Artigo científico apresentado ao curso de graduação em Direito da Universidade Brasil, Campus Fernandópolis/SP. Como requisito parcial para obtenção do grau de bacharel em Direito. Área de concentração: Direito Penal. Orientador: Prof. Me. ANDRÉ DE PAULA VIANA. Co-Orientador: Prof. Me. ÉRICA CRISTINA MOLINA DOS SANTOS
RESUMO: O presente trabalho traz em seu desenvolvimento a figura do psicopata e a forma como a justiça brasileira lida com o mesmo, a forma como está é tratada, como aspectos penais para o assunto, pouco discutido, mas de muita importância à área da psicologia forense. Tem o intuito de trazer à baila o assunto para área acadêmica com exemplos, bem como devido esclarecimento técnico no que diz respeito à teoria geral de crime, e de pena no brasil. Procura citar também através de aspectos doutrinários e jurisprudenciais a análise dos magistrados a respeito do juízo sobre inimputabilidade ou semi-imputalidade, fazendo-se necessário o entendimento sobre quem são os psicopatas e como a lei penal é aplicada. Ressalta-se a devida explicação e análise à luz do Código de Processo Penal e Código Penal a respeito do presente tema, como a forma que trata a Lei de execução Penal nos casos de autores de ação ou omissão delitiva.
Palavras-chave: Imputabilidade; Semi-imputabilidade; Penal; Psicopatia.
ABSTRACT: The present work brings in its development the figure of the psychopath and the way the Brazilian justice deals with it, the way it is treated, as criminal aspects for the subject, little discussed, but very important in the area of forensic psychology. It aims to bring up the subject for the academic area with examples, as well as due technical clarification with respect to the general theory of crime, and punishment in Brazil. It also seeks to quote through doctrinal and jurisprudential aspects the analysis of the magistrates regarding the judgment on non-imputability or semi-imputability, making it necessary to understand who the psychopaths are and how the penal law is applied. Emphasis is given to the proper explanation and analysis in the light of the Code of Criminal Procedure and Penal Code regarding this subject, as the form that the Law of Criminal Execution deals with in cases of perpetrators of criminal action or omission.
Keywords: Imputability; Semi-imputability; Criminal; Psychopathy.
SUMÁRIO: 1. INTRODUÇÃO. 2. O DIREITO E A PSIQUIATRIA FORENSE. 2.1. História de estudo. 2.2. O direito penal e a psiquiatria forense. 3. CONCEITO. 3.1. Da imputabilidade penal. 3.2. Da inimputabilidade penal. 3.2.1. Da existência da inimputabilidade antes do cometimento do crime. 3.2.2. Da existência da inimputabilidade durante o cometimento do crime. 3.2.3. Da existência da inimputabilidade depois do cometimento do crime. 4. DA SEMI-IMPUTABILIDADE PENAL. 5. CASOS FAMOSOS DE PSICOPATAS BRASILEIROS. 5.1. Pedro Rodrigues Filho (Pedrinho Matador). 5.2. Francisco de Assis Pereira (Maníaco do Parque). 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS. 7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.
1. INTRODUÇÃO
A psicopatia é um tema de relevante significado na área da psicologia forense. Psicopatia, atualmente, é entendida como um transtorno de personalidade, tendo como característica principal uma alteração de caráter, sendo definido como Transtorno de personalidade antissocial, como descreve o Manual de Diagnóstico e estatísticas dos transtornos mentais(DSM-5), dessa forma, tal questão interessa a este trabalho no que tange às questões penais, haja vista que os portadores de tal transtorno apresentam comportamentos que propiciam os mesmos a cometer infrações penais, como a impulsão, ausência de autocontrole comportamental, empatia, e responsabilidade (KRAEPELIN, 1904).
Sendo estes indivíduos pessoas de todos os tipos sociais, não havendo distinção de gênero, desprovidos de remorso, sensibilidade, culpa, senso de responsabilidade ética. São perfeitamente capazes de esconder suas intenções e suas atitudes e se apresentam como pessoas normais, capazes de dar respostas sociais apropriadas, para situações cotidianas, esse distúrbio não é visto como uma doença mental, já que por sua vez, o agente tem a plena consciência do certo e errado, e do caráter ilícito de suas atitudes.
O trabalho em seu desenvolvimento trata de tal problemática de forma sucinta, porém clara, sendo este um problema real e que envolve séculos de estudos na área da psicologia e psiquiatria, mas pouco abordado na área forense, sendo este de suma necessidade, tendo em vista traços da psicopatia na grande maioria de reeducandos no sistema penal de todo o mundo.
Este trabalho possui o intuito de pontuar como o Código Penal Brasileiro se posiciona diante desses agentes, sobre a psiquiatria forense, bem como abranger acerca do exame psiquiátrico e criminológico assim trazendo casos famosos de crimes cometidos pelos mesmos.
Esta pesquisa é de grande relevância para que todos entendam da importância e da existência deste problema, que todos estão sujeitos a se deparar com um psicopata, e de como o nosso sistema lida com o assunto.
2.O DIREITO E A PSIQUIATRIA FORENSE
2.1 História de estudo
A psicopatia, sendo, hoje, definida como Transtorno de Personalidade Antissocial, fora inicialmente registrada em escritos psiquiátricos no Século XVIII por Philippe Pinel como “mania sem delírio”. Pinel, considerado o pai da psiquiatria, percebeu que havia pacientes, que, embora tivessem comportamentos violentos, tinham plena consciência de seus atos, dessa forma, temos os primeiros registros psiquiátricos sobre o que hoje chamamos “Psicopata”.
A discussão se deu início quando alguns psiquiatras e filósofos se questionaram se esses agentes com atitudes repugnantes e imorais seriam capazes de, no curso de seus atos, entender que aquilo era errado, inclusive sendo descrito por Homero que a Loucura era fruto de capricho dos “deuses” que utilizavam de algumas pessoas como fantoches, a fim de manifestar algumas de suas vontades. Mais tarde, por volta de 1 a.C. Hipócrates, também grego, que descreveu a loucura como mau natural, com uma visão sem grau de espiritualidade, como dantes era descrita a Loucura. Logo mais, com a ascendência do Cristianismo, a loucura foi reconsiderada como uma força exterior, como descrevia Homero anteriormente, só que, diferindo de outrora, a loucura era considerada reação de demônios, ou ainda como consequência do pecado (PESSOTTI, 1994).
Distúrbios, doenças e transtornos mentais começaram a ter cunhos científicos aprofundados a partir do fim século XVIII, com Philippe Pinel, bem como com a afirmação de Hegel de que “a alienação mental não é a perda abstrata da Razão, mas somente contradição na Razão que ainda existe” (HEGEL), e no início do século XIX, acarretando novidades em termos de pesquisas.
2.2 O direito penal e a psiquiatria forense
A psiquiatria forense juntamente com o direito penal não tem muitos estudos se for comparado às outras áreas do direito. Se tratando de processo penal no Brasil, quando se há dúvidas a questão da saúde mental do réu, o juiz deverá instaurar incidente de insanidade mental com espeque nos art.149 a 154, do Código de Processo Penal, os quais prelecionam sobre a possibilidade de dúvida sobre a sanidade mental do agente, devendo essa dúvida ser sanada por terceiro com devido conhecimento técnico sobre o assunto. Dessa forma, temos que o código processual traz em seu artigo 149 as possiblidades de requerimento do incidente, Ipsis litteris:
Art. 149. Quando houver dúvida sobre a integridade mental do acusado, o juiz ordenará, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, do defensor, do curador, do ascendente, descendente, irmão ou cônjuge do acusado, seja este submetido a exame médico-legal.
§ 1° O exame poderá ser ordenado ainda na fase do inquérito, mediante representação da autoridade policial ao juiz competente.
§ 2° O juiz nomeará curador ao acusado, quando determinar o exame, ficando suspenso o processo, se já iniciada a ação penal, salvo quanto às diligências que possam ser prejudicadas pelo adiamento.
Temos no artigo 149 a apresentação da condição do requerimento do incidente de insanidade mental, pelo Ministério Público, defensor, curador, ascendente, descendente, irmão ou cônjuge do acusado, a possibilidade da realização ex officio pelo Juiz, ou ainda, conforme o primeiro parágrafo, a representação na fase inquisitiva pela autoridade policial competente. Verifica-se ainda, que, tendo iniciada a ação penal, há a possibilidade da suspensão do processo, exceto em casos que a instrução seja prejudicada por tal suspensão.
A fim de confirmar tal dúvida, juntamente é feita uma perícia psiquiátrica com a finalidade de averiguar se o agente tinha ou não discernimento da conduta ilícita necessária e se poderia se comportar de forma contraria da qual se comportou, como podemos verificar nos artigos 151 e 152 do CPP. Tais artigos tratam da possibilidade de o acusado realizar a infração sob coação irresistível ou estrita obediência a ordem, devendo o mesmo ser amparado pelo artigo 22 do Código Penal, sendo punível o autor da coação ou da ordem; em verificando que a doença mental do acusado sobreveio à infração, deve-se ater ao §2º do artigo 149, sendo suspenso o processo até que o acusado se restabeleça.
É de suma importância a perícia psiquiátrica penal, pois é um procedimento complexo, exigindo o profundo conhecimento no assunto, assim também deverá ter a noção de elaboração de laudos e da matéria de direito penal. Os laudos serão considerados como provas, tendo influencia na sentença do juiz, logo, é estritamente necessário a estes o devido conhecimento técnico sobre o assunto. Entretanto, de acordo com o artigo 182, CPP: “Art. 182. O juiz não ficará adstrito ao laudo, podendo aceitá-lo ou rejeitá-lo, no todo ou em parte”.
A avaliação da perícia tem os objetivos de estabelecer o diagnóstico da situação que o agente se encontra. Os fatores desta avaliação são basicamente os mesmos que são usados na psiquiatria clínica geral, sendo um exame psíquico para avaliação do estado mental atual do mesmo. Assim avaliando a existência de alteração psíquica ou doença para então o direito penal decidir como resolverá o caso.
3.CONCEITO
Os comportamentos dos psicopatas na sua maioria apresentam periculosidade, refletindo na sociedade, amigos e família, já que por sua vez conhecem as regras, mas decidem agir como bem entendem buscando satisfazer suas vontades e necessidades sem sentir nenhum tipo de culpa pelo mal que possa causar ou se preocupar com as consequências de seus atos. A psiquiatra Hilda Morana afirma que “de 1 a 3% (um a três por cento) da população apresenta psicopatia e que, dentro do sistema prisional, cerca de 20% (vinte por cento) dos encarcerados é psicopata [...]” (MORANA, 2017).
No nosso sistema, o psicopata criminoso cumpre pena privativa de liberdade ou ficam submetidos à medida de segurança. Ocorre que ainda não existe tratamento especifico para este distúrbio, além disto, a ausência de estrutura no sistema prisional seja em hospitais de custódia, hospitais psiquiátricos e penitenciaria.
Quanto à aplicação de pena, cabe ao magistrado, nos termos do artigo 59 do Código Penal, e ainda a avaliação do mesmo à luz do artigo 182 do Código de Processo Penal, sendo a este dada a discrição de acatar em parte ou em todo o laudo psicológico do acusado, ou ainda rejeita-lo, neste último, o acusado cumprirá a pena à Luz da Lei de Execução Penal, sendo considerado imputável. No entanto, temos que, sob o aspecto doutrinário, há a concordância de que o psicopata possui ciência do caráter ilícito da infração que comete, estando a pratica infracional ligada a lucidez de suas ações, in verbis:
Trata-se da primeira hipótese de causa de exclusão da imputabilidade. Menciona a lei a doença mental. Embora vaga e sem maior rigor científico, a expressão abrange todas as moléstias que causam alterações mórbidas à saúde mental”. (MIRABETE; FABRINNI, 2016, p.197).
É mencionada a ausência de rigor científico na edição do artigo 26 do Código Penal, deixando vasto o campo de possibilidades de transtornos mentais, dentre eles tratamos dos de personalidade antissocial, tendo margem para a discrição do magistrado. Entretanto.
A grande problemática do jus puniendi quando aplicado aos casos envolvendo psicopatas é a incapacidade que estes possuem de entender a dimensão dos atos cruéis praticados, ou seja, a punição para eles não são um meio impeditivo para o cometimento de novo fato delituoso. (FERRARI, 2001, p.102)
Nos termos de Ferrari, observa-se que de acordo com a mente do psicopata, a punição não surte, na maioria das vezes, efeito reeducativo.
Em casos de inimputabilidade, o magistrado recorre a medida de segurança nos termos do artigo 26 do Código Penal, ou ainda, nos casos de semi-imputabilidade. Insta ressaltar que a aplicação de medida de segurança não se confunde com pena, conforme se vê na jurisprudência elencada a seguir:
HABEAS CORPUS Nº 462.893 - MS (2018/0197852-1) RELATOR : MINISTRO SEBASTIÃO REIS JÚNIOR IMPETRANTE : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL ADVOGADO : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL PACIENTE : ANTÔNIO NADRA JEHA FILHO PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. VIAS DE FATO E AMEAÇA. MEDIDA DE SEGURANÇA DE INTERNAÇÃO. SEMI-IMPUTABILIDADE. ALEGAÇÃO DA DEFESA DE INTERNAÇÃO DESNECESSÁRIA. CONSTATAÇÃO DE PERICULOSIDADE. RISCO PARA A FAMÍLIA. REEXAME FÁTICO E PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. Ordem denegada. DECISÃO Trata-se de habeas corpus impetrado em benefício de Antônio Nadra Jeha Filho, em que se aponta como autoridade coatora a Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul. No Processo n. 0043354-43.2015.8.12.0001, o Juízo da 2ª Vara da Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da comarca de Campo Grande/MS condenou o paciente à pena de 2 meses de prisão simples, por contravenção de vias de fato, e 4 meses de detenção, pelo delito de ameaça, totalizando 6 meses de detenção, em regime aberto, substituída a pena privativa de liberdade por medida de segurança de internação, pela prática do delito descrito no art. 21 do Decreto-Lei n. 3.688/1941 e art. 147 do Código Penal, ambos c/c art. 26, parágrafo único, e art. 98, do mesmo diploma legal (fls. 275/282). Interposta apelação pela defesa (n. 0043354-43.2015.8.12.0001), foi pedida a absolvição do paciente e, subsidiariamente, a declaração de semi-imputabilidade. A Primeira Câmara Criminal negou provimento ao recurso, nos termos da seguinte ementa (fl. 360): APELAÇÃO CRIMINAL AMEAÇA E VIAS DE FATO VIOLÊNCIA DOMÉSTICA ABSOLVIÇÃO - INVIÁVEL PROVAS SEGURAS PALAVRA DE VÍTIMAS E DE INFORMANTES PRETENDIDA EXCLUSÃO DA APLICAÇÃO DO ART. 98, DO CÓDIGO PENAL - IMPOSSIBILIDADE INCIDENTE DE INSANIDADE MENTAL COM PRODUÇÃO DE LAUDO PSIQUIÁTRICO, CORROBORADO POR LAUDO PSICODIAGNÓSTICO PARA FINS JUDICIAIS - CONCLUSÕES PERICIAIS QUE INDICAM ANOMALIA PSÍQUICA E RECOMENDAM AFASTAMENTO DO CONVÍVIO FAMILIAR, POR REPRESENTAR RISCO AOS FAMILIARES - REDUTORA DA SEMI-IMPUTABILIDADE DO ART. 26, PARÁGRAFO ÚNICO RECONHECIDA - MEDIDA DE SEGURANÇA ADEQUADAMENTE IMPOSTA - PEITO DE RECONHECIMENTO DE DETRAÇÃO PENAL E DE EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE INVIÁVEL MEDIDA DE SEGURANÇA QUE NÃO SE CONFUNDE COM PENA - INAPLICÁVEL A DETRAÇÃO PENAL. Ministro Sebastião Reis Júnior Relator (STJ - HC: 462893 MS 2018/0197852-1, Relator: Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, Data de Publicação: DJ 21/11/2018).
Conforme se verifica na jurisprudência elencada, temos que a medida de segurança não se confunde com pena, sendo a medida aplicada nos casos em que o agente infrator, embora inimputável, manifeste risco real à vítima, e sendo o semi-imputável passível de pena, porém reduzida.
3.1 Da imputabilidade penal
A condição de culpabilidade, ao que diz respeito à teoria tripartida de crime, trata da base para a possibilidade da aferição de pena a fato típico e antijurídico, logo, não pode ser responsabilizado penalmente o agente que não preenche os requisitos da culpabilidade, sendo estes: Capacidade da culpabilidade, consciência da ilicitude e exigibilidade da conduta (BITTENCOURT, 2016). Dessa forma, se o indivíduo não é culpável, também não é imputável, não tendo assim a plenitude da consciência da ilicitude.
Entende-se como ser imputável o indivíduo que, no momento do fato, possuía a plena capacidade de entendimento jurídico e ético e de autodeterminação, podendo atribuir ao agente a devida responsabilidade pela prática da infração penal cometida. Capez, diz que:
[...] A imputabilidade é a capacidade de entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se de acordo com esse entendimento, o agente deve ter condições físicas, psicológicas, morais e mentais de saber que está realizando um ilícito penal. Não basta só a capacidade plena é necessário também ter total condição de controle sobre sua vontade, ou seja, o agente imputável não é somente aquele que tem capacidade de intelecção sobre o significado de sua conduta, mas também de comando da própria vontade. A imputabilidade apresenta, assim, um aspecto intelectivo, consistente na capacidade de entendimento, e outro volitivo, que é a faculdade de controlar e comandar a própria vontade. Faltando um desses elementos, o agente não será considerado pelos seus atos. (CAPEZ, 2008, p, 308)
Dessa forma, temos na citação de Capez, dois elementos chave ao portador de transtorno de personalidade, devendo se relevar o gozo de suas faculdades mentais em plenitude como condição específica à imputabilidade, apresentando o aspecto que trata do intelecto do infrator, e sua capacidade de entender a imoralidade que comete, e o segundo, que trata do pleno controle de sua vontade, de forma que ambos estejam presentes na conduta do agente. Nos termos “A imputabilidade penal é a condição atribuída ao agende delituoso que se mostra incapaz de responder pelo ilícito penal cometido”. (MIRABETE; FABRINNI, 2016).
3.2 Da inimputabilidade penal
De acordo com o artigo 26 do Código Penal, é somente considerado inimputável quem por desenvolvimento mental incompleto, doença mental ou retardado não possuir a capacidade do gozo no momento da ação, que esteja incapaz de entender o caráter ilícito do ocorrido. Ou seja, para o psicopata ser considerado inimputável, teria que se tratar de uma doença ou desenvolvimento mental retardado ou incompleto, o que não é o caso desses portadores, o agente tem pleno conhecimento do ato ilícito, o indivíduo psicopata não apresenta nenhuma desordem mental.
Art. 26 - É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.
Ante o citado, temos que o Código Penal, para determinar a isenção de pena ao agente, determinou dois critérios que tratam da condição psicológica do infrator, sendo eles: Doença mental ou desenvolvimento incompleto ou retardado; e, a absoluta incapacidade de, ao tempo da ação ou da omissão, entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. Adotando então o critério biopsicológico para aferição da inimputabilidade do agente (GRECO, 2016, p.497).
3.2.1 Da existência da inimputabilidade antes do cometimento do crime
Nos casos em que há a existência de inimputabilidade ante o cometimento da infração, temos que a mesma deve ser comprovada em laudo psicológico nos termos do artigo 150, do Código de Processo Penal, através da instauração do incidente de sanidade mental, com espeque no art. 149, CPP. Comprovada a insanidade mental do acusado, cabe ao magistrado acatar ou rejeitar, em parte ou em todo o laudo psicológico.
Caso, ao tempo da avaliação psiquiátrica o acusado estiver preso, o mesmo será internado em manicômio judiciário até o resultado do exame. O exame psicológico não terá prazo maior que quarenta e cinco (45) dias, exceto nos casos em que o perito necessitar da dilação do prazo, e em não havendo riscos à instrução, a fim de facilitar a avaliação psicológica, o juízo poderá remeter os autos ao perito, nos termos do §1º e 2º do art. 150, Código Processual Penal.
3.2.2 Da existência da inimputabilidade durante o cometimento do crime
Há ainda a possibilidade de inimputabilidade durante o cometimento da infração, com espeque no artigo 22 do Código Penal, in verbis:
Art. 22 - Se o fato é cometido sob coação irresistível ou em estrita obediência a ordem, não manifestamente ilegal, de superior hierárquico, só é punível o autor da coação ou da ordem.
Dessa forma, nas infrações em que o autor comete o ato sob coação irresistível, ou ainda, caso o mesmo esteja em estrida obediência a ordem, o terceiro, coator, é imputável, tendo este responsabilidade pelo ilícito penal.
3.2.3 Da existência da inimputabilidade depois do cometimento do crime
O Código de Processo penal abrange ainda os casos em que o autor da infração se torna inimputável após a prática do crime. Porém, o autor não possui punibilidade extinta. O processo é suspenso até que o acusado se restabeleça, nos termos do art. 152, §2º, CPP.
Caso o acusado esteja cumprindo pena, cumpre-se o disposto no artigo 183 da Lei de Execução Penal:
Art. 183 - Quando, no curso da execução da pena privativa de liberdade, sobrevier doença mental ou perturbação da saúde mental, o Juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público, da Defensoria Pública ou da autoridade administrativa, poderá determinar a substituição da pena por medida de segurança. (Redação dada pela Lei nº 12.313, de 2010).
Sendo assim, sendo a pena imposta ao réu, sobrevindo à este doença mental ou perturbação de saúde mental, a determinação da substituição da pena por medida de segurança poderá ser requerida pelo Ministério Público, Defensoria Pública ou da autoridade administrativa, ou ainda efetivada pelo juiz ex officio, vejamos: “Art. 184. O tratamento ambulatorial poderá ser convertido em internação se o agente revelar incompatibilidade com a medida.”
Pode ainda o tratamento ambulatorial ser convertido em internação, em casos de incompatibilidade com a medida.
4.DA SEMI-IMPUTABILIDADE PENAL
Nesse caso o agente tem apenas parcialmente a capacidade de determinação e entendimento, o que se dá na redução de um terço a dois terços de pena. O semi-imputável é aquele que ter o seu desenvolvimento mental incompleto ou retardado. E também é necessário uma pericia judicial para que se confirme se o indivíduo é portador da doença mental, uma perturbação de saúde mental, ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado.
Art. 26 - do Código Penal: Redução de pena Parágrafo único - A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.
Parágrafo único - A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.
Ante o dispositivo legal art. 26, parágrafo único, temos que o autor da ação ou omissão delitiva pode ter a pena reduzida de um a dois terços, tratando este da semi-imputabilidade segundo a doutrina. O que se chama impropriamente ‘responsabilidade diminuída’ não é senão responsabilidade com menor culpabilidade (HUNGRIA, 1948-1951).
5. CASOS FAMOSOS DE PSICOPATAS BRASILEIROS
No Brasil, temos diversos exemplos notáveis de psicopatas que cometeram assassinatos em série, como os exemplos a seguir.
5.1 Pedro Rodrigues Filho (Pedrinho Matador)
Nascido em, Santa Rita do Sapucaí, Pedro Rodrigues Filho (66), é considerado o maior “serial killer” brasileiro atualmente, tendo cometido diversos homicídios antes de completar 18 anos, Pedrinho matador admite ter matado mais de 100 pessoas ao longo de sua vida, a maioria delas enquanto encarcerado.
O primeiro de seus crimes foi aos 14 anos, ao executar a tiros o prefeito da cidade que havia dado ordem de demissão da escola em que este trabalhava sob a acusação de roubar merenda da escola, logo após, matou o vigia desta escola, que supunha ser o verdadeiro ladrão. Após, realizou diversos homicídios, até ser recluso aos 18 anos.
Pedrinho Matador, como é sua alcunha, viveu 42 anos em regime fechado, onde diz ter praticado a maioria dos seus homicídios, inclusive contra o próprio pai. Verifica-se neste caso que o sistema carcerário por vezes acaba sendo um lugar mais violento do que se espera, já que o objetivo da execução penal é a reeducação e reinserção do preso na sociedade. “Pedrinho viveu de acordo com as regras não escritas que governam as cadeias brasileiras. Transgrediu uma: sobreviveu” (MENDONÇA, 2004:64).
Hoje Pedro Rodrigues cumpre pena em liberdade na casa de parentes e, inclusive, tem um canal no Youtube intitulado “Pedrinho ex-matador & Pablo Silva 2p”, onde comenta casos de homicídios graves no brasil, além de contar um pouco da sua história.
5.2 Francisco de Assis Pereira (Maníaco do Parque)
O histórico infantil de Francisco Assis Pereira, e o ambiente em que foi criado, tendo sido abusado sexualmente e convivendo com a crueldade a animais e sadismo, influenciaram nas atitudes da persona do conhecido Maníaco do Parque. O mesmo fora acusado e condenado por homicídio triplamente qualificado, estupro, atentado ao pudor e ocultação de cadáver de 11 mulheres, e encontra-se hoje cumprindo pena com previsão de soltura em 2028.
À época dos fatos, Francisco de Assis trabalhava como motoboy em uma empresa próxima a delegacia que investigava seus crimes, tendo sido encontrado após denúncia de um colega de quarto que viu sua foto na televisão no ano de 1998. Foto esta identificada após seu ex-patrão encontrar a carteira de identidade de uma das vítimas de Francisco no encanamento do vaso sanitário da empresa.
Francisco fora sentenciado como semi-imputável haja vista ter sofrido de um elemento chamado “homicídio sexual por fatores inconscientes” conforme seu laudo psicológico, influenciado pelos abusos e maus-tratos sofridos na infância (CAIXETA; COSTA, 2009).
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ante o que fora exposto no presente trabalho, vê-se a forma como é tratada a psicopatia pelo Direito Penal brasileiro, bem como a forma de aplicação de penalidade no que tange à culpabilidade pelo psicopata homicida, e as medidas de segurança tomadas quanto a estes.
Fora explanado também sobre a forma como são analisados os casos cujo agente infrator sofre de transtornos mentais, a saber, a psicopatia. Dessa forma, temos no decorrer deste, assuntos necessários para o entendimento dos conceitos de imputabilidade, culpabilidade, dentre outros, tendo em vista a necessidade de recorrer à visão geral de crime, e a definição da psicopatia pela psiquiatria, abrangendo o sistema penal brasileiro.
Insta ressaltar que, a não aplicação da medida de segurança de modo correto nesses casos, acaba implicando na ineficácia da reinserção dos demais reeducandos à sociedade, haja vista que a convivência com a violência, rebeldia, bem como motins, ou o envolvimento com facções e grupos criminosos dentro do estabelecimento prisional, como foi o caso do “Serial Killer” Pedrinho Matador, que tendo cumprido 42 anos em regime fechado, teria efetuado a maioria das suas execuções enquanto encarcerado. Logo o sistema Penitenciário não alcançaria o seu objetivo de reeducação.
Foi possível perceber através deste, que algumas visões sobre a relação entre a psicopatia e a moralidade não existe, sendo o psicopata incapaz de tomar decisões morais, sendo assim, não deve ser reinserido na sociedade, além de ser considerado inimputável ou semi-imputável, por outro lado, há correntes doutrinárias que acreditam ser o infrator portador de psicopatia perfeitamente capaz de discernir seus atos, tendo este pleno gozo de suas faculdades mentais, não podendo ser o transtorno psicopata como justificativa pelas infrações do mesmo. Sendo assim, à luz do que preleciona o artigo 26, do Código Penal (inimputabilidade), bem como seu parágrafo único (sobre semi-imputabilidade), a divergência doutrinária leva-nos a resolução de tal impasse às jurisprudências sobre o assunto.
Tal impasse e a resolução do mesmo nos leva a outro questionamento: seria possível a criação de estabelecimentos psiquiátrico-penais suficientes para que fossem tratados tais indivíduos? A depender da resposta deste teríamos a solução para a problemática proposta por este trabalho, tendo em vista o fato de que os mesmos (sob medida de segurança), não cumprem pena, logo, não estão sob tutela da Lei de Execução Penal.
Portanto, ante o exposto no parágrafo anterior e tendo em vista o dispositivo e as fontes do direito utilizadas para tratar o assunto, temos como uma possível medida para solução do objetivo que tratou este trabalho. Ressaltando-se o fato de que a aplicação do disposto no art.26, §ú, necessita de comprovação técnica da portabilidade de transtorno mental pelo sentenciado, e por vezes, embora algumas jurisprudências se utilizem da aplicação do mesmo, o faz de forma atécnica, conforme dispomos no decorrer do trabalho.
No mais, temos que as hipóteses que o presente levantou trata-se de assunto de extrema relevância ao direito, porém pouco abordado pela doutrina, devendo ser dada a devida importância pelas fontes formais de direito, afim de que sejam devidamente embasadas as sentenças e/ou acórdãos que tratam do assunto em questão, bem como as discussões acadêmicas sobre tal.
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graduanda no curso de Direito pela Universidade Brasil, Campus Fernandópolis.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SANTOS, Kenya Flávia Coelho Dos. Psicopatia no direito penal: o que o Código prevê e a ineficácia do sistema prisional brasileiro quanto a reeducando psicopatas. Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 12 ago 2020, 04:26. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/55024/psicopatia-no-direito-penal-o-que-o-cdigo-prev-e-a-ineficcia-do-sistema-prisional-brasileiro-quanto-a-reeducando-psicopatas. Acesso em: 23 dez 2024.
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