RESUMO: A Constituição Federal brasileira de 1988 aliada a uma esparsa legislação formam o que se chama de “direito processual coletivo brasileiro”, tendo contornos ainda assistemáticos, deixando de prever um sem fim de situações processuais. Dentre elas, emergiu a necessidade de – em certas conjunturas - cobrar de uma coletividade deveres. O cabimento dessa sorte de ação é rechaçado por parte da doutrina, embora o pensamento majoritário milite em seu favor. Trata-se da ação coletiva passiva, objeto de análise do presente mediante coleta do que já produzido na doutrina acerca de seu cabimento. Com lastro na corrente capitaneada pela Professora Ada Pellegrini, o presente artigo dialoga com os argumentos contrários à admissibilidade da ação, concluindo que a primeira corrente deve prevalecer.
Palavras-chave: Direito processual civil. Processo coletivo passivo. Cabimento.
Sumário: 1. Introdução. 2. Cabimento da ação coletiva passiva no processo civil brasileiro. 2.1. Breves notas acerca da tutela coletiva no Brasil. 2.2. Da necessidade de manejo da ação coletiva passiva 2.3. Dos argumentos contrários a seu cabimento 2.4. Dos argumentos favoráveis a seu cabimento. 3. Conclusão. 4. Referências.
1. Introdução
A estrutura assistemática do processo coletivo no Brasil, não obstante o grande apreço dado aos direitos coletivos na Constituição de 1988, acabou por largar no ostracismo a previsão de uma demanda na qual a coletividade fosse cobrada por algum dever, e não agraciada por algum direito. A prática processual, contudo, verificou a necessidade de manejar o que se nomeia de ação coletiva passiva, ao tempo em que surge o questionamento: como situar o seu cabimento dentro do plano legal vigente?
A defesa do cabimento da ação coletiva passiva no Brasil, mesmo com um fraco supedâneo legal em vigor, é capitaneada pela professora Ada Pellegrini Grinover[1] – que defende o fortalecimento da demanda através de imposições legiferantes pertinentes – e desponta como corrente majoritária. Noutra via, há quem resista em admitir o seu cabimento[2].
É por acreditar na coerência da corrente liderada por Ada Pellegrini que desponta como objetivo do presente trabalho a coleta na doutrina pátria subsídios para dar força à ideia de uma ação coletiva passiva brasileira, sem, contudo, deixar de discutir os argumentos que militam em sentido contrário. Pretende-se, inclusive, que esse movimento dialético recrudesça a confiança no cabimento da ação em estudo.
2. Ação coletiva passiva no direito processual brasileiro
2.1. Breves notas acerca da tutela coletiva no Brasil
É inegável que existem situações em que uma coletividade, em estrutura molecular[3], necessita e pode estar em juízo para cobrar direitos coletivos lato sensu (direito coletivo stricto sensu, difuso e individual homogêneo). A lide existe e o cabimento de ações coletivas está previsto no ordenamento jurídico, a exemplo da ação civil pública, regulamentada pela Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985.
Que existem situações outras em que a mesma coletividade, em mesma estrutura molecular, pode ser chamada a prestar deveres coletivos lato sensu ou a ela ser imposto um estado de sujeição, oriundo de um direito potestativo, é possível de ser imaginado. Não só é possível abstrair a situação, como a necessidade de propor esse tipo de demanda vem ocorrendo ante o Judiciário brasileiro.
Entrementes, não há previsão expressa no plano legal vigente de um rito que possa ser instrumentalizado para cobrar deveres coletivos em juízo. Como, então, harmonizar a escassez legislativa e a necessidade de levar o imbróglio ao conhecimento do Judiciário, inclusive em respeito ao princípio da inafastabilidade do Poder Judiciário?
A doutrina pátria buscou, então, na experiência jurídica norte-americana a inspiração para tal desiderato: a defendant class action, a qual consiste em instrumento processual que permite que aquele que tenha uma queixa contra uma multiplicidade de pessoas, possa resolver toda a disputa demandando apenas em desfavor de alguns membros de toda a classe[4].
No contexto pátrio, o advento da Constituição da República Federativa do Brasil – CRFB em outubro de 1988, trouxe alterações concernentes às ações coletivas ditas radicais[5] se comparadas às Constituições antecessoras. Todavia, àquela época, as ideias em torno da demanda coletiva e seu importante papel na efetivação dos interesses coletivos ainda eram embrionárias[6].
A Assembleia Constituinte inovou ao alocar os direitos coletivos no rol de direitos fundamentais. O Capítulo I, do Título 2 da CRFB/88, dispõe sobre os “direitos e deveres individuais e coletivos”, destacando-se que a Constituição fala, expressamente, não só em direitos, mas também deveres coletivos.
Mais adiante, no artigo 5º, XXXV, ficou consagrado o princípio da inafastabilidade do Poder Judiciário ao dispor a Constituição que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. Nessa inafastabilidade (e nessa universalidade) não pode ser excluída a tutela coletiva, seja ela de direitos ou deveres coletivos.
Trilhando outros passos Constituição adentro, o artigo 8º, ao dispor acerca da associação profissional ou sindical, prescreveu no inciso VIII que “ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas”. Dessa forma, mais uma vez, fala-se da tutela coletiva.
E também não o deixou de fazer da seara trabalhista. O dispositivo de número 114 da Constituição delimitou a competência da Justiça do Trabalho e pontuou que é ela competente para o processamento e julgamento das “ações sobre representação sindical, entre sindicatos, entre sindicatos e trabalhadores, e entre sindicatos e empregadores”.
Sobre esse inciso, exalte-se com furor que a Constituição admitiu, expressamente, que há a possibilidade de uma demanda entre sindicatos e trabalhadores, assim como entre sindicatos e empregadores. Isso quer dizer que o legislador admitiu a hipótese de haver a presença da coletividade no polo passivo da demanda.
Há, segundo Fredie Didier, tutela coletiva no âmbito eleitoral. Para ele, a ação de impugnação de mandato eletivo (AIME) seria uma ação coletiva[7] inscrita na Constituição. Merecem atenção, também, as disposições infraconstitucionais acerca das ações coletivas. Dentre elas, Fredie Dider aponta a existência de uma concepção que acredita ser a ação penal condenatória uma ação coletiva[8].
Fica, contudo, a cargo da Lei da ação civil pública (Lei nº 7.347/85) e do Título III do Código de defesa do consumidor (Lei nº 8.078/90) as maiores expressões das ações coletivas no Brasil, principalmente no que tange a normas processuais. Juntas, elas formam aquilo que se chama na doutrina de “microssistema processual para as ações coletivas[9]”.
2.2. Da necessidade de manejo da ação coletiva passiva
Da leitura da digressão acima esposada, é observável que, em que pesem alguns esforços legislativos para dar contornos às ações coletivas – inserindo normas gerais para tópicos como representação e coisa julgada, por exemplo -, há ainda uma carência de instrumento mais sistemático e completo.
Nesse diapasão, pontua Thiago Oliveira Tozzi que “é consabido que o direito processual coletivo pátrio consubstancia ramo do direito [...] todavia desprovido de sistemática própria, apesar dos incipientes esforços enviados pela doutrina nacional – e mesmo pela jurisprudência – tendentes a mapear-lhe caracteres[10]”. Veja-se, por exemplo, que na legislação infraconstitucional vigente não estão acolhidas e regulamentadas algumas situações fáticas que vem sendo levadas a juízo.
No ano de 2004, a título exemplificativo, diante da greve nacional dos policias federais, a União propôs ação em desfavor dessa classe em nome da Federação Nacional dos Policiais Federais – a FENAPEF – e do Sindicato dos Policiais Federais do Distrito Federal, almejando o retorno da categoria às atividades.
Outro caso noticia que ação coletiva foi proposta contra sindicato de revendedores de combustíveis, em que foi pleiteada uma adequação dos preços praticados a limites máximos de lucro, no intuito de proteger a livre concorrência e os consumidores[11].
A demanda deixa em dificuldades o magistrado que, ao apreciar a proposição, não conta com uma legislação que disponha de normas para julgar a coletividade no polo passivo do processo. De toda sorte, fica assentada a premissa que o processo coletivo passivo é necessário, principalmente na corrente sociedade de massa, mas fica o questionamento a ser respondido: é ele cabível na atual ordem jurídica pátria?
De toda sorte, antes de dar início ao diálogo entre as correntes que militam a favor e contra o cabimento da ação, necessário é assinalar o conceito de ação coletiva passiva na doutrina. Para Fredie Didier, pode ser caracterizada a ação nos seguintes termos:
Há ação coletiva passiva quando um agrupamento humano for colocado como sujeito passivo de uma relação jurídica afirmada na petição inicial. Formula-se demanda contra uma dada coletividade. Os direitos afirmados pelo autor da demanda coletiva podem ser individuais ou coletivos (lato sensu)[12].
Diogo Campos Medina Maia destaca em seu conceito de ação coletiva passiva que ela versa acerca de direito a ser exercido (de modo ordinário ou extraordinário) em desfavor de ente coletivo com legitimidade extraordinária, conforme possibilidade inferida do ordenamento jurídico, no afã de tutelar direito individual ou coletivo lesado ou disso ameaçado[13].
2.3. Dos argumentos contrários a seu cabimento
Considerando o conceito coletado na doutrina para a ação coletiva passiva, pontue-se que parte dos doutrinadores brasileiros acreditam não ser possível aceitar o cabimento da ação coletiva passiva[14]. Há, nesse sentido, três argumentos principais que sustentam a corrente.
O primeiro, e mais forte, deles é a inexistência do texto legal expresso. Para essa corrente doutrinária, esse ponto é obstáculo insuperável. Tal denegação de possibilidade do cabimento da demanda coletiva proposta em desfavor do representante da coletividade baseia-se, sui generis, nos próprios termos empregados pela legislação vigente, sempre indicativa de uma postura ativa.
Ressaltam eles que os diplomas legais mencionam a possibilidade de atuação dos representantes na qualidade de autores, ressaltando as expressões existentes em diversos dispositivos legais que seriam indicativas dessa única possibilidade[15]. Esse, inclusive, é o entendimento de Antônio Gidi que, numa comparação com as defendant class actions americanas, pontuando que:
Nas class actions norte-americanas a legitimidade para condução de um processo coletivo é outorgada tanto do lado ativo como do lado passivo da ação. [...] Nas ações coletivas do direito brasileiro, todavia, somente se confere legitimidade “ad causam” ativa aos entes elencados no art. 5º da LACP e no art. 82 do CDC. Arruda Alvim observa que embora o art. 81 do CDC se refira à “defesa” dos direitos dos consumidores, essa expressão tem o significado de agir ativamente em juízo, e não a possibilidade de os entes do art. 82 serem réus em uma ação coletiva (ou individual)[16].
Hugo Nigro Mazzilli comunga do entendimento, observando que a substituição processual é temática adstrita ao direito escrito, e a lei (CDC e LACP) só previu a possibilidade dos legitimados, ali inscritos, exercerem a substituição processual do grupo lesado no polo ativo[17]. Esse é um caudaloso argumento e não pode ser olvidado.
Um segundo apontamento indica que o sistema de verificação da condição de representante adequado dá-se segundo critério ope legis e, por esse motivo, não seria possível a admissão das ações passivas porque não conta o ordenamento brasileiro com um sistema de aferição aberto, isto é, ope judicis, hipótese na qual se correria o risco de constar no polo passivo alguém que não representa, com efetividade, os interesses da coletividade que formalmente ele representa[18].
Por fim, cumpre destacar a terceira, e última, alegação da corrente denegatória da ação coletiva passiva brasileira. Faz ela referência a uma problemática ligada ao instituto da coisa julgada. Nela, segundo Humberto Theodoro Júnior, não poderia a coisa julgada prejudicar os direitos individuais dos representados, tendo em vista o regime de extensão in utilibus da coisa julgada às situações individuais, conforme o art. 103 do Código de defesa do consumidor[19].
2.4. Dos argumentos favoráveis a seu cabimento
Em que pesem as alegações apresentadas, a maior parte da doutrina filia-se à corrente capitaneada pela processualista Ada Pellegrini Grinover, com o entendimento de que é possível o cabimento da ação coletiva passiva no Brasil. Kazuo Watanabe, inclusive, pondera que atualmente a doutrina tem se posicionado em defesa do reconhecimento da ação coletiva passiva[20].
Nesse sentido, impende arrolar os motivos pelos quais a ideia é sustentada por Ada Pellegrini, bem como outros argumentos levantados por outros doutrinadores. Nesse sentido, o primeiro fator a ser chamado ao rol é a realidade social. Como já fora anteriormente narrado, há muito, na história da humanidade, existe a necessidade de certos agrupamentos (coletividades) serem demandados em juízo.
A revolução industrial no século XVIII, em especial, intensificou as relações socioeconômicas, transformando o cenário mundial de forma a fazer emergir as classes operárias. Essas coletividades passaram a manter relações cada vez mais fortes, interligadas e coesas. Dessa forma, por estarem os indivíduos da classe unidos numa unidade, passaram a reclamar novas formas de solução de litígios, fazendo nascer os litígios coletivos[21].
Essas relações perenes e coesas, em razão da sociedade de consumo e de massa, foram estendidas às mais diversas formas de agrupamentos sociais, por exemplo, aos grupos de consumidores.
Os conflitos envolvendo essas coletividades acaba por levar o agrupamento a figurar na parte passiva da relação jurídica de pretensão – obrigação[22]. Isso quer dizer que surge a necessidade de a demanda ser proposta em desfavor da coletividade.
Assim, diante de uma novel conjuntura social e de uma defasagem do aparato jurídico para satisfazê-la, fica clara a necessidade de ser pensado um novo instrumento jurídico para tutelar essa ordem de conflitos.
O segundo ponto a ser trazido à tona é a efetiva prática processual, pois, não obstante trate este artigo de discutir a admissibilidade da ação coletiva passiva no Brasil, ela vem sendo manejada no país. Relembrem-se os casos concretos anteriormente citados e que não constituem exemplos isolados.
Nesse sentido, arrole-se a ação que tramitou em Baturité, estado do Ceará, na qual o Ministério Público ajuizou ação civil pública em desfavor de alguns comerciantes que utilizavam, de forma indevida, as calçadas para a venda de produtos[23].
Ademais, na prática processual com a coletividade na posição de acionada, relembre-se que acerca da seara trabalhista a Constituição de 1988 dispõe em seu artigo 114, III, que a Justiça do Trabalho é competente para processar e julgar “ações sobre representação sindical, entre sindicatos, entre sindicatos e trabalhadores, e entre sindicatos e empregadores”. A previsão expressar da Constituição aviva, assim, a admissibilidade da demanda em discussão.
Não seja olvidado, contudo, que as ações a que fazem referência o artigo 114 não correspondem a ações coletivas passivas típicas que este trabalho persegue, mas mostram que há uma tendência nesse sentido.
Dando terceiro passo nos argumentos que militam em favor da ação coletiva passiva, podem ser lembrados alguns dispositivos existentes na ordem legal em vigência que, apesar de não tornarem típica a demanda em estudo, a ela dão fôlego.
Ada Pellegrini destaca, dentro do microssistema das ações coletivas, três dispositivos que são um elixir para a corrente a que faz defesa. O primeiro deles é o artigo 5º, §2º da LACP, que trata da autorização de haver litisconsórcio do Poder público ou outras associações legitimadas a qualquer das partes do processo. A autora conclui silogisticamente que “é evidente, portanto, que se a intervenção no processo de entes legitimados às ações coletivas pode se dar como litisconsorte do autor ou do réu, é porque a demanda pode ser intentada pela classe ou contra ela[24]”.
Corroborando com a LACP, o artigo 107 do Código de defesa do consumidor contempla a denominada “convenção coletiva de consumo”, deixando permitido às entidades civis de consumidores e às associações de fornecedores, ou sindicatos de categorias econômicas, regular, por convenção escrita, relações ao preço, à qualidade, à quantidade, à garantia e características de produtos e serviços, bem como à reclamação e composição do conflito de consumo.
Mais uma vez, a dicção do CDC contribui para a afirmação da ação coletiva passiva ao dispor, no artigo de número 83 que “para a defesa dos direitos e interesses protegidos por este Código, são admissíveis todas as espécies de ações capazes de propiciar sua adequada e efetiva tutela”.
Sobre esse dispositivo, Ada Pellegrini, uma dos autores do anteprojeto explica que “o sentido do dispositivo é o da irrestrita tutelabilidade, em juízo, das questões inerentes às relações de consumo, consubstanciando a ideia da efetividade do processo[25]”.
Isso posto, é de arrematar que o sistema brasileiro acerca das demandas coletivas permite, de lege data, que a classe figure no polo passivo da ação sem, com isso, negar que algumas problemáticas podem derivar dessa posição, no que concerne ao regime da coisa julgada, por exemplo[26]. Esse tema, contudo, não será explorado neste trabalho.
Em suma, todos os três aspectos destacados no afã de admitir o cabimento da tutela coletiva passiva são coroados pelo, quiçá, mais robusto argumento a favor da demanda: o princípio constitucional da inafastabilidade do Poder Judiciário. O dispositivo no qual está inscrito o princípio é o artigo 5º, XXXV, com a dicção de que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.
Por fim, valha-se dos métodos hermenêuticos para dar vazão à admissibilidade da ação coletiva passiva. Na ausência do texto legal expresso, e até mesmo em sua presença, a atividade hermenêutica leva, através de regras técnicas, a obtenção de um resultado na decidibilidade de conflitos[27].
Não se busca aqui legitimar a todo custo o cabimento demanda de estudo, fazendo caber a interpretação ao gosto do autor, mas sim fazer uso razoável dos princípios e regras aqui estudados e manejar, adequadamente, métodos hermenêuticos.
Nesse sentido, segundo a lição de Tércio Ferraz Jr., fala-se em interpretação sistemática quando se enfrentam questões de compatibilidade num todo estrutural, levando em conta a unidade do sistema jurídico do ordenamento[28]. Acerca dessa compatibilidade, o autor afirma que “a incompatibilidade é o elemento racional que implica a presunção de que o legislador sempre pretende ordenações razoáveis[29]”.
Alerta o estudioso que essa compatibilidade é estudada levando em consideração a organização hierárquica das fontes, na qual as relações de hierarquia principiam (e culminam) pela primeira norma-origem do sistema, a Constituição[30].
Assim, sistematicamente, unindo a disposição constitucional da universalidade (inafastabilidade) de jurisdição, a não vedação do processo coletivo passivo e os dispositivos legais que colocam a coletividade em situação de sujeição passiva no processo, entende-se como compatível a ação coletiva passiva com a ordem legal vigente.
3. Conclusão
Mesmo tendo conhecimento do hiato legislativo e das problemáticas processuais que surgem da aplicação da ação coletiva passiva sem sua expressa previsão típica (regime da coisa julgada e da representação adequada), seu manejo é inevitável. Nesse sentido, as palavras de Couture arrematam:
O silêncio do legislador, dentro da ideia de plenitude da ordem jurídica, é, por assim dizer, um silêncio cheio de vozes. Nesse silêncio, naquele ponto exato em que o legislador foi omisso, é onde se entrecruzam todas as outras normas. [...] O caso não previsto contém, praticamente, todas as previsões possíveis. Qual deve ser a reação do intérprete em sua tarefa em face do silêncio da lei processual? Seria de desejar que fosse possível responder essa pergunta numa só palavra. Tal coisa, porém, é impossível[31].
Em última análise, a ação coletiva passiva, mesmo ante o vácuo legislativo, representa as premissas intrínsecas a um Estado Democrático de Direito, no qual repousa no acesso à Justiça um de seus valores mais fundantes[32].
4. Referências
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[1] GRINOVER, Ada Pellegrini. Código brasileiro de defesa do consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 9 ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007. p. 850.
[2] DINAMARCO, Pedro da Silva. Ação civil pública. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 269.
[3] DIDIER JR., Fredie; ZANETI JR., Hermes. Curso de direito processual civil. Processo Coletivo. Vol 4. 6ª ed. Salvador: Jus Podivm, 2011, p. 32.
[4] WOLFSON, Barry M. Defendant Class Actions. Ohio State Law Journal. v. 38, n. 3, 1977. Disponível:< http://heinonline.org/HOL/LandingPage?collection=journals&handle=hein.journals/ohslj38&div=30&id=&page=>. Acesso em 23. nov. 2019. p. 459.
[5] DIDIER JR., Fredie. Curso de direito processual civil. Teoria geral do processo e processo de conhecimento. Vol 1. 21ª ed. Salvador: Jus Podivm, 2019, p. 43.
[6] MENDES, Aluisio Gonçalves de Castro. A legitimação, a representatividade adequada e a certificação nos processos coletivos e as ações coletivas passivas. Revista de Processo – RePro. ano 37. n. 209. São Paulo: Revista dos Tribunais, pp. 243-265. jul. 2012. p. 258.
[7] DIDIER JR, Fredie; ZANETI JR., Hermes. Curso de direito processual civil. Processo Coletivo. Vol 4. 13ª ed. Salvador: Jus Podivm, 2019, p. 46.
[8] Idem.
[9] Idem, p. 50.
[10] TOZZI, Thiago Oliveira. Ação Coletiva Passiva. Revista de Processo – RePro. ano 37. n. 205. São Paulo: Revista dos Tribunais, pp. 267-297. mar. 2012. p. 269.
[11] DIDIER JR., Fredie; ZANETI JR., Hermes. Processo Coletivo Passivo. Revista de Processo – RePro. ano 33. n. 165. São Paulo: Revista dos Tribunais, pp. 29-43. nov. 2008. p. 34.
[12] DIDIER JR., Fredie; ZANETI JR., Hermes. Pocesso Coletivo Passivo. Revista Ciências Jurídicas e Sociológicas da Unipar. v. 11, n. 2, pp. 719-736. jul./dez. 2008.
[13] MAIA, Diogo Campos Medina. A ação coletiva passiva: um retrospecto histórico de uma necessidade presente. In: GRINOVER, Ada Pellegrini; MENDES, Aluísio Gonçalves de Castro; WATANABE, Kazuo (Coord.) Direito Processual Coletivo e o anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos. São Paulo: RT, 2007. p. 68.
[14] Pedro Dinamarco, Hugo Nigro Mazzilli, Arruda Alvim, Humberto Theodoro Júnior e Antônio Gidi.
[15] VIGLIAR, José Marcelo Menezes. Defendant class action brasileira: limites propostos para o Código de Processos Coletivos. In: Ada Pellegrini Grinover; Aluisio Gonçalves de Castro Mendes; Kazuo Watanabe. (Org.). Direito Processual Coletivo e o Anteprojeto de Código Brasileiro de Processo Coletivos. 1 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007, v. 1, p. 313.
[16] GIDI, Antonio. A class action como instrumento de tutela coletiva dos direitos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 51.
[17] MAZZILLI, Hugo Nigro. A defesa dos interesses difusos em juízo. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 314.
[18] Idem.
[19] THEODORO JR., Humberto. Curso de direito processual civil. Procedimentos especiais. v. 3. 41ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009. p. 44.
[20] GRINOVER, Ada Pellegrini; WATANABE, Kazuo, NERY JUNIOR, Nelson.. Código brasileiro de defesa do consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 9 ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007. p. 850.
[21] MAIA, Diogo Campos Medina. A ação coletiva passiva: um retrospecto histórico de uma necessidade presente. In: GRINOVER, Ada Pellegrini; MENDES, Aluísio Gonçalves de Castro; WATANABE, Kazuo (Coord.) Direito Processual Coletivo e o anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos. São Paulo: RT, 2007. p. 338.
[22] MELLO, Marcos Bernardes de. Teoria do fato jurídico: plano da existência. 7ª edição. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 153.
[23] Processo 2000.0173.3752-7/0 da 2ª Vara cível de Baturité-CE.
[24] GRINOVER, Ada Pellegrini; WATANABE, Kazuo, NERY JUNIOR, Nelson.. Código brasileiro de defesa do consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 9 ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007. p. 850.
[25] Idem, p. 851.
[26] Idem, p. 851.
[27] FERRAZ JR., Tércio Sampaio. Introdução ao estudo do direito. Técnica, dominação, decisão. 5ª Ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 289.
[28] Idem, p. 293.
[29] Idem, p. 295.
[30] Idem, p. 293.
[31] COUTURE, Eduardo J. Interpretação das leis processuais. Rio de Janeiro: Forense, 1997. p. 45.
[32] TOZZI, Thiago Oliveira. Ação Coletiva Passiva. Revista de Processo – RePro. ano 37. n. 205. São Paulo: Revista dos Tribunais, pp. 267-297. mar. 2012. p. 284.
Graduada em Direito pela Universidade Federal de Alagoas (2013). Pós-graduanda em Direito Processual Civil pela Universidade Cândido Mendes. Ocupante dos cargos de Técnico Judiciário e Assessor de Juiz junto ao Tribunal de Justiça de Alagoas (desde 2019). Atuou como Assessora Jurídica do Ministério Público de Contas (2013-2019) e como Advogada (2013-2018).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CARVALHO, Patricia Bastos de. Cabimento da ação coletiva passiva no processo civil brasileiro Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 13 dez 2019, 04:33. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/53985/cabimento-da-ao-coletiva-passiva-no-processo-civil-brasileiro. Acesso em: 23 dez 2024.
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