Resumo: Tem se acentuado a discussão acerca da legalização do aborto no Brasil, há projetos de leis no Congresso visando sua liberação e, ao mesmo tempo, houve a judicialização do tema no STF. O presente artigo visa investigar, primeiramente, se cabe tal mudança legal e a que órgão, num Estado Democrático de Direito, caberia realizar tal empreitada.
Palavras chaves: Aborto, Congresso Nacional, Supremo Tribunal Federal, Direito Constitucional, legitimidade democrática.
Sumário: 1. Introdução . 2. O Conceito de aborto. 3 Aborto no Congresso Nacional. 4 Aborto no Supremo Tribunal Federal. 5. Uma questão jurídica ou política? 6. Mutação constitucional. 8. Conclusão. 9. Referências Bibliográficas
A discussão acerca da existência, ou concessão, do direito ao aborto às mulheres sempre causou polêmicas no Brasil e no mundo, para alguns trata-se de um direito fundamental das mulheres, decorrentes do poder que cada um deva ter sobre seu próprio corpo. Para os defensores dessa tese, o direito ao aborto também deve ser encarado como uma justiça que visa corrigir a opressão vivida pelo gênero feminino no decorrer da história nas mãos do patriarcado, regime que teria tirado das mulheres o poder sobre sua própria vida, as transformando em objetos dos quais os homens podiam dispor da maneira que achassem mais úteis.
Para os contrários à legalização do aborto, o direito fundamental em jogo é o direito à vida, que é inerente a todo ser humano. Para os defensores dessa tese, não há que se falar em direito ao próprio corpo para justificar o aborto pelo fato de o feto não ser uma extensão do corpo da mulher, mas sim um ser autônomo e alheio em relação à sua progenitora.
Há no Congresso Nacional inúmeros projetos que tratam da questão do aborto, alguns visando restringi-lo ainda mais, outros afrouxa-lo no ordenamento jurídico ou legaliza-lo. Devido haver projetos tratando do tema desde 1989, o Partido Socialismo e Liberdade adentrou no STF com arguição de descumprimento de preceito fundamental visando que o Supremo declare o direito ao aborto como fundamental e o legalizando até a 12ª semana da Gravidez diante da inércia do parlamento brasileiro no tratamento do tema.
O presente artigo visa, através de pesquisa bibliográfica, responder as seguintes perguntas: Aborto é uma questão jurídica ou política? Numa democracia, quem deve determinar a mudança de uma Lei? Em um Estado Democrático de Direito quem deve legislar? Não se procura aqui tratar do mérito moral ou utilitário do aborto, o objetivo é tratar de um possível processo para mudança do regramento da questão no ordenamento jurídico brasileiro.
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS) aborto é “a interrupção, antes das 22 semanas de gestação, estando, nesse caso, o feto, geralmente, com peso inferior a 500 g. Quando o feto é retirado nessas condições é incapaz de sobreviver fora do útero da mãe.” (SANTOS, 2019?).
Há dois tipos de aborto, o espontâneo que ocorre de forma natural e o aborto provocado, feito pela ingestão de medicamentos abortivos ou por meio de intervenção cirúrgica, na qual ocorre a raspagem da parede uterina para retirada do feto. No Código Penal brasileiro há apenas duas hipóteses na qual o aborto não é punível
Art. 128 - Não se pune o aborto praticado por médico:
Aborto necessário
I - se não há outro meio de salvar a vida da gestante;
Aborto no caso de gravidez resultante de estupro
II - se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal. (BRASIL, 1940)
Para além dos casos expressamente previstos no ordenamento jurídico nacional, o Supremo Tribunal Federal, no ano de 2012, por 8 votos a 2 decidiu que aborto de fetos sem cérebro não é crime. Nas palavras do ministro relator Marco Aurélio Mello (2012)
Aborto é crime contra a vida. Tutela-se a vida em potencial. No caso do anencéfalo, não existe vida possível. O feto anencéfalo é biologicamente vivo, por ser formado por células vivas, e juridicamente morto, não gozando de proteção estatal. [...] O anencéfalo jamais se tornará uma pessoa. Em síntese, não se cuida de vida em potencial, mas de morte segura. Anencefalia é incompatível com a vida.
Sendo assim, no presente artigo trataremos da interrupção da gravides antes das primeiras 22 semanas de gestação, por meio artificial, fora da previsão do artigo 128, incisos I e II do Código Penal e da decisão da Suprema Corte que descriminalizou o aborto de feto anencefálico.
Tramitam no Congresso Nacional diversos projetos que tratam do aborto, muitos para expandir as suas possibilidades legais, alguns para restringi-lo e outros que visam apenas garantir a manutenção do atual regramento do assunto no ordenamento jurídico. Os principais projetos que visam a legalização do aborto são o do ex-deputado do PSOL, Jean Wyllys, e dos ex-deputados do PT, Eduardo Jorge e Sandra Starling.
O PL 1135/1991 de autoria dos então deputados Eduardo Jorge e Sandra Starling visa suprimir o artigo que caracteriza crime o aborto provocado pela gestante ou com seu consentimento. Já o PL 882/2015 de autoria do ex-deputado Jean Wyllys estabelece as políticas públicas no âmbito da saúde sexual e dos direitos reprodutivos e dá outras providências. Em suma, ambos os projetos objetivam a legalização do aborto até a 22ª semana de gestação. Vejamos alguns artigos do PL 882/2015
Art. 2º - No exercício de suas liberdade, intimidade e autonomia, todas as pessoas têm direito a decidir livremente sobre sua vida sexual e reprodutiva, conforme direitos e deveres estabelecidos pela Constituição Federal.
Art. 3º - O Estado garantirá o direito à reprodução consciente e responsável, reconhecendo o valor social da maternidade na garantia da vida humana, e promoverá o exercício pleno dos direitos sexuais e reprodutivos de toda a população, entendendo-se que a interrupção voluntária da gravidez não constitui um instrumento de controle de natalidade.
Art. 4º - O direito à maternidade voluntária e livremente decidida é plenamente reconhecido.
Art. 10º - Toda a mulher tem o direito a realizar a interrupção voluntária da gravidez, realizada por médico e condicionada ao consentimento livre e esclarecido da gestante, nos serviços do SUS e na rede privada nas condições que determina a presente Lei.
Art. 11 - Toda mulher tem o direito a decidir livremente pela interrupção voluntária de sua gravidez durante as primeiras doze semanas do processo gestacional.
Art. 12 – Ultrapassado o prazo estabelecido no artigo 11 da presente Lei, a interrupção voluntária da gravidez somente poderá ser realizada:
I – Até a vigésima segunda semana, desde que o feto pese menos de quinhentos gramas, nos casos de gravidez resultante de estupro, violência sexual ou ato atentatório à liberdade sexual, sem a necessidade de apresentação de boletim de ocorrência policial ou laudo médico-legal.
II – A qualquer tempo, nos casos de risco de vida para a gestante, comprovado clinicamente.
III – A qualquer tempo, nos casos de risco à saúde da gestante, comprovado clinicamente.
IV – A qualquer tempo, nos casos de incompatibilidade e/ou inviabilidade do feto com a vida extrauterina, comprovado clinicamente.
Ambos os projetos até aqui citados se encontram arquivados. Na contramão da legalização do aborto no Brasil o ex-senador Magno Malta, e outros, propuseram a PEC nº 29 de 2015 no intuito de alterar a Constituição Federal para acrescentar no art. 5º, a explicitação inequívoca “da inviolabilidade do direito à vida, desde a concepção”. O objetivo declarado de tal projeto seria blindar o direito à vida de investidas do Governo Federal, do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal, ainda segundo os autores o objetivo não é restringir o aborto ainda mais que o ordenamento jurídico atual mas, críticos alertam que o caráter aberto da proposição pode sim abrir margem para negar o aborto nas duas possibilidades previstas no Código Penal e na criada a partir da jurisprudência do STF. A PEC em questão se encontra em tramitação no Senado Federal.
O partido Socialismo e Liberdade (PSOL) apresentou ao Supremo Tribunal Federal uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental objetivando a declaração de inconstitucionalidade dos artigos 124 e 126 do Código Penal que criminalizam o aborto. A ADPF 442 descriminaliza o aborto até a 12ª semana de gestação.
Uma ADPF é uma modalidade do controle concentrado de constitucionalidade feita pelo STF, quem apresenta tal ação ao Supremo entende que o objeto dela é um preceito fundamental, ou seja, um direito constitucional base do nosso Estado Democrático de Direito (Lei nº 9.882/99).
Sendo assim, o proponente da ADPF 442 entende ser o aborto um direito fundamental das mulheres sendo, consequentemente uma questão jurídica e não uma questão política. Nesse entendimento a Constituição Federal de 1988 concede as mulheres o direito ao aborto, e o Poder Público ao manter válido os artigos 124 e 126 do Código Penal estão em desacordo com o ditame constitucional.
Os preceitos fundamentais apontados como sendo violados pela criminalização do aborto na Petição Inicial da ADPF 442 são o da dignidade da pessoa humana, da cidadania, da não discriminação, da inviolabilidade da vida, liberdade e igualdade, da proibição da tortura ou tratamento desumano e degradante, da saúde e do planejamento familiar das mulheres, adolescentes e meninas.
A desavença institucional acerca do aborto tem por questão de fundo a natureza da discussão, alguns sustentam que a Constituição não permite o aborto, ao contrário, sustenta ser a vida o bem mais precioso a ser tutelado pelo Estado, razão pela qual é perfeitamente constitucional a criminalização do aborto provocado. Outros alegam que os princípios constitucionais garantem que o aborto faz parte da autonomia privada, na qual o Estado não deve interferir. Para o primeiro grupo aborto é uma discussão política, pois o Congresso tem poder tanto para mudar o entendimento vigente quanto para mantê-lo, mas, para o segundo grupo diante dos princípios constitucionais e seu caráter imutável, a questão já está decidida e cabe ao Judiciário aplicar a Lei.
Para elucidar essa questão é preciso investigar a real posição da Lex Mater acerca do tema. A Constituição Federal de 1988 não trata especificamente do aborto, mas em seu artigo 5º garante a inviolabilidade do direito à vida a todos os que vivem no país, sejam naturais ou estrangeiros. O texto é claro e objetivo, não deixando margem para interpretação diversa do sentido original do texto.
A ADPF 442 em sua petição inicial indica os princípios fundamentais que estariam sendo violados pelo Código Penal em seus artigos 124 e 126 e deles trataremos a seguir.
Dignidade da Pessoa Humana; o termo causa polêmica por seu caráter aberto e extremamente abstrato, a verdade é que se perguntarmos a 10 pessoas o que significa dignidade da pessoa humana teremos 10 significados diferentes. Vejamos uma ponderação importante sobre tal princípio
Até o momento todos os autores se limitaram a uma identificação externa – deveras insuficiente, razão pela qual muitos dizem que o princípio da dignidade da pessoa humana não possui uma definição. Na verdade referido princípio trata-se de uma cláusula aberta, uma fórmula lógica abstrata cujo conteúdo será preenchido concretamente a partir de certas circunstâncias de tempo, lugar e desenvolvimento histórico-cultural em cada coletividade. A dignidade da pessoa humana possui uma identificação externa, como um direito natural, um direito humano, um direito fundamental e um princípio de hermenêutica. É um valor que orienta todos os demais princípios, direitos, deveres e atos, tornando-se assim a pedra angular de todos os direitos naturais, do Homem, humanos, fundamentais. Por outro lado, em sua identificação interna, a dignidade da pessoa humana é um eixo de tolerabilidade, uma barra de proteção, uma linha divisória que delimita até que ponto algo, qualquer fato ou situação, é considerado tolerável por determinada coletividade, conforme suas referidas circunstâncias de tempo, lugar e desenvolvimento histórico-cultural. Ou seja, analisa-se o que o indivíduo deve ser obrigado a suportar ou tolerar por se tratar de um mero dissabor da vida em coletividade ou algum infortúnio proveniente de fato da natureza. Nem tudo agrada a todos. Porém, ainda que algo seja desagradável existem meros desprazeres decorrentes da vida em coletividade ou do mundo natural dos fatos que são considerados “toleráveis”, ou seja, é exigível dos indivíduos em geral que suportem aquele fato ou situação. A tolerabilidade em geral é um parâmetro para a edição de normas e atos jurídicos. Entretanto, a tolerabilidade em concreto deve ser analisada caso a caso, tendo em vista que ao legislador não é fisicamente possível prever juridicamente todas as hipóteses que poderão ocorrer no mundo real dos fatos. Por sua vez, os fatos e situações considerados intoleráveis, violadores da dignidade humana, são aqueles que o Estado e a coletividade não poderiam exigir que algum indivíduo os tolerasse. O individuo, por si só, pode optar por suportar certas situações intoleráveis, desde que se trate de direito ou bem jurídico disponíveis, mas em razão da intolerabilidade geral o Estado não pode lhe obrigar a realizar tal escolha, sob pena de violar-lhe a dignidade como pessoa humana. (MOTTA, 2013)
Certamente há situações nas quais a ameaça a dignidade da pessoa humana salta aos olhos, e para se evitar o uso partidário do termo o tratando como método para impor sua visão particular que o mais sensato é submeter tal princípio à visão geral da nação, se perguntando como a coletividade vê a questão, mas o aborto legal não se encaixa nessa situação uma vez que é um assunto que causa polarização mais pela paixão com que atua seus defensores do que pelo seu apelo popular no Brasil, mesmo entre as mulheres. Vejamos, de acordo com pesquisa Datafolha, realizada no ano de 2018, 59% dos brasileiros se declaram contrários à legalização do aborto, em pesquisa realizada em 2019 pelo mesmo instituto de pesquisa, 41% dos brasileiros se declaram contra qualquer forma de aborto, ou seja, mesmo nos casos permitidos no Brasil. Infelizmente, tais pesquisas até aqui citadas não segmentaram os resultados por sexo, mas uma pesquisa realizada pelo Departamento Materno-Infantil da Fundação Universidade do Rio Grande. Rio Grande – RS, no município de Rio Grande – RS, apenas com mulheres concluiu que somente 30% destas são favoráveis a legalização da prática, resultado que combinado com os anteriores nos permite inferir que a opinião das mulheres a nível nacional não varie muito desse resultado. Ou seja, para caracterizar o aborto com indigno à condição humana é preciso afirmar que impera um pensamento completamente imoral por parte dos brasileiros, se tomarmos o sentimento moral do povo a verdade é que o aborto legal é que feriria a dignidade da pessoa humana.
Da cidadania e da não discriminação; A nossa Lei Maior em seu artigo 1º, inciso II declara ser a cidadania um fundamento da nossa República, mas o que isso significa? Em regra, adota-se a concepção Russeauneana de cidadão que consiste na afirmação que cidadão é todo aquele que participa da vida política do Estado, podendo votar e ser votado e sujeito as obrigações para com a sociedade previstas no ordenamento jurídico estatal (ROUSSEAU, 2006) nesse sentido afirmar que o Código Penal ao proibir o aborto vai contra tal princípio é um tiro no escuro, uma afirmação vazia de significado já que não está sendo censurado a defesa do tema no debate nacional e tampouco proíbe que os seus defensores constituam representantes para tentar mudar, politicamente, o tratamento jurídico atual da questão. Já o princípio da não discriminação entra na mesma questão, sujeitar alguém a lei não pode ser considerado discriminatório, e a proibição de aborto não constitui perseguição as mulheres, uma vez que a maioria delas se declaram contra o ato e que caso aprovado, haveria o aborto de bebês do sexo feminino, não apenas masculino.
Da inviolabilidade do direito a vida, liberdade e igualdade; interessante notar que do ponto de vista dos autores da APDF em questão o aborto ilegal é uma ameaça à vida da gestante que opta pelo aborto, mas os mesmos desconsideram completamente o direito a vida dos que vão ser abortados e esse é o ponto principal de discórdia entre os pró-aborto e os pró-vida, a sobreposição do valor da vida de um sobre o outro (mãe e filho), mas se analisarmos os meios que cada lado tem de preservação da própria vida então constata-se que a mulher tem vários meios de não chegar a necessidade de um aborto, um número considerável de métodos contraceptivos, já a única defesa da vida do indivíduo intrauterino é a sociedade.
Por fim, alega o PSOL na ADPF 442 que a proibição do aborto fere também os direitos ao planejamento familiar e saúde, bem como a vedação a tortura na Lei Maior
A criminalização do aborto provoca violações ao direito à saúde (CF, art. 6º), à integridade física e psicológica das mulheres e à proibição de submissão a tortura ou a tratamento desumano ou degradante (CF, art. 5º, III), uma vez que a negação do direito ao aborto pode levar a dores e sofrimentos agudos para uma mulher, ainda mais graves e previsíveis conforme condições específicas de vulnerabilidade que variam com a idade, classe, cor e condição de deficiência de mulheres, adolescentes e meninas. (BOITEUX e outras, 2017, p. 9)
O argumento gira em torno de possíveis riscos do aborto ilegal, mas ao citar esse quesito as autoras da peça estão se referindo à consequências que certas mulheres sofrem ao cometerem um crime, e para isso a propositura é a não mais tipificação do crime em questão, o aborto, note-se que se trata de uma argumentação com aparência jurídica, mas em essência é um argumento plenamente político, que faria sentido numa discussão numa das casas do Congresso Nacional, mas não na Suprema Corte. Pois, todo indivíduo ao executar um crime se põe em risco e esse argumento então serve para o desmonte completo do Código Penal.
Por tudo até aqui exposto, conclui-se que não assiste razão a quem vê na Carta Magna de 1988 qualquer vedação à proibição do aborto, percebe-se que apenas por muita criatividade interpretativa os princípios elencados pela petição inicial da ADPF em questão se vinculam aos artigos 124 e 126 do Código Penal. Assim sendo, a legalização do aborto é uma questão política, não jurídica.
Diante do fato de que a Constituição Federal de 1988 não garante direito ao aborto às mulheres, fazendo do tema algo de exclusiva competência do Congresso Nacional, juristas podem trazer a discussão para um novo campo, o campo da chamada mutação constitucional. Mutação constitucional, segundo Pansieri e Souza (2018), é a uma mudança no sentido do texto constitucional ao invés de na forma, não é feita pelos meios e através dos ritos constitucionalmente estabelecidos para se mudar uma Carta Magna formalmente, mas ocorre na esteira da mutabilidade da realidade social, que provocam mudanças de valores e a partir dessas mudanças se legitimam uma interpretação diversa do sentido original do texto.
Mas a resposta a essa possibilidade está ligado ao aqui exposto a respeito do princípio da Dignidade da Pessoa Humana, que é a percepção social. Se houve uma mudança social tão grande que provocou uma mudança de valores que desemboca na incompatibilidade dos artigos 124 e 126 do Código Penal com o espírito social da nossa época então por qual motivo a enorme maioria dos brasileiros continuam serem contrários a legalização do aborto? A resposta é simples, trata-se de uma questão de costumes, não de direito fundamental. E sendo assim, a intromissão indevida do Poder Judiciário na questão, poder que mais está afastado do controle popular na tripartição do poder estatal pode acabar por corroer toda legitimidade democrática do nosso Estado Democrático de Direito.
O Aborto é um tema que causa paixões, justamente por não ser uma questão com resposta fácil. Envolve moralidade, religião, liberdade, o papel da mulher na sociedade e uma crescente polarização entre conservadores e progressistas em todo o mundo.
Através deste estudo, percebe-se que o tema foi apresentado ao Congresso e por este, em resposta a rejeição do tema no meio da população, se calou, calou-se, mas não se omitiu, uma vez que ao se calar acabou por dizer, dizer que as ruas dizem não.
Examinando-se a Constituição vigente conclui-se que esta não garante o direito ao aborto, muito menos vê tal direito como fundamental, isso exclui o Pode Judiciário da discussão e legitima o Pode Legislativo para mudar, ou não, o status quo.
Assim sendo, cabe mudança no atual tratamento que o ordenamento jurídico dá ao aborto, mas tal mudança só é legitima se ocorrer no seio do debate legislativo, através do convencimento e totalmente exposto ao controle da Soberania Popular. Por não se tratar de direito fundamental, o Poder Judiciário e mais especificamente o Supremo Tribunal Federal deveriam se abster de interferir nesse assunto.
BOITEUX, Luciana e outras. ADPF 442. Disponível em http://redir.stf.jus.br/estfvisualizadorpub/jsp/consultarprocessoeletronico/ConsultarProcessoEletronico.jsf?seqobjetoincidente=5144865. Acesso em 05/01/2020.
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Estudante de Direito no Centro Universitário Estácio de Belo Horizonte e conciliador no Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FERNANDES, Atos Henrique. Aborto: entre o Supremo e o Congresso Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 28 jan 2020, 04:27. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/54190/aborto-entre-o-supremo-e-o-congresso. Acesso em: 23 dez 2024.
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