Resumo: este trabalho tem como objetivo analisar os principais aspectos controversos envolvendo a crescente tensão entre a liberdade de expressão e o tipo penal de desacato. Preliminarmente, faz-se breve análise do desenho jurídico-constitucional de ambos os institutos no seio do Estado Democrático de Direito. Em seguida, tem-se esmiuçado alguns traços referentes à discussão no âmbito internacional, mormente no Sistema Interamericano de Direitos Humanos. Por fim, analisa-se precedente do Superior Tribunal de Justiça acerca do tema: o Habeas Corpus 379.269/MS. Este caminho demonstrará o reconhecimento da constitucionalidade e da convencionalidade do desacato frente ao ordenamento jurídico brasileiro. O método utilizado na pesquisa foi o lógico-dedutivo, com base em revisão bibliográfica e análise jurisprudencial.
Palavras-chave: Liberdade de expressão. Desacato.
Sumário: 1. Introdução; 2. Desenho jurídico-constitucional da liberdade de expressão; 3. Aspectos do desacato no ordenamento jurídico brasileiro; 4. Corte Interamericana de Direitos Humanos: liberdade de expressão e desacato; 5. O Habeas Corpus 379.269/MS; 6. Conclusão; 7. Referências Bibliográficas
1. Introdução
Dentre os direitos e garantias fundamentais elencados no Estado Democrático de Direito brasileiro, a liberdade de expressão, insculpida no art. 5, IX da CF, ganha foros de importância na atualidade.
Através da livre manifestação do pensamento os seres humanos podem exercer a cidadania, a democracia e, conforme demonstrado ao longo das linhas deste trabalho, a própria dignidade da pessoa humana.
Embora num primeiro momento se possa pensar tratar de direito absoluto, limites externos e internos mesclam e entrelaçam a liberdade de expressão, sendo, talvez, o mais problemático deles, a própria tipificação do desacato no ordenamento jurídico.
Perguntas surgem quanto a (des) necessidade de tipificação do desacato, acerca de sua constitucionalidade e convencionalidade, bem como de suas limitações e restrições. Todos estes pontos serão explorados nas próximas linhas.
2. Desenho jurídico-constitucional da liberdade de expressão
O direito fundamental[1] à liberdade de expressão[2] apresenta contornos peculiares num Estado Democrático de Direito[3], principalmente no que diz respeito com as limitações ou restrições de seu exercício, quer por parte de particulares em relação à particulares, quer por parte de particulares em relação ao próprio Estado.
Para que se compreenda melhor esta situação, faz-se mister breve análise de suas formulações teóricas. Afinal, entender os fundamentos que se apresentam como justificativa para a tutela da liberdade de expressão é de extrema importância, quando se enfrentam intrincados problemas relacionados à sua normatização.
Segundo Gilmar Ferreira Mendes (2018, p. 390):
É frequente que se diga que “a busca da verdade ganha maior fecundidade se levada a cabo por meio de um debate livre e desinibido”. A plenitude da formação da personalidade depende de que se disponha de meios para conhecer a realidade e as suas interpretações, e isso como pressuposto mesmo para que se possa participar de debates e para que se tomem decisões relevantes. O argumento humanista, assim, acentua a liberdade de expressão como corolário da dignidade humana. O argumento democrático acentua que “o autogoverno postula um discurso político protegido das interferências do poder”. A liberdade de expressão é, então, enaltecida como instrumento para o funcionamento e preservação do sistema democrático (o pluralismo de opiniões é vital para a formação de vontade livre).
Em que pese a sua importância para o exercício adequado da busca da verdade, da cidadania[4], da democracia e até mesmo da dignidade da pessoa humana[5], tem-se evidente que nenhum direito fundamental pode ser tido como absoluto.
A liberdade de expressão encontra limites internos ou imanentes e externos. Por um lado, diz-se internos ou imanentes aqueles limites encontrados no seio do próprio direito fundamental que se está a analisar. Isso porque, os dispositivos constitucionais que definem determinado direito fundamental têm um pressuposto fático limitado ou restrito. Por outro lado, diz-se externos aqueles limites encontrados em outros dispositivos constitucionais ou até mesmo em dispositivos infraconstitucionais.
Veja que se os dispositivos infraconstitucionais podem limitar direitos fundamentais, deve haver limites dos limites (schranken-schranken). Entende-se que são três: a proporcionalidade (Verhältnismäßigkeit), a razoabilidade (Angemessenheit) e a preservação do núcleo irredutível ou essencial.
Em que pese num primeiro momento se possa pensar tratar que a figura do desacato aparenta não se coadunar com a liberdade de expressão, uma vez que o bem jurídico[6] tutelado pena norma penal incriminadora não teria o condão de mitigar a figura do direito fundamental em questão, tal posicionamento não merece prosperar, conforme demonstrarei nas próximas linhas.
3. Aspectos do desacato no ordenamento jurídico brasileiro
Analisando a evolução histórica do desacato no Brasil, esclarece Cesar Roberto Bittencourt (2020, p. 220) que:
A punição do crime de desacato remonta ao direito antigo, tendo larga aplicação no direito romano, que reprimia as ofensas irrogadas contra os magistrados, e eram consideradas injuria atrox (gravíssimas), cujas penas cominadas eram das mais graves: a deportação, para alguns, e a pena de morte, para outros. Essa orientação foi mantida durante a Idade Média pelos práticos, que a estenderam aos sacerdotes. (...) A partir dos Códigos Penais franceses de 1791 e 1810, já na era na codificação (seguidos pelos códigos de diversos países), ampliaram, de modo geral, essa figura delituosa para alcançar a todos os funcionários públicos, com a denominação de autrage, e, de modo geral, fundamentaram a criminalização dessas condutas na necessidade de assegurar aos agentes públicos a possibilidade de exercerem de modo eficaz suas funções e, assim, atingir a finalidade superior, de caráter eminentemente social, que a Administração procura. Alguns códigos, como o alemão, por exemplo, não disciplinaram o desacato como figura autônoma de crime, mantendo o critério tradicional.
O bem jurídico protegido pela norma penal incriminadora é a própria administração pública, mais especificamente a sua moralidade e probidade administrativa. Nota-se que, em verdade, protege-se a probidade da própria função pública, ou seja, sua respeitabilidade[7]. Conforme explica Magalhães Noronha (1986, p. 317):
O bem jurídico considerado é a dignidade, o prestígio, o respeito devido à função pública. É o Estado diretamente interessado em que aquele seja protegido e tutelado, por ser indispensável à atividade e à dinâmica da administração pública.
Por sua vez, o sujeito ativo[8] pode ser qualquer pessoa que desacata funcionário público no exercício da função ou em razão dela. O sujeito passivo primário é o Estado e o secundário o funcionário público desacatado.
O tipo objetivo consiste em desacatar, menosprezar, desrespeitar funcionário público no exercício da função ou em razão dela. Nas palavras de Nelson Hungria (1958, p. 424):
É qualquer palavra ou ato que redunde em vexame, humilhação, desprestígio ou irreverência ao funcionário. É a grosseria falta de acatamento, podendo consistir em palavras injuriosas, difamatórias ou caluniosas, vias de fato, agressão física, ameaças, gestos obscenos, gritos agudos etc.
O tipo subjetivo consiste no dolo, representado pela vontade consciente de praticar a conduta descrita na norma penal incriminadora. Veja, também, que é necessário que o sujeito ativo tenha plena consciência de que está diante de um funcionário público e que este se encontra no exercício de sua função ou em razão dela, sob pena de incorrer em erro. No que diz respeito ao especial fim de agir expressa Heleno Cláudio Fragoso (1981, p. 465) que:
Consiste na vontade consciente de praticar a ação ou proferir a palavra injuriosa, com o propósito de ofender ou desrespeitar o funcionário público a quem se dirige. É este o fim que distingue o desacato da resistência, nos casos em que materialmente as ações se confundem.
Consuma-se o delito em questão com a prática efetiva do desacato, através de uma das fórmulas supramencionadas. Todavia, impende observar a crítica de Guilherme de Souza Nucci (2002, p. 1023):
Se o funcionário demonstra completo desinteresse pelo fato ofensivo proferido pelo agressor, não há que se falar em crime, pois a função pública não chegou a ser desprestigiada. É o que pode acontecer, quando um delegado, percebendo que alguém está completamente histérico, em virtude de algum acidente ou porque é vítima de um delito, releva eventuais palavras ofensivas que essa pessoa lhe dirige. Não se pode considerar fato típico, desde que o prestígio da administração tenha permanecido inabalável.
Perceba-se que a tentativa é perfeitamente possível, embora de difícil caracterização.
Trata-se de crime comum porquanto não exige qualidade especial do sujeito ativo, formal, de forma livre, comissivo, instantâneo, unissubjetivo e plurissubsistente.
4. Corte Interamericana de Direitos Humanos: liberdade de expressão e desacato
No que diz respeito à matéria do tipo penal de desacato, o caso Palamara Iribarne vs. Chile é o que teve maior importância e destaque.
Consta dos autos que Palamara Iribarne integrou as Forças Armadas Chilenas em meados de 1970. Todavia, aposentando-se, optou por escrever um livro em que discorria sobre diferentes pontos da inteligência militar chilena, bem como a necessidade de adequação de parâmetros éticos, democráticos, transparentes e humanos. Acontece que, em meio a esta atividade, teve o seu livro censurado. Insurgindo-se contra este ato, sofreu diversos processos criminais, dentre eles um de desacato.
A Corte Interamericana de Direitos Humanos insurgiu-se contra a decisão, mas logo após o Chile revogou a lei de desacato no país, mantendo, todavia, um delito de ameaça a agentes públicos.
Quer isso dizer que o direito à liberdade de expressão continuou com restrições, não se podendo afirmar, portanto, tratar-se de um direito humano absoluto.
5. O Habeas Corpus 379.269/MS
O leading case para o problema em questão pode ser encontrado, sem sombra de dúvidas, no bojo do Habeas Corpus 379.269/MS, julgado em 2017, pela 3o Seção do Superior Tribunal de Justiça. O caso envolveu a prática, no mesmo contexto fático, dos crimes previstos no art. 306, CTB (dirigir veículo automotor sob a influência de álcool), art. 330, CP (desobediência) e art. 331, CP (desacato).
Consta dos autos que policiais militares, no exercício regular de suas funções, abordaram o paciente por conduzir seu veículo automotor em condições psicomotoras alteradas em razão da ingestão de bebida alcoólica. Quando solicitada a sua identificação pessoal, o paciente desacatou os funcionários públicos no exercício de suas funções, praticando diversos atos obscenos e proferindo dizeres de baixo calão.
Rejeitada parcialmente a denúncia, o juiz de direito valeu-se do postulado da consunção, admitindo a peça acusatória somente quanto aos crimes dos artigos 331, CP e 306, CTB. O Ministério Público Estadual, através de recurso em sentido estrito, recorreu da decisão, para incluir o crime do art. 330, CP, pedido este acatado pelo Tribunal de Justiça daquele Estado. Acontece que, diante do cenário, a Defensoria Pública Estadual impetrou habeas corpus junto ao Superior Tribunal de Justiça, alegando a existência de manifesto constrangimento ilegal e pleiteou absorção do crime de desacato pelo de desobediência.
O remédio constitucional foi denegado, pelos motivos corretamente abaixo elencados, demonstrando o acerto do Superior Tribunal de Justiça no que diz respeito à matéria. Os entendimentos arcados pelo voto vencedor do Ministro Saldanha Palheiro podem ser resumidos nos seguintes tópicos: a) não se tem como aplicável o postulado da consunção entre o tipo penal de desacato e de desobediência, porquanto ambos tutelam bens jurídicos distintos; b) deve-se entender o desacato como uma forma sui generis de injúria, marcado pela ofensa à função pública dos funcionários públicos que integram a estrutura burocrática do Estado; c) a Corte Interamericana de Direitos Humanos não abarca o direito fundamental à liberdade de expressão como absoluto, mas relativo; d) por não apresentar verdadeira função jurisdicional, as manifestações da Comissão Interamericana de Direitos Humanos não passam de meras recomendações, que podem ou não ser observadas; e) visto que não há precedente relacionado especificamente ao Brasil, resta-se evidente que não há nenhuma obrigação de revogar, afastar, limitar ou restringir a aplicação do crime de desacato; f) por fim, pela teoria da margem de apreciação nacional, mesmo que houvesse qualquer precedente relacionado ao Brasil, este, por si só, seria insuficiente para guiar os rumos de deliberação da aplicação de eventual jugado em seu âmbito interno.
6. Conclusão
Ante o exposto, resta-se evidente que a figura do desacato permanece criminalizada no ordenamento jurídico brasileiro. A tipificação penal da ofensa contra os funcionários públicos pode ser vista como verdadeira proteção especial que não impede, de qualquer forma, o direito fundamental à liberdade de expressão. Todavia, tal proteção deve ser usufruída sem exageros ou excessos, sob pena de sua deslegitimação.
Acrescenta Rogério Sanches Cunha (2020, p. 929) que:
Afastar a figura criminosa do desacato não traria mudança significativa nos limites do direito de expressão, pois o exagero poderia de qualquer forma ser punido como injúria majorada. Logo, o esforço para discernir a censura do insulto permaneceria. O importante não é afastar a priori a possibilidade de punição do desacato, mas, mantendo a proteção ao exercício da função pública, exercer o controle sobre eventuais abusos desse exercício. Noutras palavras, compete ao Poder Judiciário garantir tanto a punição do exagero no exercício do direito de crítica à atividade desempenhada pelo funcionário público quanto a punição do abuso na reação do funcionário diante de uma crítica justa proferida pelo cidadão.
Embora a Comissão Interamericana de Direitos Humanos tenha se manifestado contrário à criminalização e persecução penal do tipo de desacato, a Corte Interamericana de Direitos Humanos tem manifestado certo consentimento no que diz respeito ao Direito Penal ser invocado para punir excessos à liberdade de manifestação do pensamento.
Não obstante, o Supremo Tribunal Federal adotou o entendimento da constitucionalidade e da convencionalidade do tipo penal de desacato, uma vez que a regra de direito internacional de liberdade de expressão não se diferencia do exposto na Constituição Federal. Quer isso dizer que nenhum direito ou garantia fundamental é absoluto, inclusive tendo a honra e a intimidade tutela penal e constitucional.
Finalizo com o habeas corpus 141.949/DF, relatado pelo ministro Gilmar Mendes, em 13/03/2018:
O exercício abusivo das liberdades públicas não se coaduna com o Estado Democrático. A ninguém é lícito usar sua liberdade de expressão para ofender a honra alheia. O desacato constitui importante instrumento de preservação da lisura da função pública e, indiretamente, da dignidade de quem a exerce. Não se pode despojar a pessoa de um dos mais delicados valores constitucionais, a dignidade da pessoa humana, em razão do “status” de funcionário público (civil ou militar). A investidura em função pública não constitui renúncia à honra e à dignidade. Nesse aspecto, a Corte Interamericana de Direitos Humanos, órgão responsável pelo julgamento de situações concretas de abusos e violações de direitos humanos, reiteradamente tem decidido contrariamente ao entendimento da Comissão de Direitos Humanos, estabelecendo que o direito penal pode punir condutas excessivas no exercício da liberdade de expressão.
7. Referências Bibliográficas
BITENCOURT, Cesar Roberto. Tratado de Direito Penal – Parte Especial. 14 ed. São Paulo: Saraiva, 2020, v. V.
CUNHA, Rogério Sanches. Manuel de Direito Penal – Parte Especial. 12 ed. São Paulo: Juspodivm, 2020.
FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de Direito Penal. Rio de Janeiro: Forense, 1981, v. II.
HUNGRIA, Nélson. Comentários ao Código Penal. 5 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1958.
MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 13 ed. São Paulo: Saraiva, 2018.
NORONHA, Edgard Magalhães. Direito Penal – Parte Especial. São Paulo: Saraiva, 1986, v. IV.
NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. 2 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.
PRADO, Luis Regis. Tratado de Direito Penal – Parte Especial. 3 ed. São Paulo: Forense, 2018.
ROXIN, Klaus. Derecho penal, parte general –Trad. Diego Manuel Luzón Peña. Madrid: Civitas, 2008, t. I.
SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. 8 ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007.
SARMENTO, Daniel. Dignidade da Pessoa Humana. 2 ed. Rio de Janeiro: Fórum, 2020.
SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. 40 ed. São Paulo: Malheiros, 2017.
TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. 16 ed. São Paulo: Saraiva, 2018.
[1] Para Ingo Wolfgang Sarlet (2007, p. 405) os direitos fundamentais são: “Todas as posições jurídicas concernentes às pessoas (naturais ou jurídicas, consideradas na perspectiva individual ou transindividual) que, do ponto de vista do direito constitucional positivo, foram, expressa ou implicitamente, integradas à Constituição e retiradas da esfera de disponibilidade dos poderes constituídos, bem como todas as posições jurídicas que, por seu conteúdo e significado, possam lhe ser equiparadas, tendo, ou não, assento na constituição formal”.
[2] Vide as seguintes Cartas: Alemanha (art. 5), Portugal (art. 37), Espanha (art. 20), México (art. 6), Argentina (art. 14) e Itália (art. 21).
[3] Na lição de José Afonso da Silva (2017, p. 121): “A configuração do Estado Democrático de Direito não significa apenas unir formalmente os conceitos de Estado Democrático e Estado de Direito. Consiste, na verdade, na criação de um conceito novo, que leva em conta os conceitos dos elementos componentes, mas os supera na medida em que incorpora um componente revolucionário de transformação do status quo. E aí se entremostra a extrema importância do art. 1o da Constituição de 1988, quando afirma que a República Federativa do Brasil se constitui em Estado Democrático de Direito, não como mera promessa de organizar tal estado, pois a Constituição aí já o está proclamando e fundando”.
[4] André Ramos Tavares (2018, p. 793) estabelece que: “Assim como ocorre com a dignidade da pessoa humana, a cidadania invoca conceito vago, embora seja pauta inafastável em qualquer Estado democrático. (...) Frise-se que a concepção de cidadania adotada pela Constituição de 1988 coincide com aquela introduzida pela Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 e vincula-se, portanto, ao movimento de incorporação (internalização) dos direitos humanos e, acrescente-se, ao movimento da máxima efetividade dos referidos direitos. (...) Como conteúdo mínimo da cidadania tem-se a vedação absoluta no ser considerado estar o indivíduo a serviço do Estado. Aqui, o conceito se justapõe à tutela derivada da própria dignidade da pessoa humana (mais um aspecto evidenciado da consubstancialidade já analisada aqui quando do estudo da dignidade)”.
[5] Nas palavras de Daniel Sarmento (2020, p. 89): “O princípio da dignidade da pessoa humana visa a proporcionar uma proteção integral à pessoa, e não a tutelar aspectos previamente recortados da sua personalidade e dos seus direitos. Por isso, deve ser dotado de suficiente elasticidade para que possa dar conta da sua tarefa monumental. (...) Essa constatação, todavia, não deslegitima o esforço de definição do conteúdo material do princípio. Mais do que legitima, esta é uma tarefa urgente. Afinal, como aplicar um princípio sem saber o que ele prescreve? Como empregá-lo como vetor hermenêutico sem conhecer a direção em que aponta? Diante dos abusos a que o princípio vem se sujeitando – trivialização, invocação sem critério e fundamentação, emprego para a imposição heterônoma de modelos de virtude e de vida boa para as pessoas etc. – ganha importância ímpar a tentativa de definição do seu conteúdo material na ordem constitucional brasileira”.
[6] Segundo Claus Roxin (p. 56, 2008): “bienes jurídicos son circunstancias dadas o finalidades que son útiles para el individuo y su libre desarrollo en el marco de un sistema social global estructurado sobre la base de esa concepción de los fines o para el funcionamiento del propio sistema”.
[7] Luis Regis Prado (2018, p.417) escreve que: “O bem jurídico protegido sedimenta-se no interesse em se assegurar o correto, normal e pleno funcionamento da Administração Pública (princípio da autoridade). tal proteção não visa propriamente à pessoa do funcionário, mas sim o respeito que se deve ter à função pública.
[8] Magalhães Noronha (1958, 328) traz questionamento interessante: “Se o ofendido, no delito em apreço, é primacialmente a Administração Pública ou o Estado, o superior, que ofende o inferior, ofende, como qualquer outra pessoa, a administração, não podendo se sobrepor-se a esta. É óbvio que, tutelando-se a administração, protegem-se seus agentes, não se excluindo os humildes e modestos. Há a considerar ainda o seguinte. Se o delito em estudo pode ser cometido pelo particular, que não é nem superior nem inferior hierárquico do funcionário, não se vê por que, em se tratando de servidores públicos, há de se atentar à relação hierárquica, quando está em jogo o mesmo bem jurídico e quando o funcionário, ao cometer tal crime, despe-se dessa qualidade, agindo e sendo considerado como particular”.
Bacharel em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM-SP). Especializando em Direito Penal Econômico pela Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP). Mestrando em Direito Penal pela Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP). Membro da Associação de Advogados de São Paulo (AASP). Membro do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM). Membro do Grupo de Pesquisa Impunidade Criminal (CNPq). Advogado regularmente inscrito na Seção de São Paulo da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: AYOUB, Omar Ali. Liberdade de expressão e desacato: desenho constitucional no estado democrático de direito Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 01 abr 2021, 04:48. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/56312/liberdade-de-expresso-e-desacato-desenho-constitucional-no-estado-democrtico-de-direito. Acesso em: 23 dez 2024.
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