GUILHERME AUGUSTO MARTINS SANTOS
(Orientador)[1]
RESUMO: Nesse artigo discute-se questões relacionadas as práticas restaurativas e o princípio da voluntariedade, bem como as possíveis consequências da não aceitação por uma das partes direcionadas ou indicadas por magistrados para participarem (in)voluntariamente desses procedimentos restaurativos. Tendo como objetivo geral: identificar a forma como as Práticas Restaurativas vem sendo recepcionada pelas partes envolvidas em um conflito em demandas já judicializadas, quando elas são encaminhadas por autoridades judiciais para participarem dos círculos restaurativos promovidos por diversos e diferentes projetos desenvolvidos em tribunais de justiça por todo o país, paralelo aos processos judiciais em curso. Utilizou-se de uma metodologia dedutiva, com base nas bibliografias e a realização comparativa da visão das principais personalidades no assunto, os especialistas como Howard Zehr e Kay Pranis. Concluindo que Justiça Restaurativa é uma nova e brilhante oportunidade de olhar para o conflito em busca da verdadeira paz social tão reverendada pelo judiciário.
PALAVRAS-CHAVE: Práticas Restaurativa; Princípio da Voluntariedade; Processos Judiciais.
ABSTRACT: This article discusses issues related to restorative practices and the principle of voluntariness, as well as the possible consequences of non-acceptance by one of the parties directed or appointed by magistrates to participate (in) voluntarily in these restorative procedures. Having as a general objective: to identify how the Restorative Practices have been received by the parties involved in a conflict in already judicialized demands, when they are referred by judicial authorities to participate in the restorative circles promoted by several and different projects developed in courts of justice by all over the country, in parallel with ongoing legal proceedings. We used a deductive methodology based on the bibliographies and the comparative realization of the vision of the leading personalities in the subject, such as Howard Zehr and Kay Pranis. Concluding that Restorative Justice is a brilliant new opportunity to look to the conflict for true social peace so revered by the judiciary.
KEYWORDS: Restorative Practices; Voluntary Principle; Court Lawsuits.
SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. As Práticas Restaurativas e suas Nuances. 2.1 Breve Histórico da Justiça Restaurativa no Exterior e no Brasil. 2.2 Noções Conceituais. 2.3 Justiça Restaurativa na Visão de Kay Pranis e Howard Zehr. 2.4 Princípios da Justiça Restaurativa. 2.5 Legislações Brasileiras e Internacionais que norteiam a Justiça Restaurativa. 3. Princípio de Voluntariedade, sua adesão nos processos de Justiça Restaurativa no Brasil e consequências. 4. Considerações Finais. 5. Referências.
1. INTRODUÇÃO
No Brasil desde o ano de 2003, através de ações desenvolvidas pela Secretaria de Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça e do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD, buscou-se mediante esforços interinstitucionais mecanismos que possibilitassem um avanço nas alternativas de tratamento dos conflitos no âmbito do judiciário.
Essa busca é motivada por termos uma Constituição Federal que instituiu aos cidadãos o pleno exercício da cidadania e o respeito a dignidade da pessoa humana estabelecido no art. 1º, além de assegurar as garantias fundamentais de direito promulgadas no art. 5º, bem como uma ordenação jurídica que promova a pacificação social para que ocorra medidas que possam repreender aqueles que cometem crimes e/ou atos infrancionais e que doravante possam resignificar as suas condutas colaborando para a construção de uma solução de acordo de forma responsável e considerando os sentimentos e as necessidades reveladas a partir da conduta desviante .
Essa forma de enfrentamento dos conflitos é conhecida mundialmente como Justiça Restaurativa-JR, que visa através de métodos humanizados colaborar com as vítimas, com os ofensores e a comunidade no sentido de buscar bases para restaurar vidas e reitegrar socialmente o sujeito enquanto indivíduo munido de direitos e principalmente de deveres.
O presente artigo analisará, em especial, as práticas restaurativas e a observância do princípio da voluntariedade, bem como as possíveis consequências da não adesão (aceitação/anuência/acolhimento) por uma das partes na resolução dos conflitos naquelas demandas já judicializadas.
Assim, o objetivo geral consistiu em identificar a forma como as Práticas Restaurativas vem sendo recepcionado pelas partes envolvidas em um conflito em demandas já judicializadas, quando elas são encaminhadas por autoridades judiciais para participarem dos círculos restaurativos promovidos por diversos e diferentes projetos desenvolvidos em diversos tribunais de justiça por todo o país.
Destaca-se que o formato espacial do círculo restaurativo simboliza a liderança partilhada, igualdade, conexão e inclusão e promove o foco, responsabilidade e participação de todos (PRANIS, 2010).
Os respectivos projetos fomentam as denominadas Práticas Restaurativas que em essência são estratégias propostas para amenizar os transtornos ocorridos a partir desses conflitos, utilizando o diálogo democrático como instrumento principal para promover a paz social entre as partes da lide e a comunidade direta e indiretamente envolvida.
Enfatiza-se que no Brasil os métodos consensuais para resolução de conflitos, incorporados no sistema de justiça favorecem consideravelmente o desempenho da missão do poder judiciário, consistente no tratamento adequado aos conflitos sociais, não só pela redução das demandas processuais, mas especialmente pela transformação sociais decorrente de mudança da mentalidade hetero compositiva para a mentalidade autocompositiva inevitavelmente mais adequada às especificidades dos conflitos e das pessoas envolvidas (WATANABE, 2011).
Por conseguinte, serão analisados os princípios fundamentais da Justiça Restaurativa, em especial, o princípio da Voluntariedade observando a sua adesão e o cumprimento da legislação, das normativas dos tribunais e as possíveis consequências da violação de um princípio tão essencial aos métodos adequados de tratamento dos conflitos.
Neste sentido, para desenvolvimento deste artigo utiliza-se a metodologia dedutiva, além de linhas de pesquisas bibliográficas, comparativos da visão das principais personalidades, especialistas como Howard Zehr e Kay Pranis, além da compreensão das Resoluções nº 2002/2012 da Organização das Nações Unidas (ONU) e nº 225/2015 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), e outras legislações do ordenamento jurídico brasileiro necessários e pertinentes a temática.
Por fim, far-se-á a descrição das práticas restaurativas aplicada e incentivada pelo poder judiciário brasileiro, como forma de tratamento dos conflitos judiciais e extrajudiciais, que aos poucos vem sendo apresentados pelos Tribunais Judiciários dos estados, com o propósito de contribuir para melhor entendimento e revelar a necessidade da observância do princípio da voluntariedade como condição intransigível.
2. AS PRÁTICAS RESTAURATIVAS E SUAS NUANCES
As Práticas Restaurativas têm se consolidado como um conjunto sistematizado de técnicas e princípios podendo ser utilizado visando o fortalecimento de vínculos das relações interpessoais, mediações, conflitos e confrontos violentos com objetivo de transformação da cultura punitiva para a cultura de pacificação social, tão necessária na atual realidade da sociedade brasileira focando na responsabilização e não na punição.
Cormier (2002, 169), compreende que a justiça restaurativa é:
A JR é uma aproximação de justiça centrada na correção dos erros causados pelo crime, mantendo o infrator responsável pelos seus atos, dando diretamente às partes envolvidas por um crime – vítima (s), infrator e coletividade – a oportunidade de determinar suas respectivas necessidades e então responder em seguida pelo cometimento de um crime e de juntos, encontrarem uma solução que permita a correção e reintegração, que previna toda e qualquer posterior reincidência.
As Práticas Restaurativas propõem uma tomada de consciência sobre os conflitos e suas consequências a partir das necessidades apresentadas pelos envolvidos de forma direta ou indiretamente, através de um diálogo qualificado e consciente como a principal ferramenta, na perspectiva de evitar que o processo fique por anos tramitando na justiça e em alguns casos até evitando o início de uma ação judicial.
Dessa forma alguns aportes mencionam concepções sobre a justiça restaurativa no sentido de compreender as práticas existentes.
Na visão de Schirch (2004), as práticas de JR podem ser um instrumento de gestão de conflitos e de situações de violência, que procuram reduzi-la, além de transformar e ajudar pessoas a seguirem em frente.
Para Catarina Corrêa, juíza e coordenadora a definição de justiça restaurativa no Tribunal de Justiça do Distrito Federal consiste:
Quando as partes percebem que as necessidades delas, tanto do ofensor quanto da vítima, são acolhidas pelo poder judiciário, sendo valoradas, elas têm uma vivência de justiça que vai além de qualquer lei, cominando na transformação das pessoas envolvidas no conflito. Trabalhando no que deu causa ao problema, indo ao encontro da verdadeira origem do problema, para que não volte a ocorrer (BRASIL, 2019, p. 01).
Neste modelo de Justiça, o juiz transfere para as partes envolvidas na lide o poder de solucionar o conflito de forma igual, consciente e responsável. Ou seja, essas partes são os protagonistas, com voz ativa, decidindo e construindo, em comum, o melhor caminho para o conflito finalizando o litígio satisfeitos com o acordado, caso ocorra. Por isso, diferencia-se da justiça retributiva, vez em que é o juiz que decide o processo judicial, além de haver a punição pelo crime cometido.
Para que se realize o processo de Justiça Restaurativa é necessário o cumprimento de algumas exigências, como por exemplo a participação de uma terceira pessoa imparcial, denominada facilitador. Esse facilitador deverá ser capacitado e imparcial para as escutas das partes envolvidas no conflito. Ele apresentará o funcionamento da JR, conduzirá de forma neutra as etapas do processo restaurativo, compostos por fases de pré-círculo, círculo, pós círculo e acordos.
O papel do facilitador para Pinto e Sócrates (2005, p. 22) encontra-se na “competência de atuar juntamente com as partes, e reduzi-lo a termo, de forma clara e precisa, fazendo dele constar as obrigações e responsabilidades assumidas”.
Vale ressaltar que independente da adesão aos processos de práticas restaurativas, o processo é autônomo e independentemente dos demais já existentes nas esferas criminais, cíveis e administrativos.
Atualmente, sua aplicabilidade é ampla, podendo ser em qualquer área sendo difundida em acordos extrajudiciais, processos judiciais de menor potencial ofensivo, violência doméstica, da infância e juventude como também na área criminal, em escolas, presídios, ambientes de trabalho profissional (organizacional).
Todavia, após entender as nuances da justiça restaurativa, se faz primordial entender como ocorreu essa implantação no ordenamento jurídico que será pontuado mediante a historicidade deste processo no exterior e no Brasil.
2.1 Breve Histórico da Justiça Restaurativa no Exterior e no Brasil
Os aportes históricos discorreram que a justiça restaurativa teve os primeiros ensaios incialmente no plano internacional, tendo as suas origens na observação dos povos indígenas, sendo consolidada em países da Europa e Estados Unidos por volta do ano de 1970, com a criação do Instituto para Mediação e Resolução de Conflitos chamado IMCR.
A finalidade do IMCR consistia em colocar presentes, frente a frente, a vítima e o ofensor aplicando as técnicas de pacificação que foram sendo aperfeiçoadas ao longo dos anos em países no mundo, aos quais foram aderindo a esse novo formato de resolução de conflito, sendo constatado no ano de 1994, 123 desses programas nos Estados Unidos (JARDIM, 2014, p. 95).
Todavia, essa prática de tratamento de conflitos foi se estendendo a outros países, na qual os principais fundadores foram Howard Zehr e Kay Pranis entre outros estudiosos que dedicam a temática.
Por ter sido bem aceito pela comunidade e por apresentar alguns resultados positivos, a Organização das Nações Unidas percebeu a necessidade de editar uma resolução com orientações aos países signatários, entre eles, o Brasil.
No Estado brasileiro, a JR foi implementada a partir do ano 2000, tendo como estado pioneiro o Rio Grande do Sul, através da aplicabilidade do Juiz Leoberto Brancher, com a criação do Núcleo de Estudos em Justiça Restaurativa da Escola Superior da Magistratura, visto que o mesmo defendia que o sistema institucional de Justiça Tradicional não é senão reflexo de um padrão cultural, historicamente pautado pela crença na legitimidade do emprego da violência como instrumento compensatório das injustiças e na eficácia pedagógica das estratégias punitivas (RIO GRANDE DO SUL, TJ/RS, 2019)
Doravante o projeto piloto difundido foi propagado, posteriormente, instalado em outros estados brasileiros, como Minas Gerais, São Paulo, Pará, Paraná, Tocantins e outros.
Mais tarde, em 2015, foi verificada ações voltadas para as práticas restaurativas em quase todos os estados brasileiros, após recomendação da Organização das Nações Unidas a partir da Resolução nº 2002/12 que instituía princípios básicos para utilização de programas de justiça restaurativa como uma nova modalidade de resolução de conflitos, pensado e protagonizando pelo diálogo entre as partes nas relações dessas discussões (ONU, 2002).
Apesar de ser algo recentemente no Brasil, é imprescindível conhecer as noções conceituais e as visões dos autores Kay Pranis e Howard Zehr, bem como os princípios que serão discorridos nas subseções a seguir.
2.2 Noções Conceituais
A Justiça Restaurativa conceitualmente pode ser explicada como um método alternativo que busca contribuir para o enfrentamento dos conflitos.
[...] “numa de suas dimensões”, pauta-se pelo encontro da “vítima”, “ofensor”, seus suportes e membros da comunidade para, juntos, identificarem as possibilidades de resolução de conflitos a partir das necessidades dele decorrentes, notadamente a reparação de danos, o desenvolvimento de habilidades para evitar nova recaída na situação conflitiva e o atendimento, por suporte social, das necessidades desveladas. (PENIDO; TERRA; RODRIGUEZ, 2013).
Ainda se encontram muitas definições do conceito de JR, por ser algo em construção e aperfeiçoamento. Mas, tem-se vários conceitos formulados por especialistas no tema, bem como normativas que estabelecem sua introdução na Justiça Brasileira.
Segundo Saliba (2009, p. 114), “não há uniformidade conceitual quanto à definição de JR, estando o conceito num processo de discussão e desenvolvimento”. Visto que, é um processo de soberania e democracia participativa numa justiça penal e social inclusiva perante o diálogo das partes envolvidas no conflito e comunidade para melhor solução que o caso requer”.
Diante de maiores orientações sobre essa nova forma de pensar e mediar conflitos, o Conselho Nacional de Justiça editou a Resolução nº 225/2016, no dia 31 de maio do respectivo ano, na qual apontou para o país a noção conceitual de justiça restaurativa que consistia em:
Um conjunto ordenado e sistêmico de princípios, métodos, técnicas e atividades próprias, que visa à conscientização sobre os fatores relacionais, institucionais e sociais motivadores de conflitos e violência, e por meio do qual os conflitos que geram dano, concreto ou abstrato, são solucionados de modo estruturado.
I – é necessária a participação do ofensor, e, quando houver, da vítima, bem como, das suas famílias e dos demais envolvidos no fato
danoso, com a presença dos representantes da comunidade direta ou indiretamente atingida pelo fato e de um ou mais facilitadores restaurativos;
II – as práticas restaurativas serão coordenadas por facilitadores restaurativos capacitados em técnicas autocompositivas e consensuais
de solução de conflitos próprias da Justiça Restaurativa, podendo ser servidor do tribunal, agente público, voluntário ou indicado por entidades parceiras;
III – as práticas restaurativas terão como foco a satisfação das necessidades de todos os envolvidos, a responsabilização ativa daqueles
que contribuíram direta ou indiretamente para a ocorrência do fato danoso e o empoderamento da comunidade, destacando a necessidade da
reparação do dano e da recomposição do tecido social rompido pelo conflito e as suas implicações para o futuro.
(...) (BRASIL, 2016).
A definição do CNJ estabelece um diálogo com a definição de JR na resolução da Organização das Nações Unidas - ONU:
É um processo no qual a vítima, o infrator e/ou outros indivíduos ou membros da comunidade afetados por um crime participam ativamente e em conjunto na resolução das questões resultantes daquele, com a ajuda de um terceiro imparcial (ONU, 2002).
Ambas resoluções permitem entender que o conceito de justiça restaurativa tem como base a compreensão que aqueles que participam do processo precisam se sentir pertencido, uma vez que no processo todas as partes estarão ligadas de alguma forma no sentido de discutir e resolver coletivamente as consequências práticas da mesma e a suas implicações para o futuro.
2.3 Justiça Restaurativa na Visão de Kay Pranis e Howard Zehr
Dentre os percursores dessa concepção de justiça restaurativa destaca-se Howard Zehr, ao discorrer em sua obra “trocando as lentes”, aportes que referenciaram de forma mundial a necessidade de implantação da JR como solução para tratar os conflitos, o modelo empregado foi pautado no modelo vítima – ofensor, mas depois outros modelos foram sendo consolidados.
Na concepção de Zehr, para se ter compreensão do conceito da JR é fundamental:
trocar as lentes – aliás, denomina-se trocando as lentes: um novo foco sobre o crime e a justiça, na perspectiva de ver o crime como uma violação de pessoas e relacionamentos, que tem por obrigação de corrigir os erros, na qual a justiça envolve a vítima, o ofensor e a comunidade na busca de soluções que promovem reparação, reconciliação e segurança (2008, p. 170-171).
Por conseguinte, o autor reforça em outra obra que
A Justiça Restaurativa oferece não é só uma nova prática de justiça, mais um olhar diferente de crime e um novo objetivo para justiça: o crime é visto como uma fonte de prejuízo que deve ser reparado. Além disso, o dano essencial do crime é a perda de confiança, tanto ao nível interpessoal e social. O que as vítimas e as comunidades precisam é ter sua confiança restaurada. A obrigação fundamental do delinquente é mostrar que eles são confiáveis. O objetivo da justiça deve ser para incentivar este processo. O objetivo primordial da justiça, então, deveria ser o restabelecimento da confiança. A tentativa de conseguir isso em ambos os níveis pessoal e social pode fornecer um guarda-chuva unificador para a nossa resposta ao crime. Ao invés de substituir outros, os objetivos mais tradicionais, que se tornaria a principal consideração na sentença, oferecendo razões e limites para a aplicação de metas, como a incapacitação e punição. (ZEHR, 1990, p.223)
Na mesma linha e com o mesmo objetivo, mas com características próprias, outra referência sobre a temática temos a autora Kay Pranis, uma especialista em referência internacional em Círculos de Justiça Restaurativa, em sua obra “processos Circulares de Construção de Paz”, apresenta o modelo adotado por ele baseado nos círculos de construção de paz.
Sua definição encontra-se no Guia do Facilitador na qual define que “O círculo é um processo de diálogo que trabalha intencionalmente na criação de um espaço seguro para discutir problemas muito difíceis ou dolorosos, a fim de melhorar os relacionamentos e resolver diferenças” (PRANIS, 2010, p. 11).
Pranis, defende que os círculos possibilitam as partes envolvidas a liberdade de haver o consenso, tendo todos a mesma oportunidade de se expressarem pelo diálogo, mas de forma totalmente voluntária e participativa.
Ambos autores defendem a importância de melhorar os conflitos existentes mediante a aplicabilidade da justiça restaurativa, porém diferem no que tange aos modelos adotados para execução desse processo onde a prática deve pautar no ofensor e no ofendido para juntos comungarem do mesmo acordo, sem a necessidade de uma ação penal.
2.4 Princípios da Justiça Restaurativa
O paradoxo de referir a Justiça na Justiça Restaurativa é permitir a compreensão de seu(s) significado(s), delimitar os pontos que congregam seus princípios e suas relações na vida social. Afirmar que a justiça é uma só, mas ela possui muitas formas de materialização e, nem sempre, coerente com suas premissas constitutivas (SANTOS, 2016, p. 35).
É imprescindível entender que os princípios universais fundamentais que norteiam a JR, aos quais são rigorosamente preconizados, precisam ser acatados não podendo em hipótese alguma serem desrespeitados ou ignorados quando determinados para os indivíduos.
Os princípios e as diretrizes da JR contemplam pressupostos teóricos e humanos, bem como sua factibilidade procedimental, para além do paradigma da violência judicial contemporânea. Ou seja, sua finalidade central é a reconstrução dos laços que se viram desfeitos pelo rompimento produzido pela relação conflituosa assim transformadas em convidadas de honra. (SALM; LEAL, 2012, p. 1).
Dentre os princípios que devem ser seguidos temos primeiramente o do Sigilo que se encontra consubstanciado em assegurar que tudo que for tratado nas sessões restaurativas não serão usadas pelas partes, nem utilizadas em processos judiciais como prova, preservando a segurança das informações para que se prevaleça um ambiente de confiança entre os envolvidos, tão pouco serão repassadas por terceiros.
Destaca-se ainda o princípio da informalidade cuja a intencionalidade deste mensura em deixar de lado a ideia de burocracia, como é exigido em tramitação na área judiciária. As maiores formalidades é apenas o cumprimento do passo a passo estabelecido em manual que é conduzido e proposto por facilitadores nas sessões de práticas restaurativas. No entanto, caso haja um acordo entre os envolvidos será lavrado um termo que tem validade judicial legal e deverá será cumprido.
Ao evidenciar o princípio da neutralidade entende-se que não existe culpado ou vítima no conflito existente, mas sim, é estabelecida a neutralização, igualdade entre as partes e facilitadores requerendo deste último uma postura imparcial a lide para se alcançar a busca pela solução do problema.
Visto que no princípio da oportunidade existe a reflexão da posição ao protagonismo dos envolvidos no conflito, em que é dado o direito a palavra as partes, um por vez, utilizando o objeto chamado bastão, instrumento da fala, em que a pessoa que tiver em seu poder, poderá falar sem que outros interfiram. Logo, esse princípio reporta-se a oportunidade em que essas partes têm de expressarem seus anseios, questionamentos, sentimentos, angústias, um ao outro, por meio de estratégias de diálogos democráticos, oficinas, escutas, reflexão, consciência dos transtornos vivenciados, seja por um dano moral ou material suportado.
Contudo ainda se aponta o princípio da voluntariedade que tem em seu escopo resguardar à vontade e o desejo de participar dos encontros propostos. Não se exigindo a obrigatoriedade da vítima e ofensor a participarem dos círculos restaurativos juntos ou em separados. Podendo em qualquer momento de os círculos haver sua desistência.
2.5 Legislações Brasileiras e Internacionais que norteiam a Justiça Restaurativa
A presente resolução nº 2002/2012, da ONU, proporcionou aos países signatários, incluindo o Brasil, a propositura do Programa de Justiça Restaurativa compreendendo que os processos restaurativos serão todos que busquem atingir resultados restaurativos, dando ênfase aos princípios básicos para utilização do programa de justiça restaurativa em matéria criminal.
Proveniente desses estudos, em 31 de maio de 2016, o Conselho Nacional de Justiça – CNJ, dispôs sobre a Política Nacional de Justiça Restaurativa no âmbito do Poder Judiciário.
Basicamente, seguindo as recomendações da Organização das Nações Unidas foram estabelecidas as resoluções 1999/26, 2000/14 e 2002/12, na qual destacam os princípios essenciais para essa política recentemente aplicada no sistema jurídico, seguindo orientações, fazendo observações dos expostos sobre capacitação, atribuições, planos pedagógicos e outros sobre a Justiça Restaurativa.
3. PRINCÍPIO DE VOLUNTARIEDADE, SUA ADESÃO NOS PROCESSOS DE JUSTIÇA RESTAURATIVA NO BRASIL E CONSEQUÊNCIAS
O princípio da voluntariedade dispõe que as partes não sejam obrigadas, em hipótese alguma, a participar dos círculos e processos restaurativos. Caso a parte não queira participar dos encontros não há que se falar de práticas restaurativas, cabendo a responsabilização do estado. Vale ressaltar que a justiça restaurativa e justiça retributiva são autônomas, podendo essa última transcorrer independentemente da aceitação ou não das práticas restaurativas, portanto ocorrerem paralelamente as tramitações de processos nas áreas cíveis e criminais visando a responsabilização do ofensor ou infrator do conflito.
Essa afirmativa se consubstancia visto que pode ocorrer um posicionamento na qual o infrator pode negar a sua responsabilidade por ter infringido a lei, ou se recusa a ver o fato como uma atitude moralmente errada, os encontros restaurativos não podem proceder (PINTO; SÓCRATES, 2005, p. 24).
No livro Práticas Restaurativas no Judiciário, institucionalização e lócus de implantação, de Santos (2019, p. 62), evidencia que:
O que se abstrai dessa voluntariedade é que consiste em um quesito imprescindível em qualquer programa que, portanto, deverá ser observada com maior rigor na implantação e/ou institucionalização do programa restaurativo, mais ainda por aqueles programas promovidos pelo poder judiciário, considerando a aparência de não autonomia do programa em relação ao processo judicial.
Nesse sentido, Santos (2019, p. 41), continua a mencionar que “percebe-se uma grande preocupação da verificação não só do respeito ao princípio básico da voluntariedade, mas também da forma e introdução do programa de JR, da capacitação e qualificação dos facilitadores”.
Assim, para esse princípio não seja violado, bem como a autoavaliação constante da sua institucionalização, se faz necessário uma atenção maior durante a fase de implantação das práticas restaurativas no judiciário, requerendo um olhar atento aos erros e acertos para se ter melhores resultados aos casos aplicados.
Ademais, Santos (2019, p. 62), volta a frisar:
Os programas restaurativos deverão ainda criar mecanismos próprios de fiscalização quanto ao trato e o respeito à voluntariedade. Devem ainda estabelecer instrumentos de autoavaliação dos seus procedimentos para identificar e excluírem eventuais questões prejudiciais à manifestação voluntária das partes em participar dos programas.
Ainda sobre o princípio da voluntariedade, destaca-se que:
Trata-se de um processo estritamente voluntário e relativamente informal, podendo ser utilizadas diversas técnicas, de mediação, conciliação e transação (em Portugal somente utiliza-se a mediação), para se alcançar o resultado restaurativo, ou seja, um acordo objetivando suprir as necessidades individuais e coletivas das partes e se lograr a reintegração social da vítima e do infrator (WINKELMANN; DETONI, 2019, p. 01).
Neste mesmo seguimento, para Santiago, Ardono, Fialho e Brum (2018, p. 01), definem como:
Tão pouco apoiar o ofensor não se significa apoiar o crime, e sim apoiá-lo no plano de reparação de danos, o objetivo neste entendimento e buscar uma solução que seja aceitável voluntariamente entre as partes as pessoas. A JR aponta o futuro promissor em direção à transformação social de um país melhor, buscando a paz.
É importante a compreensão que as partes afetadas pelo conflito devem voluntariamente optar pela justiça restaurativa como mecanismo solucionador do conflito em tela, diferentemente do processo tradicional, pois caso as pessoas não queiram optar pelo modelo restaurativo o estado não pode intimá-las a utilizar essa via e sim as esferas civis, criminais e penais.
O fato de ser caracterizado como relativamente informal alude à forma como acontecem os procedimentos. As partes são consultadas se desejam participar e a solução tida como justa é obtida através do diálogo entre elas, nos chamados círculos restaurativos, câmaras restaurativas, ou mesmo encontro restaurativo (SOUZA, 2019).
Por conseguinte, analisando as legislações pertinentes ao tema, logo no início da Resolução nº 225/16, realizada na 232ª Sessão Ordinária, em 31 de maio de 2016, na qual propôs em suas considerações, a Política Nacional de JR no âmbito do Poder Judiciário, que é evidente a exigibilidade do cumprimento do princípio da voluntariedade em seu trecho a seguir:
Considerando: que o direito ao acesso à Justiça, previsto no art. 5º, XXXV da carta Magna, além da vertente formal perante os órgãos judiciários, implica o acesso a solução efetiva de conflitos por intermédio de uma ordem jurídica justa e compreende o uso de meios consensuais, voluntários e mais adequados a alcançar a pacificação de disputa (BRASIL, CNJ, 2016).
Mais à frente, em seu inciso I, do artigo 1° da referida resolução dispõe ser necessária a participação do ofensor, e, quando houver, da vítima, bem como a presenças representantes da comunidade direta ou indiretamente atingida pelo fato e de um ou mais facilitadores restaurativos (BRASIL, CNJ, 2016).
Outro ponto salutar refere-se ao artigo 2º, especificamente no parágrafo 2° que nos traduz a condição fundamental para que ocorra a prática restaurativa, sendo destacada como:
O prévio consentimento, livre e espontâneo, de todos os seus participantes, assegurada a retratação a qualquer tempo, até mesmo a homologação do procedimento restaurativo. Nesse momento o facilitador entra em ação, apresentando o funcionamento da prática restaurativa, explicando as etapas de pré-círculo, círculo e pós-círculo deixando à vontade as partes decidirem por sua adesão ou não ao método restaurativo. E por fim, reduzi-la a termo, de forma genérica, o que foi estabelecido para prosseguir com os tramites legais processuais do programa JR ou de ações autônomas (BRASIL, CNJ, 2016).
Caso uma das partes não aceite participar do processo restaurativo, a parte que aceitou poderá seguir com a técnica sozinha. Onde a todo o instante será ofertado e dado o suporte necessário psicológico, social a parte que aderiu ao método. Mas é evidente que a essência da prática restaurativa perde sua validade, que é envolver todos que sofreram com o conflito e restaurá-las a partir da reflexão e da assunção de responsabilidade.
Ademais, não será admitida a coação ou obrigatoriedade da participação dos envolvidos as práticas de justiça restaurativa. Como cita no artigo 8º (BRASIL, CNJ, 2016):
Os procedimentos restaurativos consistem em sessões coordenadas, realizadas com a participação dos envolvidos de forma voluntária, das famílias, juntamente com a Rede de Garantia de Direito local e com a participação da comunidade para que a partir da solução obtida, possa ser evitada a recidiva do fato danoso, vedada qualquer forma de coação ou a emissão de intimação judicial para as sessões.
Os esclarecimentos de Jesus (2005), evidenciam que a Justiça Restaurativa é compreendida por um processo colaborativo e de envolvimento daqueles diretamente afetados por um crime, denominadas de “partes interessadas principais” objetivando determinar a melhor forma de preparação do dano gerado.
A maioria dos Tribunais de Justiça Estaduais na tentativa de institucionalizar as práticas restaurativas, após o incentivo das normativas nacionais e internacionais, passam a indicar em alguns dos seus documentos o princípio da voluntariedade e a necessidade da sua observância.
Adepto aos programas de JR, o tribunal de Justiça da Bahia- TJBA, em seu artigo 6, da resolução nº 8, de 28 de julho de 2010, reforça as atribuições dos facilitadores com foco para que eles possam garantir a voluntariedade das partes nas práticas restaurativas:
(...)
§ 1º É dever dos facilitadores manterem-se com neutralidade e imparcialidade, garantirem a voluntariedade de participação das partes na intervenção restaurativa e assegurarem a confidencialidade das informações prestadas na condução do pré-encontro, na mediação e do encontro restaurativo;
(...) (BAHIA, TJBA, 2010).
No Estado do Mato Grosso, o do Tribunal de Justiça- TJMT, instituiu o Programa de Justiça Restaurativa e criando o Núcleo Gestor de Justiça Restaurativa - NUGJUR, no âmbito do Poder Judiciário do Estado de Mato Grosso, em que regulamenta o núcleo e o funcionamento dos processos restaurativos, onde na Resolução nº 13/2017 TP, em seu artigo 8º, inciso I, intitula que ao facilitador em JR, compete:
I - coordenar os trabalhos de escuta e diálogo entre os envolvidos, por meio da utilização de métodos consensuais na forma autocompositiva de resolução de conflitos, próprias da Justiça Restaurativa, devendo ressaltar durante os procedimentos restaurativos o sigilo, a confidencialidade e a voluntariedade da sessão, o entendimento das causas que contribuíram para o conflito, as consequências que o conflito gerou e ainda poderá gerar, e o valor social da norma violada pelo conflito (MATO GROSSO, TJMT, 2017).
No livro Manual de Gestão para Alternativas Penais: Práticas de Justiça Restaurativa enfatiza que a orientação fornecida pelos facilitadores, adequada às pessoas envolvidas em cada caso, encaminhadas pelo poder Judiciário, necessitam ser observadas requisitos importantes para o encaminhamento, preparação e o funcionamento da JR, principalmente quanto a: fase de pré-encontro é aquela que se realiza a partir de encontros privativos com as pessoas diretamente envolvidas em cada caso (BRASIL, 2017, p. 41).
Sobrepujando o manual destaca que: (BRASIL, 2017, p. 58):
(...)
Realização de um ou quantos encontros forem necessários até que os facilitadores percebam o momento adequado de realizar o encontro entre as pessoas;
Cuidado com o primeiro encontro, informando sobre a voluntariedade do procedimento, uma vez que uma orientação inadequada sobre a condução do caso e sobre a participação das pessoas poderá resultar em revitimização;
(...)
- Voluntariedade de participação em tal procedimento;
- Sigilo das informações tratadas;
- Suspensão do processo penal até decisão final do caso na instância da Justiça Restaurativa;
No que tange aos encaminhamentos o manual enfatiza o procedimento a ser seguido (BRASIL, 2017, p. 63):
Os encaminhamentos são realizados pela equipe de acordo com as demandas apresentadas pelas pessoas envolvidas antes, durante ou a partir dos acordos firmados na Justiça Restaurativa. Destaca-se que para o encaminhamento à rede de proteção ou em casos onde se constate a necessidade de tratamentos, estes serão sempre voluntários. Grande parte do público que chega aos programas apresentam vulnerabilidades sociais e os encaminhamentos para a rede parceira visam a minimização destas vulnerabilidades.
(...)
“Os Círculos de Justiça Restaurativa e de Construção de Paz ocorrem em três etapas: pré-círculo, círculo restaurativo e pós-círculo. Na etapa do pré-círculo é realizada uma primeira aproximação com as pessoas envolvidas no conflito, sendo apresentada a metodologia e o propósito do trabalho. Neste momento também se oportuniza um espaço de fala aos participantes sobre o fato ocorrido e se tem a aceitação da proposta, respeitando-se o princípio da voluntariedade”.
(...)
O Tribunal de Justiça do Distrito Federal - TJDF, na portaria conjunta nº 6 de 15 de janeiro de 2019, disciplinou a política judiciária de justiça restaurativa do tribunal de justiça do Distrito Federal e dos territórios – TJDFT, não comenta sobre o princípio da voluntariedade (BRASIL, 2019).
No Estado do Paraná, o Tribunal de Justiça – TJPR, na Portaria nº 08/2019, instituiu o Núcleo Permanente de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos (NUPEMEC), compreende no uso de suas atribuições legais e regimentais que:
Considerando: as recomendações da Organização das Nações Unidas para fins de implantação da Justiça Restaurativa nos estados membros, expressas nas Resoluções 1999/26, 2000/14 e 2002/12, que estabelecem os seus princípios básicos;
Considerando que o direito ao acesso à Justiça, previsto no art. 5º, XXXV, da Carta Magna, além da vertente formal perante os órgãos judiciários, implica o acesso a soluções efetivas de conflitos por intermédio de uma ordem jurídica justa e compreende o uso de meios consensuais, voluntários e mais adequados a alcançar a pacificação de disputa (PARANÁ, TJPR, 2019).
Os pontos discorridos afirmam que a justiça restaurativa é uma tratativa que deve ser instituída em todo o território brasileiro com o intuito de garantir aos indivíduos a mediação dos conflitos sem a prescrição jurídica de ordem mais severa e aplicativa com penalidades civis, criminais ou penais.
Sendo de suma importância nessa organização o papel do facilitador para empoderar a mediação na justiça restaurativa buscando soluções harmoniosas para diminuir os conflitos existenciais entre as partes.
Ressaltando que a justiça restauradora é a possibilidade plausível para o infrator conseguir a sua reinserção na sociedade e exercer a sua cidadania de forma consciente dos direitos e deveres que todos os indivíduos devem seguir no que tange aos direitos legais já instituídos na Constituição Federal de 1988.
Levando-se em consideração todo o exposto, faz-se necessário repisar que a adesão nos processos de JR no Brasil é livre e voluntária. Logo, é obrigatório e fundamental valer-se da importância ao respeito do princípio da voluntariedade aplicados aos programas de Justiça Restaurativas nos estados brasileiros, compreendendo que o não cumprimento do princípio acarreta perdas e violações de interesses dos participantes dessas práticas restaurativas trazendo consequências/prejuízos, por vezes, irreversíveis as partes e aos envolvidos em geral.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
As práticas restaurativas vêm contrapondo a ideia da justiça punitiva, firmando-se como justiça dialogal e participativa em todas as suas áreas de aplicação, dando um outro olhar da sociedade para a Justiça, sendo visível que o atual modelo punitivo tem seus graves erros e consequências muitas vezes irreversíveis necessitando de mudanças urgentes.
Conclui-se, que este olhar proposto pela Justiça Restaurativa de não punição por punição, mas sim de fazer as partes refletirem, no seu íntimo, sobre consequências e a responsabilização de atitudes que prejudicaram não somente a vítima, mas também toda a coletividade podendo haver a reparação do dano financeiro, psicológico e moral, possibilitando as partes poderem colocar-se no lugar do outro para reflexão, aumentando a empatia, minimizando e evitando futuros conflitos.
É notório a imensurável oportunidade que este modelo de tratamento dos conflitos possui, podendo proporcionar um enfrentamento racional dos conflitos pregando uma justiça de não violência e mais comunicação. Entretanto, para que ferramenta se concretize de forma eficaz, ela obrigatoriamente deve-se valer de forma consensual e voluntária, sendo estes valores indissociáveis.
Na pesquisa foram analisadas resoluções, portarias, ordenamentos jurídicos e regimentos dos tribunais brasileiros identificando e compreendo que não é permitido a violação do princípio da voluntariedade, prevalecendo o respeitado aos princípios da dignidade da pessoa humana, igualdade e vontade das partes no enfretamento dos conflitos por meio das práticas restaurativas.
Para além da análise do tema tratado, identificou-se a necessidade de maior amplitude não só de mais divulgação nos estados sobre esse tema, mas de apresentação dessa metodologia ao próprio judiciário com recorrentes capacitações aos servidores, magistrados e voluntariados.
Além de disseminação do tema nas atividades acadêmicas, escolares, televisivas, nas comunidades para quebra de barreira de algo que ainda é desconhecido para muitos brasileiros.
Em essencial, destaca-se que o momento qual o ofensor é convidado efetivamente para participar das práticas restaurativas deva acontecer de forma natural, espontânea e sem a indicação de condições ou supostas vantagens que possa induzir sua participação forçada.
É relevante trazer para a explanação que o princípio é importante, mas há especialistas que entendem ser necessário que a voluntariedade seja obrigatória trazendo discordância quanto a alguns casos restaurativos em que esse princípio não foi observado.
Logo, a inobservância do princípio da voluntariedade poderá colocar em risco a possibilidade de verdadeiramente transformar a vida e o comportamento desse indivíduo, mas também da vítima e da comunidade direta ou indiretamente evolvida e/ou atingida pelo crime, transformando um pouco a realidade estrutural e cultural que o Brasil ainda carrega consigo de punibilidade, dando chances as partes de poderem expressarem seus questionamentos, desejos e indagações do conflito sofrido.
Complementa-se que a JR é uma nova e brilhante oportunidade de olhar para o conflito em busca da verdadeira paz social tão reverendada pelo judiciário. Uma técnica que precisa estar constantemente sendo lapidada, mas que veio somar nas relações interpessoais, transformando e resgatando os valores humanos, cada vez mais esquecidos e perdidos pela atual sociedade considerada volátil.
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[1] Guilherme Augusto Martins Santos. Mestre em Direito pelo Centro Universitário de Brasília, pós-graduado em nível de especialização em Direito Civil e Processo Civil pela Católica do Tocantins, especialista em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Universidade Cláudio Mendes. E advogado militante – Advocacia Privada. Professor titular da Faculdade Católica do Tocantins e da Faculdade Serra do Carmo. [email protected]
Acadêmica do Curso de Direito da Faculdade Serra do Carmo.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, Cyntia Rezende. Práticas restaurativa e o princípio da voluntariedade Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 22 nov 2019, 04:51. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/53807/prticas-restaurativa-e-o-princpio-da-voluntariedade. Acesso em: 23 dez 2024.
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