LELAND BARROSO DE SOUZA
(Orientador)
RESUMO: O presente artigo aborda o tema Reverão de Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal pelo Congresso Nacional. Como metodologia de trabalho, foi realizada uma pesquisa de cunho bibliográfico, na literatura pertinente, com uma abordagem exploratória e resultados qualitativos. O trabalho foi dividido em três capítulos, onde primeiramente foi analisado o Controle da Constitucionalidade, suas normas, formas e eficácia, no segundo capítulo foi apresentada a Reversão Jurisprudencial por reação legislativa e por fim no terceiro capítulo foi apresentado um caso concreto relativo ao tema abordado. O conteúdo apresentado, assim como a metodologia empregada visou uma avaliação da Reversão do STF da ótica de jurisprudência.
Palavras-chave: Reverão; Jurisprudência; Supremo Tribunal Federal; Congresso Nacional.
ABSTRACT: This article deals with the theme "Review the Jurisprudence of the Federal Supreme Court by the National Congress. As a working methodology, a bibliographical research was carried out, in the pertinent literature, with an exploratory approach and qualitative results. The work was divided in three chapters, where the Constitutionality Control, its norms, forms and effectiveness were first analyzed, in the second chapter the Jurisprudential Reversal is presented by legislative reaction and finally in the third chapter a concrete case is presented regarding the subject addressed. The content presented, as well as the methodology employed, aimed at an evaluation of the STF Reversal from the point of view of jurisprudence.
Keywords: Reversion; Jurisprudence; Supreme Federal Court; National Congress.
SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Equilíbrio e Gestão da Constitucionalidade. 2.1. A hierarquia das normas no ordenamento Jurídico. 2.2. Controle de Constitucionalidade: Conceito e Formas. 2.3. Efeito e eficácia do Controle de Constitucionalidade. 3. REVERSÃO JURISPRUDENCIAL POR REAÇÃO LEGISLATIVA. 4. ANALISE DE CASO CONCRETO - ADI´s 4430, 4795 E 5051. 5. Análise Conclusiva. 6. Referências bibliográficas.
INTRODUÇÃO
O Supremo Tribunal Federal – STF desempenha um papel de grande importância no cenário político do ordenamento jurídico consuetudinário do país. É o órgão máximo do Judiciário, sendo, portanto, responsável pela guarda da constituição, dentre outras competências, como o julgamento da ação direta de inconstitucionalidade, descumprimentos de lei.
A convergência entre o papel político desempenhado pelo STF e o fato deste ser um Tribunal de última instância, constitui um agravante na identificação de uma linha interpretativa do Tribunal em relação a diversos temas. Esta temática ganha relevância quando relacionada aos casos de ocorrência de reversão de jurisprudência, quando há por parte do Tribunal uma revisão do entendimento consolidado em julgados anteriores e adoção de um novo posicionamento que pode ser parcial ou totalmente contrário ao sedimentado em seus precedentes.
O termo “jurisprudência consolidada” pode ser entendido como sendo um compêndio de decisões com tese de solução única na aplicação e na resolução de casos variados, por um período específico que compreende o necessário para a criação de uma imagem ou de uma expectativa acerca da solução de um litígio.
Portanto, é fato conhecido que a jurisprudência consolidada gera certo grau de expectativa na sociedade, por conta da contiguidade da interpretação acerca da aplicabilidade de uma determinada tese, cuja eficácia tenha sido constatada em outros casos. Essa expectativa acaba por servir de referência acerca do desempenho dos atores jurídicos envolvidos no processo, tais como juízes, tribunais inferiores, demais poderes e até normas de conduta em maior ou menor escala.
Desta forma é natural uma possível quebra, ou que este cenário ganhe proporções de insegurança jurídica, mediante uma não previsibilidade da atuação da Corte. Essa inconsistência entre a estabilidade e o dinamismo jurisprudencial é um item intrínseco à própria função interpretativa, sendo passível a identificação de formas de amortização dos possíveis impactos negativos ocasionados pela mutação jurisprudencial.
Considera-se que, dado o desempenho político central e suas respectivas competências outorgadas na revisão de precedentes, o STF possui um ônus argumentativo mais amplo.
Quanto à segurança jurídica, é necessário que a Corte demonstre as justificativas para escolha dos elementos que culminaram numa alteração da postura até então adotada, além da fundamentação de sua decisão frente ao caso concreto. Esta mudança de postura costuma ocorrer, seja por conta de peculiaridades do caso ou por alterações no ordenamento jurídico. Entretanto para que se considere que houve a manutenção da coerência decisória e segurança jurídica, esta alteração deve ocorrer de forma coerente, com a devida argumentação lógica e embasamento jurídico, além de clareza e de explicitação das razões que levaram à reversão.
Desta forma, destaca-se a importância do entendimento da forma como se constitui a jurisprudência desse Tribunal e de forma particular sobre sua transformação, com base numa análise e entendimento acerca da coerência argumentativa necessária para as tomadas de decisões nesse âmbito.
2. EQUILÍBRIO E GESTÃO DA CONSTITUCIONALIDADE
2.1 Hierarquia e ordenação das normas no ordenamento Jurídico
Um dos elementos-chave para a existência de um determinado nível de controle dentro um conjunto de processos é a parametrização. E para que haja uma compreensão das normas no sistema jurídico é importante conhecer os critérios relevantes na construção da hierarquia de comandos de legalidade.
É fato conhecido a peculiar competência da área de Direito de auto regularização, porquanto é uma característica intrínseca de uma determinada norma a capacidade de determinar tanto o processo de produção, quanto o conteúdo de outra norma (NOVELINO, 2013).
A partir do conceito de supra-infra-ordenação de Hans Kelsen, a norma superior é reguladora do processo de produção da norma inferior, assim como de sua validação, desde que respeitada à forma de prescrição definida pela norma superior. Deste modo, a determinação por uma norma do processo de elaboração de outra norma é indicativa de sua posição hierarquicamente superior.
Este parâmetro, entretanto, é questionado quando da ocorrência de uma norma cuja criação esteja associada a parâmetros distintos, ou mesmo nos casos em que mais de uma norma tenha obediência a um exclusivo regramento de formação. Para os dois casos, estabelece-se um nível de superioridade a partir da existência de conflito entre as normas, onde se parte da premissa de que somente a primeira possui validade.
Para Novelino o entendimento é escorreitamente apresentado, a ver:
Na classificação proposta haverá hierarquia todas as vezes em que a forma de elaboração ou o conteúdo de uma norma forem determinados por outra. Para que seja validada, a norma deverá ser elaborada em conformidade com o seu fundamento de validade. A subordinação jurídica implica a prevalência da norma superior sobre a inferior sempre que houver um conflito entre elas (NOVELINO, 2013, p.218).
A ordenação das normas pode ser analisada a partir de distintos patamares. Na esfera federal, a Constituição da República Federativa Brasileira representa o posto máximo, sendo fato notório que neste campo não há hierarquias jurídicas dentre suas normas, independentemente de suas naturezas, original ou derivada. A partir do estabelecimento de uma equiparação entre emendas constitucionais, são, portanto, atendidos os respectivos tratados e convenções internacionais, cuja aprovação ocorre na Casa do Congresso Nacional, por dois turnos de votação e por pelo menos três quintos dos membros, conforme o §3º do art. 5º da CRFB/88. (BRASIL/1988).
No nível hierarquicamente abaixo, encontram-se os atos normativos primários que apresentam supedâneo direto constitucional (leis ordinárias, delegadas, complementares, decretos legislativos, medidas provisórias e outras resoluções). Também se encontram tratados e convenções internacionais, cujo teor não contemple questões relacionadas aos direitos humanos.
Por fim, no nível ligeiramente inferior, encontram-se os decretos regulamentares de cunho do Poder Executivo, ou atos normativos secundários, cujo proposito é a facilitação do processo de cumprimento e execução das leis. Estes atos normativos obtêm fundamentação de validade a partir das próprias leis que se propõem regulamentar, mas a que devem subordinação. Possuem ainda fundamentação indireta na Carta Magna.
No âmbito estadual, estão as Constituições Estaduais, que se encontram hierarquicamente em patamar abaixo da Constituição da República Federativa Brasileira. Devem, portanto, submissão aos seus princípios e normas de observância. As Constituições Estaduais encontram-se, entretanto, em um patamar acima em relação às legislações estaduais e municipais. Em relação à lei orgânica do munícipio, existem pontos de vista diferentes, havendo uma parcela de defensores da ideia de igualdade hierárquica, sob a defesa de garantia da autonomia dos entes. A doutrina possui a premissa de que a lei orgânica está sob julgo de obediência da Constituição Estadual do referido ente federativo, caracterizando um sistema de hierarquia entre normativas justificadas materialmente (SARMENTO/2012).
Na esfera municipal, encontram-se por ordem hierárquica, no topo, a Constituição Federal, abaixo as Constituições Estaduais, mais abaixo as leis orgânicas do Municípios e na base as leis municipais ordinárias e complementares. Para casos em que haja divergência de interesses entre a lei orgânica e demais leis municipais, este se resolve a partir da legalidade.
Visto que a Constituição Federal se constitui como fundamento imediato de legitimidade das leis em todas as esferas, não se identifica uma ordem hierárquica entre os níveis federativos. Esta tem por estabelecido uma sistemática de repartição horizontal de competências, onde casos de usurpação de competência legislativa entre entes acarreta transgressão constitucional, independente da classificação hierárquica entre ambos.
Continentino explica:
Os sujeitos políticos brasileiros são servos do texto constitucional, devendo, assim, atuar em conformidade à rígida distribuição de competências. Um não pode se aventurar em searas normativa e administrativa reservadas constitucionalmente ao outro Ente. Um não pode usurpar do outro sua competência constitucional. Daí, a conclusão é simples e de clareza solar: não é pelo fato de uma lei emanar do Órgão legislativo da União Federal (Congresso Nacional) que gozará de supremacia sobre uma lei confeccionada pelo Órgão legislativo municipal (Câmara de Vereadores). Se o legislador federal invadir o campo de competência legislativa reservado constitucionalmente à atuação do legislador municipal, a lei federal será inconstitucional (inconstitucionalidade formal orgânica), ou seja, inválida em nosso ordenamento jurídico (CONTINENTINO, 2012 p.2).
Ao serem verificados possíveis conflitos normativos, a competência para anulação de normas cuja edição não obedeça ao prescrito para e por ordens hierarquicamente superiores, cabe somente a alguns órgãos. Para os casos de conflito com a Constituição, a declaração da inconstitucionalidade pode ser realizada por qualquer juiz ou tribunal.
Nos casos em que seja configurado o conflito com a Constituição, cabe a um juiz ou tribunal a constatação da inconstitucionalidade por intermédio do controle difuso. Nestes casos, a verificação terá validade, somente para o caso concreto objeto da decisão. Quanto à competência, para referir à inconstitucionalidade em termos abstratos da norma, retirando-a do ordenamento, esta é restringida apenas ao STF, desde que em exercício do monitoramento de constitucionalidade, no controle concentrado, com efeito Erga omnes.
2.2 Controle de Constitucionalidade: Conceitos e Formas
Quanto à sua definição conceitual, uma gestão de constitucionalidade está vinculada à Constituição Federal e sua predominância sobre o ordenamento jurídico, assim como a austeridade constitucional e a manutenção de direitos elementares. Em um primeiro momento, constitui um pressuposto vital a manutenção da supremacia constitucional o escalonamento das normas do ordenamento, visto que, dada a posição de primazia da Constituição Federal, constitui um arcabouço referencial para elaboração legislativa e limitação de conteúdo ordinário das normas.
Outro fator a ser considerado é a inflexibilidade constitucional no estabelecimento de procedimentos de maior solenidade, tornando o processo de alteração constitucional mais dificultoso e conferindo um status de superioridade à Constituição em relação às normas ditadas pelo Legislativo no exercício da função ordinária.
A interseção entre o controle e a rigidez constitucional é de tal forma acentuada que no Estado onde não existe este controle, automaticamente a Constituição acabará por adquirir alto nível de flexibilidade, ainda que se autodenomine rígida, enquanto o poder constituinte derivado encontrar-se-á em estado livre para o legislador.
Com relação à supremacia dos direitos e garantias fundamentais, afirma Moraes:
O controle configura-se, portanto, como uma garantia de supremacia dos direitos e garantias fundamentais previstos na constituição que configuraram limites ao poder do Estado, e também compõe uma parte da legitimação do próprio Estado, determinando, portanto seus deveres e tornando possível o processo democrático em um Estado de Direito (MORAES/2010 p.71).
Em termos conceituais o controle da constitucionalidade representa conferir a correspondência de um ato normativo com a Constituição Federal, assegurando a invariabilidade de seus requisitos formais e materiais, tarefa esta, que cabe inicialmente a órgãos específicos. Desta forma, a operação dos possíveis controles de leis e atos normativos ocorre a partir de elementos e momentos distintos.
Quanto aos aspectos temporais, o controle pode ser preventivo ou repressivo.
No primeiro caso, ele ocorre previamente à promulgação do ato normativo, com objetivo de evitar discordância ou conflito com a Constituição Federal. Seu exercício se dá nos poderes da seguinte forma: No Poder Legislativo, o controle de constitucionalidade se dá através da ação das Comissões de Constituição e Justiça. No Poder Executivo, através do veto do colegiado ou ainda a Prima facie a um projeto de lei considerado inconstitucional. No Poder Judiciário, em caso de impetração de mandado de segurança por parlamentar nos casos de denúncia a inobservâncias ao processo legislativo constitucional.
Segundo Pedro Lenza:
Explicando, a única hipótese de controle preventivo a ser realizado pelo Judiciário sobre projeto de lei em trâmite na Casa Legislativa é para garantir ao parlamentar o devido processo legislativo, vedando a sua participação em procedimento desconforme com as normas da Constituição. Trata-se, como visto, de controle exercido, no caso concreto, pela via de exceção ou defesa, ou seja, de modo incidental (LENZA, 2011, p.238).
Desta forma, entende-se que o direito público subjetivo de participação de um processo legislativo hígido compete apenas ao Legislativo. A jurisprudência do STF fixou-se na acepção do sentido de negação à legitimidade ativa de terceiros, que não possuem condição de parlamentar, embora se valendo da condição de destinatários da lei ou de emenda proposta à Constituição e sob possível julgo de inválida alteração em controle preventivo de constitucionalidade em abstrato, o que constitui algo não existente em nosso sistema constitucional (LENZA/2011).
Quanto ao controle repressivo, opera após a conclusão definitiva do processo legislativo e confirmada a real lesão aos ditames constitucionais. No Poder Legislativo, a efetivação ocorre no exercício de sustação dos atos do Poder Executivo pelo Congresso Nacional, quando estes ultrapassam as barreias da delegação legislativa, havendo inclusive a possibilidade de rejeição das medidas provisórias inconstitucionais pelo parlamento. No Poder Executivo compete a negação do cumprimento a qualquer lei que seja considerada como inconstitucional.
Exige-se uma justificativa formal com os motivos ensejadores de recusa e de publicação do ato. No Poder Judiciário, a afirmação da inconstitucionalidade da lei ou ato normativo pode ser realizada por qualquer juiz ou tribunal, no exercício do controle difuso, conquanto que o controle concentrado, em nível nacional, fica reservado somente ao STF, conforme anteriormente explicitado.
Há internamente no controle, uma distinção entre os aspectos concreto e abstrato. Uma vez em processo constitucional subjetivo, avalia-se em termo de constitucionalidade para atendimento de possíveis interesses privados que envolvam direitos subjetivos. Este controle é chamado de incidental, por meio de defesa ou exceção.
Para estes casos, anteriormente à sentença do objeto litigioso, é necessário aferir as questões de direito que envolvam concordância entre lei e parâmetro constitucional, portanto, a posição constitucional embasará a cognição do juízo de convicção decorrente da matéria principal.
Entretanto, a perspectiva abstrata será exercida, indiferentemente à existência de caso concreto a ser levado ao Judiciário e desaguando no conflito direto que há entre a norma impugnada e o parâmetro constitucional, considerados os aspectos jurídicos e outros atores fatídicos do questionamento. A partir do fato de que essas diferenciações sejam consideradas e avaliadas, ressalta-se que ambas as formas de controle apresentam, conformidades e particularidades em comum.
Segundo Novelino:
No controle dito ‘concreto’ o processo mental de verificação da constitucionalidade é semelhante ao desenvolvido no controle abstrato, com a diferença de que a aferição da constitucionalidade do ato (antecedente) precede a decisão de um caso concreto (consequente). Apesar de se influenciarem reciprocamente, as duas análises, a rigor, são feitas em separado. A primeira envolve uma ‘questão de direito’ consistente na verificação, a partir do problema suscitado, da compatibilidade entre a lei (objeto) e a Constituição (parâmetro). A segunda está relacionada a uma ‘questão de fato’ na qual é analisada especificamente a situação concreta do autor, ou seja, todo e qualquer fato relevante para a aplicação da norma. A análise da questão de direito (constitucionalidade da lei) será um pressuposto para decidir a questão de fato (procedência do pedido) (NOVELINO, 2013, p.204).
Uma vez conceituado o Controle de Constitucionalidade e suas maneiras de execução, deve-se atentar à análise da sua eficácia e seus possíveis efeitos, mediante o que concerne à atuação do Poder Judiciário enquanto entidade guardiã da legalidade e a Administração Pública, no que concerne sua atuação enquanto ferramenta estatal para veiculação das execução das obrigações do Estado-Nação para com a População e a integridade de seu poder de polícia enquanto legitimado pela própria legalidade, entidades estas que maculadas em suas teias estariam em caso .
2.3 Efeito e Eficácia no Controle de Constitucionalidade
Com relação à análise de resultados e sua eficácia, percebe-se que divergem conforme a modalidade (concreta ou abstrata). Para o controle concreto-difuso, com posicionamento relevante no processo judicial subjetivo, resguardados seus interesses, o órgão de jurisdição age com discrição, não declarando as possíveis inconstitucionalidades da norma, mas reconhecendo a adição e afastando sua aplicabilidade no caso concreto.
Observa-se que nos tribunais, entretanto, para que haja uma inaplicação da norma é necessário que tenha sido formulada anteriormente declaração de invalidade, quer seja pelo tribunal ou pelo STF. Esta oficialização da inconstitucionalidade, gera resultados somente entre os envolvidos, não se estendendo a terceiros, no chamado efeito Inter pars.
Com relação ao controle abstrato-concentrado, o art. 102, § 2º, da CF/88 atribui expansiva cobertura às deliberações do STF, gerando auto grau de eficácia e associação do Judiciário e a Administração pública:
Art. 102, § 2º, CF/88 – As decisões definitivas de mérito, proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, nas ações diretas de inconstitucionalidade e nas ações declaratórias de constitucionalidade produzirão eficácia contra todos e efeito vinculante, relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública.
O nível de eficácia que não requer existência de formalidades tem grande poder de alcance em esferas particulares e públicas. O seu poder de vinculação é mais limitado, com alcance a órgãos envolvidos, não acobertando órgãos particulares em totalidade, apenas em sentido reflexo, através de possíveis interações.
Desta forma, possível encontrar semelhanças entre esta estruturação e elementos do direito no que constitui um sistema, no qual os órgãos do judiciário prestam respeito aos seus antecessores. Esta constitui uma resolução judicial de caráter paradigmático com produção de uma associação entre poderes.
Para Novelino:
Em sua direção horizontal, o sistema determina a observância aos elementos precedentes, cuja produção ocorre de forma interna. Em sua direção vertical, o sistema direciona o vinculo com outros órgãos do Poder Judiciário e da Administração Pública. Em se tratando do direito norte-americano a abrangência é maior e as decisões emitidas pela Suprema Corte contemplam tanto os membros, quanto demais órgãos do Poder Judiciário (binding effect). (NOVELINO/2013, p.288).
É notório que, embora esta função seja observada por relatores do STF, não há uma aproximação do plenário, apesar deste possuir liberdade para a revisitação e revisão dos seus julgados. Percebe-se também que não há uma interligação com o Legislativo, apesar da sua capacidade de elaboração de possíveis leis que contrariem a tese ora tida como inconstitucional pelo Tribunal, por conta da conexão de equidade presente entre os poderes.
Apesar da racional preposição, é fato que no ato de edição de uma norma cujo entendimento seja firmado, nota-se divergências de entendimento entre os órgãos abrangidos. Esta situação, permite em casos de abuso, a possibilidade de transgressões à constitucionalidade.
3. REVERSÃO JURISPRUDENCIAL POR REAÇÃO LEGISLATIVA
Embora as decisões constitucionais possuam alto grau de eficácia e efeito associativo, não possuem nenhuma proibição para que seja possível editar leis ou emendas opostas ao outrora decidido pela Corte, não sendo portanto, vetados previamente.
Trata-se, portanto, de um proceder legislativo em resposta à decisão da Corte Constitucional, cujo propósito é a reversão jurisprudencial. O doutrinador e professor Pedro Lenza explica que esta eventual coibição ao Legislativo de opor-se jurisprudência do Superior Tribunal Federal representa um inaceitável fenômeno de regressão constitucional, para o qual:
O Legislativo, portanto, mantém sua autoridade para a ação legislativa, no direcionamento da suprema corte, ou ainda esmo em sentido inverso a ela, embora em caso de impedimento dessa ação, configurar uma paralização em termo de desenvolvimento social. Justifica-se isso devido a valoração da segurança jurídica, realizado com a extensão dos efeitos, comprometeria a capacidade de decisão, posto que impediria o processo de atualização das normas por obra do Poder Legislativo (Lenza, 2011, p.128).
Todavia, esta conduta parlamentar com o intuito de exceder a autoridade decisória do STF pode se apresentar abusiva se ultrapassadas as fronteiras das funções constitucionais do Legislativo, com ação desconstituída da execução legítima do Judiciário, com propósitos e interesses obscuros, constituindo uma grave violação ao princípio da separação dos poderes.
Constata-se nestes casos que, mediante as insatisfações do parlamento com possível declaração de inconstitucionalidade da Suprema Corte, a ação comum por parte do Parlamento é a busca por fazer prevalecer as suas determinações, independentemente da edição normativa que entre em conflito com a decisão judicial, comprometendo a autoridade do Judiciário. Este cenário é digno de recusa, portanto foram traçadas limitações à prerrogativa de reação legislativa, de forma a manter a harmonização das relações entre poderes (LENZA, 2011, p.143).
Conforme decisão plenária na ADI n. 5.105/DF, de relatoria do Min. Luiz Fux, julgada em 01 de outubro de 2015, cuja divulgação ocorreu no informativo n. 801, o STF observou o texto e determinou limitações à atuação congressual. Por tratar-se de revisão legislativa instituída através de emenda constitucional, a rescisão só pode ocorrer em se tratando de hipótese de violação ao art. 60 e §§ da CF/88.
Portanto, em caso de edição da uma emenda pelo Congresso Nacional com fins de modificar as interpretações dadas pelo STF a determinada temática, essa emenda unicamente será declarada inconstitucional se houver ofensa a cláusula superior ou a processo legislativo relativo às edições de emendas. Este cenário, se deve ao fato de se tratar de proposta de modificação de modelo de controle que baseou a compreensão da corte julgadora, não sendo, portanto possível a continuidade do julgado, pois, os princípios em que se baseava foram alteradas no ordenamento pátrio.
No caso da reversão jurisprudencial proposta por lei ordinária que se diferencia pois entrará em conflito direto com a jurisprudência do STF, originando-se, desta forma, com pretensão relativa de inconstitucionalidade. Assim, ficará cabível ao legislador o ônus de argumentar quanto a legitimidade da proposta de correção do precedente (SARMENTO E NETO, 2012, p.384).
A validade se dará a partir da comprovação pelo Congresso Nacional de que as premissas fáticas e jurídicas alegadas na fundamentação do texto, não são mais válidas.
Este cenário constitui um quadro considerado por muitos autores como sendo uma “mutação constitucional” operada pelo Poder Legislativo, não excluindo, entretanto, a prerrogativa do Supremo Tribunal Federal, da revisão e reapreciação da referida matéria, respeitada a argumentação congressual que venha a justificar a alteração do entendimento por parta da Corte.
Esta temática constitui um diálogo de abertura permanente, no qual qualquer alteração no contexto socia, influencia diretamente o cenário constitucional, podendo gerar alterações e mutações constitucionais, seja por iniciativa do Poder Judiciário ou por iniciativa do Poder Legislativo. Nos dois casos mantém-se um controle equilibrado, acarretando uma sistemática jurídica em consonância com a dinâmica social.
Para Sarmento e Souza Neto:
Não é benéfico conferir a um único órgão determinada prerrogativa de conceder a decisão final a cerca do sentido da Constituição. (...). É mais adequada à adoção de um padrão que não confira a instituições esta obrigação última, produzindo um espaço propicio as auto-correções entre envolvidos no sentido constitucional, baseadas no princípio do diálogo, ao invés de uma postura tradicionalista, que concede a decisão final nessa área STF (SARMENTO E NETO, 2012, p.402).
Ainda segundo os autores:
Os entendimentos do STF não são suscetíveis de serem invalidadas. Este fato, entretanto não é impedimento para edição de uma nova lei, cujo conteúdo seja similar ao que foi declarado inconstitucional. Esse posicionamento pode vir a ser derivado do texto constitucional, que não expandiu ao Poder Legislativos os efeitos de vinculação do entendimento do STF na gestão constitucional (art. 102, § 2º, e art. 103-A, da Constituição). Caso isto ocorra, é plausível que a nova lei venha a ser declarada também como inconstitucional (SARMENTO E NETO, 2012, p. 386).
O Superior Tribunal Federal, entretanto, tem o poder de reflexão acerca da argumentação fornecida pelo Parlamento ou ainda debatida publicamente, para embasamento de novo ato normativo. Caso venha a ignorar esta argumentação, corre o risco de converter a medida em uma afronta à sua autoridade. Neste cenário, há a probabilidade de modificação da disposição dos ministros, podendo existir alterações na composição da Corte.
4. ANÁLISE DE CASO CONCRETO – ADIs 4430, 4795 E 5051
O tema discutido pode ser ilustrado da seguinte maneira. a partir de uma análise minuciosa de um caso concreto, que contribuiu para o robustecimento do entendimento em discussão. O Supremo Tribunal Federal, em julgamento às ADIs 4430 e 4795, ocorridas em outubro de 2012, promulgou como inconstitucionais alguns dispositivos da Lei nº 9.504/97, conhecida como Lei das Eleições.
Demonstrando insatisfação com essa promulgação, o Congresso Nacional editou a editou a Lei nº 12.875/2013 que trouxe modificações a Lei nº 9.504/97, com objetivo de reestabelecer algumas normas, similares às anteriormente declaradas como inconstitucionais na decisão do Supremo Tribunal federal no julgamento das ADIs 4430 e 4795.
Embora a Lei nº 12.875/2013 tenha sido uma conduta reativa à decisão do Supremo Tribunal Federal, deve-se considerar o fato de que foi uma maneira de o Parlamento suplantar a interpretação legislativa dada pela Corte Suprema ao tema. Não obstante, foi elaborada a ADI desfavorável à novel Lei nº 12.875/2013, tombada sob o n. 5.105, o que alvoreceu para a regulação da temática pelo Superior Tribunal Federal.
O Min. Luiz Fux, relator, efetivou a revisão dos precedentes e julgados da corte, conforme abaixo:
Da análise dos retromencionados arestos, e da postura institucional adotada pelo Supremo Tribunal Federal em cada um deles, pode-se concluir, sem incorrer em equívocos, que (i) o Tribunal não subtrai ex ante a faculdade de correção legislativa pelo constituinte reformador ou legislador ordinário, (ii) no caso de reversão jurisprudencial via emenda constitucional, a invalidação somente ocorrerá, nas hipóteses estritas, de ultraje aos limites preconizados pelo art. 60, e seus §§, da Constituição, e (iii) no caso de reversão jurisprudencial por lei ordinária, excetuadas as situações de ofensa chapada ao texto magno, a Corte tem adotado um comportamento de autorrestrição e de maior deferência às opções políticas do legislador. Destarte, inexiste, descritivamente, qualquer supremacia judicial nesta acepção mais forte. (STF/2015).
A partir desta lógica, foi verificado pelo relator que a hipótese de revisão legislativa não era legítima em sua totalidade. A análise partiu do pressuposto de que a argumentação justificadora da nova Lei, constante em seu projeto, era composta em sua maior parte de termos genéricos, não possuindo, portanto a arcabouço necessário para eliminar certas premissas fixadas pelo Superior Tribunal Federal na composição jurídica do controle concentrado de constitucionalidade.
Este fato motivou a denunciação de uma configuração de desrespeito legislativo à decisão da Corte. Como ponto pendente ao Parlamento, ficou a demonstração dos desacertos de entendimento judicial, baseados nas alterações factuais. Nos termos do julgado:
Consoante afirmado, não se afigura legítima a edição de leis ordinárias que colidam frontalmente com a jurisprudência fixada pelo Supremo Tribunal Federal (leis in your face), sem que o legislador se desincumba do ônus de trazer aos autos novos argumentos, bem como de demonstrar o desacerto do posicionamento da Corte em razão de mudanças fáticas ou axiológicas, tomando como parâmetro, por óbvio, a mesma norma constitucional.
(...)
In casu, a situação de inconstitucionalidade se agrava porquanto a decisão se ancorou em sólida construção argumentativa calcada em cláusulas pétreas (e.g., pluralismo político, liberdade de criação de partidos políticos, tutela das minorias partidárias etc.). Ora, se o exame de validade da lei superadora se submete, prima facie, a escrutínio severo e estrito de constitucionalidade, de forma a exigir do legislador a demonstração de inadequação do precedente à luz das circunstâncias fáticas e jurídicas, este ônus é imposto, a fortiori, nas hipóteses em que o Supremo Tribunal Federal assenta a inconstitucionalidade com espeque em cláusulas pétreas (STF/2015).
Mediante o embasamento apresentado na conclusão da análise, ficou pautada a condição de irrefutabilidade quanto ao deferimento dos pedidos da ADI 5.105/DF quanto à declaração de inconstitucionalidade dos artigos 1º e 2º da Lei nº 12.875/2013. Quanto à representatividade dessa procedência, constituiu uma legitima “resposta” do Poder Judiciário aos desplantes muitas vezes exercidos pelo Poder Legislativo na edição de atos normativos. Como forma de estímulo à consonância e ao equilíbrio entre os poderes e salvaguarda da sociedade, da já promulgada austeridade na observância dos preceitos constitucionais, conforme conclusão do julgado na ADI 5.105/DF:
Por esses motivos, entendo que a reação jurisprudencial, materializada na Lei nº 12.875/2013, ao subtrair dos partidos novos, criados no curso da legislatura, o direito de antena e os recursos do fundo partidário, remanesce eivada do vício de inconstitucionalidade, na medida em que, além de o legislador não ter logrado trazer novos e consistentes argumentos para infirmar o pronunciamento da Corte, referido diploma inviabiliza, no curto prazo, o funcionamento e o desenvolvimento de minorias político-partidárias, em flagrante ofensa aos postulados fundamentais do pluralismo político, e da liberdade partidária, insculpidos no art. 17, caput, e § 3º, da Constituição de 1988. Ex positis, voto pela procedência total dos pedidos deduzidos, a fim de declarar a inconstitucionalidade dos artigos 1º e 2º, da Lei nº 12.875/2013 (STF. ADI nº 5.150/DF. Rel. Min. Luiz Fux. Órgão julgador: plenário. Julgamento: 01/10/2015).
5. ANÁLISE CONCLUSIVA
Com o que se pôde concluir do presente trabalho de conclusão de curso, em que pese o objetivo principal de análise do papel do Congresso Nacional na reforma de decisões da Suprema Corte e o mecanismo gerado para o exercício desta função, na perspectiva de seu aspecto constitucional, foi possível aferir que sua atuação de fato é satisfatória, sendo a hipótese traçada, para análise do correto Controle de Constitucionalidade, bem como sobre a acurácia do mecanismo do Congresso, confirmada.
Entretanto, cumpre destacar alguns alarmes encontrados.
A organização escalonada e hierárquica das normas no ordenamento jurídico cujo parâmetro mediador é a determinação do modo de produção ou conteúdo, é propícia à ocorrência de conflitos entre as diferentes normas.
Nestes casos, a norma ligeiramente superior hierarquicamente sobressai-se.
Verificou-se que, para conflitos envolvendo a Constituição Federal, faz-se uso do controle de constitucionalidade concentrado pelo STF, mas que pode ser exercido por um juiz ou Tribunal, mediante caso concreto ou tese, transformando-se assim em controle difuso, aliado ao how-to do paradigma adotado pelo Supremo Tribunal Federal. Percebe-se que, neste caso, a decisão não incorpora vínculo com o plenário da corte, cuja liberdade e avaliação é ampla. Em contrapartida não são percebidos os reflexos de vinculação ao entendimento da corte suprema.
Cabe ao Poder Legislativo, no interim de suas atribuições de legislação, a intervenção na coisa julgada pelo STF, por meio da promulgação de atos normativos supervenientes, com potencial ensejo ao ato de reversão da jurisprudência constitucional. Observa-se, entretanto, que esta prerrogativa do Legislativo não é autônoma, por risco de comprometimento da autoridade e ocorrência de institucionalidade, por caber ao Supremo Tribunal Federal a autoridade jurídica para invalidar determinados atos legislativos.
Uma vez editada determinada emenda constitucional, está assegurada quanto à declaração de inconstitucionalidade, salvo nos casos de ofensa direta a alguma cláusula pétrea ou ainda ao próprio processo de edição de emendas, por constituir uma mudança na construção do modelo de controle, fundamental no entendimento da corte, impossibilitando a subsistência de suas vezes.
Conclui-se ainda que uma vez proposta lei ordinária para revisão jurisprudencial, há portanto hipótese relativa de inconstitucionalidade da mesma, cabendo à figura do legislador o ônus da comprovação de legitimidade da correção e comprovação de invalidade das premissas fundamentais da decisão e julgado. Este fenômeno jurisprudencial constitui o ato de superação legislativa da jurisprudência constitucional pela promoção de mutação constitucional.
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Bacharelando em Direito vinculado ao Centro de Ensino Superior do Estado do Amazonas – CIESA
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: NELSON BARBOSA DA SILVA JúNIOR, . Reversão de Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal pelo Congresso Nacional Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 27 set 2019, 04:42. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/53485/reverso-de-jurisprudncia-do-supremo-tribunal-federal-pelo-congresso-nacional. Acesso em: 23 dez 2024.
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