubblica democratica, fondata sul lavoro.
La sovranità appartiene al popolo, che la esercita nelle forme e nei limiti della Costituzione.
[71] Art. 4
La Repubblica riconosce a tutti i cittadini il diritto al lavoro e promuove le condizioni che rendano effettivo questo diritto.
Ogni cittadino ha il dovere di svolgere, secondo le proprie possibilità e la propria scelta, un'attività o una funzione che concorra al progresso materiale o spirituale della società.
[72] Art. 35.
La Repubblica tutela il lavoro in tutte le sue forme ed applicazioni.
Cura la formazione e l'elevazione professionale dei lavoratori.
Promuove e favorisce gli accordi e le organizzazioni internazionali intesi ad affermare e regolare i diritti del lavoro.
Riconosce la libertà di emigrazione, salvo gli obblighi stabiliti dalla legge nell'interesse generale, e tutela il lavoro italiano all'estero.
[73] Art. 36.
Il lavoratore ha diritto ad una retribuzione proporzionata alla quantità e qualità del suo lavoro e in ogni caso sufficiente ad assicurare a sé e alla famiglia un'esistenza libera e dignitosa.
La durata massima della giornata lavorativa è stabilita dalla legge.
Il lavoratore ha diritto al riposo settimanale e a ferie annuali retribuite, e non può rinunziarvi.
[74] Art. 46.
Ai fini della elevazione economica e sociale del lavoro in armonia con le esigenze della produzione, la Repubblica riconosce il diritto dei lavoratori a collaborare, nei modi e nei limiti stabiliti dalle leggi, alla gestione delle aziende.
[75] Artigo 58.º - Direito ao trabalho
1. Todos têm direito ao trabalho.
2. Para assegurar o direito ao trabalho, incumbe ao Estado promover:
a) A execução de políticas de pleno emprego;
b) A igualdade de oportunidades na escolha da profissão ou género de trabalho e condições para que não seja vedado ou limitado, em função do sexo, o acesso a quaisquer cargos, trabalho ou categorias profissionais;
c) A formação cultural e técnica e a valorização profissional dos trabalhadores.
[76] Artigo 59.º - Direitos dos trabalhadores
1. Todos os trabalhadores, sem distinção de idade, sexo, raça, cidadania, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, têm direito:
a) À retribuição do trabalho, segundo a quantidade, natureza e qualidade, observando-se o princípio de que para trabalho igual salário igual, de forma a garantir uma existência condigna;
b) A organização do trabalho em condições socialmente dignificantes, de forma a facultar a realização pessoal e a permitir a conciliação da actividade profissional com a vida familiar;
c) A prestação do trabalho em condições de higiene, segurança e saúde;
d) Ao repouso e aos lazeres, a um limite máximo da jornada de trabalho, ao descanso semanal e a férias periódicas pagas;
e) À assistência material, quando involuntariamente se encontrem em situação de desemprego;
f) A assistência e justa reparação, quando vítimas de acidente de trabalho ou de doença profissional.
2. Incumbe ao Estado assegurar as condições de trabalho, retribuição e repouso a que os trabalhadores têm direito, nomeadamente:
a) O estabelecimento e a actualização do salário mínimo nacional, tendo em conta, entre outros factores, as necessidades dos trabalhadores, o aumento do custo de vida, o nível de desenvolvimento das forças produtivas, as exigências da estabilidade económica e financeira e a acumulação para o desenvolvimento;
b) A fixação, a nível nacional, dos limites da duração do trabalho;
c) A especial protecção do trabalho das mulheres durante a gravidez e após o parto, bem como do trabalho dos menores, dos diminuídos e dos que desempenhem actividades particularmente violentas ou em condições insalubres, tóxicas ou perigosas;
d) O desenvolvimento sistemático de uma rede de centros de repouso e de férias, em cooperação com organizações sociais;
e) A protecção das condições de trabalho e a garantia dos benefícios sociais dos trabalhadores emigrantes;
f) A protecção das condições de trabalho dos trabalhadores estudantes.
3. Os salários gozam de garantias especiais, nos termos da lei.
[77] Artículo 35
Todos los españoles tienen el deber de trabajar y el derecho al trabajo, a la libre elección de profesión u oficio, a la promoción a través del trabajo y a una remuneración suficiente para satisfacer sus necesidades y las de su familia, sin que en ningún caso pueda hacerse discriminación por razón de sexo.
La ley regulará un estatuto de los trabajadores.
[78] Artículo 40
Los poderes públicos promoverán las condiciones favorables para el progreso social y económico y para una distribución de la renta regional y personal más equitativa, en el marco de una política de estabilidad económica. De manera especial realizarán una política orientada al pleno empleo.
Asimismo, los poderes públicos fomentarán una política que garantice la formación y readaptación profesionales; velarán por la seguridad e higiene en el trabajo y garantizarán el descanso necesario, mediante la limitación de la jornada laboral, las vacaciones periódicas retribuidas y la promoción de centros adecuados.
[79] Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
(...)
IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
[80] Art. 193. A ordem social tem como base o primado do trabalho, e como objetivo o bem-estar e a justiça sociais.
[81] JOSÉ AFONSO DA SILVA sustenta que: “(...) embora capitalista, a ordem econômica dá prioridade aos valores do trabalho humano sobre todos os demais valores da economia de mercado.” (SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 27. ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 788). Conquanto tal afirmação revele importante reconhecimento doutrinário da especial valorização que se deve destinar ao desenvolvimento das atividades laborais, não é possível, para aqueles que adotam a noção de princípio proposta por ALEXY, acompanhar a assertiva do autor brasileiro. Isto porque fazê-lo significaria admitir a existência de uma relação de precedência incondicionada entre princípios, o que frontalmente se contrapõe à idéia de princípios como normas que determinam que algo deve ser realizado na maior medida possível, de acordo com as condições fáticas e jurídicas do caso concreto. Não há princípios absolutos. Diante de inevitáveis tensões entre princípios, o jurista deverá proceder ao sopesamento, buscando a concordância prática entre eles e a máxima realização possível, no caso particular, de cada um dos princípios colidentes. A relação de precedência entre princípios é sempre relativa e dependente das peculiaridades do caso específico.
[82] SILVA NETO, Manoel Jorge. Direito Constitucional Econômico. São Paulo: LTr, 2001, p. 96. No mesmo sentido, pondera EDILTON MEIRELES que “(...) é através do trabalho que o homem se vê, exterioriza-se, realiza-se e se coloca diante dos outros” (A Constituição do trabalho: o trabalho na constituição da Alemanha, Brasil, Espanha, França, Itália e Portugal. São Paulo: LTr, 2012, p. 21).
[83] MEIRELES, Edilton. Op. cit., p. 32.
[84] Ibidem, p. 32.
[85] GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988 (Interpretação e crítica). 9. ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 182. Referindo-se ao sentido atribuído à valorização do trabalho humano, LEONARDO BOCORNY afirma que “(...) o grande avanço do significado do conceito que se deu no último século foi no sentido de se admitir o trabalho (e o trabalhador) como principal agente de transformação da economia e meio de inserção social, por isso, não pode ser excluído do debate relativo às mudanças das estruturas de uma sociedade” (A valorização do trabalho humano do Estado Democrático de Direito. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2003, p. 42).
[86] RODOLFO PAMPLONA FILHO leciona que o assédio moral consiste em “uma conduta abusiva, de natureza psicológica, que atenta contra a dignidade psíquica do indivíduo, de forma reiterada, tendo por efeito a sensação de exclusão do ambiente e do convívio social” (Noções conceituais sobre o assédio moral na relação de emprego. Disponível em: http://www.faculdadebaianadedireito.com/artigosCompleto.asp?artigos_codigo=21. Acesso em: 09/05/2012, p. 02).
[87] LOPEZ, Manuel Carlos Palomeque. Derechos fundamentales generales y relacion laboral: los derechos laborales inespecíficos in El Modelo Social en la Constitución Española de 1978. Antonio V. Sempere Navarro (Director). Madri: Ministerio de Trabajo y Asuntos Sociales, 2003, p. 229.
[88] Obtempera EDILTON MEIRELES que esta conseqüência, de outra parte, “decorreria do princípio da valorização do trabalho humano em sua vertente impeditiva do retrocesso social, ao lado dos objetivos fundamentais da República de construção de uma sociedade justa e solidária livre de desigualdades sociais e da pobreza” (A Constituição do trabalho: o trabalho na constituição da Alemanha, Brasil, Espanha, França, Itália e Portugal. São Paulo: LTr, 2012, p. 33-34). O princípio da vedação ao retrocesso social, vale esclarecer, torna “insusceptíveis de rebaixamento os níveis sociais já alcançados e protegidos pela ordem jurídica, seja por meio de normas supervenientes, seja por intermédio de interpretação restritiva” (REIS, Daniela Muradas. O princípio da vedação do retrocesso jurídico e social no Direito Coletivo do Trabalho in Revista Síntese Trabalhista e Previdenciária. São Paulo, v. 22, 2011, p. 84).
[89] CAMARGO, Ricardo Antônio Lucas. Ordem jurídico-econômica e trabalho. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1998, p. 55-68.
[90] MEIRELES, Edilton. Op. cit., p. 118.
[91] Ibidem, p. 118.
[92] Art. 5º (omissis) XIII - é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer;
[93] Art. 8º É livre a associação profissional ou sindical, observado o seguinte: (...)
[94] Art. 9º É assegurado o direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender.
[95] Ibidem, p. 118.
[96] Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
(...)
XX - proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos termos da lei;
(...)
XXX - proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil;
XXXI - proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência;
XXXII - proibição de distinção entre trabalho manual, técnico e intelectual ou entre os profissionais respectivos;
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
(...)
VIII - a lei reservará percentual dos cargos e empregos públicos para as pessoas portadoras de deficiência e definirá os critérios de sua admissão;
(...)
X - a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o § 4º do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices;
XI - a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderão exceder o subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, aplicando-se como li-mite, nos Municípios, o subsídio do Prefeito, e nos Estados e no Distrito Federal, o subsídio mensal do Governador no âmbito do Poder Executivo, o subsídio dos Deputados Estaduais e Distritais no âmbito do Poder Legislativo e o sub-sídio dos Desembargadores do Tribunal de Justiça, limitado a noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento do subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tri-bunal Federal, no âmbito do Poder Judiciário, aplicável este limite aos membros do Ministério Público, aos Procuradores e aos Defensores Públicos;
[97] Art. 7º (omissis) I - relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos;
[98] Art. 37. (omissis) I - os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei, assim como aos estrangeiros, na forma da lei;
[99] Ibidem, p. 119.
[100] Ibidem, p. 119-120.
[101] Art. 8º (omissis) III - ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas;
[102] Art. 114 (omissis) § 2º Recusando-se qualquer das partes à negociação coletiva ou à arbitragem, é facultado às mesmas, de comum acordo, ajuizar dissídio coletivo de natureza econômica, podendo a Justiça do Trabalho decidir o conflito, respeitadas as disposições mínimas legais de proteção ao trabalho, bem como as convencionadas anteriormente.
[103] Art. 103. Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade:
IX - confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional.
[104] Ibidem, p. 120-125.
[105] Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
(...)
VIII - busca do pleno emprego;
[106] Art. 7º (omissis) XXVII - proteção em face da automação, na forma da lei;
[107] Art. 7º(omissis) XXIV - aposentadoria;
[108] Art. 187. A política agrícola será planejada e executada na forma da lei, com a participação efetiva do setor de produção, envolvendo produtores e trabalhadores rurais, bem como dos setores de comercialização, de armazenamento e de transportes, levando em conta, especialmente:
(...)
VII - a eletrificação rural e irrigação;
VIII - a habitação para o trabalhador rural.
[109] Art. 186. A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos:
(...)
III - observância das disposições que regulam as relações de trabalho;
IV - exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.
[110] Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.
[111] Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
(...)
VI - instituir impostos sobre:
(...)
c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei;
(...)
§ 4º - As vedações expressas no inciso VI, alíneas "b" e "c", compreendem somente o patrimônio, a renda e os serviços, relacionados com as finalidades essenciais das entidades nelas mencionadas.
[112] Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
(...)
III - a promoção da integração ao mercado de trabalho;
[113] Art. 7º (omissis) XXV - assistência gratuita aos filhos e dependentes desde o nascimento até 5 (cinco) anos de idade em creches e pré-escolas;
[114] Art. 7º (omissis) XII - salário-família pago em razão do dependente do trabalhador de baixa renda nos termos da lei;
[115] Art. 7º (omissis) XXXIII - proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos;
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
§ 3º - O direito a proteção especial abrangerá os seguintes aspectos:
I - idade mínima de quatorze anos para admissão ao trabalho, observado o disposto no art. 7º, XXXIII;
[116] Art. 7º (omissis) XXXI - proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência;
Art. 227. (omissis) § 1º O Estado promoverá programas de assistência integral à saúde da criança, do adolescente e do jovem, admitida a participação de entidades não governamentais, mediante políticas específicas e obedecendo aos seguintes preceitos:
(...)
II - criação de programas de prevenção e atendimento especializado para as pessoas portadoras de deficiência física, sensorial ou mental, bem como de integração social do adolescente e do jovem portador de deficiência, mediante o treinamento para o trabalho e a convivência, e a facilitação do acesso aos bens e serviços coletivos, com a eliminação de obstáculos arquitetônicos e de todas as formas de discriminação.
[117] Art. 7º (omissis) XVIII - licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte dias;
[118] Art. 7º (omissis) XXII - redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança;
Art. 200. Ao sistema único de saúde compete, além de outras atribuições, nos termos da lei:
(...)
II - executar as ações de vigilância sanitária e epidemiológica, bem como as de saúde do trabalhador;
(...)
VIII - colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do trabalho.
[119] Ibidem, p. 125.
[120] Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:
I - direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho;
[121] Art. 10. É assegurada a participação dos trabalhadores e empregadores nos colegiados dos órgãos públicos em que seus interesses profissionais ou previdenciários sejam objeto de discussão e deliberação.
Juiz do Trabalho Substituto no Tribunal Regional do Trabalho da Sexta Região. Mestre em Relações Sociais e Novos Direitos pela Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia. Especialista em Direito e Processo do Trabalho pelo JusPodivm/BA. Diretor de Prerrogativas da Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da Sexta Região -- AMATRA VI (gestão 2018/2020). Professor. Membro do Instituto Baiano de Direito do Trabalho (IBDT).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: TEIXEIRA, Leandro Fernandez. A Constituição Econômica e a Constituição do Trabalho Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 11 jul 2019, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/53160/a-constituicao-economica-e-a-constituicao-do-trabalho. Acesso em: 23 dez 2024.
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