RESUMO: O presente trabalho irá analisar a conceituação de conflito de atribuições, bem como a sua diferença em relação ao conflito de competência. Será feita uma análise dos possíveis órgãos competentes para dirimir o conflito de atribuições. Tudo será feito com base em estudo de casos do STF e análise da doutrina. Por fim, abordar-se-á o posicionamento atual do STF, bem como a importância da solução da controvérsia.
Palavras-chaves: Conflito de atribuições no MP. STF. CNMP.
SUMÁRIO: 1. INTRODUÇÃO. 2. COMPETÊNCIA X CONFLITO DE ATRIBUIÇÃO. 3. HIPÓTESES DE CONFLITO DE ATRIBUIÇÃO NO ÂMBITO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. 4. POSICIONAMENTO ATUAL STF. CONCLUSÃO. REFERÊNCIAS.
1. INTRODUÇÃO
O conflito de competência é tema com maior consolidação no ordenamento jurídico brasileiro, havendo vasta previsão legal e constitucional regulamentando o seu funcionamento. No entanto, no tocante ao conflito de atribuição, o qual ocorre no âmbito do Ministério Público, sempre houve grande divergência doutrinária e jurisprudencial sobre a quem competiria dirimir os conflitos em algumas situações, como entre Promotor de Justiça e Procurador da República.
Dessa forma, o presente trabalho busca abordar a evolução jurisprudencial sobre o conflito de atribuições no Ministério Público, apontando inclusive os posicionamentos doutrinários e as críticas. Para isso, utilizou-se da análise dos julgados do Supremo Tribunal Federal sobre o tema, bem como do estudo da doutrina que estuda e debate o assunto.
Assim, inicialmente, diferenciar-se-á o conceito de conflito de competência e de atribuições. Após, serão apontados os casos em que poderá ocorrer conflito de atribuições no âmbito do Ministério Público, bem como a qual órgão é atribuída a competência para dirimir os conflitos em cada caso. Em seguida, abordar-se-á as situações que geravam divergências sobre de quem restaria a atribuição para solucionar o conflito, apontando, na oportunidade, a evolução do Supremo Tribunal Federal sobre o tema. Por fim, será apresentado o entendimento atual da Corte Suprema.
2. COMPETÊNCIA X CONFLITO DE ATRIBUIÇÃO
Inicialmente, competência, segundo a doutrina tradicional, é a medida de jurisdição que dispõe cada órgão jurisdicional. É, assim, a limitação do exercício legítima do exercício do poder jurisdicional. No entanto, poderá ocorrer divergência sobre essa repartição de competências, ocasionando o conflito de competência, consoante art. 66 do Código de Processo Civil de 2015, haverá esse conflito quando:
Art. 66. Há conflito de competência quando:
I - 2 (dois) ou mais juízes se declaram competentes;
II - 2 (dois) ou mais juízes se consideram incompetentes, atribuindo um ao outro a competência;
III - entre 2 (dois) ou mais juízes surge controvérsia acerca da reunião ou separação de processos.
Parágrafo único. O juiz que não acolher a competência declinada deverá suscitar o conflito, salvo se a atribuir a outro juízo.
Nesse sentido, AMORIM (2016) dispõe que o inciso III do artigo destacado anteriormente é apenas uma especificação dos outros dois incisos. Dessa forma, existem apenas duas espécies de conflito de competência o positivo (inciso I) e o negativo (inciso II). Há, em suma, a divergência entre os membros da magistratura, o qual será dirimido consoante normas constitucionais e legais.
Entretanto, a divergência no exercício de funções constitucionalmente atribuídas não ocorre apenas no âmbito dos órgãos jurisdicionais, há, por exemplo, conflito entre os membros do Ministério Público. Nesse caso, há o conflito de atribuições, o qual é, consoante BRASILEIRO (2021), é o procedimento incidental que visa dirimir a controvérsia entre dois ou mais órgãos do Ministério Público acerca da responsabilidade ativa para a persecução penal ou outra atribuição ministerial. A diferença precípua entre essa divergência entre membros do Ministério Público do conflito de competência decorre da ausência de autoridades judiciais envolvidas.
3. HIPÓTESES DE CONFLITO DE ATRIBUIÇÃO NO ÂMBITO DO MINISTÉRIO PÚBLICO
É possível que ocorra conflito no caso dentro do mesmo Ministério Público Estadual. Nesse caso, o conflito é solucionado pelo Procurador-Geral de Justiça do estado ao qual pertencem os Promotores de Justiça, conforme art. 10, X, da Lei nº 8.625/93:
Art. 10. Compete ao Procurador-Geral de Justiça:
(...)
X - dirimir conflitos de atribuições entre membros do Ministério Público, designando quem deva oficiar no feito;
Já no caso do de conflito entre membros da mesma linha de atuação do Ministério Público da União, a solução caberá à Câmara de Coordenação e Revisão, de acordo com a Lei Complementar nº 75/93:
Art. 62. Compete às Câmaras de Coordenação e Revisão:
(...)
VII - decidir os conflitos de atribuições entre os órgãos do Ministério Público Federal.
Art. 103. Compete à Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público do Trabalho:
(...)
VI - decidir os conflitos de atribuição entre os órgãos do Ministério Público do Trabalho.
Art. 136. Compete à Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Militar:
(...)
VI - decidir os conflitos de atribuição entre os órgãos do Ministério Público Militar.
Art. 171. Compete às Câmaras de Coordenação e Revisão:
(...)
VIII - decidir os conflitos de atribuição entre os órgãos do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios.
Em sendo de ramos diferentes do Ministério Público da União, a competência será atribuída ao Procurador-Geral da União, como chefe da carreira, veja-se art. 26 da Lei Complementar nº 75/93:
Art. 26. São atribuições do Procurador-Geral da República, como Chefe do Ministério Público da União:
(...)
VII - dirimir conflitos de atribuição entre integrantes de ramos diferentes do Ministério Público da União;
A controvérsia doutrinária ocorria na situação em que o conflito envolvia dois membros de MPE de diferentes estados ou um membro da União e outro do estado. A primeira posição apontada pela doutrina foi de vislumbrar essa situação como um “conflito virtual de competência”, uma vez que a divergência entre os parquets eventualmente iria ocasionar uma atuação perante os seus juízos a que estão vinculados, o que ocasionaria um conflito de competência. Assim, a atribuição para dirimir seria do Superior Tribunal de Justiça, à luz do art. 105, I, alínea “d”, Constituição Federal, tendo em vista que seria o conflito de competência entre o juiz de direito de um estado e de outro estado, ou entre um juiz federal e um juiz de direito.
Já a segunda corrente apontava que seria um conflito entre entidades da federação. Dessa forma, o MPF representaria a União e o MPE o estado, por consequência seria um conflito federativo. Consoante art. 102, I, alínea “f”, da Constituição Federal, a competência seria do Supremo Tribunal Federal. Essa posição foi adotada pelo Supremo Tribunal Federal, conforme ACO nº 853 e nº 889.
Surge uma terceira corrente que passou a ser adotada pelo STF a partir de 2016. Passou-se a entender que não seria um conflito jurisdicional, sendo, na verdade, um conflito de natureza administrativa. Portanto, a competência para dirimir a controvérsia seria do Procurador-Geral da República. Esse posicionamento foi firmado na ACO nº 924 e nº 1.394. Segundo a Corte Suprema, o PGR seria o chefe do Ministério Público nacionalmente. Ademais, o Tribunal apontou, também, que não estaria conseguindo dirimir todos os conflitos, o que estava prejudicando a celeridade dos feitos, além da possibilidade da prescrição das demandas.
No entanto, tal posicionamento sempre foi muito criticado pela doutrina. Inicialmente, apontava-se que o PGR não é chefe do Ministério Público dos estados, e sim da União, não tendo o PGR nenhuma posição de hierarquia em relação aos MP dos estados.
4. POSICIONAMENTO ATUAL STF
O Supremo Tribunal Federal supera, novamente, o seu entendimento no início de junho de 2020, passando a apontar o Conselho Nacional do Ministério Público como competente para dirimir esse conflito de atribuições, conforme ACO nº 843.
Segundo o Ministro Alexandre de Moraes, a competência não seria, de fato, do STF, pois as competências da Corte são taxativas, devendo ser interpretadas restritivamente, com a finalidade de que o Tribunal Supremo possa cumprir as funções que lhe são constitucionalmente outorgadas. Ademais, por se tratar de questão administrativa, restaria ao CNMP solucionar esse conflito, à luz do art. 130-A, §2º, incisos I e II, da Constituição Federal, haja vista que esse órgão dispõe, segundo o Ministro Relator, da função precípua de realizar o controle de atuação administrativa e financeira do Ministério Público como um todo.
Importante ressaltar que a referida decisão proferida na ACO nº 843 envolvia conflito entre MPF e MPE. Apesar disso, BRASILEIRO (2021) entende que a ratio da decisão também se estende aos conflitos entre membros do Ministério Público vinculados a estados diferentes.
CONCLUSÃO
A partir da análise feita pelo presente trabalho, nota-se que a importância na definição pelo Supremo Tribunal Federal de quem seria a atribuição para dirimir os conflitos no âmbito do Ministério Público. Isso decorre do fato de que havia várias demandas aguardando a solução da divergência, a fim de que fosse possível a continuidade do processamento, o que poderia ocasionar a prescrição.
Ademais, observa-se uma evolução na jurisprudência da Corte Suprema no sentido de buscar concretizar as suas competências constitucionais primordiais. Dessa forma, o Tribunal tem-se afastado de certos temas que não possuem, precipuamente, a importância da corte como intérprete e guarda da Constituição. Tal aspecto foi, inclusive, destacado pelo Ministro Alexandre de Moraes. Há, assim, um movimento do STF em reduzir os seus processos, a fim de proporcionar a concretização do princípio constitucional da celeridade e efetividade da prestação jurisdicional.
Por fim, o posicionamento do Supremo Tribunal Federal atendeu aos anseios dos Ministérios Públicos estaduais que apontavam a ausência de subordinação ao Procurador-Geral de República, sendo uma instituição independente, à luz da Constituição Federal. Concretizou-se, também, a importante posição do Conselho Nacional do Ministério Público no âmbito da instituição.
REFERÊNCIAS
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BRASIL. Lei Complementar nº 75, de 20 de maio de 1993. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/Lcp75.htm>. Acesso em: 05/03/2021.
BRASIL. Lei nº 8.625, de 12 de fevereiro de 1993. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8625.htm>. Acesso em: 05/03/2021.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ACO 843/SP, Rel. para acórdão Min. Alexandre de Moraes, julgado em 05/06/2020. Disponível em: < http://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=2354390>. Acesso em: 05/03/2021.
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LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal. 9ª ed., Salvador: Juspodivm, 2021.
Neves, Daniel Assumpção Amorim. Manual de Direito Processual Civil. Salvador: Editora Juspodivm, 2016.
formada em Direito na UFC, pós-graduada em Direito Constitucional e Processual Civil.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: VASCONCELOS, Brenda Aguiar. A evolução jurisprudencial sobre o conflito de atribuições no âmbito do Ministério Público Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 18 mar 2021, 04:36. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/56260/a-evoluo-jurisprudencial-sobre-o-conflito-de-atribuies-no-mbito-do-ministrio-pblico. Acesso em: 23 dez 2024.
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