MURILO BRAZ VIEIRA [1]
(Orientador)
RESUMO: O presente trabalho tem por escopo o estudo do trabalho análogo ao escravo na indústria têxtil. Para tanto, será utilizado o método dedutivo de pesquisa, e a utilização de pesquisa bibliográfica, jurisprudencial e legislativa. A indústria têxtil é um dos setores que mais crescem economicamente. Os flagrantes neste ramo da economia demonstram as condições precárias em que os trabalhadores vivem, com condições de trabalho em péssimas condições, jornadas de trabalho excessivas, visando tão somente o lucro. Estas posturas dos empregadores ferem um dos princípios basilares do direito, qual seja da dignidade da pessoa humana, além de ser considerado um retrocesso para os direitos humanos. No que atine os meios legais utilizados para combate desta exploração, estes devem ser aprimorados, juntamente com a educação da população e dos imigrantes que chegam diariamente ao país para que esta forma desumana de trabalho seja extinto.
Palavras-chave: Dignidade. Indústria Têxtil. Trabalho análogo ao escravo.
ABSTRACT: The present work has as scope the study of the analogous work to the slave in the textile industry. For this, the deductive method of research will be used, and the use of bibliographical, jurisprudential and legislative research. The textile industry is one of the fastest growing sectors economically. The striking in this branch of the economy demonstrate the precarious conditions in which workers live, with working conditions in very bad conditions, excessive working hours, aiming only at profit. These employers' postures undermine one of the fundamental principles of law, which is the dignity of the human person, and are considered a setback for human rights. Regarding the legal means used to combat this exploitation, these must be improved, along with the education of the population and immigrants who arrive daily in the country so that this inhuman form of work is extinguished.
Keywords: Dignity. Textile industry. Analogous work to the slave.
1 INTRODUÇÃO
O trabalho escravo no âmbito têxtil tem relação com toda a população, segundo o fato de estar presente no nosso cotidiano de forma implícita e explicita a ponto de pessoas estarem perdendo sua dignidade como trabalhadores por conta de cobranças e irregularidades no ambiente do trabalho.
Segundo Zygmunt Bauman "vivemos tempos líquidos, onde nada é para durar". Essa é uma frase do filosofo Polonês, que pode ser utilizada como uma reflexão para mundo têxtil, ao qual vem se deparado com o desfreio do consumismo em torno de produção para alimentar os desejos da população e obter lucros insaciáveis com o ramo da indústria têxtil.
Nesse contexto, considerando o latente consumismo ligado a indústria têxtil, que notadamente atinem grupos econômicos, que visam tão somente a obtenção de lucro. Em vista disso, existem inúmeras irregularidades sobre normas e direitos dos trabalhadores ao qual são expostos em jornadas exorbitantes e inaceitáveis dentro do direito do trabalho.
Abstrai-se, portanto, a necessidade de estudo sobre trabalho escravo no âmbito têxtil. Já que nos dias atuais constam inúmeras reportagens e relatos de pessoas e trabalhadores presos nessa rede de mercado por vários motivos, que para muitos podem ser fútil, em quanto para outros, necessário.
Nesta senda, surgem as seguintes indagações: qual é o impacto do trabalho escravo aos trabalhadores da indústria têxtil? E qual a relação da sociedade líquida atual com esses impactos, uma vez que o consumismo se mostra crescente cada vez mais?
O objetivo geral é descobrir qual foi o impacto social do trabalho escravo no ramo da indústria têxtil, em tempos de consumismo crescente na sociedade.
Em decorrência do objetivo mencionado, estabelece os seguintes objetivos específicos: Descrever a definição de trabalho escravo nos dias atuais; Verificar o panorama da indústria têxtil; Analisar a relação entre o consumismo crescente da sociedade líquida com a precarização do trabalho na indústria têxtil, possíveis impactos que a sociedade liquida traz aos trabalhadores da área têxtil.
Para abordar sobre o tema, foi realizado pesquisa estratégica descritiva e exploratória com método hipotético dedutivo, abordagem qualitativa e procedimento de pesquisa bibliográfica de autores que falam sobre o trabalho escravo, assim como consultas em site do Ministério Público do Trabalho e de normas pertinentes ao direito, bem como doutrinas acerca do tema em espeque.
Na primeira seção realizou-se uma pesquisa bibliográfica acerca do trabalho escravo, evolução histórica das leis trabalhistas.
Em seguida por meio de pesquisa verificou o panorama do trabalho na indústria têxtil em que obteve informação sobre a exploração da mão de obra dos trabalhadores dos procedimentos da cadeia de produção.
Por fim na última seção realizou-se uma pesquisa de dados fornecidos no site do Ministério Público do Trabalho, juntamente com estudos bibliográficos de autores sobre o tema, em que se analisou o impacto social do trabalho escravo no âmbito da indústria têxtil, assim como um breve estudo sobre a sociedade liquida e suas supostas consequências para os trabalhadores desse ramo.
2 EVOLUÇÃO JURÍDICA DO DIREITO DO TRABALHO
Com a evolução do direito, as legislações brasileiras passaram a versar não somente sobre as formas de estado, mas também surgiu a necessidade de normas que versem sobre o direito do trabalho. (MARTINS, pág. 55, 2018).
Nesse sentido, em 13/05/1888 foi assinada pela Princesa Isabel a Lei Áurea que aboliu a escravatura. Para Delgado (2011, p. 105) a Lei Áurea apesar de não possuir qualquer caráter justrabalhista, pode ser considerada como o marco inicial de referência da História do Direito do Trabalho brasileiro, cumprindo papel relevante para configurar esse novo ramo jurídico especializado.
De fato, constituiu diploma que tanto eliminou da ordem sociojurídica relação de produção incompatível com o ramo justrabalhista (a escravidão), como em consequência, estimulou a incorporação pela prática social da fórmula então revolucionária de utilização da força de trabalho: a relação de emprego. Nesse sentido, o mencionado diploma sintetiza um marco referencial mais significativo para a primeira fase do Direito do Trabalho no país do que qualquer outro diploma jurídico que se possa apontar nas quatro décadas que se seguiram a 1888. (DELGADO, 2011, p.105)
Nesse diapasão, com advento da Organização Internacional do Trabalho, criada em 1919, passou-se os organismos internacionais a adotarem mecanismos internos de proteção ao trabalho. Nesse sentido cita-se:
As transformações que vinham ocorrendo na Europa com advento da primeira guerra mundial e o aparecimento da OIT, em 1919, incentivaram a criação de normas trabalhistas em nossa legislação. Existiam muitos imigrantes no Brasil que deram origem aos movimentos operários reivindicando, melhores condições de trabalho e salário. (MARTINS. Pág. 56. 2018).
O Direito do Trabalho no Brasil começa então, a partir da Revolução de 1930, quando o Governo Provisório chefiado por Getúlio Vargas criou o Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio e deu início à elaboração de uma legislação trabalhista ampla e geral.
Antes disso, as poucas leis existentes com dispositivos e conteúdo de caráter trabalhista não podem ser consideradas para efeito do estabelecimento de uma normatização capaz de ser caracterizado como um sistema de proteção dos trabalhadores.
Em janeiro de 1942, o então Ministro do Trabalho, Indústria e Comércio, Alexandre Marcondes Filho, autorizado por Getúlio Vargas, nomeou uma comissão constituída de dez membros que, sob sua presidência, ficou encarregada da elaboração do que foi designado de anteprojeto de Consolidação das Leis do Trabalho e Previdência Social. (MARTINS. p.98).
Em 1 de maio de 1943, a Consolidação das Leis do Trabalho foi aprovada pelo Decreto-lei n. 5.452, que, no entanto, somente foi publicado no Diário Oficial em 9 de agosto daquele ano, entrando em vigor três meses depois, em 10 de novembro de 1943.
Desde sua entrada em vigor, a CLT sofreu inúmeras alterações, inclusive com a revogação de diversos dispositivos a partir da promulgação da Constituição Federal de 1988, mas a sua base original continuou a mesma.
Recentemente, porém, através da Lei n. 13.467, de 13 de julho de 2017, a CLT sofreu a sua mais ampla e significativa alteração. Dos 922 (novecentos e vinte e dois) artigos da CLT, foram alterados 54 (cinquenta e quatro), inseridos 43 (quarenta e três) novos artigos e 9 (nove) foram revogados, totalizando 106 (cento e seis) modificações.
Muitas dessas alterações, em especial as que consubstanciam a previsão de prevalência do negociado sobre o legislado, terão reflexos significativos na própria estrutura do Direito do Trabalho e inauguram um novo momento das relações de trabalho no Brasil.
A despeito das críticas que sempre foram feitas à CLT, principalmente aquelas que se referiam ao seu caráter intervencionista, não há como negar sua importância única para o desenvolvimento do Direito do Trabalho no Brasil.
Outrossim, no âmbito internacional, diversas outras legislações esparsas entraram em vigor, até que em 1948 a ONU promulgou a Declaração Universal dos Direitos do Homem, que retomava as ideias da Revolução Francesa. A declaração reconhecia a trindade de valores supremos: a igualdade, a fraternidade e a liberdade. Em seu artigo 4º ela declara: “Ninguém será mantido em escravatura ou em servidão; a escravatura e o trato dos escravos, sob todas as formas, são proibidos”.
No que atine aos Direitos Fundamentais previstos na Constituição Brasileira de 1988, destacam-se os elencados no caput do artigo 5º: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”. (BRASIL. Constituição Federal, 1988, art. 5).
O uso de pessoas traficadas para trabalhos forçados é amplo e está em diversas áreas, principalmente porque as cadeias de suprimentos industriais são complexas. Da manufatura de roupas, extração de cacau e produção de chocolates, produção de aparelhos eletrônicos e mineração entre outros, a indústria raramente sabe ou rastreia de onde sua matéria prima vem. No Brasil, 46.478 foram libertadas de condições análogas à escravidão de 1995 até 2011 (REIS, 2014).
Na linha do exposto, é imperioso ressaltar o cuidado do Constituinte, ao dispor em livro próprio sobre os direitos trabalhistas, no qual, são normas de observância obrigatória, tendo como uma das vertentes, a erradicação do trabalho escravo.
Não é demais dizer que além do regramento interno, atualmente dispomos de Declaração Universal dos Direitos Humanos, da Organização das Nações Unidas, a Declaração dos Direitos Fundamentais no Trabalho, bem como tantos outros documentos de proteção Universal dos Direitos Humanos.
Em arremate, vale mencionar o artigo 23º, a Declaração Universal dos Direitos do Homem dispõe que:
1. Toda a pessoa tem direito ao trabalho, à livre escolha do trabalho, a condições equitativas e satisfatórias de trabalho e à proteção contra o desemprego.
2. Todos têm direito, sem discriminação alguma, a salário igual por trabalho igual.
3. Quem trabalha tem direito a uma remuneração equitativa e satisfatória, que lhe permita e à sua família uma existência conforme com a dignidade humana, e completada, se possível, por todos os outros meios de proteção social.
4. Toda a pessoa tem o direito de fundar com outras pessoas sindicatos e de se filiar em sindicatos para defesa dos seus interesses.
Delgado (2016, p. 65) destaca que o Direito Internacional vem ganhando força devido à globalização e cita a recente jurisprudência do Supremo Tribunal Federal que conferiu caráter supralegal às regras de tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos, acentuando a importância no Brasil das convenções da OIT internamente ratificadas.
3 INSTRUMENTOS DE COMBATE AO TRABALHO ANÁLOGO AO ESCRAVO NO BRASIL
Para a exclusão do trabalho do escravo em nosso país, é preciso a interação de diversos fatores, em conjunto, vez que não existe uma medida específica para combate ao trabalho escravo. No Brasil, há muito que se investir na prevenção da exploração do trabalho humano, bem como em fiscalização, haja vista que já existe uma legislação relativamente boa, e com penas severas, sendo a dificuldade existente na constatação e denúncia.
Dentre os órgãos de combate ao trabalho escravo, existe a Organização Internacional do Trabalho - OIT, que reconheceu a existência do trabalho escravo no Brasil em 1995, oriundo de diversas denúncias, que motivou uma sequência de investigações. O relatório, conclusivo, apontou a que existe escravidão no país, é o que relata Damião (2014, p. 67).
Oliveira (2006, p. 19) também aponta que, após a constatação mencionada alhures foi implantado Grupos de Fiscalização Móvel, sob coordenação da OIT, que visavam à abolição do trabalho forçado.
Nesse diapasão, já no ano de 2014, na Conferência Internacional do Trabalho em Genebra foi aprovado um protocolo internacional, respaldado por uma recomendação, que atualiza a Convenção 29 da OIT sobre Trabalho Forçado. O instrumento em espeque aborda sobre vários pontos, mas principalmente dispõe que:
[...] o Protocolo reforça o marco legal internacional ao introduzir novas obrigações relacionadas com a prevenção do trabalho forçado, com a proteção das vítimas e com o acesso a compensações e ainda, requer que os governos adotem medidas para proteger melhor os trabalhadores de práticas de recrutamento fraudulentas ou abusivas, especialmente trabalhadores migrantes e enfatiza o papel a ser desempenhado por parte de empregadores e trabalhadores.
A OIT possui um trabalho combativo tanto em âmbito nacional quanto no internacional, enfrentando dificuldades de regulamentação tão somente no âmbito internacional, haja vista que de acordo com Damião (2014, p. 71), tais protocolos internacionais, são omissos no que cerne a punição dos países no âmbito internacional, acaso descumprissem as disposições contidas nos instrumentos internacionais. Mas, não deixando de ser um forte e combativo instrumento contra o trabalho degradante e escravo.
Ainda no que atine aos instrumentos de combate ao trabalho escravo, existe ainda, a lista suja. Em março de 2003, nos dizeres de Silva (2010, p. 172), “o Governo Federal lançou o Plano Nacional para Erradicação do Trabalho Escravo, reafirmando a existência da escravidão no Brasil e tornando sua eliminação uma prioridade nacional.”.
Nesse contexto, pelo instrumento em espeque, foram introduzidas diversas medidas para combater o trabalho análogo ao de escravo, e dentre elas foram previstas “cláusulas contratuais impeditivas para obtenção e manutenção de crédito rural e de incentivos fiscais nos contratos das agências de financiamento”, quando comprovada a prática de trabalho escravo. Silva (2010, p. 173) explica que para que se fizesse cumprir esta meta, o MTE editou a Portaria nº 1.234/2003, dispondo que:
[...] o Ministério deveria encaminhar, semestralmente, relação de empregadores que submetem trabalhadores a formas degradantes de trabalho ou os mantêm em condições análogas à de escravo aos órgãos governamentais por ela especificados, com o fim de subsidiar ações no âmbito de suas competências.
Este instrumento, visa, esclarecer a sociedade como um todo quem são os escravocratas, e possibilita que estas pessoas, informações, o que repise, a função desta lista é exercer controle preventivo e repressivo para contenção do trabalho escravo. Tanto é que, a lei deixa assente que estes escravocratas, tenham como punição um impedimento para concessão de créditos públicos ou de incentivos fiscais, além de permitir que sejam tomadas outras medidas, além de outras medidas no âmbito privado, como em relações comerciais com estas pessoas que exploram o trabalhador.
A Coordenadoria Nacional de Erradicação ao Trabalho Escravo, CONAETE, foi criada pela portaria nº 231, de 12 de setembro de 2002. Silva (2006, p.) explica que a coordenadoria é composta por procuradores representantes de todos os Estados brasileiros, sendo que:
[...] tem por finalidade coordenar e harmonizar a atuação dos membros do Ministério Público do Trabalho em todo o território nacional, além de buscar parcerias com outras instituições governamentais que atuam na área do combate ao trabalho análogo ao de escravo, como o Ministério do Trabalho e Emprego, a Polícia Federal, a Justiça do Trabalho e outros ramos do Ministério Público, a par de tentar uma maior articulação com a sociedade civil organizada.
Na linha do exposto, ainda sobre os mecanismos de erradicação do trabalho escravo, é imperioso ressaltar que existe ainda, o CONAETE, o qual é composto por procuradores do trabalho, que exercem a função de acompanhar, operações do Grupo Especial de Fiscalização Móvel, para facilitarem as relações com os trabalhadores e viabilizar e garantir a melhor coleta de provas para melhorar a coleta de provas para carrear eventuais atuações do Ministério Público do Trabalho.
Segundo dados colhidos pelo órgão supramencionado, em 2009, conforme trabalhado por SILVA (2006, p.), verberou com dados fundamentados nos casos apurados, foram averiguados 566 estabelecimentos, sendo que 3.571 trabalhadores mantidos em condições análogas à de escravo, dentre os quais, foram firmados 167 termos de ajuste de conduta e propostas 59 ações civis públicas sobre os fatos ocorridos.
De com as informações e missão do Ministério Público do Trabalho na internet a CONAETE tem por escopo:
[...] erradicar o trabalho em condições análogas às de escravo, a Conaete investiga situações em que os obreiros são submetidos a trabalho forçado, servidão por dívidas, jornadas exaustivas ou condições degradantes de trabalho, como alojamento precário, água não potável, alimentação inadequada, desrespeito às normas de segurança e saúde do trabalho, falta de registro, maus tratos e violência. O desafio da coordenadoria é aumentar sua atuação no combate ao trabalho análogo ao escravo, aperfeiçoando o ótimo trabalho que já vem sendo realizado, para que o trabalho análogo ao escravo seja extinto de uma vez por todas.
O Termo de Ajuste de Conduta, supramencionado, funciona como instrumento normativo que consiste em um acordo firmado com o empregador com a finalidade de coibir as práticas lesivas que este vinha praticando. Silva (2006, p. 186) define o Termo de Ajuste de conduta como:
[...] o instrumento utilizado pelos órgãos públicos legitimados à propositura da ação civil pública, com o fim de obter dos interessados o compromisso de ajustamento de suas condutas às exigências legais pertinentes, conforme as condições ajustadas, mediante cominações, com eficácia de título executivo extrajudicial.
Damião (2014, p.104) explica que quando em uma investigação se confirma a presença do trabalho análogo ao escravo, “o Procurador do Trabalho tem a faculdade de, em vez de imediatamente propor a ação civil pública, acordar com o empregador investigado um ajuste, denominado Termo de Ajuste de Conduta”.
O TAC proporciona a paralisação imediata da conduta ilícita, com a libertação imediata dos trabalhadores e a regularização dos seus contratos de emprego. Ainda, explica que:
[...] em caso de descumprimento, o legitimado a ação civil pública terá em suas posses um título com natureza executiva, o que garante ainda mais a celeridade dos atos processuais, eis que desnecessária será a fase do conhecimento processual.
Damião (2014, p. 105) também comenta que os órgãos legitimados para realizar o TAC devem estabelecer cominações em eventual descumprimento do acordo, podendo prever multas com o condão de obrigar o descumpridor a realizar o pactuado no termo.
Silva (2006, p. 186) explica que “a multa prevista no termo de ajuste de conduta, entretanto, não é substitutiva das obrigações de fazer e/ou não fazer pactuadas, servindo apenas para persuadir o compromissário a cumprir as obrigações previstas no instrumento. Ainda, conforme Damião (2014, p. 105), “o termo também se presta à fixação de indenização por dano moral coletivo, no caso de labor análogo ao escravo”.
Desta forma, o Termo de Ajuste de Conduta, é um forte mecanismo de combate ao trabalho análogo ao escravo, por ser medida imediata, e te por escopo a regularização da situação dos trabalhadores, além de ser título executivo extrajudicial, o que permite sua execução em caso de descumprimento do acordo.
Pela via judicial, existem diversos mecanismos, dentre eles a Ação Civil Pública, que tem por finalidade, combater ao trabalho análogo ao escravo na medida em que faz cessar a situação de ilegalidade do empregado, condenando o empregador a obrigações de fazer e não fazer, além de poder conceder indenização por danos materiais e morais aos trabalhadores.
Nos termos de Damião (2014, p. 106) a ação civil pública foi prevista inicialmente pela Lei de Ação Popular e posteriormente pelo Código de Proteção e Defesa do Consumidor, porquanto, é imperioso ressaltar que, o instrumento processual, serve também para a proteção contra o trabalho análogo ao escravo consiste em direito individual homogêneo, coletivo e difuso, caracterizando os interesses transindividuais ou metaindividuais, ou seja, direitos que “ultrapassam os direitos dos sujeitos individuais, posto que a lesão gerada alcança um grande número de pessoas. ”
Em arremate, Damião (2006, p. 107), assenta o tema: “forma de exercer tais labores e o acesso à justiça por parte de seus executores estão prejudicados, posto que muitos trabalhadores encontram-se encarcerados, cerceados de liberdade de ir e vir” sendo que necessitam da proteção e iniciativa estatal para a defesa de tais direitos.
Nesse diapasão, nos termos do art. 1º da Lei 7.347/85, é cabível o ajuizamento da Ação Civil Pública para prevenir ou reprimir danos morais ou materiais causados ao meio ambiente, bem como a outros interesses difusos ou coletivos. No que tange a legitimidade para propor esta medida, a lei define de forma exaustiva, quais os legitimados para propor, dentre eles, é imperioso destacar, o Ministério Público.
4 TRABALHO ANÁLOGO AO ESCRAVO NA INDÚSTRIA TÊXTIL
Na linha do exposto, tem-se que, com a evolução histórica sistemática do direito do trabalho, não se admitiu a exploração do trabalho humano, de forma degradante ou até mesmo de forma escrava como ocorria em outro momento histórico.
Todavia, com a difusão da tecnologia, bem como com a facilidade de divulgação de produtos, diga-se, estimuladas por uma sociedade pautada pelo consumismo desmotivado, desarrazoado, passou-se, a maior procura de produtos que atendessem as necessidades destas pessoas.
As indústrias têxtil e do vestuário foram as primeiras de uma série a implementar os novos métodos e a criar uma nova divisão de trabalho baseada na racionalidade da produção. Com as mudanças tecnológicas introduzidas, verificou-se a passagem rápida e firme do modelo artesanal e doméstico de produção, baseado no talento individual e na elaboração singular do produto, para o modelo industrial, de atividade coletiva e produção em massa. (BIGNAMI. Pág. 18. 2010)
Desse modo, dessume-se que, os consumidores passaram a busca por novas marcas para se adequarem na sociedade de consumo, porquanto, por vezes abandonando o consumo racional, e buscando o que está na moda, alimentando o consumismo.
Os membros da sociedade de consumidores são eles próprios mercadorias de consumo, e é a qualidade de ser uma mercadoria de consumo que os torna membros autênticos dessa sociedade. Tornar-se e continuar sendo uma mercadoria vendável é o mais poderoso motivo de preocupação do consumidor, mesmo em que geral latente e quase nunca consciente (BAUMAN, 2008, p. 76).
Nesse diapasão, de modo a atender a demanda de mercado, houve aumento na produção. É dizer, que de um lado teve aumento no aspecto econômico, de outra banda tem-se o aumento da exploração do trabalho degradante humano, visando auferir tão somente lucros e objetivando alimentar o consumismo social.
As indústrias têxtil e do vestuário foram as primeiras de uma série a implementar os novos métodos e a criar uma nova divisão de trabalho baseada na racionalidade da produção. Com as mudanças tecnológicas introduzidas, verificou-se a passagem rápida e firme do modelo artesanal e doméstico de produção, baseado no talento individual e na elaboração singular do produto, para o modelo industrial, de atividade coletiva e produção em massa. (BIGNAMI. Pág. 3. 2010)
A difusão da indústria têxtil, pautada em atender padrões sociais e anseios econômicos, aumenta, incrivelmente, a produção de costura e rebaixa os preços injustos. Assim sendo, existe o aumento da concorrência, todavia, não existe a valorização do trabalho.
No Brasil, várias marcas famosíssimas foram flagradas com a exploração do trabalho de forma análoga ao escravo, dentre elas a Riachuelo, a qual foi condenada a pagar uma pensão a suas funcionárias, as quais eram submetidas a condições de exploração psicológica, conforme dados da ONG Brasil 2016:
O grupo Riachuelo foi condenado a pagar pensão vitalícia a uma de suas ex-funcionárias em mais uma ação que revela as precárias condições de trabalho impostas às costureiras que produzem para as grandes marcas da moda. A condenação descreve um ambiente de trabalho em que a exigência de metas de produção ocorria mediante abusos físicos e psicológicos. Segundo seu relato, a costureira era pressionada a produzir cerca de mil peças de bainha por jornada. A meta, por hora, era colocar elástico em 500 calças ou costurar 300 bolsos. Na ação, a funcionária diz que muitas vezes evitava beber água para diminuir suas idas ao banheiro. Idas que, segundo ela, seriam controladas pelo encarregado mediante o uso de fichas. (ONG REPÓRTER BRASIL, 2016).
A exploração do trabalho pode ocorrer das mais diversas formas. Porquanto, a maioria dos casos, as pessoas as quais se sujeitam a esta modalidade laboral, são desempregadas ou pessoas extremamente pobres e vulneráveis são atraídas por propostas vantajosas, bons salários, direitos trabalhistas e boas condições de trabalho, mas a realidade é outra. Os aliciadores atuam de forma a satisfazer apenas as prioridades das empresas, desprezando a dignidade e as necessidades da pessoa explorada.
As grandes empresas, sempre em busca de altos lucros, contratam confecções para terceirizar a mão de obra na fabricação das peças, de modo a baratear o custo de produção.
Do ponto de vista normativo, o trabalho análogo ao escravo é definido pelo Artigo 149 do Código Penal da seguinte maneira:
Artigo 149. Reduzir alguém a condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalhando, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto:
Pena- reclusão, de dois a oito anos, e multa, além da pena correspondente à violência § 1º. Nas mesmas penas incorre quem:
I- cerceia o uso de qualquer meio de transporte por parte do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho;
II – mantém vigilância ostensiva no local de trabalho ou se apodera de documentos ou objetos pessoais do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho.
§ 2º. A pena é aumentada de metade, se o crime é cometido:
I – contra a criança ou adolescente;
II – por motivo de preconceito de raça, cor etnia, religião ou origem.
Nesse contexto, além da responsabilização na esfera penal, conforme disposto na legislação supramencionada, existe sim, a dever reparatório na esfera moral, vez que as condições de trabalho precário, com salários baixos, ocasionam reflexos no que atine ao psicológico do trabalhador, sem descurar que violam direitos e garantias fundamentais estampados na Constituição Federal. Vejamos a ementa de um julgado da casuística ora posta:
O posicionamento do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região no processo nº 00435-2008-042-03-00-5 RO se destaca da seguinte forma: EMENTA: AÇÃO CIVIL PÚBLICA - CONDIÇÕES DEGRADANTES DE TRABALHO - DANO MORAL COLETIVO - Na lição de Francisco Milton Araújo Júnior, “o dano moral pode afetar o indivíduo e, concomitantemente, a coletividade, haja vista que os valores éticos do indivíduo podem ser amplificados para a órbita coletiva. Xisto Tiago de Medeiros Neto comenta que ‘não apenas o indivíduo, isoladamente, é dotado de determinado padrão ético, mas também o são os grupos sociais, ou seja, as coletividades, titulares de direitos transindividuais. (...)’. Nessa perspectiva, verifica-se que o trabalho em condições análogas à de escravo afeta individualmente os valores do obreiro e propiciam negativas repercussões psicológicas em cada uma das vítimas, como também, concomitantemente, afeta valores difusos, a teor do art. 81, parágrafo único, inciso I, da Lei 8.078/90, haja vista que o trabalho em condição análoga à de escravo atinge objeto indivisível e sujeitos indeterminados, na medida em que viola os preceitos constitucionais, como os princípios fundamentais da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III) e dos valores sociais do trabalho (art. 1º, IV), de modo que não se pode declinar ou quantificar o número de pessoas que sentirá o abalo psicológico, a sensação de angústia, desprezo, infelicidade ou impotência em razão da violação das garantias constitucionais causada pela barbárie do trabalho escravo” (“in” Dano moral decorrente do trabalho em condição análoga à de escravo: âmbito individual e coletivo - Revista do TST, Brasília, vol. 72, nº 3, set/dez/2006, p. 99). (BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho da 3.ª Região. 2008. recurso ordinário trabalhista: RO 1953908 00435-2008-042-03-00-5).
No que atine aos Direitos Humanos, Mauricio Godinho Delgado. (2018) aponta que:
O universo social, econômico e cultural dos Direitos Humanos passa, de modo lógico e necessário, pelo ramo jurídico trabalhista, à medida que este regula a principal modalidade de inserção dos indivíduos no sistema socioeconômico capitalista, cumprindo o papel de lhes assegurar um patamar civilizado de direitos e garantias jurídicas, que regra geral, por sua própria força e/ou habilidade isoladas, não alcançariam. (DELGADO, 2018, p.82).
Neste espeque, os Direitos Humanos são de fulcral importância para a preservação de direitos do indivíduo e de modo a prevenir a exploração do trabalho escravo, haja vista que tem por escopo delinear o respeito à dignidade da pessoa humana. É que, acaso desrespeitadas estas diretrizes, há que se concluir que os Direitos Humanos, bem como os Fundamentais foram violados e não é possível se obter a inserção do cidadão no sistema socioeconômico capitalista.
De saída, dentre os instrumentos existente de combate ao trabalho escravo, é importante destacar a Instrução Normativa n° 91 de 2011 do Ministério do Trabalho e Emprego que, que tem por escopo dispor sobre a fiscalização para a erradicação do trabalho em condição análoga à de escravo no Brasil. É que, da análise do texto, tem-se que é bastante claro e define as providências adotadas e que devem ser observadas pelos Auditores-Fiscais do Trabalho na fiscalização para eliminar a prática de exploração do trabalho escravo.
Não é demais dizer que existe uma instrução redigida pelo Ministério do Trabalho e Emprego, o qual define que trabalho realizado em condições análogas à de escravo é definida pela conduta de submissão de trabalhador a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, sujeição de trabalhador a condições degradantes de trabalho, restrição da locomoção do trabalhador, seja em razão de dívida contraída. Nesta senda, tem-se a privação de uso de transporte por parte do trabalhador, vigilância extrema, retenção de documentos ou objetos pessoais do trabalhador, por parte do empregador ou seu preposto, com o fim de retê-lo no local de trabalho, são condutas que configuram o trabalho análogo ao escravo, eis que fere a dignidade da pessoa humana. (BRASIL, Instrução Normativa nº 91 do Ministério do Trabalho e Emprego, de 5 de outubro de 2011).
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A presente pesquisa teve por objetivo demonstrar à situação dos trabalhadores reduzidos a condição, análoga a de escravo na indústria têxtil brasileira, além de expor os mecanismos vigentes de combate a exploração do trabalho humano.
Na primeira parte, foi exposta a evolução histórica do direito do trabalho no Brasil, bem como da legislação interna, além dos princípios protetores do direito do trabalho e o princípio da dignidade da pessoa humana estampado na Constituição Federal.
Porquanto, na segunda parte, foram abordados os mecanismos vigentes para o combate do trabalho escravo. Partindo-se então, para a análise do trabalho análogo ao escravo na indústria têxtil.
De início, é imperioso destacar que o trabalho escravo é considerado abolido, não só no Brasil, como também em vários organismos internacionais, haja vista a vedação destas práticas, por ofender a dignidade humana. É dizer, os direitos humanos, materializado por pactos internacionais, passou-se a abolir a exploração do trabalho humano no âmbito mundial.
Todavia, a sociedade atual, segundo os estudos apontados por Bauman, tiveram seus pensamentos, influenciados por imersas transformações, vez que o consumo deixou de ser utilizado de forma racional, passando, contudo, a ser utilizado para atender padrões sociais insaciáveis, estimulando o consumismo descontrolado, fazendo com que grandes empresas voltem seus investimentos para alcançar este tipo de destinatários.
Outro aspecto de grande relevância é a influência midiática como uma das grandes causadoras de mudança no comportamento da sociedade sobre o consumismo, uma vez que nas mídias e meios de comunicações estão presentes fortemente as propagandas e meios de articulações para prender atenção e olhares dos consumidores.
No entanto, por trás dessas propagandas e mídias a população não consegue enxergar o outro lado ao qual se faz necessário para a obtenção de determinados produtos, como é o caso da indústria têxtil. Nesse contexto, existe, o lado glamoroso fabulado pelas mídias, estimulando apenas o consumo.
Nesse diapasão, por este estudo, atestou-se, os casos de flagrantes de exploração de mão de obra humana, por vezes em condições análogas a de escravo, para atingir tão somente a aferição de lucros, com jornadas excessivas, e repise-se, desrespeitando várias leis trabalhistas, além de direitos básicos inerentes a pessoa humana.
Notou-se, ainda, que a exploração do trabalho, é realizada em grande maioria por empresas de grande porte, e que possuem forte influência midiática. No caso em espeque, fora analisado a condenação da Riachuelo ao pagamento de pensão vitalícia a funcionários, haja vista que submetiam estas, a condições análogas a escrava, impondo a confecção de várias peças de roupas em um curto espaço de tempo.
Certamente, existem muito que se fazer para a erradicação do trabalho escravo no país, porém, para que isto ocorra, é preciso investir na conscientização dos trabalhadores sobre seus direitos, bem como dos consumidores, estimulando-os a consumir de forma racional, ou ao menos pesquisar a postura social da empresa, consultando a lista suja, antes de consumir, como forma de punição indireta.
Ademais, fora abordado ainda, a participação de suma importância da OIT, a ação do Grupo Especial de Fiscalização Móvel e da Coordenadoria Nacional de Erradicação ao Trabalho Escravo, a ação civil pública e o TAC, Termo de Ajuste de Conduta, que vem se destacando por ser uma medida mais célere e eficaz para punição das empresas.
Em arremate, tem-se que, o trabalho análogo ao escravo afronta notoriamente a Constituição Federal, o Código Penal, a Declaração Universal dos Direitos do Homem, sem descurar a ofensas perpetradas aos princípios trabalhistas e o maior de todos os princípios, o princípio da dignidade da pessoa humana.
REFERÊNCIAS
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[1] Mestre em Direito. Advogado e Professor do Curso de Direito da Faculdade Serra do Carmo.
Acadêmica do 10º Período do Curso de Direito da Faculdade Serra do Carmo.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: VIANA, Jamyres Vitor. O trabalho análogo ao escravo na indústria têxtil Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 03 dez 2019, 04:12. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/53871/o-trabalho-anlogo-ao-escravo-na-indstria-txtil. Acesso em: 23 dez 2024.
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