NILCE ELAINE BYRON RAMOS
(Orientador)[2]
RESUMO: Este artigo, inserido na área de concentração do direito ambiental e do direito constitucional, focaliza o tema “Racismo ambiental sob a ótica do direito e a psicologia ambiental”. O racismo ambiental vai além da cor da pela ou questões culturais, abrange questões territoriais, provocando injustiças contra grupos vulneráveis, em especial com a exploração de terras e pessoas em áreas ricas em biodiversidade e pobres socialmente. Essas violações de direitos ocorrem tanto no campo quanto no meio urbano. A presença do racismo ambiental no direito brasileiro é um tema relativamente novo e vai de encontro às premissas do art. 225 da Constituição Federal de 1988 que estabelece que todos têm o direito a um ambiente ecologicamente equilibrado. Desta forma, o artigo procura responder a seguinte situação-problema: quais as políticas públicas de combate ao racismo ambiental no Brasil? Tem, portanto, como objetivo geral, tecer uma discussão sobre o termo racismo ambiental, a partir da sua contextura histórica, e promover um diálogo com o termo Justiça Ambiental. Teve também como objetivos específicos: identificar e elencar os principais elementos do racismo ambiental e da psicologia ambiental na ótica do direito ambiental e constitucional brasileiro; verificar quais as políticas públicas de combate ao racismo ambiental existem ou podem ser implantadas no Brasil; e, discutir a importância da justiça ambiental neste contexto. Tal debate se desenvolveu através da metodologia da pesquisa de cunho bibliográfico em livros e artigos científicos que tratam do tema que envolvem a discussão acerca dos direitos contra o racismo ambiental.
Palavras-Chave: Direito Ambiental; Racismo Ambiental; Psicologia Ambiental.
ABSTRACT:This article, inserted in the area of concentration of environmental law and constitutional law, focuses on the theme “Environmental racism from the perspective of law and environmental psychology”. Environmental racism goes beyond the color of fur or cultural issues, encompasses territorial issues, causing injustice against vulnerable groups, in particular by exploiting land and people in areas rich in biodiversity and socially poor. These rights violations occur both in rural and urban areas. The presence of environmental racism in Brazilian law is a relatively new theme and goes against the premises of art. 225 of the Federal Constitution of 1988 which states that everyone has the right to an ecologically balanced environment. Thus, the article seeks to answer the following problem situation: what are the public policies to combat environmental racism in Brazil? Therefore, its general objective is to make a discussion about the term environmental racism, from its historical context, and to promote a dialogue with the term Environmental Justice. Its specific objectives were: to identify and list the main elements of environmental racism and environmental psychology from the perspective of Brazilian environmental and constitutional law; verify which public policies to combat environmental racism exist or can be implemented in Brazil; and discuss the importance of environmental justice in this context. This debate developed through the methodology of bibliographic research in books and scientific articles that deal with the theme and involve the discussion about the rights against environmental racism.
Keywords: Environmental law; Environmental racism; Environmental Psychology.
INTRODUÇÃO
“Todos são iguais perante a lei”. Com essa frase, a grande maioria dos ordenamentos jurídicos do mundo se inicia e se consubstancia no direito de igualdade entre todos os cidadãos. Mas do que um direito, a igualdade é um princípio constitucional no Brasil. E no caso do meio ambiente se consolida no art. 225 da Constituição Federal de 1988 (CF/1988) que diz que todos têm direito a um meio ambiente equilibrado.
O racismo, seja de que nível for ou em que campo ocorrer, é uma das maiores violências que se pode cometer contra o ser humano. Muitas vezes acha-se que o termo racismo faz referência apenas em questões relacionadas à cor da pele, ou a etnia de cada cidadão. Não é. O termo é muito maior do que isso. Racismo é tratar desiguais de forma desigual.
No geral o racismo ambiental trata das questões em que o ser humano que vive em sociedade ao lado de seus iguais quer na matéria quer na forma, não pode ser tratado de forma desigual. A grande maioria das constituições dos países considera todos os seres humanos iguais, não obstante a evolução diária de seus conceitos, costumes e regramentos e permaneçam desiguais, justamente em função do preconceito, conquanto o axioma constitucional mostra-se cada vez mais distante da – agora não tão certa – evolução humana.
Como dito anteriormente, o racismo ambiental é uma das maiores violências cometidas pelo ser humano contra si mesmo. Esse tipo de violência é umas das maiores facetas do complexo fenômeno de idéia preconcebida, que desconhece barreiras de classe social, tipos de cultura, níveis socioeconômicos e limitações individuais. Seus incidentes ocorrem tanto no espaço privado quanto no público, atingindo todas as pessoas.
O racismo em termos gerais atinge todos os desprotegidos socialmente. Assim, acontece com os negros, com os portadores de deficiência, com aqueles que optam por uma sexualidade diferenciada dos padrões normais, com os profissionais de profissões que se dizem exclusivas de gênero, com os pobres a quem lhes é negado tudo. É um problema específico da sociedade, dos agravos às relações interpessoais, esse tipo de violência social adquiriu proporção de um complexo problema, que invoca políticas públicas para que este seja combatido. Da mesma forma, acontecem com as pessoas submetidas a um meio ambiente desequilibrado, as condições insalubres, que acabam por sofrer constantes discriminações do poder público, em função das variantes ambientais, em decorrência da padronização imposta pelo Estado nas políticas públicas, o que torna imperativo o resgate de suas cidadanias, no sentido de buscar também um pouco da nossa cultura, pois se sabe que a língua, o meio ambiente seja parte da cultura, é nela que esta se projeta e opera. Apesar de todos esses contratempos, o racismo ambiental acaba por encontrar elementos subjacentes que o faz se proliferar de forma proveitosa e negativa.
Tem, portanto, como objetivo geral, tecer uma discussão sobre o termo racismo ambiental, a partir da sua contextura histórica, e promover um diálogo com o termo Justiça Ambiental. Teve também como objetivos específicos: identificar e elencar os principais elementos do racismo ambiental e da psicologia ambiental na ótica do direito ambiental; verificar quais as políticas públicas de combate ao racismo ambiental; e, discutir a importância da justiça ambiental no contexto das políticas públicas de combate ao racismo ambiental.
Com isso, neste artigo se desenvolveu uma discussão acerca do racismo ambiental sob a ótica do Direito e da psicologia ambiental. Pretendeu-se oferecer um espaço para reflexão a respeito de colocar as minorias e os grupos vulneráveis, que não conseguem se proteger sozinhas, que estão longe dos olhos da sociedade, não só por serem pobres, mas principalmente por se encontrarem em completo desamparo em razão de viverem em um meio ambiente ecologicamente desequilibrado. É se discutir tal problemática Racismo ambiental que aflige nossa sociedade, trazendo a contribuição do direito e da psicologia ambiental, necessários para assegurar o controle, conquista, consolidação e ampliação dos direitos.
Esta pesquisa justifica-se pela necessidade de proporcionar uma discussão a respeito do tema racismo ambiental e estabelecer ações voltadas à justiça ambiental que possam combater os efeitos dos impactos sofridos pela natureza e pelas pessoas. Do ponto de vista acadêmico este trabalho se justifica pela necessidade de apresentar um estudo delimitado unicamente na educação ambiental enquanto tema transversal. Do ponto de vista social, o que justifica o trabalho é o crescimento da importância deste tema para a melhoria da qualidade de vida das pessoas. As diretrizes metodológicas utilizadas foram à abordagem bibliográfica qualitativo-descritiva extraída de livros e revistas impressas e eletrônicas voltadas para o tema em questão.
1 RACISMO AMBIENTAL
O racismo é um fenômeno histórico que se manifesta de diferentes formas. É gerador de múltiplas violências, desigualdade racial, perseguição religiosa, extermínio. E pode estar implícito a idéias preconceituosas e a práticas de discriminação, segregação, e isolamento social.
O termo racismo se entende como “[...] o uso político de alguns resultados aparentemente científicos, para levar à crença da superioridade de uma raça sobre as demais. Este uso visa a justificar e consentir atitudes de discriminação e perseguição contra as raças que se consideram inferiores” (BOBIO, 2000, p. 1.059).
Herculano (2008, p.17) preceitua que:
Racismo é a forma pela qual desqualificamos o outro e o anulamos como não-semelhante. [...] Assim, nosso racismo nos faz aceitar a pobreza e a vulnerabilidade de enorme parcela da população brasileira, com pouca escolaridade, sem renda, sem políticas sociais de amparo e de resgate, simplesmente por- que naturalizamos tais diferenças, imputando-as a “raças”.
O racismo permanece operando na contemporaneidade, mas de maneira cada vez mais complexa. O revés do racismo já ultrapassou as questões raciais e étnicas e se expandiu no convívio social, na vida política, local de nascimento, tipo de trabalho, escolaridade, e o que se destaca a questão ambiental. O conceito de racismo ambiental tem uma vertente emblemática considerável, conforme aponta Alier (1998): “uma metáfora pela qual os pobres e todos aqueles que sobrevivem em áreas de refúgio são percebidos como de uma raça inferior, não importa sua cor ou etnia”. Nesse contexto, vale ressaltar conceito segundo Pacheco (2006, p.11):
Racismo ambiental é o conjunto de idéias e práticas das sociedades e seus governos, que aceitam a degradação ambiental e humana, com a justificativa da busca do desenvolvimento e com a naturalização implícita da inferioridade de determinados segmentos da população afetados – negros, índios, migrantes, extrativistas, pescadores, trabalhadores pobres, que sofrem os impactos negativos do crescimento econômico e a quem é imputado o sacrifício em prol de um benefício para os demais. O racismo ambiental seria, portanto, um objeto de estudo crítico da Ecologia Política (ramo das Ciências Sociais que examina os conflitos socioambientais a partir da perspectiva da desigualdade e na defesa das populações vulnerabilizadas).
Nesse sentido, se compõe nas injustiças e discriminações étnicas e raciais, que estabelece quem são os injustiçados e quem são os privilegiados nas disputas pelo território e em torno dos direitos socioambientais. Foi dessa forma que o conceito de racismo ambiental surgiu no final da década de 1970 nos EUA a partir da mobilização da população negra do Condado de Warren na Carolina do Norte contra um depósito de resíduos tóxicos (PACHECO, 2006).
Entre 1978 e 1982 constatou-se que três quartos desse tipo de aterro estavam localizados em locais habitados pela população negra, embora na região essa população representasse apenas 25% dos habitantes (Pacheco, 2006). Notou-se que as industriais despejavam seus resíduos tóxicos nessa região justamente por representarem a minoria, com incapacidade de resistir a sua atuação, por serem um grupo étnico-raciais sem desenvolvimento socioeconômico. A partir daí cravou-se uma luta por justiça ambiental, equidade social, e discriminação racial, que vinham sendo negligenciados pelos movimentos ambientais tradicionais, que se preocupavam apenas com as questões ecológicas (PACHECO, 2006).
Assim, o Racismo Ambiental é caracterizado pelo fato de a maior parte dos riscos ambientais socialmente induzidos no processo de extração dos recursos naturais ou na disposição de resíduos no ambiente recair desproporcionalmente sobre os grupos étnicos desprovidos de poder e sobre os mais pobres (ACSELRAD; MELLO; BEZERRA, 2009).
As igrejas e outras associações que lutavam contra a discriminação racial e de injustiça social, impulsionaram o surgimento de grupos ambientalistas negros norte-americanos, esse movimento tornou-se uma extensão dos movimentos pelos direitos civis surgidos no EUA. De acordo com Almeida (2016, p.29):
É possível que se leia o surgimento do movimento por justiça ambiental justamente como a síntese do processo de aproximação e intercâmbio entre a agenda ambientalista moderna e o movimento negro, pelo que a agenda de entidades ambientais passa a integrar demandas em prol da equidade social com status de direito civil.
Segundo Scholberg (2009, p. 46), seria possível identificar duas correntes dentro desse movimento ambientalista: o “movimento contra a contaminação tóxica” e o “movimento contra o racismo ambiental”. A expressão justiça ambiental ganharia maior notoriedade política a partir do segundo, eis que a perspectiva emerge eminentemente a partir de mobilizações que se opuseram a casos locais de racismo ambiental (SANTOS, 2012, 2012).
A partir dessa premissa constatou-se que esses movimentos de justiça social e ambiental ao longo dos anos tiveram um papel histórico fundamental no desenvolvimento e formulação de leis e políticas públicas que visam assegurar o direito ambiental efetivam ente sustentável. Além disso, foram criados fundos de contribuição a comunidades afetadas pelos agentes poluentes, com vistas a possibilitá-las a produção de provas e meios jurídicos de atuação (HERCULANO, 2008).
Várias conquistas foram legitimadas por esses movimentos, mas para compreender os resultados dessas conquistas, é necessário retratar o Racismo ambiental na sua conjuntura e a contribuição da Justiça Ambiental.
2 RACISMO AMBIENTAL X JUSTIÇA AMBIENTAL
A partir da conjuntura tradicional acerca do racismo, outros aspectos começaram a se evidenciar e a serem estudados, dentre as quais o racismo ambiental. Ao analisar o racismo em suas peculiaridades, tanto institucional, cultural e científica.
Para Prado (2011, p. 67) concluem que “a forma mais recente de discriminação que atinge os povos mais pobres e os ecossistemas, é denominada de racismo ambiental”. Expressivamente, Pacheco (2007) indica uma relação de pessoas e situações que caracterizam racismo ambiental e acabam passando despercebidos pelos cidadãos e pelo poder público. Dessa forma, a autora confirma que:
[...] é fundamental assumir que racismo e preconceito não se restringem a negros, afros descendentes, pardos ou mulatos. Está presente na forma como tratamos nossos povos indígenas. Está presente na maneira como “descartamos” populações tradicionais - ribeirinhas quebradeiras de coco, geraiszeiros, marisqueiros, extrativistas, caiçaras e, em alguns casos, até mesmo pequenos agricultores familiares. Está presente no tratamento que damos no Sul/ Sudeste, principalmente, aos brancos pobres cearenses, paraibanos, maranhenses.... Aos “cabeças-chatas” em geral, no dizer preconceituoso de muitos, que deixam suas terras em busca de trabalho e encontram ainda mais miséria, tratados como mão-de-obra facilmente substituível que, se cair da construção, corre ainda o risco de “morrer na contramão atrapalhando o tráfego” (PAECHO, 2007, p. 7-8).
Maíra Mathias (2017, p. 6), expressa:
Em tempos de capitalismo global, o conceito de racismo ambiental foi sendo ampliado – e também disputado. Já a disputa do conceito veio da própria necessidade de expandir e angariar mais apoios para a luta contra o racismo ambiental. Isso se deu depois da Conferência Nacional das Lideranças Ambientalistas de Cor, nos Estados Unidos em 1991. O encontro gerou um documento intitulado ‘Princípios da Justiça Ambiental’. “Você tem um movimento popular cuja grande bandeira é a luta contra o racismo ambiental. Dentro da luta, uma das coisas que o movimento quer é justiça ambiental.
A Declaração de Lançamento da Rede Brasileira de Justiça Ambiental, fruto do Colóquio Internacional sobre Justiça Ambiental, Trabalho e Cidadania, realizado na cidade de Niterói-RJ em 2001, traz uma conceituação bem básica ampla sobre Racismo Ambiental, estabelecendo, claramente como este ocorre e que implicações dele são decorrentes:
Entendemos por injustiça ambiental o mecanismo pelo qual sociedades desiguais, do ponto de vista econômico e social, destinam a maior carga dos danos ambientais do desenvolvimento às populações de baixa renda, aos grupos raciais discriminados, aos povos étnicos tradicionais, aos bairros operários, às populações marginalizadas e vulneráveis. Por justiça ambiental, ao contrário, designamos o conjunto de princípios e práticas que asseguram que nenhum grupo social, seja ele étnico racial ou de classe, suporte uma parcela desproporcional das conseqüências ambientais negativas de operações econômicas, de decisões de políticas e de programas federais, estaduais, locais, assim como da ausência ou omissão de tais políticas; b- asseguram acesso justo e equitativo, direto e indireto, aos recursos ambientais do país; c- asseguram amplo acesso às informações relevantes sobre o uso dos recursos ambientais e a destinação de rejeitos e localização de fontes de riscos ambientais, bem como processos democráticos e participativos na definição de políticas, planos, programas e projetos que lhes dizem respeito; d- favorece a constituição de sujeitos coletivos de direitos, movimentos sociais e organizações populares para serem protagonistas na construção de modelos alternativos de desenvolvimento, que assegurem a democratização do acesso aos recursos ambientais e a sustentabilidade do seu uso (NITEROI - RJ, 2001, p. 1-2).
Para além dessa compreensão de racismo ambiental tradicional, outro aspecto mais amplo surge: a vulnerabilidade das populações dos países em desenvolvimento como o Brasil em comparação aos países ricos. O contexto brasileiro é determinado por razões relevantes para se compreender as relações raciais que são estabelecidas, pois para retratar racismo deve-se considerar o regime de escravidão vigente durante séculos e o processo de redemocratização construído através das lutas dos movimentos sociais. Como foi bem avaliado por Santos (2012, p.23):
O racismo ambiental por certo é um discurso poderoso para o enfrentamento das injustiças ambientais diretamente vinculadas ao preconceito racial. Contudo, não serve para o enfrentamento de muitas outras situações de injustiças ambientais contemporâneas, cujos fatores determinantes não se vinculam a uma questão puramente racial.
Percebe-se que o termo racismo ambiental não se limita a questões étnicas e raciais, mas, sobretudo a um processo econômico, político, de uma população invisibilidades socialmente. A partir daí a ligação com o termo de Justiça Ambiental. Justiça pode ser definida de vários modos. Para Castilho (2013, P. 5), “a virtude determinante da conduta humana na direção do que é justo e no rechaço do que é injusto”.
É na busca por justiça que os movimentos sociais surgem, a partir da insatisfação de segmentos da sociedade com a realidade vigente, o que é, via de regra, causada pela opressão dos grupos sociais detentores do poder sobre os grupos socialmente subordinados, conhecidos também por grupos desprivilegiados, dominados, subalternos, minorias, entre outras tantas denominações. Entre as formas de opressão, destacam-se a dominação política, econômica, cultural, ideológica e psicológica, entre outras. Segundo Rammê (2012, p. 23):
Tal fenômeno fez com que o movimento por justiça ambiental, a partir da experiência Norte Americana, se difundisse pelo mundo, ganhando contornos bem mais amplos que originalmente vinculados às lutas contra o racismo ambiental ou contra contaminação tóxica. Atualmente, o movimento por justiça ambiental abarca todos os conflitos socioambientais, cujos riscos sejam suportados de forma desproporcional sobre a população socialmente vulnerável ou mesmo sobre países ditos de “Terceiro Mundo”.
O movimento por justiça ambiental tem sua origem nos anos 80, nos movimentos por direitos civis de grupos negros norte-americanos mobilizados contra a contaminação ambiental de suas áreas de moradia. A justiça ambiental nasce da luta da sociedade civil contra a apropriação desigual dos recursos ambientais e a luta contra a prática de destinar a maior carga dos danos ambientais do desenvolvimento nas populações marginalizadas e vulneráveis, por conseguinte, reivindicação por justiça ambiental é também por justiça social. ACSERALD (2009, p. 9) retrata que:
O movimento de justiça ambiental surgiu, como extensão do movimento moderno por direitos civis, a partir do momento no qual as pessoas começaram a entender que há uma relação direta entre seu local de trabalho, sua comunidade e sua saúde. A luta é por direito de viver em um ambiente limpo e saudável, incluindo o ambiente de trabalho e moradia e, sobretudo, de receber uma proteção ambiental justa e equânime - e que nenhuma pessoa ou grupo social esteja acima da lei. O que o movimento dedica-se a fazer é evidenciar o padrão estatístico, onde ocorrem os aterros, incineradores e demais unidades poluidoras quaisquer, documentando por meio de provas como cartas, memorandos ou relatórios oficiais que possam demonstrar que estes eventos se deslocam para locais onde a população ofereça menor resistência.
No que se refere o ponto de vista por justiça ambiental, o debate distributivo é de grande relevância. Como se refere Baggio, pela perspectiva do movimento por justiça ambiental, os elementos da natureza “[...] passam a ser vistos como bens ambientais, e os riscos ocasionados pelas atividades humanas em sociedade, como encargos a serem distribuídos de forma igualitária”. Já Herculano compara s perspectiva da justiça ambiental a uma “especialização da justiça distributiva”, relacionada diretamente com uma proposta de justa distribuição do meio ambiente ecologicamente equilibrado a todos os seres humanos.
O sentido distributivo, que o movimento por justiça ambiental concentra, processa-se da distribuição desigual dos riscos ambientais se espalhe, inflamando a desigualdade social, o preconceito racial e cultural existente na sociedade. Diante disto, Baggio (2014, p. 10) afirma:
[...] as demandas por justiça ambiental surgem em um contexto de conflitos culturais muito próximos das lutas multiculturais, quer seja pela forte presença do elemento de identidade, que somado à desigualdade sócio-econômica, torna-se um fator determinante na caracterização da discriminação ambiental imposta a certos grupos, quer seja pela denúncia à insuficiência da neutralidade do Estado para atender às demandas coletivas inerentes aos movimentos sociais por justiça ambiental.
É através das iniciativas se conseguiu muitos espaços para se pensar políticas públicas, adquiridas através de muitas lutas por parte desses movimentos. É neste contexto que se insere um conjunto de ações e programas que são desenvolvidos pelo Estado para garantir e colocar em prática direitos que são previstos na Constituição Federal e em outras leis.
3 AS POLÍTICAS PÚBLICAS VOLTADAS PARA O CONTROLE DO RACISMO AMBIENTAL
A prerrogativa de ingresso à moradia para uma parte da população classificadas de baixa renda é imprescindível para amparar as necessidades dos grupos sociais mais vulneráveis. A Política habitacional é uma fonte potencializadora do combate ao racismo ambiental, mas para isso é necessárias políticas habitacionais eficientes e contínuas que consentem a inserção destes indivíduos na cidade e a sua inserção na sociedade.
Políticas Públicas pode ser apresentado a partir da definição apontada por Rodrigues (2010), ao afirmar é o processo em que diversos grupos, cujos interesses divergem, tomam decisões coletivas que direcionam a sociedade. Para tanto, Souza (2006, p. 25) expressa que “as políticas públicas repercutem na economia e nas sociedades, daí por que qualquer teoria da política pública precisa também explicar as inter-relações entre Estado, política, economia e sociedade”. Ou ainda“uma diretriz elaborada para enfrentar um problema público, relevante para a comunidade e para atender as suas necessidades” (SECCHI, 2011, p.2).
Sendo assim as políticas públicas são, instrumentos para efetivar os direitos do cidadão, intermediando o pacto entre o Estado e a sociedade. Não há, entretanto, certeza de que os direitos sociais sejam efetivados, pois tudo irá depender da maior ou menor representatividade que cada segmento representado possui.Faz-se necessário destacar a Política Pública Habitacional como uma forma de enfrentamento ao Racismo ambiental. Para tanto, é relevante traçar um breve histórico sobre as políticas habitacionais no Brasil.
O registro das políticas habitacionais ocorreu no final do século XIX, com o fim do regime da escravidão, onde os negros foram expulsos do campo e migraram para as cidades. Paralelamente, imigrantes europeus chegavam ao Brasil para trabalharem na nascente indústria brasileira, provocando o aumento da população das cidades, o que, conseqüentemente acarretou demanda por moradia (MARICATO, 1997, p. 33)
O grande marco da política habitacional do Brasil, devido à pressão social, foi à criação em 1946, a Fundação da Casa Popular (FCP), com o objetivo de promover moradias para a população pobre. Todavia, a FCP não obteve êxito, pela falta de recursos, tendo sua participação reduzida em 1952. O fracasso da FCP foi devido ter adotado um caráter emergencial e sem planejamento, pois a finalidade não era solução do problema da moradia, mas “derivar dividendos políticos, que a forma de votos, quer a forma de prestígio” (AZEVEDO; ANDRADE, 1982, p. 54).
Já em 1975, mais um investimento para combater o crescimento das favelas é realizado pelo governo federal, a criação do Programa de Financiamento de Lotes Urbanizados (PROFILURB). No entanto, os lotes ficavam afastados dos centros urbanos, dificultando o acesso à cidade e seus serviços, causando rejeição ao novo programa (AZEVEDO; ANDRADE, 1982).
Com a Constituição Federal de 1988, o direito à moradia passa a ser considerado um direito social, inclusive previsto na Declaração Universal dos Direitos do Homem, Art. XXV6, para a preservação da dignidade da pessoa humana. A Constituição veio instituir a descentralização das políticas públicas de planejamento urbano, atribuindo tal tarefa aos municípios, para uma maior eficiência das políticas. No ano de 2001, foi promulgada o Estatuto da Cidade - Lei 10.257, com intuito de fornecer suporte jurídico aos processos de planejamento urbano, a função social da propriedade, o planejamento das políticas urbanas, e o acesso universal à cidade, para que a “descentralização e a democratização caminhem juntas para garantir a plena legitimidade social dos processos de planejamento urbano” (FERNADES, 2008, p. 44).
Lançado em 2009, temos o Programa Minha Casa, Minha Vida (PMCMV), voltado para o atendimento de famílias de baixa renda, onde está sendo investidos expressivos subsídios para a aquisição da casa própria.
A inclusão social e o combate à pobreza devem passar pelo fornecimento de moradias adequadas à população, pois, trata-se de um bem de forte impacto na diminuição da pobreza, na melhoria do bem estar e da qualidade e vida de um modo geral.
4 A PSICOLOGIA AMBIENTAL
A importância Psicologia ambiental como viés para análise do racismo ambiental, para isso, é necessário realizar um breve conceito para entendimento dessa ligação com psicologia, meio ambiente e sociedade.
O conceito de psicologia começa a ser utilizado a partir do conceito de psicologia social comunitária que tem algumas características próprias, derivadas da própria forma como surgiu entre nós esta nova área de estudo. Sabe-se que a prática científica não é imune aos movimentos sociais em cujo contexto se desenvolve, e a psicologia ambiental ao lado da psicologia social comunitária não é exceção a esta regra (CAMPOS, 2016).
A utilização de teorias e métodos da psicologia em trabalhos feitos em comunidades de baixa renda, visando, por um lado deselitizar a profissão, e, de outro, buscar a melhoria das condições de vida da população em condições de vulnerabilidade socioambiental, constitui o espaço teórico e prático do que passamos a denominar a psicologia ambiental conforme aponta Freitas apud Campos (2016, p. 10). Bairros populares favelas são os lugares em que tiveram início essas experiências de psicologia ambiental.
Mais recentemente, com a ampliação dos sistemas de saúde e educação pública no país, e o aumento do número de psicólogos trabalhando em postos de saúde, creches, instituições de promoção do bem-estar social, ou setores do sistema judiciário voltados para o cuidado das pessoas, enfim em instituições públicas que visam promover o desenvolvimento social, a psicologia ambiental procura desenvolver os instrumentais de análise e intervenção relevantes para as novas problemáticas que se apresentam aos psicólogos.
Góis apud Campos (2016, p. 89) define a psicologia ambiental como uma área da psicologia social que estuda a atividade do psiquismo decorrente do modo de vida do lugar/comunidade; estuda o sistema de relações e representações, identidade, níveis de consciência, identificação e pertinência dos indivíduos ao lugar/comunidade e aos grupos comunitários. Visam ao desenvolvimento da consciência dos moradores como sujeitos históricos e comunitários, através de um esforço interdisciplinar que perpassa o desenvolvimento dos grupos e da comunidade. [...] seu problema central é a transformação do indivíduo em sujeito.
A partir dos mecanismos de psicologia ambiental chega-se aos processos de construção da cidadania e direitos sociais com os fatores de fortalecimento dos segmentos vulnerabilidades.
Para Demo (2001), participar é, antes de tudo, um processo, uma caminhada, que desafia qualquer grupo que queira influenciar nos seus destinos, na sua história. É um desafio que gera dentro da sociedade humana caminhos pacíficos - através do diálogo e da negociação - para a conquista de seus direitos, para um aclaramento de seus deveres, para uma determinação de seus limites e de sua potencialidade.
Para o autor supracitado a participação impulsiona a sociedade a descobrir, através do uso de sua criatividade, formas alternativas de conquistar uma melhoria de qualidade de vida. Participar é tomar parte em alguma coisa, é ter parte em alguma coisa, é fazer parte de algo, é ser parte de uma coisa. Assim os seres humanos tomam parte, têm parte, são partes da humanidade. Quer dizer, participam desse grande conjunto de seres que forma a humanidade. Mas participar tem também sentido mais específico. Significa atualmente uma conquista que os seres humanos vêm fazendo para poderem se responsabilizar pela procura de solução para todo e qualquer problema que exista.
Para Demo (2001), cada vez mais a palavra "participar" vai tomando o sentido de exteriorizar uma necessidade que a pessoa humana tem dentro de si de querer expressar o que pensa fazer construir, sentir-se unido a outros. "Participar" vai se tornando uma necessidade de auto expressão, de valorização de si mesmo, de valorização da sociedade.
Os seres humanos vivendo na sociedade vão percebendo que existem alguns que têm nas mãos as decisões, apossaram-se do poder. Essa descoberta faz com que se tenha vontade de tomar parte nas decisões, se procure construir e responsabilizar-se pelas soluções tomadas por esse poder. Daí surge à necessidade de participar das atividades que fazem com que o ser humano progrida social e individualmente.
Assim, participar tem muito a ver com o envolvimento efetivo nos destinos, nos rumos e no poder de decisão daquelas resoluções que poderão interferir na vida de cada uma das pessoas. Ainda hoje acontecem grandes lutas: as lutas contra o racismo, que certamente levarão a humanidade a participar da grande universalidade das raças; as lutas contra a guerra e pela paz; as lutas pela preservação da ecologia; as lutas pelos pobres e oprimidos.
Essas lutas acontecem para que as diversas categorias de seres humanos possam participar das grandes decisões e possam responsabilizar-se pelas decisões tomadas por aqueles que estão no poder em nome do povo. Participar é a grande batalha da humanidade para poder traçar o caminho de seu próprio destino.
Historicamente o processo de construção da cidadania reporta-nos a períodos remotos da organização social dos indivíduos, pois ao contrário do que se pensa esta não emerge com a égide do sistema capitalista, mas se origina ainda nos primórdios das civilizações européias.
De acordo com Costa (2005, p. 27), a humanidade deve aos gregos o moderno conceito de cidadania, ou melhor, de democracia. “A própria palavra democracia, que nasceu na polis ou cidade-estado como Atenas e Corinto, significava poder popular”.
A cidadania significava, portanto, algo mais do que a garantia de plenos direitos. Era, pois, um status que oferecia ao cidadão várias possibilidades, indo além das destinadas ao indivíduo comum. Em Roma, a situação não era diferente. Sociedade escravista, baseada nas “gens” (famílias), era dominada pelos patrícios, os quais detinham a cidadania e os direitos políticos. À plebe, constituída de romanos não nobres e de estrangeiros, não cabia qualquer tipo de direito. Este quadro alterou-se aos poucos, possibilitando o acesso à cidadania a todos os romanos de nascimento, mesmo que fossem escravos libertos. (COSTA, 2005, p. 78).
Vale destacar que “a cidadania é limitada por fatores políticos” (CARVALHO, 2002, p. 115). Ou seja, depende das condições políticas enraizadas, sendo necessária para sua efetivação a mudança de costumes e de mentalidades em uma sociedade tão marcada pela experiência do mando e do favor, da exclusão e do privilégio.
Para Carvalho (2002) esses fatores políticos proporcionam as condições para que se formassem, depois, os conceitos de mercado de trabalho informal e marginalidade, isso porque, no primeiro conceito, não estavam contemplados os desempregados, ou subempregados, mas todos que por mais regulares e estáveis que estivessem não tinham suas ocupações regulamentadas pelo Estado. As posturas de política social eram concebidas como privilégio e não como direito, já que uma série de trabalhadores (todos os autônomos e, principalmente, as trabalhadoras domésticas) ficava à margem dos benefícios concedidos pelo sistema previdenciário da época.
5 OS DIREITOS SOCIAIS COMO VIÉS DA CIDADANIA COLETIVA
Os direitos sociais são uma dimensão dos direitos fundamentais do homem que se consubstanciam geralmente nos ordenamentos jurídicos estatais como prestações positivas com objetivo de dar melhores condições de vida aos mais fracos. São fundamentadas nos direitos que tendem a realizar a igualização de situações sociais desiguais.
Portanto, direitos que se conexionam com o direito de igualdade, fundamental no viés da cidadania. Esses direitos sociais valem como pressupostos do gozo de direitos individuais na medida em que cria condições materiais mais propícias ao auferimento da igualdade real, o que, por sua vez proporciona condição mais compatível com o exercício efetivo da liberdade (RIBEIRO, 2009).
Vale destacar que, no Brasil, a Constituição de 1988 realiza a dicotomia entre Direitos Sociais e Direitos Sociais dos trabalhadores, quando a solução lógica deveria ser a unificação da terminologia, de modo que os direitos dos trabalhadores se alojassem, diretamente, nos Direitos Sociais. Com efeito, no artigo 6º, a Constituição declara que são Direitos Sociais “a educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados” (RIBEIRO, 1999).
Neste contexto, os direitos dos cidadãos são decorrências dos direitos das profissões e as profissões só existem via regulamentação estatal. O instrumento jurídico comprovante do contrato entre o Estado e a cidadania regulada é a carteira profissional que se torna, em realidade, “mais do que uma evidência trabalhista, uma certidão de nascimento cívico” (SANTOS, 1979, p. 76.
Um ponto determinante a ser esclarecido neste estudo diz respeito à dicotomia entre direitos sociais e direitos humanos sendo que o primeiro assume caráter de ‘ajuste’ das desigualdades entre os grupos sociais advindas das ações principalmente do Estado.
Assim, de acordo com os estudos de Guerra (2001) pode-se definir direitos Sociais como direitos de conteúdo econômico que se traduzem em determinadas prestações devidas pelo Estado ou por outras Instituições à generalidade dos cidadãos ou a determinados grupos abstratamente considerados e atribuídos com o intuito de realizar a Justiça Social. Esses direitos sociais são profundamente confundidos com direitos humanos. Os direitos sociais são uma outorga do Estado, enquanto os direitos humanos são elementos da sociedade com base na liberdade e na igualdade, dois valores universais que se traduzem em princípios básicos, dos quais emanam todos os direitos humanos. Foi baseado nesses valores que a humanidade veio consolidando ao longo da sua história o reconhecimento de que todo e qualquer ser humano é dotado de dignidade, inerente à sua condição humana. Este reconhecimento resultou na concepção de direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais, fundados nos princípios de igualdade e liberdade.
A expressão mais notória desta grande conquista é o artigo 1º da Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 10 de dezembro de 1948; que dispõe o seguinte: “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. Dotados como estão de razão e consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade”. Neste contexto, a Declaração Universal dos Direitos Humanos é um marco, resultante de longa luta, conquista e construção perpetrada ao longo da história constitucional do ocidente, como pode ser verificada em vários antecedentes. Guerra (2001, p. 114) destaca exatamente essa distinção quando observa com propriedade:
Não raramente, são confundidos com os designados Direitos Humanos ou Fundamentais. Todavia, trata-se de uma realidade diferente, porque os Direitos Sociais resultam da outorga de determinados benefícios por parte do Estado aos seus cidadãos e, embora uma das finalidades do Estado seja a promoção do bem-estar daqueles que lhe estão ligados pelo vínculo da nacionalidade, a atribuição de mais e melhores Direitos Sociais, depende de múltiplos fatores, designadamente o desenvolvimento econômico do país. Digamos que o não reconhecimento de determinados Direitos Sociais, não resulta necessariamente numa violação da dignidade da pessoa humana. Os Direitos Fundamentais ou Direitos Humanos são inerentes à natureza da pessoa humana. São Direitos originários e imprescritíveis, não têm origem em qualquer concessão por parte do Estado. São anteriores ao próprio Estado e constituem como uma reserva moral do homem.
Como se vê Guerra destaca determinados Direitos Sociais para a população em geral e, observa que estes podem e devem contemplar grupos restritos que se beneficiem de direitos específicos sem que estes assumam a natureza de privilégios de classe. Isso significa que, as pessoas com deficiência, por virtude da incapacidade física, sensorial ou mental de que são portadoras, estão sujeitas a determinadas garantias legais previstas no plano de direitos sociais. Assim, razões de justiça e solidariedade social impõem que os custos destas limitações sejam em parte suportados pela sociedade em geral, através da criação de mecanismos legais susceptíveis de proporcionarem igualdade de oportunidades para todos ou destinados a garantirem certas prestações com caráter compensatório. No entanto seu conceito está diretamente ligado à questão da exclusão social.
Nesta questão, a sociedade moderna distingue-se radicalmente das sociedades antigas no que se refere à concepção e ao trato da exclusão social. Nestas últimas, sociedades cujas bases estão fundadas em princípios éticos particularistas, “a exclusão social é natural, intrínseca e constituinte” (RIBEIRO, 1999, p. 292).
O campo da exclusão social é múltiplo e pode considerar vários aspectos dentre elas a exclusão ambiental causada por processo de desigualdades socioambiental. Xiberras apud Nascimento (1994) diz com muita propriedade que a exclusão ambiental representa sempre uma ruptura de vínculos ambientais constituídos nos ordenamentos jurídicos, assim a exclusão social compreende uma rica variedade de situações, dentre elas a ambiental, o que se coaduna com o processo de racismo ambiental.
Assim, alguns autores como Santos (2012) enquadram o racismo ambiental como exclusão social na matriz que articula a inserção social e a integração ao direito ao direito a um meio ambiente equilibrado por intermédio de 4situações clássicas: a) a situação de integração social, em que as pessoas excluídas social e ambientalmente estão fora do contexto de direitos sociais da CF/1988; b) a situação da formatação de políticas públicas em que as pessoas sejam inseridas no contesto social e ambiental, objeto destas políticas públicas; c) a situação de vulnerabilidade, em que as pessoas ao serem alvo do racismo ambiental perdem sua condicional idade de inserção ambiental; d) e, finalmente, a situação de exclusão ou de desfiliação em que as pessoas são desinseridas e desintegrados dos direitos contidos no art. 225 da CF/1988. Isso tudo já havia sido alertado por Jaguaribe (1989), fazendo alusão que as constantes crises econômicas por que o Brasil passa de tempos em tempos atinge profundamente a estrutura social extremamente heterogênea, tenderia normalmente a criar situações crescentes de exclusão.
CONCLUSÃO
O interesse pela discussão sobre a questão do Racismo Ambiental nasceu de uma observação mais ampla acerca das possibilidades e limites da utilização do direto ambiental em consonância com a psicologia ambiental como um instrumento de ajuda no exercício da cidadania de comunidades em condições de vulnerabilidade social. Muito embora, não tenhamos feito à pesquisa empírica, em conversas formais e informais com alguns moradores da comunidade destas áreas, percebemos na leitura a dificuldade que os profissionais detêm no sentido de proceder a um ordenamento seqüencial que seja reflexivo e flexível na composição da ajuda a essas pessoas na intervenção, pois a psicologia ambiental é uma psicologia social que estuda a atividade do psiquismo decorrente do modo de vida do lugar/comunidade buscando respostas para o sistema de relações e representações, identidade, níveis de consciência, identificação e pertinência dos indivíduos ao lugar/comunidade e aos grupos comunitários o que se coaduna perfeitamente com o direito.
Neste ínterim, se pretendeu com este trabalho, como objetivo geral tecer uma discussão sobre o termo racismo ambiental, a partir da sua contextura histórica, e promover um diálogo com o termo Justiça Ambiental, sendo possível constituir historicamente a inclusão da psicologia ambiental em consonância com o direito ambiental como elemento constitutivo e imprescindível para a formação cidadã de uma comunidade, sendo que a mesmo é parte integrante do cotidiano da vida das pessoas em seus projetos de vida.
No que tange ao primeiro objetivo específico de identificar e elencar os principais elementos do racismo ambiental e da psicologia ambiental na ótica do direito ambiental concluiu-se que ao analisar, pelo estudo bibliográfico, os elementos contextuais, históricos e evolutivos sobre o racismo ambiental nos diferentes segmentos sociais, perceberam-se que o mesmo é basicamente um processo de irracionalidade e, portanto pressupõem seqüência no tempo, não se manifestando num dado momento, mas se realizando continuamente ao longo da história, atravessando estágios diversos. Para combatê-lo deve se construir movimentos de participação e trabalhar com a construção da cidadania coletiva na questão social em suas diferentes formas de manifestação.
Quanto ao segundo objetivo específico de verificar quais as políticas públicas de combate ao racismo ambiental concluíram-se, por analogia, pela pesquisa bibliográfica, que esta questão pode aprofundar-se com a práxis da construção da cidadania e influir nos projetos de vida das pessoas que se encontram nestas condições reelaborando suas prioridades, sempre numa perspectiva de intervenção planejada, com a participação direta e indireta do povo, com os profissionais que trabalham na área.
Com relação ao terceiro objetivo específico de discutir a importância da justiça ambiental no contexto das políticas públicas de combate ao racismo ambiental, concluiu-se, pela pesquisa bibliográfica, a questão da participação dos comunitários, de forma geral é uma questão de coerência e consciência que precisa ser estimulada pelos profissionais, já que as dificuldades são muitas, principalmente relacionadas às suas próprias sobrevivências o que acaba por afastá-los da luta conjunta pelo estabelecimento da cidadania. Neste contexto: como sugestão pode-se, por meio dos profissionais e das instituições sociais da comunidade:- Elaborar, coordenar, executar e avaliar planos, programas e projetos que sejam do âmbito da formação da cidadania com participação da sociedade civil; - Planejar, organizar e administrar benefícios sociais; - Planejar, executar e avaliar pesquisas que possam contribuir para a análise da realidade social e para subsidiar ações profissionais; - Planejamento, organização e administração de políticas sociais.
Finalizando, nossa compreensão é que os profissionais de direito e de psicologia devem estar sempre atentos à questão social e suas múltiplas formas de expressão, para poder compor e elaborar um planejamento que possa compreender o real, para além do real, que sirva como guia, direção e caminho, devendo estar aberto para o surgimento de novas demandas, podendo assim, ser repensado, adequado, corrigido, ou seja, permanentemente avaliado e passível de mudanças.
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[2] Docente do Curso de Direito do Centro Universitário de Ensino Superior do Amazonas – Ciesa. E-mail: [email protected]
Discente do Curso de Bacharel em Direito pelo Centro Universitário de Ensino Superior do Amazonas – CIESA.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FONTINELE, Angelica de Oliveira. Racismo ambiental sob a ótica do direito e a psicologia ambiental Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 07 out 2019, 04:44. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/53538/racismo-ambiental-sob-a-tica-do-direito-e-a-psicologia-ambiental. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: WALKER GONÇALVES
Por: Benigno Núñez Novo
Por: Mirela Reis Caldas
Por: Juliana Melissa Lucas Vilela e Melo
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