THAIS FEITOSA OLIVEIRA[1]
(coautora)
FABRÍCIO DE FARIAS CARVALHO[2]
(orientador)
RESUMO[3]: A efetividade, como um direito fundamental claramente disposto em alguns dispositivos da Constituição Federal de 1988, faz-se imprescindível nos processos executivos, e para essa garantia, o ordenamento jurídico prevê, como possível meio apto, a cláusula geral executiva do art. 139, inciso IV, do Código de Processo Civil. Intenta-se verificar a necessidade de utilização de medidas executivas atípicas por parte do poder público e apresentar contraposições à decisão do Superior Tribunal de Justiça no HC 453.870-PR. Assim, com o emprego do método indutivo, esboçou-se sobre o conjunto fático analisado no julgado. Compreende-se que não há óbices à aplicação da atipicidade executiva nos processos de execução fiscal, pois a Fazenda Pública, além da sua condição de desigualdade em relação ao particular, os privilégios que lhe são concedidos são necessários para se fazer cumprir o interesse da coletividade. Nota-se que tais medidas são passíveis de se firmar na cobrança judicial de créditos públicos para resguardar os direitos dos cidadãos contribuintes, desde que não haja excessos e nem a violação aos princípios do Estado Democrático de Direito. Para alcançar o objetivo exposto, far-se-á uma abordagem doutrinária, jurisprudencial, e de artigos científicos que dispõem sobre o tema.
Palavras-chave: Execução Fiscal, Efetividade, Medidas Atípicas
Abstract: Effectiveness, as a fundamental right clearly stated in some provisions of the 1988 Federal Constitution, is essential in executive processes, and for this guarantee, the legal system provides, as a possible suitable means, the general executive clause of art. 139, item IV, of the Civil Procedure Code. It is intended to verify the need for the use of atypical executive measures by the government and to present oppositions to the decision of the Superior Court of Justice in HC 453.870-PR. Thus, with the use of the inductive method, the factual set analyzed in the court was outlined. It is understood that there are no obstacles to the application of executive atypicality in tax enforcement processes, since the Public Treasury, in addition to its condition of inequality in relation to the private, the privileges that are granted to it are necessary to enforce the interest of the collectivity. It is noted that such measures are likely to be established in the judicial collection of public credits to safeguard the rights of taxpaying citizens, as long as there are no excesses and no violation of the principles of the Democratic Rule of Law. In order to achieve the above objective, a doctrinal, jurisprudential approach and scientific articles on the topic will be used.
Keywords: Tax Enforcement, Effectiveness, Atypical Measures
SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Efetividade do processo. 3. Atipicidade executiva. 3.1 Diretrizes para a concretização da cláusula geral executiva 3.2 Critérios limitadores. 4. Aplicação das medidas atípicas nas execuções fiscais. 4.1 O processo de Execução Fiscal. 4.2 Medidas atípicas aplicáveis. 4.3 Contraposições à decisão do STJ no HC 453.870-PR. 5. Conclusão. Referências
1 INTRODUÇÃO
O processo de execução fiscal, regulamentado pela Lei n° 8.630 de 1980, foi instituído para a cobrança judicial de quantia certa, por dívidas tanto tributárias quanto não tributárias pela Fazenda Pública. Assim, o Estado, ao tributar, o faz em busca do seu desígnio maior: o bem comum, em obediência ao princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse privado, pressuposto lógico de qualquer ordem social estável. O executivo fiscal, possuindo natureza nacional, pode ser considerado um dos processos de maior relevância, seja no âmbito Federal, Estadual, Municipal ou Distrital, mas apesar disso, apresenta um grau de eficácia muito baixo.
O Novo CPC inovou significativamente com o objetivo de conferir maior efetividade, celeridade e segurança jurídica na prestação da tutela jurisdicional. A atipicidade executiva prevista no seu art. 139, inciso IV, não foi uma novidade, pois já era consagrada no art. 461, §5°, do CPC de 1973, quanto às obrigações de fazer, não fazer e entregar coisa. A inovação foi no sentido de, expressamente, munir o magistrado de mecanismos para a obtenção da tutela satisfativa também nas ações que tenham como objeto prestações pecuniárias.
Os demorados processos de execução fiscal que pendem na praxe forense exigem a utilização de meios alternativos para melhora do trâmite e consequentemente da efetividade. Um dos meios potencialmente aptos a contribuir para tal fim seria a adoção do poder geral de execução concedido ao juiz, a exemplo do que dispõe o artigo 139, inciso IV, do Novo CPC.
Com o presente artigo, busca-se compreender que pela importância da efetividade dos processos de modo geral, mas especialmente da tutela executiva, a utilização das medidas constritivas nos processos de execução fiscal não encontra óbice nas especificidades que regem a atuação da Fazenda Pública, visto que necessita de procedimento próprio e diferenciado para o seu exercício, por não estar nas mesmas condições dos particulares.
O Capítulo I abordará sobre a efetividade e a sua importância para os processos executivos. O Capítulo II discorrerá sobre a atipicidade, especificamente, sobre as diretrizes para a concretização da cláusula geral executiva, bem como os limites que devem ser obedecidos quando da sua aplicação. No Capítulo III, discutir-se-á sobre a atipicidade nos processos de execução fiscal; as medidas aplicáveis; e uma análise das justificativas utilizadas pelo STJ no HC 453.870-PR. Por fim, no Capítulo IV, a conclusão.
2 EFETIVIDADE DO PROCESSO
O Processo Civil é ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais[4], e o CPC disciplina expressamente a noção de efetividade quando dispõe em seu art. 4º que as partes têm direito de obter em tempo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa[5]. Além disso, que todos os sujeitos do processo devem cooperar para que se obtenha uma decisão de mérito justa e efetiva[6].
O processo efetivo como um direito fundamental está claramente disposto em alguns dispositivos da Constituição Federal de 1988, quais sejam o que disciplina o princípio da eficiência (art. 37); o princípio da duração razoável do processo (art. 5º, LXXVIII); as garantias inerentes ao devido processo legal (art. 5º, LIV e LV); o processo adequado, preciso e técnico; e o amplo acesso à justiça (art. 5º, XXXV).
A efetividade do processo faz-se imprescindível, especialmente, nos processos de execução. Conforme Fredie Didier Júnior (2017, p.128), o princípio da efetividade assegura um direito fundamental à tutela executiva, pois explica que podem ser extraídos diversos princípios do devido processo legal, e que dele se extrai o da efetividade, pois para ele, “processo devido é processo efetivo”.
Desse entendimento retira-se que o interesse de ter um processo executivo com resultado, decorre da forma como as normas são interpretadas, já que a interpretação deve tirar o maior proveito possível a fim de promover a efetividade. Nesse ponto, observa-se o poder-dever do juiz, no qual deverá adotar as medidas executivas necessárias para a ocorrência da prestação da tutela executiva, podendo também deixar de aplicar alguma norma que impõe restrição a uma determinada medida.
O CPC de 1973 pautava-se pelo princípio da tipicidade das formas executivas e o juiz limitava-se apenas em seguir o procedimento fixado pelo legislador. No entanto, “a evolução da sociedade fez com que novas necessidades de tutela dos direitos fossem postas a nu, evidenciando a falta de sensibilidade e de efetividade do modelo executivo do Código de Processo Civil de 1973, na sua versão original.” (MARINONI; ARENHART; MITIDIERO, 2019, p. 396).
O Novo CPC oferece a separação entre os mecanismos para a efetivação das sentenças judiciais e para a concretização de prestações impostas por documentos privados (títulos executivos extrajudiciais), havendo a distinção dos regimes de “cumprimento de sentença” e de “processo de execução”, mas essa divisão é mais aparente do que efetiva.
José do Santos Carvalho Filho (2019, p. 33-34), ao ensinar sobre os princípios fundamentais que regem a Administração Pública, preleciona que a efetividade não se confunde com eficiência e nem com eficácia. Enquanto a eficiência está relacionada “ao modo pelo qual se processa o desempenho da atividade administrativa”; a eficácia relaciona-se “com os meios e instrumentos utilizados pelos agentes”; a efetividade, por sua vez, “é voltada para os resultados obtidos com as ações administrativas.”.
Nesse sentido, de acordo com Geisa de Assis Rodrigues (et tal, 2016), a noção de efetividade processual está presente nos conceitos ligados ao princípio da eficiência, por isso, pode ser dito que cabe ao Poder Judiciário se organizar de forma adequada para garantir que a tutela jurisdicional possa ser conferida ao titular do direito material de maneira oportuna, célere e em prazo razoável.
Assim, importa dizer que a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5º, inciso XXXV, ao dispor que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”, afirma a existência de direito fundamental a um processo adequado e efetivo. Então, uma vez que o Estado chama para si a responsabilidade da prestação jurisdicional, é importante que se comprometa com a efetividade da tutela satisfativa.
Nesta seara, consoante Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero (2018), a tutela jurisdicional é exercida mediante a propositura de uma ação que se perfaz como direito à tutela adequada, efetiva e tempestiva mediante um processo justo, e para que assim seja alcançado, é preciso adequar-se ao caso concreto através de procedimentos diferenciados conforme as necessidades e particularidades do direito material.
Esses autores defendem que, por essa razão, o Novo CPC, além de prever procedimentos diferenciados, paralelos ao procedimento comum, também introduz várias técnicas processuais capazes de adequar concretamente o processo às necessidades do direito material afirmado em juízo, como por exemplo, as técnicas executivas atípicas previstas nos seus artigos 139, inciso IV, e 536 a 538.
Dado o exposto, observa-se que a tutela jurisdicional tem que ser efetiva, seja ela de um particular ou da própria Fazenda Pública, pois se trata de uma imposição que respeita aos fundamentos do Estado Constitucional. No âmbito da tutela executiva, a efetividade tem o intuito de utilizar todas as medidas executivas coercitivas necessárias para convencer o devedor a cumprir as obrigações, para que se alcance o máximo possível o direito material.
3 ATIPICIDADE EXECUTIVA
O CPC de 2015 inovou significativamente com o objetivo de conferir maior efetividade, celeridade e segurança jurídica na prestação da tutela jurisdicional. Sendo assim, com o intuito de contribuir ao debate, pretende-se explorar sobre as principais diretrizes de aplicação e de limitação das medidas atípicas elencados pela doutrina até o momento.
3.1 Diretrizes para a concretização da cláusula geral executiva
Dentre as inúmeras alterações no ordenamento jurídico pátrio, trazidas pelo Novo CPC, importante consignar que a atipicidade executiva não foi uma delas, pois já era consagrada no CPC de 1973, no seu art. 461, §5°, no tocante às obrigações de fazer, não fazer e entregar coisa.
A inovação ocorreu no art. 139, inciso IV, no sentido de, expressamente, munir o magistrado de mecanismos para a obtenção da tutela satisfativa também no que se refere às obrigações pecuniárias, a qual preconiza que:
Art. 139. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe: (...)
IV - determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária.
Tal dispositivo aduz que o juiz poderá dirigir o processo utilizando-se dessas medidas, “inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária”. À vista disso, enquanto antes eram aplicáveis apenas às obrigações de fazer, não fazer e entregar coisa, hoje é possível a aplicação também às obrigações de pagar quantia certa.
Para Daniel Assumpção Amorim Neves (2018), é cabível a aplicação ampla e irrestrita do princípio da atipicidade a qualquer espécie de execução, independente da natureza da obrigação, sendo possível, até mesmo, a aplicação de astreintes nas execuções de pagar quantia certa.
É certo que a busca pela satisfação do direito do exequente dá-se pelo juiz, no caso concreto, por meios executivos, e são variados os meios previstos em lei: expropriação, penhora, busca e apreensão, astreintes, arresto executivo, remoção de pessoas ou coisas, fechamento de estabelecimentos comerciais etc. Contudo, “apesar de bastante amplo o rol legal, a doutrina é pacífica no entendimento de que trata-se de rol meramente exemplificativo, podendo o juiz adotar outros meios executivos que não estejam expressamente consagrados em lei.” (NEVES, 2018, p. 1074).
Depreende-se do entendimento de Fredie Didier Júnior (et tal, 2017) que esse dispositivo, ao estabelecer que cabe ao juiz determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento da ordem judicial, consiste em espécie normativa composta de termos vagos e por conta dessa indeterminação legislativa, há várias concepções sobre cláusulas gerais, dentre elas, a de reforçar o poder criativo da atividade jurisdicional.
Nesse sentido, cláusula geral pode ser conceituada como uma espécie de texto normativo, cuja hipótese fática é composta por termos vagos e o efeito jurídico é indeterminado, o que reforça o poder criativo da atividade jurisdicional, no qual o julgador é chamado para interferir mais ativamente na construção do ordenamento jurídico, servindo para a realização do caso concreto.
Em réplica, Araken de Assis (2018, p. 129) pondera que “a fértil imaginação das pessoas investidas na função judicante, exasperadas por execuções que não progridem, amontoadas nos cartórios de espaço exíguo e embaladas pela cultura do autoritarismo, disseminada na literatura processual, concedeu as maiores arbitrariedades, visando compelir o executado a cumprir a obrigação ou o direito exequendo.”.
Além disso, esse autor leciona que a tipicidade dos meios executórios é recomendada por razões políticas de relevo, e que é necessária a sua previsão em lei, não podendo ser dado ao judiciário o poder de criar novos meios executórios. Em sua concepção, a legalidade estrita é o que basta para pré-excluir a criação e o emprego heterodoxo de meios executórios.
Por outro lado, Marcelo Miranda Caetano (2018, p. 225) afirma:
A dicção do art. 139, IV, CPC é avanço louvável na processualística pátria, a permitir a utilização de meios executivos atípicos à superação de expedientes voltados ao retardo e desarrazoado inadimplemento executório, e sua correta utilização processual servirá ao incremento do poder diretivo do juiz fazer cumprir suas decisões, inclusive de ofício, dentro da desejada finitude e do senso de celeridade, economia e eficácia que o processo judicial precisa ter.
Assim, é possível afirmar que a ampliação do poder geral de adoção de medidas executivas consiste num grande avanço. Apesar disso, quanto ao tema, percebe-se que ainda há muitas controvérsias, e estas gravitam sobre os questionamentos de ser ou não possível a utilização desses mecanismos; sobre existir ou não limite para a imaginação do aplicador do Direito, intérprete da lei; e ainda, se tudo é possível com base nessa cláusula geral.
Ressalta-se, portanto, que a ideia trazida pelo art. 139 do Novo CPC, é um contraponto à figura tradicional do magistrado, que, sob esse prisma, deve ser alterada para postura “participativa”, que representa aquela forma de atuação do juiz que dialoga, tanto extra-autos quanto para além do âmbito da unidade judiciária, com a sociedade e demais instituições (LARANJAL; SIMÕES, 2016).
Há no âmbito processual cível, três enunciados normativos que sinalizam tratar-se de cláusulas gerais, o art. 297, o §1° do art. 536 e o art. 139, IV. O art. 297 disciplina sobre a possibilidade de o juiz determinar todas as medidas necessárias no caso da tutela provisória; e o art. 536, §1° dispõe sobre a possibilidade de o juiz impor, por exemplo, multa, busca e apreensão, a remoção de pessoas e coisas, trazendo a expressão “determinar todas as medidas necessárias à satisfação do exequente.”.
Quanto ao art. 139, inciso IV, ao dispor que “cabe ao juiz determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária.”, também constitui-se numa cláusula geral executiva.
Diante disso, pela conclusão de Eduardo Talamini (2018), percebe-se que o poder geral de medidas executivas atípicas nas diferentes modalidades executivas sempre terá vez quando se está diante de verdadeira ordem do juiz, com conteúdo mandamental, não podendo ser artifício para desrespeitar os pressupostos e limites das medidas típicas.
Nesse contexto, esse é o entendimento abaixo colacionado:
O poder geral de adoção de medidas atípicas é instrumento de efetivação das decisões (“... assegurar o cumprimento...”, diz o art. 139, IV). Sua função é essencialmente executiva: propiciar a tutela a que o jurisdicionado tem direito, nos limites do devido processo legal formal e material. Não se trata de puro instrumento de afirmação da autoridade judicial nem de meio de punição à afronta a essa autoridade. Para isso, existem sanções específicas (p. ex. CPC, arts. 77, §2°, 81 e 774, par. ún.). (TALAMINI, 2018, p. 56-57).
Desse modo, as cláusulas gerais existem para se fazer cumprir uma decisão judicial, e em todo e qualquer caso, é indispensável a observância no seu exercício, da proporcionalidade, razoabilidade e eficiência da medida. É o que se verá a seguir, quanto aos critérios limitadores da atuação do juiz quando da aplicação das medidas inominadas.
3.2 Critérios Limitadores
Depois de esclarecida as diretrizes para a fixação de medidas atípicas, inclusive nas obrigações de pagar, outro problema surge, que é a necessidade de se fixar limites na utilização da atipicidade executiva. A doutrina atua no sentido de estabelecer critérios mínimos de orientação, principalmente do magistrado, na sua decisão.
De modo geral, nas palavras de Marco Aurélio Ventura Peixoto (et tal, 2018), os critérios propostos para balizar a incidência do instituto em análise são, entre outros: a observância dos postulados da proporcionalidade; da utilização do dispositivo de modo subsidiário relativamente às medidas atípicas; a exigência de fundamentação adequada; e de observância ao contraditório.
Segundo Humberto Ávila (2015), o postulado da proporcionalidade deve ser respeitado nas situações de causalidade entre dois elementos empiricamente discerníveis, um meio e um fim, de forma que possa proceder à adequação. Em outras palavras, deve-se analisar se o meio realmente promoverá o fim; se não há outros meios menos restritivos dos direitos fundamentais; e se as vantagens trazidas pela promoção do fim correspondem às desvantagens provocadas pela adoção do meio.
Pelo princípio da tipicidade dos meios executivos, a escolha da medida executiva é definida pela lei, ou seja, o juiz só pode aplicar uma das medidas previstas pela própria lei. Quando o assunto é a atipicidade executiva é preciso investigar os limites de sua aplicação, ou seja, é preciso investigar qual o parâmetro de controle da escolha realizada pelo juiz.
Dessa forma, no que diz respeito à aplicação de medidas atípicas para a execução nas obrigações de pagar quantia, o princípio da subsidiariedade é de suma importância, sendo preciso examinar, especialmente, cada uma das hipóteses que podem ser utilizadas para tal execução, devendo atentar-se sempre pela chamada “tipicidade prima facie”.
Não é cediço encontrar decisões significativas de consenso na doutrina quanto os limites de incidência do poder geral de execução e as possibilidades de sua aplicação nas obrigações de pagar quantia certa, mas é possível depreender que, majoritariamente, entende-se possível e que é mais conveniente a sua aplicação de forma excepcional, ou seja, de forma subsidiária.
Nessa acepção, o Fórum de Processualistas Civis–FPPC aprovou dois Enunciados interpretativos: Enunciado 12/FPPC [7] e Enunciado 396/FPPC[8]. Um fazendo alusão à necessidade de serem esgotadas todas as medidas típicas para que se proceda à utilização das técnicas inominadas de execução e outro sobre a possibilidade da sua determinação, de ofício pelo juiz, desde que observadas a dignidade da pessoa humana, a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência.
À vista disso, pelo entendimento de Marco Aurélio Ventura Peixoto, Patrícia de Almeida Montalvão Soares e Renata Cortez Vieira Peixoto (2018), é cabível a aplicação de medidas atípicas sub-rogatórias e coercitivas, desde que observado o princípio do contraditório e para a sua determinação de ofício, que sejam observados os princípios fundamentais do processo civil, estampados no art. 8° do NCPC[9].
Além dos postulados que norteiam o conteúdo da decisão, revela-se de grande importância que o pronunciamento judicial seja devidamente fundamentado. Esse dever de fundamentação que a doutrina chamou de “exaustiva” ou “analítica” funciona como um mecanismo de controle para as partes, em que o juiz deve discorrer o porquê uma medida é mais adequada e não outra (FREITAS; LIGERO, 2019).
Faz-se necessário que as decisões, quando decretadas, sejam devidamente fundamentadas, conforme preceituam os ditames do art. 489, §1°, incisos I e II do NCPC, os quais declaram que não se considera fundamentada qualquer decisão judicial que se limitar à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida; empregar conceitos jurídicos indeterminados ou sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso.
O art. 93, inciso IX também disciplina o postulado da fundamentação ao dispor que todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos e todas as decisões serão fundamentadas. Para Fredie Didier Jr. (2018), é inegável que todo pronunciamento judicial de cunho decisório precisa ser fundamentado, e o papel da fundamentação ganha ainda mais relevância quando o órgão julgador exercita o poder geral de efetivação.
O princípio do contraditório, de acordo com Fernanda Duarte, Gilson Bonfim e Janssen Murayama (2016), fundamenta-se num modelo cooperativo, percebendo-o como um princípio realmente capaz de permitir que os sujeitos do processo influenciem efetivamente a tomada de decisão, pois o magistrado, mesmo nos casos que poderia decidir de ofício, está obrigado a dar oportunidade às partes para se manifestarem.
Em virtude disso, já que a escolha da medida executiva atípica pressupõe a análise de enunciados normativos de conteúdo aberto, é imprescindível a observância do contraditório (arts. 7°[10] e 9°, CPC[11]), ainda que prorrogado para momento posterior, ou seja, a defesa na fase de conhecimento, o recurso cabível ou possível pedido de reconsideração.
Por fim, Alexandre Câmara (2018) conclui que os limites existem e não devem ser ultrapassados, para que não importe na violação de preceitos do Estado Democrático de Direito, como o respeito à dignidade humana e ao devido processo constitucional, pois a liberdade concedida ao juiz naturalmente aumenta sua responsabilidade, mas é inadmissível a sua utilização para contrariar leis ou princípios.
4 APLICAÇÃO DAS MEDIDAS ATÍPICAS NAS EXECUÇÕES FISCAIS
Como dito, o CPC de 2015 inovou em seu artigo 139, IV, quando concedeu poderes ao magistrado para decidir amplamente com base no princípio da atipicidade na ordem judicial, inclusive nas prestações pecuniárias, faz-se necessário debater sobre a correlação da atipicidade nos processos de Execução Fiscal e entendimento jurisprudencial.
4.1 Processo de Execução Fiscal
Inicialmente, ressalta-se que a prestação jurisdicional executiva se presta a atuar impondo medidas práticas necessárias para fazer cumprir o disposto em sentença ou em título executivo extrajudicial, já que este, por sua vez, atesta a certeza do dever de cumprimento da prestação, consistindo num conjunto de atos eminentemente práticos e materiais.
No Brasil, no que concerne ao processo de execução fiscal, foi instituído pela Lei de Execuções Fiscais (LEF) ou Lei n° 6.830, datada de 22 de setembro do ano de 1980[12]. Essa lei disciplina a cobrança judicial de dívida ativa da Fazenda Pública, por meio de título executivo extrajudicial, aplicando subsidiariamente, as normas do CPC, naquilo que é compatível.
É por meio da Execução Fiscal que a Fazenda Pública, através do Poder Judiciário, busca no patrimônio do executado, bens suficientes para saldar o crédito cobrado. Trata-se da cobrança de Dívida Ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e respectivas autarquias, vide caput do artigo 1º da referida lei.
Conforme art. 2° e parágrafos da lei supracitada[13], qualquer valor, cuja cobrança seja atribuída por lei à União, aos Estados, aos Municípios e ao Distrito Federal, será considerado Dívida Ativa da Fazenda Pública, no qual o órgão competente poderá proceder à inscrição do executado, como ato de controle administrativo da legalidade e fará a apuração da certeza e liquidez do crédito tributário ou não tributário.
Outrossim, a Certidão de Dívida Ativa será estabelecida pelos mesmos elementos do Termo de Inscrição de Dívida Ativa, e será autenticada pela autoridade competente, constituindo título executivo extrajudicial. Seus requisitos são indispensáveis na utilização da ampla defesa do executado, que se dará, em regra, através de embargos à execução fiscal.
A petição inicial deve ser instruída com a certidão da dívida ativa, que indicará, nos termos do artigo 6º da Lei 6.830/80 (LEF), apenas o juiz a quem é dirigida, o pedido e o requerimento para a citação do executado. A produção de provas pela Fazenda Pública independe de requerimento na petição inicial, e o valor da causa será o da dívida constante da certidão, com os encargos legais.
O despacho judicial é que defere ou indefere a inicial. Em caso de deferimento, interrompe o prazo prescricional, e importa em ordem para a citação; já a penhora, ocorrerá caso não haja pagamento da dívida ativa nem o oferecimento da garantia à execução; e o arresto, se o executado não tiver domicílio ou dele se ocultar.
O sistema tributário, então, outorgou ao próprio Fisco o poder de formar diretamente um título para fins executivos, dotado de presunção de certeza e liquidez. Neste procedimento, o Estado promove as medidas práticas necessárias, invadindo o patrimônio do executado e dele retirando o produto para a satisfação do interesse do credor. Sendo assim, a execução fiscal busca fazer cumprir a obrigação de pagar uma quantia certa, vinculada à certidão de dívida ativa, aos interesses do devedor fazendário (SCHERER, 2015).
Com isso, frisa-se o entendimento de José Denilson Branco (2016), de que a cobrança da dívida ativa serve como instrumento de expropriação patrimonial, compelindo forçosamente aquele que se recusa a cumprir voluntariamente com a obrigação surgida a partir do fato gerador. O que força a afirmar que o poder estatal utiliza essa via para satisfazer as demandas dos serviços públicos e os anseios da sociedade.
4.2 Medidas Atípicas aplicáveis
Além de entender sobre o processo de Execução Fiscal, também é necessário abordar sobre as medidas atípicas a ele aplicáveis. Estas podem ser, por exemplo, a suspensão da carteira nacional de habilitação, a apreensão do passaporte, o impedimento das empresas em participarem de licitações, a aplicação de multa, e a inscrição em cadastro de inadimplentes.
De acordo com Minatto (2017), os juízes em suas decisões inovaram quando passaram a determinar a apreensão da CNH e do passaporte, pois não deixa de ser uma forma do devedor ser compelido a pagar a dívida. Então, tais medidas podem ser solicitadas pelo credor, qual seja, no caso da Execução Fiscal, a própria Fazenda Pública na busca dos seus créditos.
Contrário a esse entendimento, Lenza (2015) ressalta que quando há a aplicação dessas medidas, é atingido o direito constitucional disposto no artigo 5º, inciso XV, da Constituição Federal, o direito de ir e vir, com o argumento de que no território nacional em tempo de paz, a locomoção é livre, podendo qualquer pessoa entrar, permanecer ou sair com seus bens, desde que os faça nos termos da lei.
No mesmo sentido, para Daniel Amorim Assumpção Neves (2017) a doutrina ainda não é pacífica na resolução do conflito sobre a possibilidade ou não da aplicação e ao requerimento de tais medidas, mas defende, assim como a doutrina majoritária, que a adoção de medidas executivas atípicas de natureza coercitiva tem que respeitar os limites impostos pela Constituição Federal de 1988.
Quanto à multa, Fredie Didier (et tal, 2018, p.331), esclarece que “na execução das obrigações pecuniárias, a multa pode ter caráter punitivo-ou também punitivo”, e destaca a possibilidade de “estar prevista em outros dispositivos (p. ex, multa por inadimplemento de tributos)”. Dá ênfase, ainda, que na execução de título extrajudicial, a multa por inadimplemento advém do próprio negócio jurídico conteúdo do título, ou decorrerá da lei, como no caso da execução fiscal.
Para ele, é possível a fixação de multa coercitiva como medida atípica, para forçar o executado a cumprir os deveres processuais, por exemplo, quando o juiz determina ao executado, a indicação de bens passíveis à penhora, entretanto, não é favorável à imposição de multa como medida atípica, com base no art. 139, IV, NCPC, na execução pecuniária, pois isso violaria o princípio da proibição do excesso, constituindo em bis in idem.
Nesse mesmo sentido, Eduardo Talamini (2018) entende que não é cabível a aplicação de medida coercitiva no cumprimento de sentença condenatória pecuniária contra o devedor, por conta do não pagamento, mas que poderão ser aplicadas para a apresentação do rol de bens que são passíveis de penhora, para que se proceda à busca e apreensão.
Nesse âmbito, há também o Cadastro Informativo de Créditos não Quitados do Setor Público Federal (CADIN) no qual a Administração Pública Federal pode padronizar os métodos de concessão dos créditos, de garantia e de incentivo tanto fiscal como financeiro. Caso tenha o emprego de recursos públicos para tais interesses jurídicos, os órgãos da Administração Pública poderão consultar o cadastro.
Nesse diapasão, Aluisio Gonçalves de Castro Mendes e Larissa Clare Pochman da Silva (2015), explicam que a execução do Novo CPC diz que o nome do executado que constar no Cadastro de Inadimplentes, se dará por meio do requerimento do exequente e o devedor será orientado sobre o método do pagamento do crédito tributário.
Como se trata de mecanismos que devem ser utilizados como ultima ratio, acaso esgotados ou frustrados os meios típicos, essa situação permite ao juiz incluir o nome do executado em cadastros de inadimplentes, inclusive em execução fiscal, em função dos artigos 782, §3° e art. 139, IV, CPC (I FNPP – Enunciado 19). [14]
Pessoas jurídicas também estão sujeitas ao pagamento de tributos, sendo assim, uma medida a ser utilizada é o impedimento de participarem de licitações, ficando impedidas de fazer parte das competições seletivas do Poder Público. A justificativa de tal impedimento dá-se através de normas específicas que contenham algum tipo de vedação ou até mesmo algum dos princípios que norteiam a Administração Pública.
Por isso tudo, existem discussões diferenciadas sobre o tema. De acordo com certos autores algumas dessas medidas violam os direitos fundamentais do executado; para outros, não há violação, já que a utilização não está indo contra a lei, sendo, portanto, utilizadas de forma lícita.
4.3 Contraposições à decisão do STJ no HC 453.870-PR
A execução fiscal possui características específicas e há quem as enxerguem como privilégios da Fazenda Pública, conquanto, não é obstáculo para a incidência de medidas atípicas, pois tais prerrogativas são essenciais no resguardo do interesse público. É o que se verá sob a análise da decisão do STJ proferida no Habeas Corpus (HC) 453.870-PR[15].
No caso, foi determinada a penhora de 30% do salário recebido pelo executado, com a retenção do valor em folha de pagamento. Em sede de segundo grau, foi deferido o pedido do exequente para inscrever o devedor em cadastro de inadimplentes, bem como a suspensão de seu passaporte e a CNH como forma de coagi-lo a pagar a dívida. Por isso, aduzindo a desproporcionalidade da medida, foi impetrado Habeas Corpus perante o STJ.
O acórdão foi proferido com o argumento de que o Poder Público já possui “altíssimos privilégios”, como a existência de varas comumente especializadas para a condução dos seus feitos; de um corpo especializado de procuradores; de lei própria regedora do procedimento (Lei 6.830/1980); e de prévia garantia do juízo para o conhecimento dos embargos.
Cabe razão à suprema corte de justiça ao dizer que o Estado, na execução fiscal, busca saldar créditos titularizados pela coletividade. Isso traz ao lume um ponto essencial, o interesse da coletividade, ou interesse público, por assim dizer. Tal ponto remete ao princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse privado, e este por si só, já é razão suficiente para o Estado, por meio de todos os meios possíveis, fazer cumprir tal princípio.
Nesse raciocínio é o que entende Maria Sylvia Zanella de Pietro (2018, p. 92), quando declara que “substituiu-se a ideia do homem como fim único do direito (própria do individualismo) pelo princípio que hoje serve de fundamento para todo o direito público que vincula a Administração em todas as suas decisões: o de que os interesses públicos têm supremacia sobre os individuais”.
A ideia de interesse público inclui o resguardo de direitos, e estes são definidos por Stephen Holmes e Cass R. Sunstein (2019) como serviços públicos que o Estado deve fornecer e pelos quais deve prestar contas, em troca de tributos pagos pelos cidadãos, devendo uma quantia de dinheiro público ser entregue a tempo às autoridades, para que assim, sejam garantidos.
Para Marco Aurélio Ventura Peixoto (et tal, 2018), as prerrogativas conferidas por lei à Fazenda Pública não devem ser encaradas como privilégios, pois o tratamento diferenciado tem a proteção do interesse público como uma razão de ser, e atende à ideia de isonomia processual, visto que, se há desigualdade entre os polos, devem ser desigualmente tratados pelo legislador.
Quanto a essa desigualdade, Marco Antônio Rodrigues (2016) ressalta que a Fazenda Pública para se defender não possui as mesmas condições dos particulares, pois exige procedimentos próprios para seu exercício, por isso é difícil ter contato com os fatos, fundamentos e informações do processo. Por esse mesmo motivo, é preciso estabelecer limites à aplicabilidade de medidas atípicas por parte do Poder Público.
Dessa maneira, os supostos privilégios citados pela Primeira Turma não devem ser encarados como prerrogativas, mas como essenciais de apoio ao Estado, devido à necessidade de preservação do interesse público primário, o da coletividade, o que justifica a existência no texto constitucional ou em leis esparsas, dede um regime diferenciado para a atuação da Fazenda Pública em juízo.
Sendo o Poder Público privilegiado na sua condição de credor, deveria garantir a celeridade e eficiência da cobrança tributária, todavia, a instabilidade, lentidão e ineficiência dos processos de execução fiscal, força o reconhecimento de que a cobrança geral anda mais rápida que a tributária, não sendo o crédito fiscal “altamente blindado” dos riscos de inadimplemento, como dito pelo STJ na decisão ora em análise.
Em outras palavras: “as fazendas públicas se desaparelharam, já que as prerrogativas processuais e materiais permitiram que se mantivessem órgãos de representação judicial deficientes, humana e materialmente e, ainda assim, continuaram as execuções fiscais a se prestar a papel de símbolo da ineficiência diante da disciplina legislativa cerrada.” (DUARTE; BONFIM; MURAYAMA, 2016, p. 151).
Quanto à efetividade do trâmite dos processos de execução fiscal no contexto prático, Paulo Caliendo (et tal, 2016), traz que:
Conforme estudos do IPEA, realizados em 2011, somente em 15,7% dos casos há penhora de bens, mas em apenas um terço dessas há apresentação voluntária de bens pelo devedor. Somente em 3,8% dos processos existe a oposição de exceção de pré-executividade, e apenas 6,5% dos devedores opõem embargos à execução. Não existem dados atualizados após a grande recessão de 2016, mas, certamente, os números devem ser ainda piores.
Ante o volume de execuções fiscais e os dados apresentados como provas cabais da péssima qualidade do sistema tributário, ofensivo aos direitos fundamentais do contribuinte, é necessário garantir a eficiência da execução fiscal, pois conforme o mesmo autor, dentre os principais objetivos almejados com a criação de uma lei especial para a execução do crédito público, estava o de garantir à Fazenda Pública melhores mecanismos para a satisfação dos seus créditos, bem como, na racionalização da cobrança da Dívida Ativa.
A expressa previsão legal da atipicidade das técnicas executivas das obrigações de pagar quantia certa, prevista no art. 139, IV, do Novo CPC, seria uma possível solução. Quanto a isso, Juliana Claro de Freitas e Gilberto Notário Ligero (2019) afirmam ser uma das mais significativas alterações no sentido de conferir maior efetividade e de dispor ao magistrado mecanismos para a obtenção da tutela satisfativa.
Imperiosa é a transcrição do Enunciado 48/ENFAM[16], nele aduz-se que o poder geral de efetivação permite a aplicação de medidas atípicas para fazer cumprir a obrigação, tanto no âmbito do cumprimento de sentença, como no processo de execução baseado em título extrajudicial, ou seja, devidamente cabível nos processos de execução fiscal.
A existência de varas comumente especializadas e um corpo especializado de procuradores também não alteram a situação de escassez de efetividade do rito em questão, visto que, mesmo sendo concedidos prazos diferenciados à Fazenda Pública, nas execuções, os juízes é que mandam os processos aos advogados do fisco, e esses excessos provocam a inoperância da execução.
O ínclito tribunal também exemplificou como privilégio do Estado, o fato da execução somente ser embargável mediante a plena garantia em juízo, porém, essa previsão na lei não mais constitui verdade absoluta, visto que a regra prevista do art. 16, §1° da LEF, é excepcionada nos casos em que o executado pode alegar determinado vício, lastreado em matérias de ordem pública com a chamada “exceção de pré-executividade”.
Da mesma maneira, Marllon Antony Silva Martins (2018) assevera que pela LEF, é preciso que seja garantida a execução antes da apresentação de embargos, mas por outro lado, é possível, na execução fiscal, o executado se defender por meio de uma figura processual de construção doutrinário-jurisprudencial, denominada exceção de pré-executividade, independentemente de assegurar o juízo da execução.
Pelo exposto, compreende-se que os privilégios mencionados são o que justifica o fato da Fazenda Pública nunca se encontrar em posição idêntica à do particular, pois é protetora do interesse de todos, não podendo ser óbice para a incidência de medidas executivas atípicas quando da cobrança nos processos de execução fiscal.
5 CONCLUSÃO
O processo efetivo, entendido como aquele no qual o Poder Judiciário garante a tutela jurisdicional de maneira oportuna, célere e em prazo razoável, é considerado direito fundamental e está claramente disposto na Constituição Federal de 1988. Por isso, a efetividade faz-se imprescindível, especialmente, nos processos de execução, e o interesse de ter um processo executivo com resultado, decorre da forma como as normas são interpretadas, para obter o maior proveito possível.
Uma das mais significativas alterações do CPC para garantir maior efetividade, foi no seu art. 139, inciso IV, ao dispor que o magistrado pode determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive quando se trata de prestações pecuniárias.
Conforme se procurou demonstrar, conclui-se que a atipicidade executiva está sujeita a limites, como o da proporcionalidade; subsidiariedade; fundamentação adequada, e a observância do contraditório, pois a liberdade concedida ao juiz aumenta sua responsabilidade, mas é inadmissível a sua utilização para contrariar leis ou princípios.
Entre as medidas atípicas que estão sendo aplicadas por diversos magistrados, está a suspensão da CNH, a apreensão do passaporte, o impedimento das empresas em participarem de licitações, a aplicação de multa e a inscrição em cadastro de inadimplentes. Com base no estudo, essas medidas são aplicáveis ao processo de execução fiscal.
Pelas contraposições às justificativas dadas pelo STJ no HC 453.870-PR, depreende-se que as características específicas do processo de execução fiscal não devem ser encaradas como privilégios concedidos à Fazenda Pública, vez que são necessários para se fazer cumprir o seu desígnio maior, o interesse público ou interesse da coletividade.
Por fim, acredita-se que as medidas aflitivas pessoais são passíveis de se firmar no executivo fiscal para subsidiar o poder público na promoção de processos efetivos e para resguardar os direitos dos cidadãos contribuintes, desde que não haja excessos e nem a violação aos princípios norteadores do Estado Democrático de Direito.
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[1]Acadêmica do Curso de Direito do Centro Universitário Santo Agostinho – UNIFSA. E-mail: [email protected].
[2] Orientador, Professor do Curso de Direito do Centro Universitário Santo Agostinho – UNIFSA, Especialista em Direito Processual Civil pela PUC/MG, Mestre em Direito Processual Civil pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PUCRS, Doutorando em Direito Processual Civil pela Universidade Estácio de Sá (RJ). E-mail: [email protected].
[3] Trabalho de Conclusão de Curso apresentado no Centro Universitário Santo Agostinho – UNIFSA, Teresina-PI, 14 de junho de 2020.
[4] Art. 1º O processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil , observando-se as disposições deste Código.
[5] Art. 4º As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa.
[6] Art. 6º Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva.
[7] Enunciado 12/FPPC: “A aplicação das medidas atípicas sub-rogatórias e coercitivas é cabível em qualquer obrigação no cumprimento de sentença ou execução de título executivo extrajudicial. Essas medidas, contudo, serão aplicadas de forma subsidiária às medidas tipificadas, com observação do contraditório, ainda que diferido, e por meio de decisão à luz do art. 489, § 1º, I e II.”; disponível em: https://institutodc.com.br/wp-content/uploads/2017/06/FPPC-Carta-de-Florianopolis.pdf. Acesso em: 31 jan. 2020.
[8] Enunciado 396/FPPC: “As medidas do inciso IV do art. 139 podem ser determinadas de ofício, observado o art. 8º”; disponível em: https://institutodc.com.br/wp-content/uploads/2017/06/FPPC-Carta-de-Florianopolis.pdf. Acesso em: 31 jan. 2020.
[9] Art. 8°. Ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência.
[10] Art. 7º. É assegurada às partes paridade de tratamento em relação ao exercício de direitos e faculdades processuais, aos meios de defesa, aos ônus, aos deveres e à aplicação de sanções processuais, competindo ao juiz zelar pelo efetivo contraditório.
[11] Art. 9º. Não se proferirá decisão contra uma das partes sem que ela seja previamente ouvida.
[12]BRASIL. Lei de Execução Fiscal. 1980. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6830.htm. Acesso em: 25 nov. 2019.
[13] Art. 2º. Constitui Dívida Ativa da Fazenda Pública aquela definida como tributária ou não tributária na Lei nº 4.320, de 17 de março de 1964, com as alterações posteriores, que estatui normas gerais de direito financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal. § 1º - Qualquer valor, cuja cobrança seja atribuída por lei às entidades de que trata o artigo 1º, será considerado Dívida Ativa da Fazenda Pública.
[14]I FÓRUM NACIONAL DO PODER PÚBLICO – ENUNCIADO 19 – (art. 782 §3º, art. 139 IV, Lei 13.105/15). A possibilidade de inclusão do nome do executado em cadastro de inadimplentes por determinação judicial é aplicável à execução fiscal; disponível em: https://www.sinprofaz.org.br/pdfs/enunciados-fnpp.pdf. Acesso em: 18 nov. 2019.
[15] Informativo 654/STJ, 1°Seção, HC 453.870 – PR, rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filo, j. 25.06.2019; disponível em: https://ww2.stj.jus.br/jurisprudencia/externo/informativo/. Acesso em: 20 out. 2019.
[16] Enunciado 48/ENFAM: “O art. 139, IV, do CPC/2015 traduz um poder geral de efetivação, permitindo a aplicação de medidas atípicas para garantir o cumprimento de qualquer ordem judicial, inclusive no âmbito do cumprimento de sentença e no processo de execução baseado em títulos extrajudiciais.”; disponível em: https://www.enfam.jus.br/2015/09/enfam-divulga-62-enunciados-sobre-a-aplicacao-do-novo-cpc/. Acesso em: 18 nov. 2019
Adovogada, pós-graduada em Direito Público e Poder Judiciário pela EJUD-PI. Cursou Direito no Centro Universitário Santo Agostinho - UNIFSA. Foi estagiária da Fundação Municipal de Saúde - FMS e da Procuradoria Geral do Município de Teresina - PI.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ABSOLON, Débora Lopes. Aplicação das medidas executivas atípicas na Execução Fiscal Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 07 maio 2020, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/54491/aplicao-das-medidas-executivas-atpicas-na-execuo-fiscal. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: ELISA CARDOSO BATISTA
Por: Fernanda Amaral Occhiucci Gonçalves
Por: MARCOS ANTÔNIO DA SILVA OLIVEIRA
Por: mariana oliveira do espirito santo tavares
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