LUCAS VIANA CAMPOS NUNES LEAL
(coautor) [1]
ROGÉRIO SARAIVA XEREZ
(orientador)[2]
RESUMO: O presente trabalho de conclusão de curso, foi desenvolvido em razão do novo instituto de Acordo de Não Persecução Penal e da existência de divergência doutrinária quanto à SUA constitucionalidade. Considerando tal circunstância, objetivou-se analisar a (in)adequação do Acordo de Não Persecução Penal ao ordenamento jurídico brasileiro, utilizando-se, precipuamente, a metodologia dedutiva e bibliográfica. Para tanto, buscou-se detalhar desde a origem deste instituto, até às consequências trazidas pelo mesmo no ordenamento jurídico. Primeiramente, discorreu-se acerca da justiça penal negociada e sua inserção no sistema legislativo do Brasil. Na segunda parte, expôs-se o conceito de ANPP, seus requisitos, as condições a serem impostas em caso de celebração; bem como a quem incumbe a fiscalização do cumprimento do acordo. No capítulo final, desenvolveu-se sobre a possibilidade de coexistência entre o ANPP e os princípios basilares do processo penal. Conclusivamente, verificou-se a inexistência de posição jurídica consolidada, bem como a necessidade de aprofundamento da problemática posta.
Palavras-chave: Acordo de Não Persecução Penal; Adequação técnica; Princípios fundamentais.
ABSTRACT: The present work of conclusion of course, was developed due to the new institute of Non-Criminal Persecution Agreement and the existence of doctrinal divergence regarding its constitutionality. Considering this circumstance, the objective was to analyze the (in) adequacy of the Penal Non-Persecution Agreement to the Brazilian legal system, using, mainly, the deductive and bibliographic methodology. To this end, we sought to detail from the origin of this institute, to the consequences brought by it in the legal system. First, it was discussed about the negotiated criminal justice and its insertion in the Brazilian legislative system. In the second part, the concept of ANPP, its requirements, the conditions to be imposed in the event of a celebration were exposed; as well as who is responsible for monitoring compliance with the agreement. In the final chapter, it developed on the possibility of coexistence between the ANPP and the basic principles of criminal proceedings. In conclusion, there was no consolidated legal position, as well as the need to deepen the problem raised.
Keywords: Penal Non-Persecution Agreement; Technical adequacy; Fundamental principles.
Sumário: 1. INTRODUÇÃO. 2. Do surgimento da justiça penal negociada no Brasil. 3. Do princípio da obrigatoriedade da ação penal. 4. Do acordo de não persecução penal. 4.1. Resolução nº 181/2017 do CNMP. 4.2. Regulamentações legais do ANPP – lei 13.964/2019. 4.3. Requisitos para celebração do ANPP. 4.4. Das condições estabelecidas para ter o benefício do acordo. 4.5. Da competência para a fiscalização do cumprimento do acordo. 4.6. Dos benefícios do ANPP. 5. Da adequação do ANPP ao ordenamento jurídico brasileiro. 5.1. Princípios processuais penais constitucionais. 5.2. Princípio da não autoincriminação e o ANPP. 5.3. Do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa. 5.4. Do princípio da lealdade. 5.5. Natureza jurídica híbrida do ANPP. 5.6. Da inexistência de posicionamento consolidado. 6. CONCLUSÃO. 7. REFERÊNCIAS.
1.INTRODUÇÃO
Um dos maiores problemas enfrentados no Brasil, atualmente, é a superlotação dos presídios. Nessa esteira, o país conta com aproximadamente 758.676 presos, de acordo com os dados do INFOPEN 2019. Em decorrência desta realidade prisional, fora inserida neste país a justiça penal negociada, materializada através de institutos como a transação penal e a suspensão condicional do processo, regulamentados na Lei nº 9.099/95.
Em consonância com essa nova modalidade de solução consensual de conflitos penais, fora introduzido no ordenamento jurídico brasileiro, no ano de 2017, através da Resolução nº 181, do Conselho Nacional do Ministério Público – CNMP, o denominado Acordo de Não Persecução Penal-ANPP. Este instituto visa à aplicação da justiça penal negociada aos crimes de médio potencial ofensivo, a fim de que seja possível a concretização das funções preventiva e repressiva da pena.
Conforme será abordado no presente trabalho de pesquisa, o Acordo de Não Persecução Penal, inicialmente fora alvo de críticas devido à via pela qual fora regulamento. Frisa-se que o procedimento para elaboração do ANPP fora contestado inclusive através de ADI. Considerando tal questionamento, no recente ano de 2019, houve a inserção deste instituto no Código de Processo Penal, artigo 28-A, através da Lei nº 13.964/19.
Todavia, a despeito da regulamentação legal do ANPP, o mesmo ainda é alvo de diversas problemáticas, sobretudo, no condizente à sua adequação aos princípios fundamentais expressos, bem como implícito no ordenamento jurídico brasileiro.
O desenvolvimento da temática central deste estudo procurará responder à questionamentos como: “O ANPP viola os princípios fundamentais? Há compatibilidade entre este instituto e o princípio da obrigatoriedade da ação penal?”, bem como buscará analisar os requisitos para celebração do acordo e as condições a serem impostas em caso de eventual aceitação. Por último, será alvo de discussão a adequação (ou não) da atribuição de competência ao juízo de execução penal para fiscalizar o cumprimento das condições impostas durante a celebração do ANPP.
Ademais, no que tange à problemática do presente projeto de pesquisa, vê-se que será debatido acerca da existência de compatibilidade entre princípios constitucionais e o ANPP, dentre os quais é possível citar, o princípio da não autoincriminação (direito ao silêncio), o contraditório, a ampla defesa, o devido processo legal. Por fim, será verificado se, durante a celebração do ANPP, é observado o princípio da lealdade, sobretudo, no que tange à imposição ou não de condições unilaterais pelos membros do Parquet.
Cabe esclarecer ainda que, no decorrer do desenvolvimento deste trabalho de conclusão de curso, será demonstrado que o ANPP deve ser entendido como uma medida descarcerizadora, posto que, não visa retirar a tipificação criminal da conduta, mas tão somente permitir a aplicação de uma sanção alternativa à pena privativa de liberdade.
Frisa-se que serão utilizadas como base metodológica a abordagem dedutiva e a pesquisa bibliográfica, utilizando-se, sobretudo, pesquisas obtidas através de julgados dos tribunais e fontes doutrinárias constantes em livros e artigos publicados na internet.
Deste modo, considerando a existência de dúvidas que pairam acerca do acordo de não persecução penal, sobretudo no condizente à sua constitucionalidade, este estudo visa contribuir com a elucidação de tais problemáticas, bem como com a formação de julgados e doutrinas hábeis a fundamentar uma posição majoritária.
2.DO SURGIMENTO DA JUSTIÇA PENAL NEGOCIADA NO BRASIL
Entende-se que a justiça penal negociada é caracterizada pela existência de consenso entre as partes, acusação e defesa, as quais, por meio de um acordo e mediante assunção de culpa, decidem qual a punição a ser imposta diante do caso concreto.
Segundo Luiz Flávio Gomes (2017):
Assim, faz-se importante conceituar a justiça penal negociada como um acordo em que ambas as partes praticam concessões recíprocas, na busca por um acordo final, no qual se permite uma disposição maior do objeto do processo, negociando-se desde o arquivamento até uma redução pena. (GOMES, p. 2-4, 2017)
Considerando o exposto, vê-se que a justiça penal negociada atua visando substituir um processo demorado, por uma solução baseada na contribuição e na flexibilização mútua. Tal circunstância pode ser benéfica para a atuação jurisdicional, sobretudo, por evitar a persecução penal formal em delitos de menor ofensividade e, assim, possibilitar uma atuação mais célere, rígida e efetiva em ações penais mais complexas.
Cumpre mencionar que a negociação na justiça criminal não teve surgimento no Brasil, já sendo aplicada em diversos países, tendo, como principal origem o denominado plea bargaining, instituto utilizado no direito norte americano.
Cláudio do Prado Amaral (2019) aduz que:
A possibilidade de redução de pena por confissão de culpa é uma prática que pareceu surgir espontaneamente nos países do common law, especialmente Estados Unidos e Reino Unido. Nesses, apesar de ser comum, não era plenamente reconhecida. Seu processo de regulamentação que se estende até os dias atuais e ainda sofre críticas. (AMARAL, 2019, p. 27)
Portanto, desde o seu surgimento a justiça penal negociada sofreu críticas, sendo decorrente em sua essência, do common law. No entanto, face à “ineficiência” do sistema penal tradicional, aos poucos esse modelo de solução dos conflitos penais fora sendo inserido no mundo jurídico, processo que perdura até os dias atuais.
Em conformidade com o desenvolvimento da justiça brasileira, este modelo de justiça criminal tem crescido de forma considerável no Brasil desde a década de 90. O sucesso desta modalidade se deu, sobretudo, por se tratar de um meio de reparar o dano, satisfazendo os anseios sociais, bem como possibilitando que o autor de um fato criminoso sofra a sanção devida em razão da prática delitiva, sem, no entanto, exclui-lo do convívio social.
Vê-se claramente a inserção da justiça penal negociada por meio da Lei nº 9.099/95, a qual disciplina institutos como a composição civil do dano, a transação penal e a suspensão condicional do processo. Além desta Lei ainda é possível citar o acordo de leniência e a colaboração premiada.
Importa detalhar que a composição civil do dano ocorre quando estão envolvidos interesses patrimoniais, visando a reparação do dano causado à vítima; já a transação penal, disposta no artigo 76, da Lei nº 9.099/95, é caracterizada pela celebração de um acordo, através do qual o investigado é submetido à medidas alternativas à pena privativa de liberdade. Dessa forma, vê-se que ambos são institutos que obstam a deflagração da ação penal. Neste sentido, Francisco Dirceu Barros (2017) afirma que:
Importante, por fim, destacar que esse tipo de atuação por parte do membro ministerial não é novidade em nosso ordenamento jurídico, haja vista a existência de institutos como a transação penal, suspensão condicional do processo e não oferecimento de denúncia em razão de acordo de colaboração premiada. (BARROS, 2017, p. 78)
Portanto, a associação entre negociação e direito penal já vem sem utilizada a nível mundial e nacional, sobretudo, com a finalidade de reduzir o excesso de demandas judiciais que não conseguem efetivar a punição e nem a ressocialização.
Neste âmbito, faz-se necessário elencar a inserção do Acordo de Não Persecução Penal, o qual fora inicialmente regulamentado por meio da Resolução 181/17 do Conselho Nacional do Ministério Público - CNMP, instituindo, assim, um novo modelo de justiça criminal negociada. Por fim, se tornando lei com o advento do popular “pacote anticrime”, tema que será desenvolvido adiante.
No entanto, apesar de todos os objetivos positivos visados pela instrumentalização da justiça penal negociada, bem como de sua vasta aplicação a nível mundial, faz-se necessário considerar que se trata de um procedimento amplamente criticado e questionado, sobretudo, em razão das possíveis consequências trazidas pela aplicação da mesma.
Frisa-se que, que a aplicação da justiça negociada pode trazer à população a ideia de impunidade ao vislumbrar situações em que, havendo subsunção entre a tipificação legal e conduta praticada, ainda assim o réu não será tecnicamente punido.
Ademais, é cediço que este tipo de política criminal pode ir de encontro a diversos princípios do ordenamento jurídico, legal e constitucional, bem como na mitigação de princípios já consagrados, como, por exemplo, o da obrigatoriedade da ação penal a ser desenvolvido ao longo da análise da problemática desta pesquisa.
O princípio da obrigatoriedade da ação penal faz com que o Ministério Público seja obrigado a promover a persecução penal, tendo em vista que ele é o titular da ação. Assim, nos casos de ação penal pública incondicionada o Membro do Parquet não deve ficar inerte quanto a propositura da ação penal.
Tourinho Filho (2007) conceitua que:
O princípio da Obrigatoriedade é o que melhor atende aos interesses do Estado, dispondo o Ministério Público dos elementos mínimos para a propositura da ação penal, deve promovê-la, sem inspirar-se em critério políticos ou de utilidade social. (FILHO, 2007, p. 333)
Em mesma direção aponta Guilherme Nucci (2008) que:
Significa não ter o órgão acusatório, nem tampouco o encarregado da investigação, a faculdade de investigar e buscar a punição do autor da infração penal, mas o dever de fazê-lo. Assim, ocorrida a infração penal, ensejadora de ação penal pública incondicionada, deve a autoridade policial investigá-la e, em seguida, havendo elementos, é obrigatório que o promotor apresente denúncia. (NUCCI, 2008, p. 47-48)
Logo, segundo os entendimentos acima expostos, percebe-se que o princípio da obrigatoriedade da ação penal tem como principal consequência retirar do órgão ministerial a discricionariedade de, analisando, conveniência e oportunidade, decidir se propõe ou não a ação penal.
Em contraponto o aludido princípio determina, que se verificado os requisitos necessários, sobretudo, prova da materialidade e indícios de autoria o Parquet é obrigado a propor a ação e oferecer a denúncia.
Ainda sobre a obrigatoriedade da ação penal, faz-se necessário esclarecer que se trata de um princípio implícito, resultante de construção doutrinária e jurisprudencial, não havendo previsão expressa na Constituição Federal e nem sequer no Código de Processo Penal. Ademais, o aludido princípio, apesar de aceito e aplicado, não é absoluto, já comportando diversas exceções, como por exemplo, a transação penal e a suspensão condicional do processo.
Já no que tange à relativização do princípio da obrigatoriedade da ação penal, insta expor o que Eugênio Pacelli (2018) discorre em seu livro:
É que o processo penal não pode se afastar de uma perspectiva minimamente funcional do Direito Penal, no sentido de dever obediência a eventuais determinações reitoras da política criminal. É o caso, por exemplo, do reconhecimento, desde logo, da insignificância da lesão ou do não atendimento das exigências de determinados e fundamentais princípios do Direito Penal, tais as hipóteses de intervenção mínima, da lesividade concreta e outros que, caso a caso, recomendem a não intervenção do sistema penal. (PACCELI, 2018, p. 118)
Logo, existem situações que apesar de não estarem expressamente previstas em lei, são jurisprudencialmente aceitas e aplicadas, mesmo indo de encontro direto com o princípio da obrigatoriedade da ação penal. Nos dizeres do autor, é possível ter em mente o princípio da insignificância, responsável por excluir da conduta elementos do crime, de modo a impedir a propositura da ação e consequente persecução criminal do mesmo.
Neste sentido, é possível concluir que o acordo de não persecução penal é apenas mais um meio de mitigação do princípio da obrigatoriedade da ação penal, instituído com a finalidade de adequar o direito que a vítima tem de ter uma resposta estatal diante da prática de um crime, bem como de dar celeridade e eficiência à persecução penal.
Insta esclarecer que por vezes a aplicação da persecução penal chega a atuar de forma inversa, posto que atualmente o judiciário está abarrocado de processos e por esta razão não consegue julgá-los com celeridade, o que faz com que muitas das ações penais tenham a pretensão punitiva fulminada pela prescrição, não sendo efetivada a punição estatal.
Dito isto, resta evidenciado que a celebração do acordo não viola o dever do estado de dar uma resposta à prática delitiva, mas apenas traz uma forma diferente de punição que, nos delitos por ele abrangidos, por serem de médio potencial ofensivo, pode garantir a imposição de medida punitiva.
Ademais, o princípio da obrigatoriedade da ação penal não é o único norteador do direito brasileiro, havendo vários outros, como por exemplo, o da eficiência, que está expressamente previsto no artigo 37 da Constituição Federal. Logo, faz-se necessário respeitar a existência do princípio da obrigatoriedade da ação penal, mas o aplicando de acordo com o princípio da razoabilidade e em consonância com os demais institutos previstos no ordenamento jurídico.
Portanto, com a regulamentação de institutos como o acordo de não persecução penal vê-se ser ratificada a mitigação do princípio da obrigatoriedade da ação penal, bem como ser inserida a ideia de discricionariedade regrada.
Neste sentido entende Rodrigo Leite Ferreira Cabral (2018):
Ademais, cumpre consignar que a resolução adotou o denominado princípio da oportunidade regrada, em que o Ministério Público somente pode celebrar o acordo, quando cumpridas determinadas condições. Assim, não existe liberdade discricionária (modelo americano) do Ministério Público, já que tem o dever de objetividade e moralidade. (CABRAL, 2018, n.p)
Portanto, o acordo de não persecução penal fora elaborado dentro do contexto de mitigação do princípio da obrigatoriedade da ação penal, que já existe no ordenamento jurídico brasileiro, contribuindo ainda, assim, para a inserção da ideia de oportunidade regrada para a propositura da ação penal, a qual se baseia na necessidade de interpretação dentro dos parâmetros da proporcionalidade e razoabilidade.
No capítulo em comento será abordado o surgimento do ANPP, sua regulamentação legal, as os requisitos para celebração, tal quais as condições a serem impostas em casos de eventual celebração do acordo. Frisa-se que também serão abordados pontos atinentes à competência para fiscalização quanto ao cumprimento, bem como os benefícios decorrentes da substituição da pena privativa de liberdade por medidas alternativas.
4.1 Resolução nº 181/2017 do CNMP
Primeiramente, deve-se destacar que em 08 de setembro de 2017, entrou em vigor a Resolução 181/2017, do Conselho Nacional do Ministério Público-CNMP. Essa Resolução trouxe várias novidades no mundo do direito, dentre as quais, a mais relevante é a que passou permitir ao Ministério Público celebrar acordo de não persecução penal, para crimes de médio potencial ofensivo.
O mencionado acordo busca uma maior “celeridade e economia processual”, pois o investigado não sofrerá uma ação penal caso cumpra as condições estabelecidas pelo Ministério Público.
Uma característica a ser considerada como positiva desse instituto é a possibilidade de o Estado oferecer resposta mais rápida aos crimes de menor gravidade, o que pode ocorrer, inclusive, dentro de pouco tempo após o crime.
Em contraponto, é possível citar como decorrência negativa da celebração do ANPP a visão social e da vítima acerca de que este instituto resulta em impunibilidade ao autor do delito, face à ausência de resposta estatal baseada na imposição de pena privativa de liberdade, como costumeiramente ocorre.
Esse “novo” instituto acompanha exemplos de países como os Estados Unidos e Alemanha, em que a grande maioria dos casos penais é resolvida por meios de acordo. Nesta sequência, enfatiza Rodrigo Cabral (2020) que:
A resolução é fortemente influenciada pela experiência alemã, cuja possibilidade de acordo surgiu, mesmo sem previsão em lei, em decorrência de práticas informais dos promotores, que constataram a incapacidade de o sistema processar todos os casos. Essa prática de celebrar acordos, posteriormente, acabou sendo chancelada pela Suprema Corte alemã, que reconheceu a sua constitucionalidade, ainda que sem previsão em lei. (CABRAL, 2020).[3]
Além do mais, cumpre registrar que o Ministério Público nessa resolução adotou o princípio da oportunidade regrada, na qual, o acordo somente poderá ser celebrado mediante o cumprimento das determinadas condições que serão ajustadas entre o MP e o investigado.
Vale destacar, ainda, que o acordo não escapa do controle judicial. Assim sendo, o poder judiciário avaliará se o acordo foi fixado corretamente e de modo justo, sem prejuízo ao réu.
É de se concluir que a nova Resolução trouxe um horizonte promissor para tornar o nosso sistema criminal, um pouco mais eficiente. Ademais, já dizia Alberto Binder (2017):
O Estado nunca se encarregou de tudo, porque não pôde e seguramente lhe seria difícil cumprir sempre tal promessa. É interessante pontuar que, apesar dos enormes saltos tecnológicos, esta incapacidade do Estado de intervir em todos os casos se acentuou, embora continue proclamando com maior ênfase sua vocação de fazê-lo. (BINDER, 2017, p. 156).
Portanto, por meio dessa breve introdução, percebe que o acordo de não persecução penal ao tempo dessa resolução do CNMP, gerou algumas polêmicas no mundo do direito, sendo que a principal delas se tratava em dizer se o acordo era constitucional ou inconstitucional.
Conforme exposto acima, o Acordo de Não persecução Penal fora amplamente questionado acerca de sua constitucionalidade, sobretudo, em razão da via pela qual fora inserido no ordenamento jurídico brasileiro, qual seja, uma Resolução do CNMP.
No entanto, tal questionamento caiu por terra, após a promulgação da Lei nº 13.964/19, popularmente intitulada de “pacote anticrime”, a qual fora responsável pela regulamentação legal do mesmo, através da criação do art. 28-A, no Código de Processo Penal.
Neste sentido, cabe esclarecer que o acordo de não persecução penal é caracterizado pela realização de um ajuste de vontades entre o investigado e o Ministério Público, mediante posterior homologação pelo juiz. Salienta-se que durante a celebração do aludido acordo, o autor do delito deve estar assistido por defesa técnica, o que possibilita a existência de igualdade entre as partes e evita a sobreposição de vontades.
Frisa-se que, nos termos do art. 28-A, caput, do Código de Processo Penal, o acordo somente será realizado mediante prévia assunção de culpa por parte do investigado, ou seja, após este ter confessado formal e circunstancialmente a prática do crime investigado.
Dessa forma, verificado o integral preenchimento dos requisitos impostos pela lei, o Ministério Público oferecerá o acordo, momento no qual serão estabelecidas condições alternativas ao investigado. Caso o mesmo aceite, estará formalmente realizado o ANPP, o que obsta o imediato oferecimento da ação penal, evitando, assim, os efeitos decorrentes da condenação criminal.
Insta salientar que a justiça penal negociada vem sendo utilizada como uma alternativa criada para solucionar os problemas decorrentes de um direito penal e processual penal que violam constantemente os princípios fundamentais, como a duração razoável do processo.
Sobre o tema ensina Erica Montenegro Alves Barroso (2020):
Assim, faz-se importante conceituar a justiça penal negociada como um acordo em que ambas as partes praticam concessões recíprocas, na busca por um acordo final, no qual se permite uma disposição maior do objeto do processo, negociando-se desde o arquivamento até uma redução de pena. Pode-se dizer que a negociação de sentença criminal, como próprio nome sugere, é um acordo entre defesa e acusação, em que se busca a declaração de culpa do arguido. (BARROSO, 2020).[4]
Nesse sentido, entende-se que o acordo de não de persecução penal, é um instituto que representa a justiça penal negociada, regulamentado em 2017 pela resolução nº 181 do CNMP, e, posteriormente, se tornando lei em 2020. É um ajuste passível de ser celebrado entre o Ministério Público e o investigado, acompanhado por seu advogado, e que, uma vez cumprido, ensejará a promoção de arquivamento da investigação. As condições e exigências do citado acordo estão todas previstas em sua regulamentação normativa, lei 13.964/2019.
Estabelece o artigo 28-A, do Código de Processo Penal que são requisitos para celebração do acordo de não persecução penal:
Art. 28-A. Não sendo caso de arquivamento e tendo o investigado confessado formal e circunstancialmente a prática de infração penal sem violência ou grave ameaça e com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos, o Ministério Público poderá propor acordo de não persecução penal, desde que necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime, mediante as seguintes condições ajustadas cumulativa e alternativamente.
Ao analisar os requisitos para a concessão do acordo, vê-se que é exigido que o acusado confessasse formal e circunstanciadamente a prática da acusação a ele imputada, ponto no qual começa a ser cabível a discussão acerca da validade para o processo penal dessa confissão.
Ora, ao fazer um paralelo com a lei das organizações criminosas, observa-se que há uma previsão para que o investigado seja “beneficiado” com a colaboração premiada, nela o infrator confessa o crime abrindo mão do seu direito de silêncio previsto constitucionalmente. Portanto, ao examinar esse requisito pode-se dizer que ele é legal.
Rogerio Sanches (2020) sobre o tema afirma que:
Apesar de pressupor sua confissão, não há reconhecimento expresso de culpa pelo investigado. Há, se tanto, uma admissão implícita de culpa, de índole puramente moral, sem repercussão jurídica. A culpa, para ser efetivamente reconhecida, demanda o devido processo legal. (SANCHES, p. 129, 2020).
Portanto, não se pode olvidar que tal pressuposto exposto acima é um requisito ilegal, e, assim como os outros que serão mencionados, devem ser cumpridos em obediência estrita na hora da realização do acordo de não persecução penal.
Com relação aos requisitos restantes, não houve muita polêmica acerca deles. No qual a infração não deve ter sido cometida com violência ou grave ameaça, a exemplo do crime de furto, e a pena mínima deva ser inferior a quatro anos. Ao observar com mais clareza, verifica-se que a na realidade a pena deva ser maior que dois anos e menor que quatro anos, pois o ANPP não será cabível quando couber transação penal, nesse sentido para ter o benefício da transação penal a pena deve ser igual ou inferior a dois anos.
No condizente à celebração do ANPP, vê-se que o artigo 28-A, incisos I a V, do CPP, impõe que após a sua celebração, o investigado se submete ao cumprimento de condições, sob pena de, em caso de descumprimento, ser ofertada denúncia, o que ensejará o regular trâmite da ação penal.
Tratando sobre a condição de reparar o dano ou restituir a coisa à vítima, exceto na impossibilidade de fazê-lo, o acordo diferente de outros institutos, ele prestigia a vítima, razão pela qual só haverá o benefício ao investigado se ele cumprir esse encargo. Para a doutrina, há uma divergência quanto a esse ajuste, se ele abrange ou não o dano moral.
São, ainda, do eminente Rogério Sanches (2020) os seguintes esclarecimentos:
Para uma corrente, o dano moral, por guardar íntima relação com a dor e o sofrimento experimentado pela vítima, não encontraria, no processo penal, o locus adequado para debate. Para outros, com os quais concordamos, embora reconhecendo a dificuldade em se estabelecer o quantum, não afastam, de plano, essa possibilidade, dependendo sempre da cuidadosa análise do fato concreto, em especial, da gravidade do ilícito, da intensidade do sofrimento, da condição socioeconômica do ofendido e do ofensor, grau de culpa, etc. Bem como a utilização dos parâmetros monetários estabelecidos pela jurisprudência para casos similares. (SANCHES, p. 130, 2020).
Desse modo, caso o investigado não tenha reparado ou restituído à vítima, pois estava impossibilitado de fazer tais ações, o acordo de não persecução ainda sim poderá ser dado a esse indivíduo.
Assim dispõe a parte final do Art. 28-A, I, do Código de Processo Penal:
Art. 28-A. Não sendo caso de arquivamento e tendo o investigado confessado formal e circunstancialmente a prática de infração penal sem violência ou grave ameaça e com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos, o Ministério Público poderá propor acordo de não persecução penal, desde que necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime, mediante as seguintes condições ajustadas cumulativa e alternativamente:
I - reparar o dano ou restituir a coisa à vítima, exceto na impossibilidade de fazê-lo;
É de suma importância ressaltar que, a exemplos dos crimes ambientais, não há possibilidade de restituir a coisa ou reparar o dano, assim levando-se em conta a concretude do caso o acusado poderá ser beneficiado através do ANPP.
Rogério Sanches (2020), com a clareza que lhe é peculiar, ao examinar a matéria, assim pontificou in verbis:
Há situações outras, em que a reparação do dano é impossível em razão do perecimento do objeto tutelado, que não pode mais ser recomposto, típico caso de alguns crimes ambientais em que, uma vez ocorrida à degradação, não há mais possibilidade de retorno ao status quo ante. (SANCHES, p. 131, 2020)
Portanto, o simples fato de restar impossível a reparação do dano, não inviabiliza a celebração do acordo.
Outra condição que poderá ser imposta ao investigado é que ele deve renunciar voluntariamente a bens e direitos indicados pelo Ministério Público, como instrumentos e produtos do crime. Neste âmbito, deve se analisar a voluntariedade do agente, oportunidade na qual caberá distingui-la de espontaneidade, bem como entender em que consistem os instrumentos e os produtos do crime.
Outro ponto bastante questionado e de muita relevância, se trata da competência para fiscalização do cumprimento do acordo após sua celebração, posto que o dispositivo constante no Código de Processo Penal, a citar, artigo 28-A, disciplina no §6º, que a execução do acordo se dará perante o juízo de execução penal.
Sobre a temática colocada, dispõe o artigo 28-A, §6º do CPP:
Art. 28-A. Não sendo caso de arquivamento e tendo o investigado confessado formal e circunstancialmente a prática de infração penal sem violência ou grave ameaça e com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos, o Ministério Público poderá propor acordo de não persecução penal, desde que necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime, mediante as seguintes condições ajustadas cumulativa e alternativamente:
§ 6º Homologado judicialmente o acordo de não persecução penal, o juiz devolverá os autos ao Ministério Público para que inicie sua execução perante o juízo de execução penal.
Dito isto, cumpre esclarecer que as atribuições do juízo de execução penal estão correlacionadas ao acompanhamento das “sanções penais”, o que pressupõe existência de condenação e pena. No entanto, é incontroverso que o acordo de não persecução penal não comina pena, sendo uma medida alternativa a esta, razão pela qual não se mostra tecnicamente adequado imputar ao juízo de execução a atribuição de fiscalizar seu cumprimento.
A despeito do posicionamento supramencionado existem doutrinadores que entendem ser adequada a atribuição de competência do juízo de execução penal para acompanhar a execução do acordo. Entre os quais, é possível citar, Renato Brasileiro de Lima (Lima, p. 108, 2020) na qual sustenta que embora a execução seja feita perante o juízo da execução penal, a “rescisão” do acordo é da competência do juízo a quem incumbiu a sua homologação.
Desse modo, conforme o doutrinador acima mencionado, a execução do ANPP continuará sendo acompanhada pelo juízo de execução e a celebração e o rompimento do acordo será assistida pelo juízo competente para a homologação.
Um dos grandes benefícios que o acordo de não persecução penal trouxe ao direito penal brasileiro, é a economia de tempo e recursos para que o sistema da justiça criminal exerça, com atenção maior, uma tutela penal mais eficiente nos crimes que merecem esse tratamento.
Vale lembrar que esse acordo é bom para a vítima quanto ao investigado, visto que aquela poderá ter o seu bem restituído de volta, pois uma das condições é de que o autor da infração repare o dano ou restitua o objeto jurídico lesado.
O acordo de não persecução penal, tem como pressuposto a existência de procedimento investigatório, o que nada mais é do que a existência de um processo formalizado, trazendo segurança aos investigados. De modo que não haja abuso do poder estatal e uma maior claridade nas negociações.
A respeito do assunto disposto, dispõe o artigo 28-A, §3º:
Art. 28-A. Não sendo caso de arquivamento e tendo o investigado confessado formal e circunstancialmente a prática de infração penal sem violência ou grave ameaça e com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos, o Ministério Público poderá propor acordo de não persecução penal, desde que necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime, mediante as seguintes condições ajustadas cumulativa e alternativamente:
§3º O acordo de não persecução penal será formalizado por escrito e será firmado pelo membro do Ministério Público, pelo investigado e por ser defensor.
Desse modo, o acordo deve ser formalizado por escrito, e assinado através do MP, pelo investigado e seu defensor, para evitar uma desproporcionalidade das condições do acordo com a infração cometida. Razão pela qual, para ser homologado o acordo, deve-se passar também pelo juiz, onde haverá uma audiência e esse verificará a voluntariedade e a legalidade do acordo.
5. DA ADEQUAÇÃO DO ANPP AO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO
A análise do tópico em comento visa responder à problemática principal deste estudo, qual seja, a existência ou não de adequação entre o Acordo de Não Persecução Penal e os princípios fundamentais. Frisa-se que para obter o posicionamento a seguir exposto, se analisará os direitos processuais garantidos aos réus, bem como a natureza jurídica deste instituto, tudo sendo feito de acordo com posicionamento jurisprudencial colacionado.
Conforme mencionado acima, muito se questiona acerca da adequação do ANPP aos preceitos previstos na Constituição Federal. Existem amplas críticas doutrinárias direcionadas a analisar a possibilidade de coexistência entre este instituto e os princípios processuais estabelecidos na Constituição Federal.
Inicialmente, cabe explicitar que dentre os princípios constitucionais mais afetados é possível citar o contraditório, a ampla defesa, o devido processo legal, bem como o direito ao silêncio, sobretudo, em razão da exigência de que o investigado confesse a prática delituosa.
Segundo explicita Douglas Mattoso Carneiro (2016), em artigo publicado na internet, os princípios supramencionados estão interligados, contribuindo para exercício da defesa garantida ao réu, conforme a seguir exposto:
Pode ser dito que o princípio da ampla defesa consubstância-se no direito das partes de oferecer argumentos em seu favor e de demonstrá-los, nos limites legais em que isso for possível. Existe, portanto, uma conexão do princípio da ampla defesa com os princípios da igualdade e do contraditório. (CARNEIRO, s.p, 2016)
Considerando o mencionado acima, faz-se necessário esclarecer que os conflitos envolvendo princípios fundamentais devem ser sanados por meio da ponderação, a qual utiliza as técnicas da proporcionalidade e da razoabilidade a fim de evidenciar qual prerrogativa deve prevalecer.
No que tange a relação entre o ANPP e tais institutos previstos na Carta Magna, vê-se que a doutrina tem se posicionado favorável à possibilidade de existência de contemporaneidade entre os aludidos direitos, sendo, inclusive, que para doutrinadores como Francisco Dirceu Barros (2019), o Acordo de Não Persecução Penal pode ser incluso no rol de tais garantias, a citar:
Dessa forma, devemos atentar para o fato de que a proposta de não persecução penal, sob uma perspectiva constitucional, é um direito fundamental, por força do artigo 5º, §2º, da Constituição Federal, segundo o qual “os direitos e garantias expressos nesta constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”. (BARROS, p. 63, 2019)
Destarte, considerando que o Acordo de Não Persecução Penal pode inclusive ser entendido como direito fundamental do acusado, para parte da doutrina, conforme colacionado acima, vê-se a existência de tendência dominante a fixar posicionamento de que este instituto não fere os princípios fundamentais.
Todavia, conforme a seguir detalhado, há também doutrina tendente a considerar a incompatibilidade do ANPP ao ordenamento jurídico brasileiro.
Como já exposto em alhures, o acordo de não persecução penal mitiga certos princípios fundamentais. Desse modo ao confessar a prática do delito resta configurada violação ao princípio do nemo tenetur se detegere? Previsto no art. 5º, LXIII da Carta Magna que assevera “o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado”.
O Pacto internacional sobre Direitos Civis e Políticos em seu art. 14, §3º, alínea “g” dispõe que toda pessoa humana tem o direito de não ser obrigada a depor contra si mesma nem a confessar-se culpada. Tal princípio significa que ninguém é obrigado a se autoincriminar ou a produzir provas contra si mesmo.
Reneé do Ó Souza (2019) afirma com precisão que:
Ao contrário de uma conclusão apressada, o dispositivo em análise não anula a garantia constitucional do acusado de permanecer em silêncio descrita no art. 5º, LXIII, da Constituição Federal. Isso porque o investigado não é compelido a dizer a verdade ou de não permanecer em silêncio. A escolha pela intervenção ativa, isto é, de prestar declarações fidedignas sobre os fatos, desde que livre e consciente, não viola aquela garantia constitucional. (SOUZA, p. 161, 2019)
Frisa-se que este posicionamento decorre da interpretação baseada no fato de que a confissão proferida pelo investigado decorre da livre vontade do mesmo.
Dessa forma, a exigência legal de que o acusado confesse não violaria o direito ao silêncio porque em nenhum momento o investigado fora privado deste, tendo confessado por sua livre escolha. Logo, vê-se que aplicando a regra da ponderação, não há que se concluir que o direito ao silêncio deve se sobrepor à prerrogativa de escolha, principalmente, quando está trouxer benefícios ao mesmo, como no caso do ANPP, que beneficia o réu com a extinção da punibilidade, evitando que o mesmo seja submetido à pena privativa de liberdade.
Por conseguinte, a autonomia de vontade faz com que o indivíduo opte por aquilo que será mais benéfico a ele, que no caso seria o acordo ou a persecução penal. Nessa perspectiva, o papel da defesa não é diminuído, pois ela deverá avaliar as condições que serão levadas ao investigado, verificando a proporcionalidade dos direitos fundamentais que poderão ser mitigados frente aos benefícios que ele terá com a celebração do ANPP.
No entanto, a despeito deste posicionamento, verificou-se também a presença de doutrinadores favoráveis à declaração de incompatibilidade entre o ANPP e as garantias concedidas ao réu pelo ordenamento jurídico brasileiro.
Neste âmbito, fora levantado inclusive questionamento acerca da validade ou não da confissão proferida pelo acusado quando da celebração do acordo, principalmente, no que tange à tese de que exigir a confissão retira a voluntariedade da mesma e, dessa forma, ferindo o princípio constitucional da não autoincriminação.
Opina Arthur Martins Andrade Cardoso (2020), em artigo publicado na internet que:
À luz da interpretação do texto constitucional e convencional supracitados e com base nas lições doutrinárias trazidas, entendemos que o requisito confissão para o ANPP elimina por completo o conteúdo essencial do nemo tenetur se detegere, uma vez que não se pode violar um Direito (silêncio) para se conceder outro Direito (ANPP). Se nenhum prejuízo pode ser imposto àquele que exerce o seu Direito Constitucional de não autoincriminar-se, igualmente nenhum Direito lhe pode ser tolhido por não confessar. Cremos que uma lei infraconstitucional (CPP) não pode eliminar o disposto nos arts. 5º, inciso LXIII da CF (norma fundamental); 8.2, "g" do dec. 678/92 (norma supralegal) e 14.3, "g" do dec. 592/92 (norma supralegal), impondo a confissão da parte mais fraca (acusado) como critério para celebração do negócio jurídico, porque tais normas são cogentes ou de ordem pública, logo inderrogáveis. Não há espaço para negociação no que se refere ao Direito ao silêncio. O acusado confessa se quiser (faculdade), não pode ser compelido pela lei a fazê-lo para obter um Direito, sob pena de eliminação do conteúdo essencial de outro Direito: ao silêncio.Outrossim, não pode o acusado sofrer qualquer prejuízo se não confessou e preenche todos os demais requisitos legais para o acordo (in casu, o prejuízo de não receber a proposta de ANPP).A confissão como exigência à proposta do ANPP (Direito Público subjetivo do acusado) equivale a renúncia do Direito ao silêncio, porque não dá opção de escolha ao acusado: ou confessa ou não recebe a proposta. (CARDOSO, n.p, 2020)
Face ao exposto, vê-se que existem dúvidas doutrinárias acerca da adequação ou não do ANPP aos princípios e garantias constitucionais. No entanto, conforme mencionado acima, os fundamentos para justificar a possibilidade de coexistência entre ambos, tem se sobreposto aos que veem o Acordo de Não Persecução Penal como um instituto capaz de ferir princípios fundamentais, principalmente, considerando os benefícios decorrentes da celebração, os quais atingem o Estado, o investigado e a vítima.
Por fim, constata-se a preponderância de argumentos hábeis a demonstrar a compatibilidade entre o Acordo de Não Persecução Penal e os princípios fundamentais, conforme exposto no presente trabalho de pesquisa.
5.3 Do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa
O Devido Processo Legal é visto pela doutrina como um princípio matriz no ordenamento jurídico, desse modo, surgindo dele corolários como o Contraditório e o da Ampla defesa. Tais princípios asseguram aos litigantes o direito de resposta e defesa daquilo que está sendo julgado.
Assim, Gil Ferreira de Mesquita (2003) aborda:
“No Brasil, a formalização da garantia do due process of law veio com a Constituição Federal de 1988, que em seu art. 5º, LIV, prevê que “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”, sendo esta ordem complementada pelo inciso LV do mesmo artigo: aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”. (MESQUITA, 2003).
Nesse diapasão, o acordo de não persecução penal disciplina questões prévias ao processo, ou seja, ele é pré-processual. Diante disso, não há que se falar em prejuízo aos princípios abordados, tendo em vista que ele é usado em processos administrativos e judiciais, o qual o acordo é um mero instrumento da justiça negocial. Desta maneira, não se enquadraria no conceito de “processo”.
Nesse ponto, brilhante a lição de Vladimir Aras (2019):
“O acordo de não persecução penal não viola a legalidade nem o devido processo legal, porque é mero ajuste para não exercício do direito de ação pelo seu titular, na forma de um arquivamento condicional, sujeito ao implemento da condição nele prevista: o cumprimento das obrigações de fazer, não fazer e dar, que poderiam ser alcançadas mediante um TAC na instância civil. Nesse sentido, o acordo de não persecução penal é híbrido entre a composição civil e a transação penal. (ARAS, p.320, 2019)
Assim, há observância do devido processo legal fica condicionada ao cumprimento das obrigações impostas pelo Ministério Público ao investigado, caso ocorra o descumprimento dessas condições não haverá supressão do princípio mencionado, logo, o Membro do Parquet promoverá a ação penal.
Todavia, verificou-se que existem posições que consideram a ausência de exercício do contraditório e da ampla defesa durante a celebração do ANPP, expondo este entendimento, sobretudo, ao considerar que a confissão proferida em sede de proposta de acordo e, para fins de concretização deste, não pode ser utilizada como elemento de prova, em caso de deflagração da ação penal, sob pena de desrespeito ao sistema acusatório.
Comenta Carolina Soares de Castro (2020) que:
Um dos pontos mais sensíveis na celebração do acordo é exigência legal da confissão formal e circunstanciada da infração penal, uma vez que, sem o exercício da ação penal, sob o crivo do contraditório e na presença de um juiz togado, não é possível admitir que esse ato projete efeitos outros que não a viabilidade da celebração do próprio acordo. (CASTRO, n.p, 2020)
Portanto, vê-se que não é unânime os posicionamentos acerca do cumprimento ou não dos princípios do contraditório e da ampla defesa, durante a celebração do ANPP. Em contraponto, a doutrina é majoritária quanto a admissibilidade desse instituto negocial frente ao princípio em apreço.
5.4 Do princípio da lealdade
O princípio da lealdade assevera que todos os sujeitos de uma relação processual devem atuar conforme a boa-fé e a moralidade, fazendo com que a lide seja resolvida da forma mais justa.
Ao definir princípio jurídico, Celso Antônio Bandeira de Mello (2020) disserta que se trata do:
“Mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce deste, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas comparando-lhes o espírito e servindo de critério para a sua exata compreensão e inteligência, exatamente por definir lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico. E acrescenta: violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma qualquer. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio atingido, por que representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão da sua estrutura mestra. Isto porque, com ofendê-lo, abatem-se as vigas que a sustêm e alui-se toda a estrutura nelas esforçada” (MELLO, p.156, 2000).
Tendo em vista o ANPP, muito se questiona acerca da imposição de forma unilateral das obrigações impostas ao investigado. Ora, esse questionamento cai por terra, tendo em vista o Art. 28-A, §5º do Código de Processo Penal, que dispõe:
Art.28-A [...]
§5º- Se o juiz considerar inadequadas, insuficientes ou abusivas as condições dispostas no acordo de não persecução penal, devolverá os autos ao Ministério Público para que seja reformulada a proposta de acordo, com concordância do investigado e seu defensor (BRASIL, 1941).
Portanto, não há abuso do órgão acusador, visto que o investigado deve estar assistido por seu advogado no momento da confissão. Em seguida, as condições que foram impostas pelo ministério público vão ser levadas ao Juiz para que ele verifique a voluntariedade e a legalidade do acordo. Caso o juiz não ache justas as condições estabelecidas, ele devolverá os autos para que o Parquet faça um novo acordo ou ofereça a denúncia.
Diante de todo o exposto, não resta dúvidas acerca da constitucionalidade do ANPP frente aos princípios fundamentais.
Um tema de muita discussão na doutrina e nos tribunais se trata da natureza jurídica do acordo de não persecução penal, visto que para alguns ele tem natureza de norma processual, para outros de norma penal e por fim de norma hibrida.
A esse respeito Aury Lopes Junior e Higyna Josita (2019) afirmam que:
Ao criar uma causa extintiva da punibilidade (art. 28-A, § 13, CPP), o ANPP adquiriu natureza mista de norma processual e norma penal, devendo retroagir para beneficiar o agente (art. 5º, XL, CF) já que é algo mais benéfico do que uma possível condenação criminal. Deve, pois, aplicar-se a todos os processos em curso, ainda não sentenciados até a entrada em vigor da lei. (LOPES JUNIOR; JOSITA, 2019)
Neste sentido, ao versar sobre causa de extinção da punibilidade, o ANPP adentrou na esfera de direito penal material, ou seja, mesmo com a inserção do dispositivo legal que o regulamentou em código processual, a este instituto deverá ser aplicada a regra da retroatividade benéfica, prevista no artigo 2ª, parágrafo único, Código Penal.
Outro ponto importante a ser mencionado se trata da análise da aplicação do ANPP às ações penais em curso, se questionando, sobretudo, até qual fase processual, nos procedimentos já deflagrados, poderá ser oferecida proposta de Acordo de Não Persecução Penal. Acerca disso, tanto a quinta turma do STJ quanto a sexta turma do mesmo tribunal divergem a respeito desse momento.
Veja a posição de ambas às turmas:
A Quinta Turma do STJ, consoante se percebe do trecho transcrito a seguir, tem assentado a aplicação do ANPP em processos em curso somente até o recebimento da denúncia: “da simples leitura do art. 28-A do CPP, se verifica a ausência dos requisitos para a sua aplicação, porquanto o embargante, em momento algum, confessou formal e circunstancialmente a prática de infração penal, pressuposto básico para a possibilidade de oferecimento de acordo de não persecução penal, instituto criado para ser proposto, caso o Ministério Público assim o entender, desde que necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime, na fase de investigação criminal ou até o recebimento da denúncia e não, como no presente, em que há condenação confirmado por Tribunal de segundo grau”. (EDcl no AgRg nos EDcl no AREsp 1.681.153/SP, Rel. Min. Felix Fischer, Quinta Turma, j. 8.9.2020, DJe 14.9.2020)
Já a Sexta Turma tem aceitado a aplicação do ANPP para processos em curso até o trânsito em julgado da condenação, conforme seguinte trecho: “o cumprimento integral do acordo de nao persecuçao penal gera a extinçao da punibilidade (art. 28-A, § 13, do CPP), de modo que como norma de natureza juridica mista e mais benefica ao reu, deve retroagir em seu beneficio em processos nao transitados em julgado (art. 5º, XL, da CF)”. (AgRg no HC 575.395/RN, Rel. Min. Nefi Cordeiro, Sexta Turma, j. 8.9.2020, DJe 14.9.2020) (STF – 2020)
Deste modo, verifica-se uma divergência entre as turmas do STJ, visto que a quinta turma aplica o ANPP em processos em curso somente até o recebimento da denúncia, já a sexta turma aceita o emprego desse instituto em processos em andamento até o trânsito em julgado da condenação.
Portanto, independentemente do momento que ocorrerá a aplicação do ANPP, ambas as turmas citadas acima já deliberaram sobre a possibilidade dele retroagir, ao passo que, apesar dos dissentimentos existentes no ordenamento jurídico brasileiro, vê-se que é aceitável a retroação desse instituto.
Face às informações acima colacionadas, vê-se que, considerando entendimento do STJ, viabilizar a retroatividade do Lei que instituiu o ANPP, a fim de beneficiar os acusados que preencham os requisitos fixados, é um meio de garantir a adequação técnica deste instituto às normas e princípios constitucionais, dentre os quais é possível citar o artigo 5ª, inciso XL da Constituição Federal, que diz “a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu”.
Ainda no que tange o questionamento acerca da (in) adequação técnica do Acordo de Não Persecução Penal frente aos princípios fundamentais, vê-se que não há consenso doutrinário e jurisprudencial da Suprema Corte Brasileira acerca deste tema, o qual, juntamente com diversos outros pontos introduzidos ou apenas regulamentados pelo Pacote Anticrime (Lei nº 13.964/19), ainda sofrem duras criticas.
Destaca-se que a despeito de não haver entendimento consolidado acerca do tema, cabe informar que recentemente, em sede de Habeas Corpus nº 185.913 Distrito Federal, decisão proferida em 22 de setembro de 2020, o Ministro do STF, Gilmar Mendes, fixou a necessidade submeter a plenário as discussões pertinentes ao Acordo de Não Persecução Penal, quesitos estes que influirão diretamente nas considerações acerca da pertinência técnica do ANPP.
Neste sentido, cabe mencionar os pontos fixados no Habeas Corpus supramencionado:
Nesse sentido, preliminarmente, delimito as seguintes questões problemas:
a) O ANPP pode ser oferecido em processos já em curso quando do surgimento da Lei 13.964/19? Qual é a natureza da norma inserida no art. 28-A do CPP? É possível a sua aplicação retroativa em benefício do imputado?
b) É potencialmente cabível o oferecimento do ANPP mesmo em casos nos quais o imputado não tenha confessado anteriormente, durante a investigação ou o processo? (STF-2020)
Portanto, vê-se que, até a presente data, não foram sanadas as diversas dúvidas que pairam acerca do ANPP. As quais estão pendentes de discussão pelo plenário do STF, conforme disposto acima.
Ainda sobre o assunto ora em apreço, observa-se que um recente julgado do Tribunal de Justiça de Alagoas é quanto a constitucionalidade formal do acordo de não persecução penal, em contraponto, nota-se que o julgado do Tribunal de Justiça de Minas Gerais trata sobre a inconstitucionalidade desse acordo.
EMENTA: ACORDO DE NÃO-PERSECUÇÃO PENAL. PLEITO DE HOMOLOGAÇÃO. SUPOSTA PRÁTICA DO CRIME DE DESTINAÇÃO AMBIENTAL DE RESÍDUOS SÓLIDOS DE MANEIRA INADEQUADA (ART. 54 DA LEI Nº 9.605/98) E DO CRIME DE NEGAR EXECUÇÃO À LEI FEDERAL (ART. 1º, INCISO XIV DO DECRETO-LEI Nº 201-67). INCIDÊNCIA APENAS DA LEI Nº 9.605/98, SOB PENA DE OCORRÊNCIA DE BIS IN IDEM. HIPÓTESE DE CABIMENTO DO ACORDO DE NÃO-PERSECUÇÃO PENAL PREENCHIDA. ACORDO HOMOLOGADO, SEM PREJUÍZO DE OFERECIMENTO DE DENÚNCIA, CASO OS TERMOS DA TRANSAÇÃO SEJAM DESCUMPRIDOS PELOS GESTORES PÚBLICOS. MAIORIA. (TJ-AL - Procedimento Investigatório do MP (Peças de Informação): 90000018420188020900 AL 9000001-84.2018.8.02.0900, Relator: Des. José Carlos Malta Marques, Data de Julgamento: 27/03/2018, Tribunal Pleno, Data de Publicação: 03/04/2018) (grifou-se)
EMENTA: CORREIÇÃO PARCIAL. DECISÃO DO JUÍZO "A QUO" QUE DEIXOU DE HOMOLOGAR ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL. INSTITUTO PREVISTO NO ARTIGO 18, DA RESOLUÇÃO Nº 181 DO CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO. INCONSTITUCIONALIDADE DECLARADA EM SEDE DE CONTROLE DIFUSO. AUSÊNCIA DE TUMULTO PROCESSUAL. DESPROVIMENTO. - O Julgador, comprometido com a imparcialidade, exerce papel fundamental na homologação dos acordos, pois analisa os termos avençados sob o viés da legalidade e constitucionalidade. Ademais, garante que sejam preservados os direitos e garantias do colaborador - Não se vislumbra erro do qual tenha advindo tumulto processual algum, haja vista que a Magistrada fundamentou a não homologação do "acordo de não persecução penal", apresentado pelo Ministério Público, por argumento que é objeto de suscitação pelo controle concentrado de constitucionalidade perante o Plenário do STF (ADI's nº 5793 e 5790), sustentando não ser possível tal medida porque inexiste lei que autorize - O instituto, por não estar previsto em lei específica, mas em resolução administrativa, não produz os efeitos legais pretendidos, de tal sorte que a decisão que não o reconhece, e afasta a aplicação do art. 18 da Resolução nº 181 do CNMP, não causa inversão tumultuária dos autos. (TJ-MG - COR: 10000190085308000 MG, Relator: Wilson Benevides, Data de Julgamento: 26/06/2019, Data de Publicação: 05/07/2019) (grifou-se)
Sendo assim, conforme exposto em alhures, conclui-se que não há posicionamento jurisprudencial consolidado acerca do ANPP.
Diante de todo o exposto, vê-se que o Acordo de Não Persecução Penal surgiu em razão da deficiência existente no sistema penal brasileiro, o qual não consegue solucionar todos os casos de maneira célere e eficaz. Razão pela qual, muitos autores de delito acabam impunes, em decorrência da lentidão nas resoluções dos processos, ensejando assim, na prescrição dos delitos.
No capítulo inicial deste projeto de pesquisa, teceu-se considerações sobre a inserção prévia da justiça penal negociada no ordenamento jurídico brasileiro, oportunidade na qual constatou-se que o ANPP, surgiu visando proporcionar, em casos de prática de crimes de médio potencial ofensivo, a imposição de medidas alternativas à pena privativa de liberdade.
Posteriormente, no segundo capítulo desta monografia, analisou-se a possibilidade de coexistência entre o ANPP e o princípio da obrigatoriedade da ação penal, verificando-se, ao final, que este princípio não é absoluto, já tendo sofrido diversas mitigações, como é possível citar, as trazidas pela Lei nº 9.099/95.
Em seguida, passou-se à parte deste trabalho de conclusão de curso na qual foram expostos os requisitos para oferecimento do acordo, bem como as condições a serem impostas em caso de eventual celebração, tal qual analisou-se a quem incumbe fiscalizar o cumprimento destas, conforme previsão do artigo 28-A, do Código de Processo Penal. Frisa-se que foram expostos também os benefícios decorrentes da celebração do ANPP e a natureza jurídica do mesmo.
Ao final do desenvolvimento da problemática que envolve o objeto do presente trabalho de conclusão de curso, verificou-se que, a despeito de inexistir posicionamento consolidado acerca da (in)adequação técnica do ANPP ao ordenamento jurídico brasileiro, a doutrina majoritária tem se posicionado favorável à compatibilidade entre estes.
Cabe esclarecer também que, constatou-se entendimento dominante acerca de que o ANPP se trata de norma híbrida, ou seja, que atinge tanto o âmbito do direto penal, bem como do direito processual penal, desse modo, podendo retroagir para beneficiar o réu.
Portanto, considerando todo o conteúdo colacionado ao longo do desenvolvimento deste trabalho, vê-se que o Acordo de Não Persecução Penal vem sendo aceito pelos membros do judiciário e do Ministério Público, bem como, em sede doutrinária, considerando, sobretudo, a possibilidade de coexistência dentre o mesmo e os princípios fundamentais, entre os quais cita-se, o da não autoincriminação, o do contraditório e a ampla defesa.
Nessa esteira, é preciso frisar que, em regra, o ANPP é celebrado em uma fase pré-processual, a qual, consoante entendimento majoritário, é inquisitorial. Salienta-se ainda que este instituto não enseja análise da culpa. Dessa forma, não há que se falar em violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa, pois para ser imputada culpa deve haver o trânsito em julgado da sentença condenatória, conforme assevera o artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal, que dispõe que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória.
Nessa perspectiva final, é de suma importância discorrer e aprofundar as pesquisas acerca do acordo de não persecução penal, tema atual, interessante e capaz de revolucionar o sistema penal, permitindo o aperfeiçoamento do cumprimento das funções preventivas e repressivas da pena, sobretudo, considerando que o ANPP visa desafogar as varas e tribunais penais, bem como objetiva garantia a duração razoável do processo e concretização do princípio da eficiência.
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STF. ADI: 6.298 Medida Cautelar. Relator: Ministro Gilmar Mendes. DJ: 22/01/2020. STF.JUS, 2020. Disponível em: http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/ADI6298.pdf>. Acesso em 28 de Setembro de 2020.
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. v. 1. 29ª ed. São Paulo: Saraiva, 2007.
[1] Acadêmico do Curso de Direito do Centro Universitário Santo Agostinho - UNIFSA. E-mail: [email protected]
[2] Orientador e professor do Curso de Direito do Centro Universitário Santo Agostinho – UNIFSA, Mestre em Direito pela Universidade CEUT. E-mail: [email protected]
[3] Informações obtidas no site do Conjur. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2017-set-18/rodrigo-cabral-acordo-nao-persecucao-penal-criado-cnmp> Acesso 05 de Abril de 2020.
[4] Informações obtidas no site da revista eletrônica Âmbito Jurídico. Disponível em: <https://ambitojuridico.com.br/edicoes/revista-172/justica-penal-negociada-sob-a-otica-do-sistema garantista-penal/>. Acesso 7 de Abril de 2020.
Graduando em Direito pelo Centro Universitário Santo Agostinho.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: DJALMA LEMOS FERREIRA JúNIOR, . Acordo da não persecução penal, análise acerca da (in) adequação técnica do instituto frente ao ordenamento jurídico brasileiro Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 10 dez 2020, 04:41. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/55868/acordo-da-no-persecuo-penal-anlise-acerca-da-in-adequao-tcnica-do-instituto-frente-ao-ordenamento-jurdico-brasileiro. Acesso em: 23 dez 2024.
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