JOSÉ ALVES MACIEL[1]
(orientador)
RESUMO: O presente artigo é um estudo sobre a atuação da Defensoria Pública do Estado do Tocantins como Órgão de Execução Penal, será discorrido brevemente sobre o histórico do acesso à justiça gratuita no Brasil e a causa que levou a criação de uma instituição específica para promover o acesso à justiça gratuita e integral a todos os cidadãos. Será abordado as contribuições que a Defensoria Pública como Órgão de Execução Penal tem exercido no Estado do Tocantins, com levantamento de casos e atividades desenvolvidas pela instituição. Também será analisado a importância do Órgão de Execução Penal para a efetivação dos direitos e garantias fundamentais, serão destacados os principais princípios no âmbito da execução penal e exemplos de sua aplicabilidade ou violação. A metodologia empregada no artigo, parte é pesquisa dos fundamentos constitucionais e legais, doutrinas pertinentes e casos concretos desenvolvidos pela Defensoria Pública.
Palavras-chave: Defensoria Pública do Estado do Tocantins. Órgão de Execução Penal. Assistência Jurídica Gratuita. Atuação Social.
ABSTRACT: This present article is a study about the acting of the Public Defender’s Office in the State of Tocantins as Criminal Execution body, it will be briefly explained the historical access to free justice in Brazil and the cause of creation of a specific institution to promote free and full access to justice for all citizens. It will be covered the contributions that the Defender’s Office as Criminal Execution body has exercised in Tocantins State with a survey of cases and activities developed by the institution. It will be also examined the importance of the penal enforcement body on the effectiveness of fundamental rights and guarantees, it will be highlighted the principal tenets in the ambit of penal execution and examples of the aplicability or violation. The metology used at this article, in part, is research of constitutional and legal grounds, pertinent doctrine and concret cases developed by the Defender’s Office
Keywords: Public Defender’s Office in the State of Tocantins. Criminal Execution body. Access to free justice in Brazil. Social Acting.
Sumário: Introdução. 1 A visão geral sobre a Defensoria Pública do Estado do Tocantins. 2. O papel da Defensoria Pública do Estado do Tocantins como órgão de execução penal. 2.1. Requerer aplicação aos casos julgados de lei posterior que de qualquer modo favorecer o condenado (art. 81-B, I, b da LEP). 2.2. Requerer ao juiz da execução ou à autoridade administrativa para instauração de sindicância ou procedimento administrativo em caso de violação das normas referentes à execução penal (art. 81-B, inciso IV). 3. O órgão de execução penal como instrumento de efetivação dos direitos e princípios fundamentais. 3.1. Princípio da humanidade. 3.2. Princípio da individualização da pena. 3.4. Princípio da intranscendência. Conclusão. Referências.
INTRODUÇÃO
O presente estudo tem o escopo de apresentar a atuação concreta da Defensoria Pública do Estado do Tocantins como Órgão de Execução Penal, bem como discorrer sobre a efetivação dos direitos e princípios fundamentais por meio do órgão.
A Constituição Federal de 1988 trouxe um contexto histórico inovador, ampliando direitos e resgatando garantias asseguradas nas constituições passadas. Uma destas inovações foi a cláusula pétrea do artigo 5°, trazendo garantias e direitos fundamentais individuais e coletivos a todos, sendo uma dessas garantias, o acesso assistência jurídica integral e gratuita, conforme estabelece o inciso LXXIV.
Como esta garantia é importante e complexa em seu desenvolvimento, o Estado, por meio da Carta Magna, institui a Defensoria Pública através do artigo 134, incumbindo-lhe como instrumento de regime democrático para exercício da prestação de orientação jurídica, promovendo direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados.
A Defensoria Pública do Estado do Tocantins foi criada em 1989, juntamente com a Constituição do Estado. Posteriormente, em 22 de dezembro de 2004, mediante Lei Complementar Estadual n° 41, foi regulamentada.
Com o advento da Lei n° 12.313/2010, que modificou a Lei de Execução Penal, a Defensoria Pública foi inserida como um dos órgãos de execução penal, atribuindo à instituição o dever de zelar pela regular manutenção dos processos de execuções penais ou medida de segurança, nos incidentes de execução, no âmbito administrativo, em todos os graus e instâncias, seja de maneira individual ou coletiva.
Deste modo, considera-se que a Defensoria Pública possui uma grande atuação nas políticas sociais do país, principalmente tratando-se na área da execução penal. Diante das tentativas de pesquisas sobre o tema em comento, verificou-se que há poucos tratamentos doutrinários com uma visão teórica e prática da atuação deste órgão, razão pela qual o presente estudo surge como um trabalho de contribuição do tema.
Portanto, apresentar-se-á ao logo do artigo científico a incumbência recém recebida pela Defensoria Pública como órgão de execução penal, adentrando no estudo social acerca dessa atribuição conferida à instituição, ressaltando os princípios inerentes à execução penal, bem como uma análise da função social do cumprimento de pena.
1 A VISÃO GERAL SOBRE A DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO TOCANTINS
Para iniciar o assunto principal sobre a Defensoria Pública do Estado do Tocantins é necessário discorrer a respeito ao acesso à justiça gratuita no Brasil, considerando que atualmente a prestação de orientação jurídica é uma das atividades desenvolvidas pelas Defensorias Públicas.
O acesso à justiça gratuita tem sua origem remota nas Ordenações Filipinas em meados dos anos de 1595, a Ordenação tratava-se de um compilado de normas editadas pelo Rei Don Filipe I, as quais eram criadas e regulamentadas pelo próprio rei, segundo seu próprio entendimento sobre o que seria ideal para a sociedade. (SILVA e ESTEVES, 2018)
Pouco a pouco o direito à gratuidade de justiça foi sendo regulamentado de forma fragmentada e sistemática, no entanto, ainda existia a ideia do imperativo ético-religioso, o qual era entendido pelos advogados da época que as orientações e prestações de serviço gratuito se traduzia em caridade, generosidade e não uma obrigação estatal.
A Primeira Constituição de 1891, não trouxe nenhum dispositivo legal que determinasse um órgão em especifico a prestação da assistência jurídica, porém, deixou claro que todos receberiam o direito a defesa, vejamos:
Aos accusados se assegurara na lei a mais plena defesa, com todos os recursos e meios essenciaes a ella, desde a nota de culpa, entregue em 24 horas ao preso e assignada pela autoridade competente, com os nomes do accusador e das testemunhas. (Art. 72, §16° da Constituição Federal de 1891).
Com a promulgação da Constituição Federal de 1934, o texto constitucional originou no artigo 113, n° 32, que a “União e os Estados deveriam oferecer aos necessitados assistência jurídica, criando, para esse efeito, órgãos especiais assegurando, a isenção de emolumentos, custas, taxas e selos”. (CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL,1934)
Nota-se que Carta Política inovou o entendimento para que houvesse uma estrutura, um órgão especial destinado para a prestação daquele serviço, com a finalidade de sistematizar o processo judiciário, facilitando a busca por orientações e serviços jurídicos pela população, favorecendo o sistema de justiça na separação dos processos que receberiam a isenção de emolumentos.
Em aplicabilidade ao dispositivo constitucional retro, o Estado de São Paulo foi o primeiro a criar o Consultório Jurídico do Serviço Social, em 1935, posteriormente os Estados do Ceará, Rio Grande do Sul e Minas Geras também inauguraram os escritórios públicos, porém esse projeto não perdurou por muito tempo, logo a instabilidade institucional no país os obrigaram a fecharem as portas.
Infelizmente, o país sofreu um grande retrocesso com a promulgação da Constituição Federal de 1937, pois a mesma não previu qualquer direito referente ao acesso à justiça gratuita, direito este que só poderia ser suprido por lei infraconstitucional.
Mais tarde, passados anos da publicação do Código de Processo Civil de 1939, por meio do Decreto Lei n° 1.608, de 18 de setembro de 1939, o legislador regulamentou em âmbito nacional as normas ao benefício da justiça gratuita no Capítulo II. (CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL,1939).
Em razão da omissão do texto constitucional de 1939, o Código de Processo Penal de 1941, mediante o Decreto Lei n° 3.689, de 03 de outubro de 1941, no artigo 32, estabeleceu que, caso fosse comprovado a pobreza do acusado ou querelante, seria pelo magistrado indicado profissional liberal para a atuação pro bono no processo penal. Analisemos:
Art. 32. Nos crimes de ação privada, o juiz, a requerimento da parte que comprovar a sua pobreza, nomeará advogado para promover a ação penal.
§ 1o Considerar-se-á pobre a pessoa que não puder prover às despesas do processo, sem privar-se dos recursos indispensáveis ao próprio sustento ou da família.
§ 2o Será prova suficiente de pobreza o atestado da autoridade policial em cuja circunscrição residir o ofendido. (Código de Processo Penal, 1941).
Como as leis infraconstitucionais tiveram que regulamentar o acesso à justiça gratuita na Constituição anterior, a nova Carta Política de 1946 resolveu parcialmente a inércia estatal, devolvendo o direito ao serviço gratuito jurídico, mas não indicou quem seria responsável por essa missão, dificultando o desenvolvimento das prestações dos serviços.
Com a instituição da Constituição Federal de 1967, a assistência judiciária transmitiu o entendimento que algum órgão de Estado estaria encarregado da postulação e da defesa em todas as instâncias, dos direitos das pessoas miseráveis. No entanto, do mesmo modo que a Constituição anterior, a Carta Política de 1967 elevou a assistência judiciária como norma não autoaplicável, pendendo de regulamentação da edição de lei infraconstitucional.
A promulgação da Constituição Federal de 1988, trouxe a previsão legal de assistência jurídica integral e gratuita como direito fundamental no artigo 5°, inciso LXXIV. Conforme o entendimento dos Professores SILVA e ESTEVES (2018, pág. 152):
Deve-se observar que a nova Constituição, ao utilizar-se do vocábulo assistência jurídica” em substituição à expressão “assistência judiciária”, acabou aumentando significativamente a amplitude do serviço assistencial fornecido à população carente, abrangendo dentre os direitos fundamentais não apenas a assistência legal para a propositura, defesa e acompanhamento das ações judiciais, mas também a orientação jurídica extrajudicial (como, por exemplo, a elaboração de contratos, a pactuação de acordos e o aconselhamento jurídico preventivo).
De modo que essa missão tivesse plena eficácia em sua operação, foi necessário a criação de uma instituição especifica para desenvolver a incumbência de alta complexidade trazida pelo ordenamento, essa instituição é a Defensoria Pública. A previsão legal que outorgou a Defensoria Pública a missão de prestar serviços jurídicos aos necessitados está disposto no artigo 134, que expressava que “a Defensoria Pública é instituição essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a orientação jurídica e a defesa, em todos os graus, dos necessitados na forma do art. 5º, LXXIV”. (CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 1988).
Posteriormente a redação do artigo 134 foi alterado pela Emenda Constitucional n° 80/2014, enfatizando à amplitude e a essencialidade da atuação da instituição na função jurisdicional do Estado, como também promovendo a necessidade das atividades destinadas aos direitos humanos, bem como regulamentando a forma de coordenação interior, suas funções, princípios institucionais, seus direitos e garantias, prerrogativas e proibições a instituição e membros. (EMENDA A CONSTITUIÇÃO, 2014)
A Defensoria Pública é uma instituição que faz parte das funções essenciais à Justiça, é um órgão que possui extra poder, pois não está vinculada diretamente aos três poderes, porém, possui autonomia para se proteger contra eventuais ingerências políticas repressivas ou represálias administrativas, financeiras, que podem prejudicar as garantias de seus assistidos, população que sofre o estigma da exclusão social no país. (SILVA e ESTEVES, 2018)
Essa inovação constitucional gerou grandes impactos sociais positivos, considerando que nenhuma constituição anterior teria apresentado uma garantia tão importante para alcançar o aperfeiçoamento do direito democrático no Brasil.
Para que todos os cidadãos pudessem alcançar as atividades a prestação jurisdicional da Defensoria Pública, foi necessário à distribuição de cada Unidade nas Comarcas em cada Estado membro e Distrito Federal.
Assim, a Defensoria Pública do Estado do Tocantins foi instituída por meio da Constituição do Estado, em 05 de outubro de 1989, a qual previa sua implantação na provisória capital do Estado, Miracema do Tocantins. (CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO TOCANTINS, 1989)
Inicialmente a instituição estava vinculada aos órgãos do poder executivo, a exemplo à Secretaria de Justiça e Secretaria Pública (SEJSP) e Procuradoria Geral do Estado (PGE). Nesta época não havia concurso público para o cargo de Defensor Público, as titulações dessas funções eram inicialmente por meio de nomeações, os ocupantes desses cargos eram advogados e o regime era contrato de trabalho. (DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO TOCANTINS, 2021)
A Defensoria Pública só foi regulamentada em 2004, mediante Lei Complementar Estadual n° 41, passando a vigorar em março de 2005. (LEI COMPLEMENTAR ESTADUAL, 2004)
Desde então a Defensoria Pública do Estado do Tocantins vem desenvolvendo a missão conferida pelo ordenamento jurídico que não é meramente legal, pois estabelece uma relação social com seus assistidos, pessoas hipossuficientes, garantindo a materialização de seus direitos conferidos pela Constituição Federal de 1988, por meio de ações sociais, núcleos especializados e outros instrumentos.
Segundo o relatório de gestão da corregedoria geral dos anos de 2019/2021, a Defensoria Pública do Estado do Tocantins realizou 330.114 (trezentos e trinta mil, cento e quatorze) atendimentos as pessoas hipossuficientes e mais de um milhão de atividades desenvolvidas. (DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO TOCANTINS, 2021)
Corroborando com o intuito de estabelecer a garantia de direitos e deveres igualitário aos cidadãos, foi conferida à Instituição o papel de Órgão de Execução Penal, buscando alcançar parte da população que se encontra fora das participações das atividades sociais comunitárias em razão de suas consequências delitivas.
A Lei Federal n. 12.313, de 19 de agosto de 2010, alterou a LEP, “passou a dispor sobre a assistência jurídica dentro dos presídios, além de atribuir competências à Defensoria Pública”. (Capez, 2020, pág. 386)
Deste modo, o presente estudo adentrará nos aspectos legais sobre o Órgão de Execução Penal e posteriormente será discorrido sobre sua função de efetivação das garantias fundamentais por meio das atividades desenvolvidas.
2 O PAPEL DA DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO TOCANTINS COMO ÓRGÃO DE EXECUÇÃO PENAL
A Lei n° 7.210/84 disciplina sobre o direito e deveres de indivíduos reclusos, sejam definitivamente ou provisoriamente presos, estabelecendo uma tutela de manutenção dos processos com as disposições de manter intactas o princípio da dignidade da pessoa humana e o devido processo legal, garantias fundamentais previstas na Carta Magna.
É sabido que a maior parte da população carcerária do Tocantins é formado por pessoas hipossuficientes, que necessitam integralmente da atuação da Defensoria Pública para obter a assistência jurídica gratuita.
Assim, a Instituição incumbida como um dos Órgãos de Execução Penal possui o dever de promover orientações jurídicas e desempenhar a defesa de seus assistidos, são pessoas hipossuficientes que contam com uma renda individual mensal de até 2,5 salários mínimos e uma renda familiar de até 04 salários mínimos. A resolução de conflitos estende-se em processos administrativos, extrajudiciais ou judiciais, garantindo a ampla defesa e contraditório, em todos os graus de jurisdição. (DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO TOCANTINS,2016)
Também é de responsabilidade da instituição a consciencialização sobre os direitos humanos, cidadania e do ordenamento jurídico, concedendo atendimento interdisciplinar como suporte de apoio aos assistidos, buscando a humanização e caracterizando cada atendimento conforme a demanda.
Outra função importante da Defensoria Pública que é imprescindível de ser discorrida é a defesa dos direitos individualizados e coletivos nos estabelecimentos penais e policiais, visando assegurar os direitos das pessoas que estão com suas liberdades tolhidas, sob quaisquer circunstâncias, o exercício pleno de seus direitos e garantias fundamentas.
Nesse sentido a Defensoria Pública do Estado do Tocantins tem buscado cada vez mais vigiar e estar presente em cada Unidade de Tratamento Penal, Cadeias Públicas e Casas de Prisão Provisórias espalhadas pelo Estado, disposta a tutelar esses direitos.
A exemplo recente da efetivação desse trabalho prestado, a coordenadora do Núcleo Especializado de Assistência e Defesa ao Preso (NADEP) da Defensoria Pública participou da inspeção a Unidade de Segurança Máxima de Cariri, Comarca de Gurupi, em 03 de fevereiro de 2021.
A Defensora Pública e coordenadora do núcleo estava acompanhada do magistrado da Vara de Execuções Penais da Comarca de Gurupi, a promotora de justiça e de alguns representantes da OAB, subseção de Gurupi.
Em nota a coordenadora informou que “a unidade é adequada ao clima, com boa ventilação para o bom cumprimento de pena. É um modelo mais adequado do que aquele que a gente vivencia nas outras cadeias, que é a superlotação” (DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO TOCANTINS, 2021).
A inspeção em estabelecimento penal está incumbida a Defensória Pública como Órgão de Execução Penal, conforme previsão legal do artigo 81-B, inciso V, vejamos: “visitar os estabelecimentos penais, tomando providências para o adequado funcionamento, e requerer, quando for o caso, a apuração de responsabilidade”. (LEI N° 7.2010/84).
As unidades da Defensoria Pública do Estado do Tocantins entre os anos de 2019 e 2021 desenvolveram cerca de 41.026 (quarenta e um mil e vinte e seis) atividades no âmbito da Execução Penal, conforme relatório de gestão da Instituição. (DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO TOCANTINS, 2021).
Observa-se que na prática, a função jurisdicional do Órgão tem conseguido alcançar várias pessoas, mostrando ser garantidora e protetora dos direitos dos reeducandos, tentando manter justa e legal a forma de cumprimento da reprimenda e tutelando os processos de execução penal. Ademais, vale ressaltar que não só os presos são beneficiados com a assistência gratuita, mas seus familiares também, pois o âmbito familiar é de extrema importância para a ressocialização.
Deste modo, vemos que para a efetivação eficaz da Lei de Execução Penal por meio do Órgão incumbido a fiscalizar e atuar na manutenção do interesse das pessoas reclusas de liberdade, é primordial se atentar ao princípio basilar nas execuções penais que é o da humanidade, segundo os dizeres de Roig, definindo no seguinte sentido:
[...] é possível afirmar que o princípio da humanidade constitui o cerne de uma visão moderna e democrática da execução penal, pautada pela precedência e ascendência substanciais do ser humano sobre o Estado e pela necessidade de reduzir ao máximo a intensidade da afetação individual. Possui, portanto, o escopo maior de capitanear a construção de uma política criminal redutora de danos, considerando nas lições de Pavarini, que a contradição entre cárcere e democracia não pode ser resolvida, mas apenas contida, por meio de uma política humanizante. (Roig, 2016, p. 38-39)
Na visão do Doutrinador Aury Lopes Junior, o Estado deveria fortalecer a Defensoria Pública, pois é por meio desta instituição que se busca o exercício da ampla defesa e contraditório, pautando-se no princípio da dignidade da pessoa humana, senão vejamos:
O que sim deve ser feito é fortalecer-se a defensoria pública. Aqui está o ponto nevrálgico da questão: para tutela do réu, deve-se fortalecer o seu lugar de fala, potencializar a sua condição de obtenção da tutela jurisdicional, e não sacrificar o sistema acusatório e a própria estrutura dialética do processo, legitimando que o acusador o defenda. (JUNIOR, 2020, p 1729).
Na busca real da efetivação dos direitos dos excluídos da sociedade, o núcleo de assistência e defesa do preso (NADEP) conjuntamente com as Defensorias Públicas do Estado, pleitearam oito ações judiciais coletivas relacionadas ao enfretamento da Covid-19, com o intuito de assegurar a aplicabilidade dos direitos fundamentais nas Unidades Prisionais.
Atuaram diretamente com a Secretaria Estadual de Cidadania e Justiça, Secretaria da Saúde do Estado do Tocantins e a Secretaria de Segurança Pública do Estado, elaborando e expedindo recomendações sobre o enfretamento do novo corona vírus (COVID19) nos sistemas prisionais.
Impetrou Habeas Corpus coletivo a favor de indivíduos que preenchiam os direitos previsto no art. 4º e 6º da Recomendação do Conselho Nacional de Justiça nº 62/2020, pois se encontravam preso por débitos alimentícios em meio à crise da Pandemia. (DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO TOCANTINS, 2021).
São múltiplas as atividades desenvolvidas pela Defensoria como Órgão de Execução Penal no Estado, seguindo a incumbência trazida pelo artigo 81-B da Lei n° 7.210/84. Assim, adentraremos em alguns pontos para melhor esclarecimento e exemplificação.
2.1. REQUERER APLICAÇÃO AOS CASOS JULGADOS DE LEI POSTERIOR QUE DE QUALQUER MODO FAVORECER O CONDENADO (art. 81-B, I, b da LEP)
A Lei 13.964 de 24 de dezembro de 2019, trouxe uma inovação legal sobre as progressões de regime, alterando o artigo 112 da Lei de Execução Penal. Basicamente, antes do aperfeiçoamento a legislação penal e processual, as progressões de regime eram contabilizadas por meio de frações e que se equivaliam a três avaliações:
A fração 1/6 era utilizada em casos de crimes cometidos por réu primário em crimes comuns ou reincidentes em crimes comuns. A fração 2/5 era utilizado em casos de delitos cometidos por réu primário em delito hediondo e a fração 3/5 em situações de reincidência.
Com a Reforma do Pacote Anticrime houve a alteração do artigo 112, redação dada pela Lei 10.792/2003 e inovou o ordenamento jurídico com a sistemática de porcentagem, vejamos:
Art. 112. A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos:
I - 16% (dezesseis por cento) da pena, se o apenado for primário e o crime tiver sido cometido sem violência à pessoa ou grave ameaça;
II - 20% (vinte por cento) da pena, se o apenado for reincidente em crime cometido sem violência à pessoa ou grave ameaça;
III - 25% (vinte e cinco por cento) da pena, se o apenado for primário e o crime tiver sido cometido com violência à pessoa ou grave ameaça;
IV - 30% (trinta por cento) da pena, se o apenado for reincidente em crime cometido com violência à pessoa ou grave ameaça;
V - 40% (quarenta por cento) da pena, se o apenado for condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, se for primário;
VI - 50% (cinquenta por cento) da pena, se o apenado for:
a) condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, com resultado morte, se for primário, vedado o livramento condicional;
b) condenado por exercer o comando, individual ou coletivo, de organização criminosa estruturada para a prática de crime hediondo ou equiparado; ou
c) condenado pela prática do crime de constituição de milícia privada;
VII - 60% (sessenta por cento) da pena, se o apenado for reincidente na prática de crime hediondo ou equiparado;
VIII - 70% (setenta por cento) da pena, se o apenado for reincidente em crime hediondo ou equiparado com resultado morte, vedado o livramento condicional.
Diante dessa nova análise de critérios objetivos para a progressão de regime, levantou-se uma discussão entre advogados e defensores sobre a interpretação do inciso VII, especificamente tratando da redação quando se refere a reincidência em delito hediondo ou equiparado, entende-se que o percentual de 60% (sessenta por cento) teria aplicação apenas em casos de crimes em que configura reincidência específica.
Como tratava-se de nova legislação e não havia entendimento consolidado sobre o tema, a 4ª Defensoria Pública das Execuções Penais de Gurupi que atua diretamente com a manutenção das defesas dos reeducandos que cumprem pena em regime mais gravoso, fechado, que estão enclausurados na Unidade de Segurança Máxima de Cariri, em Cariri do Tocantins, constatou que havia uma lacuna na redação do inciso VII, do artigo 112, que beneficiariam os apenados, pois, a reincidência referida na norma não se tratava da reincidência genérica, conforme entendimento consolidado anteriormente pelo Supremo Tribunal Federal por meio do julgado do HC nº 238592 / RJ (2012/0070240-7) autuado em 09/04/2012, mas sim específico.
Assim, a 4ª Defensoria Pública das Execuções Penais de Gurupi pleiteou várias impugnações de cálculo requerendo a aplicabilidade da porcentagem 40% (quarenta por cento) aos casos em que os reeducandos teriam cometido um crime comum e posteriormente um crime hediondo, ou cometido primeiramente crime hediondo e depois crime comum.
Para exemplificar a atuação de forma prática, em um caso especifico a Defensoria Pública como órgão de execução penal requereu que fosse aplicada a lei mais benéfica ao reeducando, determinado a alteração da porcentagem de 60% (sessenta por cento) da pena de 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses que se tratava de reincidência em crime comum para 40% (quarenta por cento).
O Ministério Público se manifestou pelo indeferimento do pedido, entendendo que nenhum momento a leitura do artigo 112 da LEP trazia a observância da reincidência específica. Contudo, o juiz a quo acolheu o pedido apresentado pela Defensoria e determinou a alteração do cálculo de pena.
Inconformado com a decisão, o Ministério Público interpôs agravo em execução penal, que em decisão de 2º grau foi decidido por unanimidade dar provimento ao recurso, resultando a elaboração de novos cálculos para retornar à fração de 60% (sessenta por cento) a pena de 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses em face da reincidência.
Nesse ínterim, após várias discussões sobre a existência da reincidência específica e as inúmeras impugnações de cálculos e recursos entendendo que sim, há uma lacuna na redação do artigo e que diante dessa ausência de especificação era claro que se deveria aplicar analogia em in bonam partem, a 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça deliberou e concedeu a ordem de ofício em dois Habeas Corpus, em decisões que mudaram a jurisprudência do colegiado, unificando o posicionamento jurisprudencial da 6ª Turma.
Destarte, a defesa postulou novo pedido para reanálise do cálculo frente ao Juízo da Vara de Execuções Penais de Gurupi, considerando que o Superior Tribunal de Justiça pacificou seu entendimento no sentido de reconhecer que, em razão da omissão legal do inciso VII do artigo 12 da LEP, não há como aplicar de forma extensiva e prejudicial o percentual de 60% (sessenta por cento).
O Ministério Público se manifestou pelo indeferimento do pedido, entendendo que a matéria já havia sido discutida anteriormente nos próprios autos, que inclusive com interposição de recurso pelo próprio MP, provido pelo Tribunal de Justiça do Tocantins. Deste modo, nos mesmos termos da acusação, o juiz a quo indeferiu a reanálise do pedido.
Contudo, posteriormente a Defensoria Pública do Estado do Tocantins, por intermédio da Classe Especial de Defensores impetrou o habeas corpus com pedido de liminar em favor do reeducando, alegando constrangimento ilegal decorrente da decisão que alterou a pena de 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses para o percentual de 60% (sessenta por cento), sendo que deveria estar em 40% (quarenta por cento), conforme o inciso V do artigo 112 da LEP, eis que o paciente é reincidente em delito comum; requerendo a adequação do percentual da referida pena para fins progressão de regime.
O Superior Tribunal de Justiça não conheceu o HC N° 656478 – TO (2021/0096805-7), mas concedeu a ordem de ofício para anular o acordão estadual e reestabelecer o veredito do Juízo da Vara de Execuções Penais de Gurupi, ou seja, o cálculo de pena foi retificado e a porcentagem da pena em questionamento passou a ser contabilizada em 40% (quarenta por cento).
Desta forma, observa-se o que a Defensoria Pública possui um trabalho árduo para garantir o que é direito estabelecido pela Carta Magna, conforme prevê o inciso XL do artigo 5° “a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu”. Este trabalho desenvolvido a fim de zelar pela manutenção do processo de execução penal de indivíduos privados de liberdade é exercido constantemente em todas os órgãos de execuções penais espelhados pelas unidades da Defensoria Pública do Estado do Tocantins. (CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 1988)
2.2. REQUERER AO JUIZ DA EXECUÇÃO OU À AUTORIDADE ADMINISTRATIVA PARA INSTAURAÇÃO DE SINDICÂNCIA OU PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO EM CASO DE VIOLAÇÃO DAS NORMAS REFERENTES À EXECUÇÃO PENAL (art. 81-B, inciso IV)
A Defensoria Pública do Estado do Tocantins por intermédio do núcleo aplicado das minorias e ações coletivas (NUAMAC), interpôs um incidente coletivo de excesso e desvio na execução com pedido de liminar, considerando que havia diversas ilegalidades na execução da reprimenda em regime semiaberto nas Unidades Prisionais de Taguatinga e Aurora do Tocantins.
Segundo o Defensor Público que pleiteou a ação, informou que “os reeducandos são obrigados a pernoitar na cadeia pública, em condições insalubres e inadequadas, numa sala administrativa improvisada como dormitório, o que coloca os servidores e agentes do estabelecimento prisional em situação de insegurança”. (DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO TOCANTINS,2020).
Verifica-se que diante da violação das normas referentes à Execução Penal, ausente estabelecimento penal adequado para o cumprimento da pena no regime semiaberto, a Defensoria Pública da Comarca de Dianópolis pleiteou um pedido requerendo a adequação na execução da pena de forma menos rigorosa, por ser medida de política criminal e reintegração social, fazendo jus ao princípio da dignidade da pessoa humana.
De fato, a Defensoria Pública como órgão de execução penal vai além de inspeções em unidades penais, a atuação é ativa e permanente. Semanalmente são realizados atendimentos jurídicos aos reeducandos que se encontram no cárcere, bem como aos reeducandos que estão em regime semiaberto, aberto e a seus familiares nas sedes das defensorias públicas; periodicamente são realizados pedidos de progressões de regime; além de outras atividades que LEP conferiu no artigo 81-B.
3 O ÓRGÃO DE EXECUÇÃO PENAL COMO INSTRUMENTO DE EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS E PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS
A Lei de Execução Penal possui o encargo de disciplinar o regramento capaz de efetivar as disposições da sentença penal condenatória, decisão criminal, visando zelar pelos direitos dos presos provisórios ou condenados, e também os direitos dos inimputáveis, os quais poderão ter suas liberdades restringidas a tratamento ambulatorial, internação em hospital de custódia ou internação em hospital psiquiátrico.
Durante a execução da pena são necessários vários atos para a manutenção das garantias, como por exemplo a requisição de juntada de certidão de remições, requisição de certidão de bom comportamento carcerário e etc.; essa tutela dos direitos se inicia na prisão provisória do acusado até a extinção da punibilidade.
O artigo 1° da lei supramencionada deixa claro que o objetivo do ordenamento jurídico é buscar a integração social do condenado ou internado, por meio de duas formas: punir e humanizar, essa punição possui limites, sendo assim, para que haja pleno exercício na execução da pena de modo que não viole o direito humano.
Conforme observa o professor Paulo Lúcio Nogueira, os princípios no âmbito da execução penal são indispensáveis, principalmente o da humanidade, analisemos:
É indispensável a existência de um processo, como instrumento viabilizador da própria execução, onde devem ser observados os princípios e as garantias constitucionais a saber: legalidade, jurisdicionalidade, devido processo legal, verdade real, imparcialidade do juiz, igualdade das partes, persuasão racional ou livre convencimento, contraditório e ampla defesa, iniciativa das partes, publicidade, oficialidade e duplo grau de jurisdição, entre outros. Em particular, deve-se observar o princípio da humanização da pena, pelo qual deve-se entender que o condenado é sujeito de direitos e deveres, que devem ser respeitados, sem que haja excesso de regalias, o que tornaria a punição desprovida da sua finalidade” (MARCÃO, apud, NOGUEIRA, p.37)
Deste modo, verifica-se que a jurisdição exercida pelo Estado com o objetivo de solucionar os conflitos sociais possui um parâmetro nas leis e princípios, sendo imprescindível essa limitação para que as sentenças e decisões sejam justas e legais. À vista disso, serão abordados em tópicos os principais princípios no âmbito da execução penal para termos uma visão da teoria e prática.
3.1. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE
O princípio da legalidade está permanentemente ligado ao Direito Penal, considerando que o primeiro artigo do Código Penal já evidência a garantia do direito e distribuição dos deveres em conformidade com a lei.
Além disso, esclarece que os atos judiciais e administrativos no âmbito da execução penal são vinculados à lei e ao princípio em comento, até mesmo aqueles atos praticados por agentes públicos que possuam poder discricionário, pois, toda decisão deve ser fundamentada, assim, não os retira o cumprimento do princípio da legalidade.
O Ilustre Doutrinador Aleix Couto de Brito, afirma que o princípio da legalidade é:
É importante deixar claro que, quando se afirma que a legalidade deve ser obedecida na execução, um dos aspectos mais importantes diz respeito à restrição de direitos. Os direitos e benefícios da execução da pena que enumeram os requisitos para concessão somente poderão possuir algum tipo de restrição quando previstos em lei. (BRITO, 2019, p. 69)
Um exemplo que demonstra na prática a aplicabilidade do princípio da legalidade é quando o magistrado ou autoridade administrativa não podem utilizar-se de suas discricionariedades e negarem um benefício com base em fundamentos próprios, pautando-se em merecimento por parte do beneficiário, ou seja, se a lei não determinar certo requisito para a obtenção do benefício, não pode o juiz ou autoridade administrativa exigi-lo, devendo estes sempre se pautarem na lei nos e princípios.
3.2. PRINCÍPIO DA HUMANIDADE
Outro princípio primordial para o regimento da lei de execução penal é o da humanidade, considerando que este implica que o cumprimento da pena seja humano e responsável, devendo sempre levar em consideração a personalidade de cada preso, e em face dessa caracterização propor uma sanção humanizada e ressocializável, capaz de inserir o apenado à vida em sociedade.
Contra todas as formas de abuso e desumanidade que muitos presos sofreram no passado por meio de penas absurdas (prisão perpetua, pena de morte, tortura) e que persiste em permanecer até os dias de hoje, este princípio é uma proteção contra o Estado, que jamais poderá configurar a pena como uma vingança social.
Em razão do passado opressor, a Carta Magna consagrou em vários artigos sobre o princípio da humanidade, no qual podemos destacar são os artigos 1º, inciso III; o artigo 4º, inciso II, que dispõe sobre a prevalência dos direitos humanos na relação internacional entre o Brasil e outros países; artigo 5°, inciso III e XLVII.
Também há a previsão constituída na Declaração dos Direitos Humanos, artigo 5° que expressa que “ninguém será submetido à tortura, nem a tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante”. (DECLARAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS, 1948).
Expressivamente, este princípio está relacionado a um caso que a Defensoria Pública por meio do NADEP atuou em favor dos reeducandos que se encontravam enclausurados na Cadeia Pública de Miracema, os quais relataram que estavam sofrendo ameaças, agressões físicas e torturas na unidade prisional. Após a vistoria a Defensoria Pública requereu por meio de ofícios e recomendações o fim das agressões. (DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO TOCANTINS, 2018).
3.3. PRINCÍPIO DA INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA
A individualização da pena tem início na seara legislativa, quando o legislador decidiu de acordo com cada delito estipular limites máximos e mínimos para a aplicação da pena.
Posteriormente, o juiz deve considerar as circunstâncias judiciais para definir a pena em concreto. De acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do acusado, a personalidade social e os antecedentes criminais, será levado em consideração para a aplicação da pena, razão pela qual há uma diferenciação entre os tipos e a aplicabilidade da reprimenda, senão vejamos o artigo 5°, inciso XLVI da Constituição Federal:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
XLVI - a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes:
a) privação ou restrição da liberdade;
b) perda de bens;
c) multa;
d) prestação social alternativa;
e) suspensão ou interdição de direitos;
Em seguida, após a sentença penal condenatório, o apenado será identificado e classificado de acordo com sua personalidade e antecedentes criminais, para que receba orientação quanto ao adequado cumprimento da pena.
Este princípio tem por objetivo humanizar os olhares das autoridades judiciais e administrativas para enxergar o condenado como um ser humano, ser que possui direitos e necessidades diferentes de acordo com sua personalidade e antecedentes criminais. Diante da classificação de cada reeducando, é necessário buscar equidade para que todos possam ter assistência.
Para Rodrigue Duque Estrada Roig a individualização da pena só é alcançada quando produz redução de danos na execução penal, analisemos:
Além disso, partindo das premissas de que o princípio individualizador possui assento constitucional e que a Constituição de 1988 instituiu o dever jurídico-constitucional de minimização de danos, faz-se necessário concluir que a individualização da execução somente se mostra constitucional quando operada no sentido redutor de danos (como, por exemplo, a flexibilização das regras do regime de cumprimento de pena, permitindo a imposição de regime menos gravoso não em função do texto de lei, mas em virtude da necessidade de individualização).(ROIG, 2018, p. 38)
Deste modo, verifica-se que o princípio da individualização da pena possui vários liames, os quais buscam uma melhor forma de cumprimento da pena, buscando tirar os danos causados e enraizados trazidos pelo passado do sistema criminal.
3.4. PRINCÍPIO DA INTRANSCENDÊNCIA
Por fim e não menos importante, o princípio da intranscendência preceitua que a pena não pode passar da pessoa do criminoso, conforme artigo art. 5º, XLV, da CF e art. 5 º, item 3°, da Convenção Americana de Direitos Humanos.
No entanto, a realidade das unidades penitenciárias brasileiras são outras, considerando que não são todas comarcas que possuem unidades de tratamento penal, o que afasta o reeducando de sua família.
Ademais, outro exemplo claro que demonstra a violação deste princípio é a restrição de visita como forma de sanção administrativa, tirando do apenado a única assistência afetiva que possui durante a execução da pena, que é de sua família, quebrando o vínculo entre os entes queridos, que são a base para a ressocialização.
O Doutrinador Rodrigo Duque Estrada Roig crítica a restrição de visita como meio de sanção disciplinar, consideremos:
Em âmbito executivo, é possível apontar como exemplo de violação ao princípio da transcendência mínima o emprego da proibição ou restrição de visita como forma de sanção disciplinar (arts. 41, parágrafo único, e 53, III, da LEP). Isso porque não somente o preso possui o direito de receber seus visitantes (art. 41, X, da LEP) e receber assistência da família (art. 5º, LXIII, da CF), mas os próprios visitantes também têm direito de estar com seus parentes e amigos presos e com eles manter laços afetivos. Além de ilegal por afetar o direito (do preso e de seus familiares) à manutenção de relações familiares, a punição nesse caso ainda passaria da pessoa do faltoso, atingindo terceiros carentes de culpabilidade. Assim posto, mesmo diante de uma falta disciplinar praticada pela pessoa presa, a suspensão de visitação não deve ser utilizada como punição, e em hipótese alguma pode conduzir à privação do direito de seu familiar. (ROIG.2018, p. 37)
Além disso, há outros meios que se entendem como violação ao princípio em comento, são a restrição ao direito de visita íntima aos condenados, considerando que o exercício da sexualidade é um direito manifesto da dignidade da pessoa humana, que traz a pessoa tolhida de liberdade e ao seu companheiro ou sua companheira a preservação dos laços afetivos.
A revista íntima, qual é manual e vexatória também faz parte desse contexto de violação, de acordo com o art. 5º da Resolução CNPCP n. 09/2006: “a critério da Administração Penitenciária a revista manual será feita, sempre que possível, no preso visitado, logo após a visita, e não no visitante”. (RESOLUÇÃO Nº 09,2006)
Verifica-se que, ausente imposição legal para limitar o sistema de punição do sistema de execução penal, os apenados sofreriam muitos abusos. É imprescindível no convívio em sociedade normas garantidoras e também normas que aplicam deveres, evitando exceções.
Portanto, diante o exposto, entende-se que órgão de execução penal não foi criado com mero intuito de regular questões relativas ao cárcere, mas está inteiramente ligado a pessoa do condenado, condenada, estando este cumprindo pena dentro ou fora da unidade penal, ou sendo incapaz, que cumpre medida de segurança.
O Órgão de Execução Penal é instrumento para fiscalização e efetivação dos direitos dos que dependem de outrem para a buscar a manutenção de seus processos, e como foi explanado, a Defensoria Pública do Estado do Tocantins tem cumprido esse papel, visitando semanalmente os apenados em sede de unidades penais, e atendendo e orientando seus familiares, dentre outras diversas atividades exercidas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esta pesquisa se propôs, como objetivo geral, apresentar a atuação prática da Defensoria Pública do Estado do Tocantins como Órgão de Execução Penal, um estudo que se iniciou com o histórico do acesso à justiça gratuita no Brasil, discorrendo sobre a instituição da Defensoria Pública até a recém incumbência recebida para atuar como Órgão de Execução Penal.
Por meio do estudo, verificou-se que o acesso à justiça não foi originado pela Constituição de 1988, mas, essa garantia só foi recepcionada como clausula pétrea pela Carta Magna, que diante do complexo de desenvolvimento da garantia fundamental também instituiu a Defensoria Pública como órgão garantidor de maior prestação de assistência jurídica e disseminador da igualdade social no Brasil.
Posteriormente foi explanado sobre as atividades desenvolvidas pela Defensoria Pública do Estado do Tocantins após receber a missão de ser Órgão de Execução Penal. Verificou-se que as atribuições desempenhadas se tratam de rol meramente exemplificativo, não se esgotando as possibilidades de interferência, pois o objetivo principal do Órgão é a participação ativa para buscar tutelar os direitos dos reeducandos.
Foi demonstrado a importância do Órgão de execução penal para a efetivação dos direitos e garantias fundamentais dos reeducandos, considerando que por meio dos Defensores e Defensoras Públicas é que os apenados conseguem receber assistência jurídica integral, bem como seus familiares.
Portanto, conclui-se que a Defensoria Pública do Estado do Tocantins como Órgão de Execução Penal é imprescindível à garantia individual e coletiva dos direitos das pessoas presas, assegurando assim, seus direitos legais e constitucionais.
REFERÊNCIAS
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[1] Qualificação do orientador: Professor Especialista do Curso de Direito da Universidade de Gurupi- Unirg.
Bacharelanda do Curso de Direito da Universidade de Gurupi- Unirg.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SOUTO, Lorrayne Batista. A atuação da Defensoria Pública do Estado do Tocantins como órgão de execução penal Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 01 jun 2021, 04:23. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/56608/a-atuao-da-defensoria-pblica-do-estado-do-tocantins-como-rgo-de-execuo-penal. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Nathalia Sousa França
Por: RODRIGO PRESTES POLETTO
Por: LEONARDO RODRIGUES ARRUDA COELHO
Por: Gabrielle Malaquias Rocha
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