KELLY NOGUEIRA DA SILVA GONÇALVES[1]
(orientadora)
RESUMO: Os casos de câncer de mama no Brasil são considerados elevados de acordo os boletins epidemiológicos divulgados pelo Ministério da Saúde necessitando assim de políticas direcionadas a saúde que tratam desse tipo de doença. O estudo a seguir tem o objetivo de apresentar as mudanças trazidas com a Lei nº 13.770, de 19 de dezembro de 2018 em relação a reconstrução mamária de mulheres que sofrem mutilação da mama em decorrência do tratamento oncológico. Quando existirem condições técnicas a reconstruçao mamária, deverá ser efetuada no tempo cirúrgico da mutilação e no caso de impossibilidade de reconstrução imediata, a paciente será encaminhada para acompanhamento e terá garantida a realização da cirurgia imediatamente após alcançar as condições clínicas requeridas. A saúde é um direito constitucional e é dever do Estado garantir a saúde através da formulação e execução de políticas econômicas e sociais que visem à redução de riscos de doenças e de outros agravos e no estabelecimento de condições que assegurem acesso universal e igualitário às ações e aos serviços para a sua promoção, proteção e recuperação. O artigo que segue é do tipo bibliográfico embasado em doutrinas, jurisprudências, textos e legislativos e a Constituição Federal de 1988.
PALAVRAS-CHAVE: Saúde. Legislação. Câncer de mama.
ABSTRACT: The cases of breast cancer in Brazil are considered high according to the epidemiological bulletins released by the Ministry of Health, thus requiring policies directed to health that deal with this type of disease. The following study aims to present the changes brought by Law No. 13,770, of December 19, 2018 in relation to breast reconstruction of women who undergo breast mutilation as a result of cancer treatment. When technical conditions exist, breast reconstruction should be performed during the surgical mutilation period and in the case of impossibility of immediate reconstruction, the patient will be referred for follow-up and the surgery will be guaranteed immediately after reaching the required clinical conditions. Health is a constitutional right and it is the duty of the State to guarantee health through the formulation and execution of economic and social policies aimed at reducing the risks of diseases and other diseases and in establishing conditions that ensure universal and equal access to actions and services for their promotion, protection and recovery. The following article is of the bibliographic type based on doctrines, jurisprudence, texts and legislation and the Federal Constitution of 1988.
KEYWORDS: Health. Legislation. Breast cancer.
SUMARIO: 1. Introdução – 2. Fundamentação - 2.1 Direito a saúde na constituição federal de 1988 - 2.2. Direitos da pessoa em tratamento oncológico pelo sistema único de saúde - 2.3 Política nacional de atenção oncológica – 3. Evolução histórica da legislação que versa sobre a cirurgia plástica reparadora da mama - 3.1. Lei nº 13.770, de 19 de dezembro de 2018 e a cirurgia plástica reconstrutiva da mama em casos de mutilação decorrente de tratamento de câncer – 4. Considerações finais – 5 Referencias.
1 INTRODUÇÃO
Os casos de câncer de mama no Brasil são considerados elevados de acordo com os boletins epidemiológicos divulgados pelo Ministério da Saúde. Devido a seriedade do câncer de mama principalmente em observância à reconstrução mamária por prótese, o presente estudo propõe uma discussão com vistas a ressaltar a importância da aplicabilidade da lei nº 13.770, de 19 de dezembro de 2018.
As mulheres que sofrerem mutilação total ou parcial de mama, decorrente de utilização de técnica de tratamento de câncer tem direito a cirurgia plástica reconstrutiva. Nessa perspectiva, este estudo parte da seguinte problemática: quais as mudanças trazidas com a Lei nº 13.770, de 19 de dezembro de 2018 em relação a reconstrução mamária de mulheres que sofrem mutilação da mama em decorrência do tratamento oncológico?
A partir desse problema investigativo elencou-se neste estudo tópicos com um delineamento jurídico sobre o direito à saúde, a evolução histórica da legislação que versa sobre a cirurgia plástica reparadora da mama, os direitos da pessoa em tratamento oncológico pelo Sistema Único de Saúde, a política nacional de atenção oncológica e finalmente a lei nº 13.770, de 19 de dezembro de 2018 e a cirurgia plástica reconstrutiva da mama em casos de mutilação decorrente de tratamento de câncer.
O objetivo deste estudo é apontar as mudanças trazidas com a lei nº 13.770/2018 e evidenciar que o direito a saúde é universal e o tratamento oncológico tem prerrogativas jurídicas direcionadas especificamente para essa enfermidade, principalmente devido ao grande aumento epidemiológico constatados pelo Ministério da Saúde.
A saúde é um direito constitucional e é dever do Estado garantir a saúde através da formulação e execução de políticas econômicas e sociais que visem à redução de riscos de doenças e de outros agravos e no estabelecimento de condições que assegurem acesso universal e igualitário às ações e aos serviços para a sua promoção, proteção e recuperação.
2 FUNDAMENTAÇÃO
2.1 DIREITO A SAÚDE NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
Precipuamente, é importante trazer o conceito estabelecido do texto Constitucional sobre a saúde, a saber:
[...] a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário a ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação (CF, art. 196), sendo de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou por meio de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado (CF, art. 197).
A proteção constitucional do direito à saúde ocorreu em 1988, tendo em vista que os diplomas anteriores não deram a esse importante direito um grande destaque. Martins (2008), esclarece que, as Constituições do Império (1824) e da República (1891) restaram silentes sobre a responsabilidade do Estado em relação ao direito fundamental à saúde.
No texto da Constituição de 1934 havia, ainda que tímida, uma preocupação com a saúde do trabalhador e também uma atenção sobre a mortalidade infantil e a higiene social e mental. Em 1937, estabeleceu-se a proteção da saúde da criança e o texto de 1946 determinava que a competência para legislar sobre a defesa e proteção da saúde seria da União. As normas constitucionais durante o regime militar também não avançaram e se preocuparam com a fixação de competência legislativa, determinando que as leis federais seriam responsáveis pelo cuidado com a saúde (MARTINS, 2008).
Juridicamente, a Carta Magna de 1988, elevou a saúde ao plano dos direitos sociais fundamentais, trazendo no seu texto diversas matérias de competência legislativa, de planejamento e execução.
A Constituição prevê competência comum da União, dos Estados e Municípios para cuidar da saúde (art. 23, II), competência da União para legislar sobre o direito sanitário (art. 24, XII), competência dos municípios em prestar, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, serviços de atendimento à saúde da população (art. 30, VII); previsão de limites mínimos de aplicação de recursos orçamentários na saúde (art. 34, VI, e); dentre outras disposições (ASENSI, 2013).
Ademais, ao instituir um sistema público de saúde a Constituição Federal de 1988 elevou as ações de saúde como matéria de relevância pública, alicerçado em princípios sociais de solidariedade, igualdade, universalidade e integralidade. As ações de saúde relacionadas ao tratamento oncológico do ponto de vista jurídico serão elencadas no tópico sequente.
2.2 Direitos da pessoa em tratamento oncológico pelo Sistema Único de Saúde
A Lei Federal nº 12.732/12 institui os direitos de pacientes com câncer de realizarem o tratamento completo pelo SUS (Sistema Único de Saúde) e de iniciarem o tratamento em, no máximo, 60 dias após o diagnóstico, são eles:
[...] Serviço Social; Saque do FGTS; Saque do PIS/PASEP; Auxílio- doença; Aposentadoria por invalidez; Amparo Assistencial ao Idoso e ao Deficiente (Lei Orgânica de Assistência Social – LOAS); Tratamento Fora de Domicílio (TFD) no Sistema Único de Saúde; Vale Social; RIOcard; Isenção de imposto de renda na aposentadoria; Quitação do financiamento da casa própria; Isenção de IPI na compra de veículos adaptados; Isenção de ICMS na compra de veículos adaptados; Isenção de IPVA para veículos adaptados; Isenção de Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU); Bilhete de Viagem do Idoso - Transporte interestadual gratuito; Laudo Médico para Afastamento de Trabalho; Laudo Médico para Atestado de Lucidez (BRASIL, 2012, p. 08).
Pelo Sistema Único de Saúde, política consolidada por meio da Constituição de 1988, são direitos do paciente de acordo o Instituto Nacional de Câncer – INCA (2018), iniciar o tratamento oncológico (cirurgia, quimioterapia ou radioterapia) no prazo máximo de 60 (sessenta) dias contados a partir da data da emissão do exame patológico, ou em prazo menor, conforme necessidade terapêutica do caso registrada em prontuário.
Ter acesso ao conjunto de ações e serviços necessários para a promoção, proteção e recuperação da saúde, ter acesso gratuito aos medicamentos necessários para tratar e restabelecer a saúde e o acesso a atendimento ambulatorial, realização de exames, internação hospitalar e demais procedimentos necessários para manutenção da saúde em tempo razoável, além de consentir ou recusar, de forma voluntária e esclarecida, procedimentos médicos de qualquer natureza.
Para Leivas (2011), a universalidade a saúde é um instrumento de inclusão social e uma garantia constitucional de acesso às ações e serviços de saúde a todos que respeitem as portas de entrada do sistema (a organização jurídico-administrativa do sistema de saúde), que devem ser definidas pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
Ou seja, todas as pessoas, em todos os níveis de assistência, sem preconceitos ou privilégios de qualquer espécie (renda, sexo, idade etc.), independentemente de vínculo previdenciário ou qualquer tipo de seguro-saúde, têm o direito de viver em condições salubres e de acesso ao sistema público de saúde.
A questão individual do direito à saúde é reconhecida como um direito público subjetivo assegurado à generalidade das pessoas, que conduz o indivíduo e o Estado a uma relação jurídica obrigacional, para Lima (2014), a essencialidade do direito à saúde fez com que o legislador constituinte qualificasse como prestações de relevância pública as ações e serviços de saúde legitimando a atuação do Poder Judiciário nas hipóteses em que a Administração Pública descumpra o mandamento constitucional em apreço.
Ao se tratar do direito ao tratamento oncológico oferecido pelo Sistema Único de Saúde, no Agravo de Instrumento nº 5006839-79.2015.404.0000/PR, o Supremo Tribunal Federal, analisando a questão da promoção do Direito à Saúde, posicionou-se sobre o tema afirmando que:
(...) O direito constitucional à saúde se traduz em um direito subjetivo público a prestações positivas do Estado, passível de garantia pela via judicial. (...) Não obstante, esse direito subjetivo público é assegurado mediante políticas sociais econômicas, ou seja, não há um direito absoluto a todo e qualquer procedimento necessário para a proteção, promoção e recuperação da saúde, independentemente da existência de uma política pública que o concretize. Há um direito público subjetivo a políticas públicas que promovam, protejam e recuperem a saúde. (...) Em geral, deverá ser privilegiado o tratamento fornecido pelo SUS em detrimento de opção diversa escolhida pelo paciente, sempre que não for comprovada a ineficácia ou a impropriedade da política de saúde existente. Essa conclusão não afasta, contudo, a possibilidade de o Poder Judiciário, ou de a própria Administração, decidir que medida diferente da custeada pelo SUS deve ser fornecida a determinada pessoa que, por razões específicas do seu organismo, comprove que o tratamento fornecido não é eficaz no seu caso (Agravo de Instrumento nº 5006839-79.2015.404.0000/PR).
A saúde está elencada no rol dos direitos sociais e se constitui obrigatória em um Estado Social de Direito, tendo por objetivo a melhoria das condições de vida, visando à concretização da igualdade material ou substancial (MORAES, 2016).
É mister destacar que, a dimensão individual do direito à saúde foi destacada pelo Ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, ao reconhecer o direito à saúde como um direito público subjetivo assegurado à generalidade das pessoas, que conduz o indivíduo e o Estado a uma relação jurídica obrigacional “[...] a interpretação da norma programática não pode transformá-la em promessa constitucional inconsequente”, impondo aos entes federados um dever de prestação positiva (MELLO, 2006).
Constata-se que, as ações e serviços públicos de saúde devem integrar-se em todo o território nacional, compondo um sistema único, regionalizado e hierarquizado, organizado de maneira descentralizada, com direção única em cada uma das esferas de governo, ou seja, na esfera federal, estadual, distrital e municipal.
2.3 Política nacional de atenção oncológica
A política nacional para atenção oncológica estabelece ações estatais previstas para o tratamento dos pacientes com câncer. A Portaria nº 2.439/GM, de 8 de dezembro de 2005, instituiu a Política Nacional de Atenção Oncológica e traçou diretrizes para promoção, prevenção, diagnóstico, tratamento, reabilitação e cuidados paliativos a serem implantadas pelos órgãos do SUS.
A Política Nacional de Atenção Oncológica foi regulamentada pela a Portaria nº 741/GM, 19 de dezembro de 2005, que definiu as Unidades de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia, são eles: os Centros de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia' (CACON) e os Centros de Referência de alta Complexidade em Oncologia.
A atenção oncológica regulamentada por legislação específica está de acordo com o dispositivo constitucional, que na lição de Mendes (2012), além do direito fundamental à saúde, há o dever fundamental de prestação de saúde por parte do Estado (União, Estados, Distrito Federal e Municípios). O dever de desenvolver políticas públicas que visem à redução de doenças, à promoção, à proteção e à recuperação da saúde está expresso no art. 196 da CF. Essa é uma atribuição comum dos entes da federação, estabelecidos no art. 23, II, da Constituição.
A prestação de saúde nos moldes constitucionais deve ser garantida mediante “políticas sociais e econômicas”, consequentemente, a garantia mediante políticas sociais e econômicas ressalva, justamente, a necessidade de formulação de políticas públicas que concretizem o direito à saúde por meio de escolhas alocativas (MENDES, 2012).
Dessa forma, a Política Nacional de Atenção Oncológica é constituída a partir dos seguintes componentes fundamentais:
[...] promoção e Vigilância em Saúde; Atenção Básica; Média complexidade; Alta complexidade; Centros de Referência de Alta Complexidade em Oncologia; Plano de Controle do tabagismo e outros Fatores de Risco, do Câncer do Colo do Útero e da Mama; Regulamentação suplementar e complementar; Regulação, fiscalização, controle e avaliação; 9. Sistema de Informação; Diretrizes Nacionais para a Atenção Oncológica. Avaliação Tecnológica. Educação permanente e capacitação. Pesquisa sobre o câncer (BRASIL, 2011, p. 23).
Ressalta-se que o constituinte estabeleceu um sistema universal de acesso aos serviços públicos de saúde, o que reforça a responsabilidade solidária dos entes da federação, garantindo, inclusive, a igualdade da assistência à saúde, sem preconceitos ou privilégios de qualquer espécie.
Fica claro então que, a garantia desse direito fundamental deve-se muito mais a questões ligadas à implementação e manutenção das políticas públicas de saúde já existentes, o que implica também a composição dos orçamentos dos entes da federação, do que à falta de legislação específica. Em outros termos, o problema não é de inexistência, mas de execução das políticas públicas pelos entes federados (TAVARES, 2018).
Nesse diapasão:
[...] o direito de proteção à saúde há de se efetivar mediante ações específicas (dimensão individual) e mediante amplas políticas públicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos (dimensão coletiva). Nessas perspectivas, as pretensões formuladas e formuláveis tanto poderão dizer respeito a atos concretos como a políticas e ações administrativas que contribuam para a melhoria do sistema de saúde, incluídas aqui as normas de organização e procedimento (MENDES, 2012, p. 568).
Sob a perspectiva evolutiva dos direitos das pessoas em tratamento oncológico, em 2013, foi lançada também, uma Política Nacional de Prevenção e Controle do Câncer (PNPCC), que conceitua o câncer como uma doença crônica prevenível. A PNPCC destaca princípios e diretrizes de promoção, prevenção, cuidado integral, vigilância, educação, comunicação e incorporação tecnológica. Apresenta ainda as responsabilidades dos entes federados nas ações de controle do câncer, bem como dos pontos de atenção e sistemas de apoio que compõem a rede de atenção à saúde, descrevendo como as ações devem ser planejadas e realizadas, em diferentes níveis de atenção, para garantir a integralidade definida no SUS (PNPCC, 2013).
De acordo o INCA (2020), em 2015, se tratando especificamente do câncer de mama, foram lançadas as novas Diretrizes Nacionais para a Detecção Precoce do Câncer de Mama no âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS, por meio da Portaria MS/GM 59/01 out 2015. A atualização das Diretrizes seguiu um processo rigoroso de revisão das evidências científicas e contou com a parceria com algumas instituições de ciência e tecnologia no Brasil. As Diretrizes são fundamentais para a organização da linha de cuidado do câncer de mama, assim como para apoiar os profissionais de saúde nas suas práticas clínicas e os pacientes nas suas escolhas frente a diferentes intervenções sanitárias.
As propostas apresentadas na politica de atençao oncologica consideram a promoção da saúde, a ampliação do acesso aos serviços, a humanização e a melhoria da qualidade da atenção, as condições essenciais para que as ações de saúde se traduzam na resolução dos problemas identificados, na satisfação da população e no reconhecimento de direitos (BRASIL, 2017).
Este documento propõe:
[...] reduzir a morbimortalidade por câncer na população feminina através de estratégias de prevenção, diagnóstico e tratamento, assim como garantir o cumprimento da lei federal, que prevê a cirurgia de reconstrução mamária nas mulheres mastectomizadas, aumentando em 45% a realização desta de cirurgia (BRASIL, 2007, p. 37).
Pelo Sistema Único de Saúde a paciente pode agendar a cirurgia de reconstrução mamária no local do tratamento. Contudo, se não estiver mais em tratamento, deverá se dirigir a uma Unidade Básica de Saúde e solicitar o seu encaminhamento para uma unidade especializada em cirurgia de reconstrução mamária.
Dessa forma, é mister que todos os dispositivos legais concernentes a esse direito a mulher levem o Estado a efetivar o direito a saúde por meio da execução de políticas econômicas que além da cirurgia plástica reconstrutiva da mama em casos de mutilação decorrente de tratamento de câncer, propicie tambem a redução de riscos de doenças e de outros agravos e por conseguinte, condições que assegurem acesso universal e igualitário a esse direito da mulher (SOUZA, 2018).
É importante ressaltar que, política nacional de atenção oncológica busca impreterivelmente, a redução da mortalidade e da incapacidade causadas por esta doença e ainda a possibilidade de diminuir a incidência de alguns tipos de câncer, bem como contribuir para a melhoria da qualidade de vida dos usuários com câncer, por meio de ações de promoção, prevenção, detecção precoce, tratamento oportuno e cuidados paliativos.
3 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA LEGISLAÇÃO QUE VERSA SOBRE A CIRURGIA PLÁSTICA REPARADORA DA MAMA
O câncer de mama é considerado uma patologia que sua cura implica na consequente mutilação do corpo feminino podendo colocar a saúde psíquica da mulher em risco. Desse modo, o Brasil possui uma legislação especifica que garante a cirurgia plástica reparadora da mama.
A legislação precursora no país que versa sobre a obrigatoriedade da cirurgia plástica trata-se da Lei 9.656, de 3 de junho de 1998 que estabelecia que as mulheres que sofrerem mutilação total ou parcial de mama, decorrente de utilização de técnica de tratamento de câncer, têm direito a cirurgia plástica reconstrutiva.
Posteriormente, a lei 9.797, de 6 de maio de 1999 estabeleceu que além da reconstituição da mama em decorrência do tratamento oncológico, está explicito que cabe ao Sistema Único de Saúde - SUS, por meio de sua rede de unidades públicas ou conveniadas, prestar serviço de cirurgia plástica reconstrutiva de mama utilizando-se de todos os meios e técnicas necessárias e quando existirem condições técnicas, a reconstrução será efetuada no mesmo tempo cirúrgico (Lei 9.797/1999, art. 2º).
A lei acima mencionada previa que mulheres que sofressem mutilação total ou parcial de mama (mastectomia) teriam direito à cirurgia plástica reconstrutiva, contudo, sem indicar o prazo em que ela deveria ser feita, assim, em 2013 a lei n. 12.802/13 dispôs sobre a obrigatoriedade da cirurgia plástica reparadora da mama pela rede de unidades integrantes do Sistema Único de Saúde - SUS nos casos de mutilação decorrentes de tratamento de câncer, para dispor sobre o momento da reconstrução mamária, determinando que, no caso de impossibilidade de reconstrução imediata, a paciente será encaminhada para acompanhamento e terá garantida a realização da cirurgia imediatamente após alcançar as condições clínicas requeridas (LEI, 12.802/13, art. 1º).
Em relação a simetrização da mama contralateral, que se trata de procedimentos de redução, elevação ou aumento indicados para a mama oposta, de forma a manter a simetria entre elas e reconstrução do complexo aréolo-mamilar que são distorcidos ou retirados e necessitam de reparação, são procedimentos que integram a cirurgia plástica reconstrutiva e ficaram estabelecidos como obrigatórios de acordo com Lei nº 13.770, de 19 de dezembro de 2018, que também estabelece que esses procedimentos devem ser realizados pelo Sistema Único de Saúde.
Vale ressaltar que, sendo a saúde um direito subjetivo público, esta é assegurada mediante políticas sociais e econômicas. Ou seja, não há um direito absoluto a todo e qualquer procedimento necessário para a proteção, promoção e recuperação da saúde, independentemente da existência de uma política pública que o concretize. Há um direito público subjetivo a políticas públicas que promovam, protejam e recuperem a saúde (MENDES, 2012).
A cirurgia plástica reconstrutiva da mama decorrente do tratamento de câncer está relacionado ao direito à saúde preconizado na Constituição Federal de 1988, em que está previsto que: “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação” (C/F, 1988, art.196).
A Constituição de 1988 é a primeira lei a consagrar o direito fundamental de proteção à saúde. Os textos Constitucionais anteriores possuíam apenas disposições esparsas sobre a questão, como a Constituição de 1824, que fazia referência à proteção de “socorros públicos” (art. 179, XXXI).
Nota-se que, o direito de proteção à saúde está previsto no art. 196 da Constituição Federal como:
[...] direito de todos” e dever do Estado”, garantido mediante “políticas sociais e econômicas” que visem à redução do risco de doenças e de outros agravos, regido pelo princípio do “acesso universal e igualitário” “às ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação” (MENDES, 2012, p.566).
Mendes (2012), leciona que a Constituição brasileira não apenas prevê expressamente a existência de direitos fundamentais sociais especificando seu conteúdo e forma de prestação, como também não faz distinção entre os direitos e deveres individuais e coletivos e os direitos sociais, ao estabelecer que os direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata.
Ademias, a saúde é um direito de todos e dever do Estado com acesso universal e atendimento integral por meio de um sistema hierarquizado, organizado e único de saúde. Com vistas a garantir o acesso universal a cirurgia plástica reconstrutiva da mama em casos de mutilação decorrente de tratamento de câncer foi instituído mais um dispositivo legal garantindo esse direito, assunto do próximo tópico.
3.1 Lei nº 13.770, de 19 de dezembro de 2018 e a cirurgia plástica reconstrutiva da mama em casos de mutilação decorrente de tratamento de câncer
O número de casos incidentes estimados de câncer de mama feminina no Brasil, para 2019, foi de 59.700. Nas capitais, esse número corresponde a 19.920 casos novos a cada ano. A taxa bruta de incidência estimada foi de 56,33 por 100 mil mulheres para todo o Brasil e 80,33 por 100 mil mulheres nas capitais (INCA, 2019).
Diante isso, a Lei nº 13.770, de 19 de dezembro de 2018, alterou as Leis 9.656, de 3 de junho de 1998, e 9.797, de 6 de maio de 1999, para dispor sobre a cirurgia plástica reconstrutiva da mama em casos de mutilação decorrente de tratamento de câncer, deixando claro que quando existirem condições técnicas, a reconstrução da mama será efetuada no tempo cirúrgico da mutilação e no caso de impossibilidade de reconstrução imediata, a paciente será encaminhada para acompanhamento e terá garantida a realização da cirurgia imediatamente após alcançar as condições clínicas requeridas.
A justificação do projeto de lei, 4409/2016, que se transformou na Lei Ordinária 13770/2018 foi a seguinte:
[...] a atenção a pacientes portadoras de câncer de mama mudou radicalmente ao se determinar, na esfera do Sistema Único de Saúde, a reconstrução imediata quando a conduta fosse possível e isenta de riscos. A grande melhora do ponto de vista estético constitui um auxiliar valioso para a recuperação da mulher, uma vez que elimina a fase em que, além de gravemente enferma, ela se sente também mutilada. O próximo passo que propomos é a intervenção sobre a mama contralateral, em razão da necessidade de proporcionar o equilíbrio anatômico. A simetria das mamas obtida através da intervenção cirúrgica trará, sem sombra de dúvidas, suporte para uma recuperação pós-operatória mais favorável. Além disso, eliminará a necessidade de outra intervenção no futuro. No entanto, o procedimento dependerá da análise das condições técnicas, que passam, primeiro, pela situação clínica da mulher e de sua vontade. Acreditamos que o acréscimo de tempo de cirurgia não será significativo ao ponto de comprometer o que propomos. Além disso, os benefícios, como dissemos, serão inestimáveis (PROJETO DE LEI, 4409/2016, p. 2).
A inovaçao trazida por esta lei foi a garantida da realização da cirurgia da mama contalateral imediatamente após alcançar as condições clínicas requeridas para a simetrização das mamas e a reconstrução do complexo aréolo-mamilar.
A reconstituição da mama em decorrência do tratamento oncológico, já constava na Política Nacional de Atenção à Saúde da Mulher, organizado pelo Ministério da Saúde, que apresentava os principais objetivos e estratégias relacionados à saúde da mulher para o período de 2004 a 2007, entretanto a garantia da realização da simetrização das mamas pelo Sistema Único de Saúde veio com o advento da Lei nº 13.770, de 19 de dezembro de 2018.
Porém, quando ela é detectada em estágios mais adiantados, pode levar à realização de cirurgias impactantes, como a mastectomia a mutilação de um órgão que simboliza a feminilidade e a maternidade na sociedade ocidental, acarretando uma série de consequências psicológicas, físicas e sociais relacionadas à imagem corporal (ALMEIDA, 2013).
Vale considerar que, a inclusão desse dispositivo fornecerá fundamentos jurídicos para que as mulheres busquem o seu direito nas locais e esferas adequados.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A discussão apontada neste estudo evidenciou as mudanças trazidas com a Lei nº 13.770, de 19 de dezembro de 2018 em relação a reconstrução mamária de mulheres que sofrem mutilação da mama em decorrência do tratamento oncológico.
As elucidações jurídicas expostas ao longo desta pesquisa deixaram claro que a Lei n. 13.770/2018, em seus muitos argumentos para sua instituição, quando estava em debate nas casas legislativas, foi em razão da necessidade de proporcionar o equilíbrio anatômico, pois a simetria das mamas obtida através da intervenção cirúrgica trará, suporte para uma recuperação pós-operatória mais favorável, além disso, eliminará a necessidade de outra intervenção no futuro.
No entanto, cabe aqui deixar claro que, o procedimento dependerá da análise das condições técnicas, que passam, primeiro, pela situação clínica da mulher e de sua vontade. Acreditamos que o acréscimo de tempo de cirurgia não será significativo ao ponto de comprometer o que propomos. Além disso, os benefícios, como dissemos, serão inestimáveis.
A lei acima mencionada buscou consolidar o direito a saúde estabelecido pela Constituição Federal de 1988 e como objetivo busca proporcionar o acesso gratuito à saúde enquanto direito de todo cidadão, as mulheres que necessitam de reconstrução mamária decorrente de mutilação de tratamento de câncer não conseguem de forma imediata.
Ademais, é importante que o Sistema Único de Saúde tenha celeridade em atender de forma imediata a mulher em tratamento oncológico da mama, como forma de evitar a violação ao direito fundamental do ser humano a saúde, devendo assim, o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício., principalmente em relação a expansão do número de serviços habilitados em alta complexidade em oncologia, suficientes para as demandas epidemiológicas, no que tange ao câncer de mama que cresce de forma exponencial no Brasil.
REFERENCIAS
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[1] Professora do curso de direito da Faculdade Serra do Carmo – Fasec. Especialista em Direito civil e advogada [email protected]
Aluna do curso de Direito da Faculdade Serra do Carmo – Fasec.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: NETA, ANUNCIAÇÃO MARIA DE SOUSA. O direito à saúde e a garantia da cirurgia reconstrutiva da mama em casos de mutilação decorrente de tratamento de câncer Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 15 jun 2020, 04:29. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/54709/o-direito-sade-e-a-garantia-da-cirurgia-reconstrutiva-da-mama-em-casos-de-mutilao-decorrente-de-tratamento-de-cncer. Acesso em: 23 dez 2024.
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