ADRIANA RIBEIRO DE FREITAS
(coautora)
WAGNER VILAÇA
(orientador)
Resumo: O direito à saúde no Brasil adveio de um longo processo histórico, com reflexos principalmente ao que se refere ao plano econômico, social e político. Diante disso, a Constituição de 1988 trouxe em seus dizeres os direitos fundamentais, dentre eles, está o direito a saúde, este esboça o dever do estado de prestar através de políticas focadas na saúde pública, a garantia de assistência à saúde como direito de todos os brasileiros. Fundamenta-se exatamente nessa evolução histórica, a criação do SUS (Sistema Único de Saúde), com ele surge também as críticas negativas e positivas, os anseios da sociedade diante da não efetividade ou de uma assistência à saúde não efetiva, e ainda as limitações das políticas públicas no que se refere ao princípio da reserva do possível. Face ao exposto, com a presente monografia busca-se analisar quais são as limitações existentes no exercício do direito à saúde, os impactos quanto ao fornecimento de medicamentos pelo Poder Público, especialmente os conflitos que surgem diante dos princípios, da reserva do possível, do mínimo existencial e da dignidade da pessoa humana, quando é decidido fazer cumprir o direito à saúde de determinado indivíduo, restringindo de certa forma este direito de um grupo de pessoas. Por fim, é indispensável a aplicabilidade dos direitos fundamentais, dentre estes, o direito à saúde, lado outro, é também essencial o cumprimento das políticas públicas de forma efetiva, pois o órgão tem a ciência da distribuição das verbas para cada setor, sendo assim, o defrontamento desse tema é de suma importância na esfera jurídica e social.
Palavras-chave: Fornecimento de Medicamentos pelo Poder Público, Políticas Públicas e o Direito à saúde, Mínimo Existencial e a Reserva do Possível.
Abstract: The right to health in Brazil came from a long historical process, reflecting mainly on the economic, social and political plan. In view of this, the 1988 Constitution brought in its sayings the fundamental rights, among them, is the right to health, this outlines the duty of the state to provide, through policies focused on public health, the guarantee of health care as the right of all The Brazilians. The creation of SUS (Unified Health System) is based exactly on this historical evolution, with which negative and positive criticisms also arise, the anxieties of society in the face of ineffectiveness or ineffective health care, as well as limitations public policies regarding the principle of reserving the possible.
In view of the above, this monograph seeks to analyze what are the existing limitations in the exercise of the right to health, the impacts on the supply of medicines by the Government, especially the conflicts that arise in the face of the principles, the reserve of the possible, the minimum existential and the dignity of the human person, when it is decided to enforce the right to health of a certain individual, restricting in some way this right of a group of people. Finally, the applicability of fundamental rights is indispensable, among them, the right to health, on the other hand, it is also essential to comply with public policies affectively, since the agency is aware of the distribution of funds for each sector, thus, the confrontation of this theme is of paramount importance in the legal and social spheres.
Keywords: Supply of Medicines by the Public Power, Public Policies and the Right to Health, Minimum Existential and the Reserve of the Possible.
O presente trabalho de conclusão de curso busca examinar quais são as limitações existentes no sistema de saúde que geram impactos no exercício desse direito, bem como no que se refere ao fornecimento de medicamentos pelo Poder Público, mais especificamente, os conflitos que surgem diante dos princípios, da reserva do possível, do mínimo existencial e da dignidade da pessoa humana, quando da decisão de escolha para beneficiar um determinado indivíduo, e não um grupo de pessoas.
Diante a isso, vale ressaltar que as problemáticas no setor de saúde é anterior e contemporâneo ao século atual, sabe-se que o direito é o instrumento que baliza os interesses conflitantes, através de interpretação sistemática de todo ordenamento jurídico, utilizando da hermenêutica e dos fatos sociais para que se cumpra a justiça e mantenha a segurança jurídica. Nessa concepção, é válido dizer que haverá situações em que os três poderes ainda que no intuito de preservar o máximo dos direitos fundamentais estabelecidos pela Carta Magna, deparar-se-á com a escassez de recursos econômicos, pois é sabido que a União, DF, estados e municípios não produz, isto é, apenas arrecada através de tributos, porém permanece o dever de prestação desses direitos, sendo assim proporciona ao tema apresentado fundamental relevância na compreensão da norma, das decisões do poder judiciário, e ainda da complexidade do juízo de ponderação, no que tange principalmente ao fornecimento de medicamentos e a assistência à saúde.
Desta forma, surgem alguns questionamentos, por exemplo, como é realizado esse juízo de ponderação? Há hierarquia entre reserva do possível e o mínimo existencial? O poder judiciário deve observar as políticas públicas ao decidir sobre fornecimento de medicamento ou outro tipo de assistência à saúde? O Estado/entes federados deve fornecer qualquer tipo de medicamento?
Por fim, é evidente e necessário verificar os dois lados, isto é, do Estado como prestador de obrigação imposta pela Constituição de 1988 e o indivíduo como aquele investido dos direitos abarcados na norma suprema, torna-se algo indispensável para compreender a aplicabilidade dos direitos fundamentais, dentre estes, o direito à saúde e, lado outro, é essencial o cumprimento das políticas públicas de forma efetiva, pois o órgão tem a ciência da distribuição das verbas para cada setor, portanto, o enfrentamento desse tema é de suma importância no âmbito jurídico e social.
Os princípios são normas que possuem grau elevado de abstração, com definições muito abertas, são eles que abrirão o caminho ou nortearão a norma regra, sendo assim, vale destacar que tantos os direitos fundamentais como os princípios que serão abordados neste tópico, estão associados às políticas públicas e à saúde.
Primeiramente, cabe traçar cada um dos princípios que conecta-se com este tema. A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, traz consigo muitos princípios importantes para o ordenamento jurídico, dentre eles, vejamos os conseguintes princípios: o princípio da Dignidade da pessoa humana, da Reserva do possível e, ainda, os princípios da razoabilidade e proporcionalidade.
Como já exposto, uma característica da norma princípio é com relação ao seu conceito aberto, não se faz diferente na compreensão do princípio da Dignidade da pessoa humana, este que fundamenta várias questões, inclusive no que se refere à questões sociais, ambientais, psicológicas e também com relação a existência do próprio ser humano, dentre muitas outras situações a qual este princípio se faz oportuno.
Entretanto, busca-se cada vez mais chegar ao entendimento de seu conceito, os autores do Livro Democracia e Direitos Fundamentais: Uma Homenagem aos 90 anos do Professor Paulo Bonavides, retrata o seguinte:
É inegável a dificuldade de se trabalhar com esse princípio ante a circunstância de tratar-se de conceito com contornos vagos e imprecisos, de ostentar natureza polissêmica, mostrando-se problemática a definição do âmbito de proteção. Mesmo Assim, O Tribunal não se furta a enfrentar a temática e vem procurando expandir os sentidos normativos da dignidade da pessoa humana para obter a melhor realização do princípio no plano concreto, construindo jurisprudência valorosa de concretização dos direitos fundamentais. (LINHARES; SEGUNDO; ROCHA NETO, 2016, p.26) (GRIFO NOSSO)
Portanto, pode-se dizer que uma das grandes dificuldades na aplicação de tal princípio, está exposto principalmente em sua extensão protetiva, qual o limite de proteção desse princípio? Trata-se de questionamento muito comum no ambiente jurídico e que ainda persiste nos dias atuais.
Outro importante princípio é a Reserva do possível, dentro deste princípio busca-se concretizar outros princípios não irrelevantes para a economia e planejamento do executivo, bem como o próprio fundamento da ordem jurídica de nosso país, porém antes de adentrarmos em um campo mais profundo do tema, vale explanar acerca do conceito da Reserva do possível, vejamos os autores Ada Pellegrine e Kazuo Watanabe: “A implementação de uma política depende, em primeiro lugar, de disponibilidade financeira – a chamada reserva do possível.[...]”
Cabe esclarecer que a União, bem como os entes federados, não produzem, isto é, não tem outra forma de arrecadar recursos sem que utilize dos instrumentos previstos na Constituição de 1988.
Nesse sentido, com finalidade de cumprir a obrigação de prestar certos direitos fundamentais e ao mesmo tempo cumprir com o fundamento do referido dispositivo, e ainda, sob sua supervisão é que são criados os tributos, claro obedecendo a competência esboçada em tal norma supramencionada.
Desse modo, depreende-se que a Reserva do possível está diretamente relacionado com os recursos angariados pela União e entes federados, com objetivo de limitar de certa forma direitos fundamentais individuais, afim de atingir o interesse da maioria.
Esclarecido o princípio da reserva do possível, passamos agora a tratar dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade. A razoabilidade, segundo Ada Pellegrine e Kazuo Watanabe, “mede-se pela aplicação do princípio constitucional da proporcionalidade. O princípio da proporcionalidade significa, em última análise, a busca do justo equilíbrio entre os meios empregados e os fins a serem alcançados.” Portanto, os dois princípios andam juntos, com relevante aplicação no que se refere ao equilíbrio entre os direitos fundamentais e os meios aos quais serão utilizados para alcança-los.
Vale destacar que os princípios expostos até aqui, estão interligados com a execução das políticas públicas no Brasil. Tais princípios abrem grande espaço para diversas opiniões acerca das decisões que vem sedo tomadas pelo poder Judiciário a respeito do direito à saúde no âmbito macro e micro de tal problemática, naqueles conflitos que carregam tanto o interesse individual, quanto o interesse da maioria, e que trazem também reflexos na continuidade do planejamento orçamentário preparado para atender todas demais áreas que precisam de verbas.
Entretanto, faz se necessário trazer ao conhecimento os direitos que envolvem com tanta frequência nos debates jurídicos acerca do tema aqui exposto, e que muito tem a ver com os princípios supracitados. Dito isso, os direitos são inerentes do ser humano em convivência com o todo, de toda relação humana pode-se extrair direitos e deveres. De forma simples, direito é o interesse protegido pela ordem jurídica, esta investe de poder aquele que detém tal interesse, seja de agir, fazer ou deixar de fazer.
Nesse sentido, preliminarmente, o direito do mínimo existencial, é dizer para o detentor do direito que à ele cabe um conjunto de condições materiais fundamentais e vitais, sendo seu desfecho a efetiva dignidade daquele ou de qualquer outro detentor do direito.
Portanto, é imprescindível sua aplicação, pois ao descumpri-lo significará desrespeito ou infringência ao mandamento constitucional, nesse caso entende-se que haverá supressão de direito fundamental para a existência humana. Conforme entendimento dos autores Ada Pellegrine e Kazuo Watanabe:
O mínimo existencial é considerado um direito às condições mínimas de existência humana digna que exige prestações positivas por parte do Estado: “A dignidade humana e as condições materiais de existência não podem retroceder aquém de um mínimo, do qual nem os prisioneiros, os doentes mentais e os indigentes podem ser privados”.
Para Ana Paula de Barcellos, o mínimo existencial é formado pelas condições básicas para a existência e corresponde à parte do princípio da dignidade da pessoa humana à qual se deve reconhecer eficácia jurídica e simétrica, podendo ser exigida judicialmente em caso de inobservância.
Costuma-se incluir no mínimo existencial, entre outros, o direito à educação fundamental, o direito à saúde básica, o saneamento básico, a concessão de assistência social, a tutela do ambiente, o acesso à justiça. (GRINOVER, WATANABE, 2013, p.132)
Com base nas explanações dos autores, é evidente que trata-se de direito elementar para o ser humano, bem como diz respeito aos direitos à vida digna e à saúde, direitos constitucionalizados de grande relevância nas relações jurídicas e sociais.
Nesse diapasão, surgem questionamentos, como por exemplo, o que é a vida digna para o Estado? Existem limites no exercício do direito à saúde? Ao analisar a primeira pergunta, fica evidente que apesar de tais direitos constarem na Carta Magna, de que não cumpri-los é se opor a norma suprema, contudo, não é possível enxergar a efetividade destes direitos na sociedade brasileira, que ainda sofre com muita miséria, existe ainda, um “paredão” de desigualdade social no Brasil.
Quanto ao segundo questionamento, vale ressaltar que não há hierarquia entre princípios constitucionais e norma regra constitucional, portanto o direito à saúde sim deve ser concretizado, porém precisa-se analisar profundamente, sobre a capacidade do Estado como garantidor de todos os direitos positivos ou prestacionais, que exige o agir deste. Entretanto, abrir espaço para tratar de assuntos como este tão polêmico e interessante é dar a oportunidade para que seja encontrada a solução, assim, todos são beneficiados.
Ademais, precisamos acreditar que as políticas públicas desenvolvidas e executadas pelos governantes eleitos pelo povo, estão buscando através de seu atos administrativos a aplicação da segurança jurídica e o interesse público. Que o poder executivo e legislativo estão pautando-se, principalmente, nas necessidades da população, e que o poder judiciário está cumprindo seu papel de guardião dos preceitos da Constituição de 1988.
É importante trazer ao conhecimento de forma simplista o conceito de políticas públicas, deixando claro que este assunto tem variados entendimentos pelas disciplinas que o cerca. Bem, a política está diretamente relacionada ao poder, ou seja, todo aquele que investe de poder está também investido de política, portanto, a política pública são ações positivas (obrigação de fazer) do poder que influenciará diretamente a toda sociedade, pode-se dizer que os direitos fundamentais prestacionais, principalmente, são exemplos de ações que devem ser implementadas no seio social, e assim concluem-se em políticas públicas.
Diante a tal consideração, o autor Felipe de Melo Fonte, trata da seguinte maneira em sua obra Políticas públicas e direitos fundamentais:
De modo geral, os estudiosos do direito tratam as políticas públicas como meios para a efetivação de direitos de cunho prestacional pelo Estado (objetivos sociais em sentido lato), sem embargo de sua importância para a efetivação de direitos fundamentais. Esta assertiva vale inclusive para a doutrina estrangeira. Este é um ponto consensual entre os estudiosos do assunto que deve ser sublinhado, pois implica reconhecer nos direitos sociais e nos demais direitos fundamentais o objetivo final de algumas das políticas públicas executadas pelo Estado (certamente não de todas, frise-se, como será explicado adiante). [...] (FONTE, 2015, p.48) (GRIFO NOSSO)
Portanto, as políticas públicas tem um papel evidentemente importante ao tratar de direito em acesso à saúde, ao fornecimento de medicamentos à população, bem como com relação ao princípio da reserva do possível, e demais princípios já expostos, pois são elas que materializará o direito transcrito na Constituição.
Por fim, os princípios, os direitos, bem como os conceitos aqui discutidos, reforçam que o debate, a busca para obter conhecimento, com a finalidade de solucionar as mazelas de nosso país, diante de tantos problemas sociais, e principalmente, aquelas que envolvem políticas públicas e direitos tão significativos para a existência humana, é o caminho para a evolução e a conquista do equilíbrio nas relações jurídicas e sociais.
O Sistema Único de Saúde (SUS) tem fundamento na Constituição de 1988, quando foi consagrado o artigo 196. De forma resumida, o artigo mencionado, rege que o direito à saúde está para todos e este é um dever do Estado, garantir, proteger, prestar, utilizando das políticas sociais e econômicas para alcançar igualitariamente o acesso de todos a este direito (BRASIL, 1988).
Portanto, o SUS é um instrumento nacional criado para equalizar a sociedade, com finalidade de maior acessibilidade na assistência à saúde pública, pois permite que haja no seio social, a efetivação da equidade, nada mais é que a igualdade material, para os sujeitos de direitos que nasceram materialmente desiguais (sem condições financeiras por exemplo para pagar determinado medicamento), seja qual for o motivo, assim gerará uma espécie de mecanismo garantidor, pois os cidadãos brasileiros usufruirão sempre que houver necessidade dos programas que compõem este sistema.
Segundo a autora Raphaela Karla de Toledo Solha (2014), a implantação do SUS no Brasil não ocorreu simultaneamente em todas as regiões, alguns municípios demoraram aderir, contundo, posteriormente também implantaram esse sistema. Isso demonstra que já em seu nascimento surgiram dificuldades, seja por motivo de diferenças regionais ou por questões políticas públicas.
Dentre tantos problemas ou dificuldades por assim dizer, alguns persistem até os dias atuais, sobre essa explanação, vejamos o que diz a supramencionada autora:
Entre os desafios para a implementação do SUS, podemos relatar: interesses político-partidários que fazem com que a gestão do sistema dependa da vontade dos políticos locais; falta de estrutura de muitos municípios para organizar e gerir seus serviços de saúde; falta de profissionais comprometidos com os princípios e diretrizes do SUS, para atuar na gestão e na assistência; pressão do empresariado do mercado de saúde contra o sistema; falta de gestão profissionalizada (não existe uma carreira pública como gestor do sistema); rede prestadora de serviços desarticulada e sucateada; subfinanciamento; baixa participação social no controle do sistema; dependência da rede privada de hospitais para prestação de serviços (como as Santas Casas, hospitais de gestão privada que prestam serviços ao SUS), filas de espera para serviços especializados, entre vários outros problemas. (SOLHA, 2014, p.12)
Fica claro que o sistema vem enfrentando diversos obstáculos, desde seu surgimento. É evidente que a implantação do SUS ainda que não consiga abarcar toda a população brasileira devido as dificuldades elencadas, traz em seu escopo aspectos positivos, como o atendimento as pessoas que sequer teriam condições de entrar em um hospital privado.
Utilizando ainda das lições apresentadas no livro da autora Raphaela Karla de Toledo Solha (2014), destaca-se sua explanação acerca da composição do sistema, traz consigo uma diversidade de serviços, que são direcionados a saúde sem deixar de observar os princípios e diretrizes previstos nas Legislações que o regulamenta (como por exemplo, a Lei de n° 8.080 de 1990), podendo estar em qualquer gestão (âmbito federal, estadual ou municipal). Quando a gestão for federal sua abrangência será determinar regras e fluxos, dando seguimento para os outros âmbitos, que darão diretrizes aos estados e cidades.
Ainda tratando dos serviços exercidos pelo SUS, utilizando como base o Livro Sistema Único de Saúde: componentes, diretrizes e políticas, da autora Raphaela Karla de Toledo Solha (2014), pode se dizer que estrutura-se nas Instituições de Pesquisa, Institutos de controle de qualidade, Laboratórios farmacêuticos oficiais, Agências reguladoras, Laboratório de análise clínica, Serviço (ou equipamentos) de assistência direta à saúde, Escolas Técnicas do SUS, inclusive, o sistema presta assistência de saúde as famílias dos militares das Forças Armadas (Exército, Marinha e Aeronáutica), ressaltando que as Forças Armadas tem papel fundamental nas ações de saúde realizadas em fronteiras e em muitas regiões do Brasil.
Para que o sistema dessa amplitude seja bem coordenado e organizado foi necessário regulamentá-lo, criando leis, portarias, decretos e normas operacionais (regimentos internos), ressaltando que poderão surgir novos dispositivos normativos para melhorar e adequar a gestão do SUS. Como já explicado a Constituição é o “berço” desse sistema de saúde, mas existem várias legislações que o regulamenta, no entanto, não será possível tratar de todas elas, apenas aquelas consideradas principais serão abordadas de maneira geral.
Nesse sentido, abre-se maior destaque nessa temática a Lei Orgânica de Saúde (LOS), que serve de espelho para as leis regionais, e é composta pela junção da Lei de n° 8.080 de 1990, que criou e estabeleceu as regras gerais para a organização e gestão do SUS (BRASIL, 1990), com a Lei de n° 8.142 de 1990, que trata sobre o controle social e repasse de verbas para os municípios (BRASIL, 1990).
Diante ao breve relato da organização do SUS, é possível constatar sua relevância para os cidadãos do Brasil, principalmente, em determinadas regiões que por questões geográficas políticas, são submetidas a realidade miserável no pleno sentido da palavra. Ademais, esse sistema preconiza também o direito à vida, bem importantíssimo em todas as esferas das disciplinas do Direito e tutelado pela Carta Magna do país (art.1°, 6° e 196 da CR/88).
Não se pode esquecer dos aspectos positivos que são consequências da implantação desse sistema. Sobre isso, a autora Raphaela Karla de Toledo Solha, diz o seguinte:
Apesar dos desafios políticos e de gestão para o funcionamento do SUS, muitas conquistas foram feitas: em 2013, cerca de dois terços da população já eram atendidos pelo sistema; 90% dos cidadãos atendidos consideravam o serviço bom/ótimo; o Brasil era o único país do mundo onde transplantes de órgãos eram realizados predominantemente pela rede pública. Houve a reorganização da rede de serviços de vigilância em saúde, a consolidação dos programas de controle de DST/Aids e a expansão dos programas de controle do tabaco e de imunizações, que são referências internacionais, entre outros avanços. (SOLHA, 2014, p.12)
É possível perceber que o sistema trouxe inúmeros benefícios para os cidadãos, no entanto, existem diversas críticas sobre o setor da saúde pública, muitas estão relacionadas ao tempo de espera para usufruir do serviço público de saúde e também com relação a estrutura física para o atendimento da população dependente do sistema (inclui-se a gestão e organização de tais serviços).
Nesse contexto, surgem algumas dúvidas, como por exemplo: Por que o sistema não consegue atender todo o povo brasileiro de forma rápida, sem que haja uma larga lista de espera para determinados exames, cirurgias, fornecimento de medicamentos, dentre outros? Por que os políticos não investem mais no setor da saúde pública? Por que criar um sistema tão problemático, no sentido de não ser tão acessível na prática? São perguntas, comuns de se ouvir em qualquer posto de saúde, UPA, UBS, Hospitais públicos, dentre outros.
As respostas para os questionamentos feitos anteriormente, podem estar em inúmeras situações, algumas pessoas vão dizer que o país necessita de mudança na concentração desses direitos de prestação pública, outros dirão que retirar essa obrigação do estado seria um retrocesso, causando uma perda de garantias enorme, pois trata-se de direito individual e fundamental.
Portanto, pode ser que a resposta esteja por exemplo nas políticas públicas, isto é, mais ações positivas dos governantes no momento do planejamento orçamentário, talvez a complexidade e abrangência do sistema para um país tão populoso seja algo que demore muitos anos para gerar um conforto e materializar de fato a equidade na saúde, a inconstância na ideologia política pode gerar uma problemática na evolução do sistema (crise política), tudo isso pode ser a causa geradora de tanto descontentamento.
Dito isso, faz-se oportuno trazer a reflexão a seguinte consideração, pode existir algumas consequências em ter um Estado tão garantidor, por exemplo grande carga tributária, pois é sabido que a máquina pública não tem atividade de produção de serviços ou mercadorias, não produz, e sim arrecada, mas arrecada de quem? Esta é uma reflexão para todos que criticam o sistema, bem como os políticos, para garantir a assistência à saúde e não ocorrer restrição de direito, o Estado precisará aumentar cada vez mais a carga tributária, isso acompanhado a uma excelente gestão pública.
Certamente, existem outros questionamentos ou prováveis soluções no campo do pensamento (imaginação) de alguns cidadãos, políticos, estudiosos e etc., mas até o atual momento o setor da saúde ainda é palco de conflitos sociais e frequentemente está presente em muitas decisões judiciais, principalmente quando envolve o fornecimento gratuito de medicamentos de valores exorbitantes para atender apenas um indivíduo especificamente.
Diante ao exposto, é importante comentar que no caso de fornecimento de medicamentos gratuitos é observada uma lista de medicamentos correlacionados pela ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), isto é, apenas aqueles reconhecidos por este órgão é que poderão ser objeto de consumo para qualquer cidadão, além de, ser necessário a judicialização para fazer com que a União, DF, estados ou municípios forneça o valor do medicamento para que o indivíduo tenha o exercício de sua saúde e no mínimo uma vida digna.
Por fim, o sistema SUS, é uma ferramenta muito interessante para o país, no entanto, é também associado a muitos pontos negativos o que faz com que seja desvalorizado, que não tenha a importância que deveria ter. Ao longo desse tópico foram demostradas suas dificuldades desde sua organização, estrutura física até a prestação de seus serviços, ficou esclarecido também que exerce uma complexidade de atividades e serviços à sociedade e que seu papel fundamental é a assistência à saúde pública, e que para tanto necessita além de sua existência, um conjunto de ações políticas para dar efetividade aos seus serviços.
O direito de acesso à saúde, bem como o dever do Estado em prestar a assistência à saúde, estão constitucionalizados na Carta Magna, o primeiro trata-se de direito inerente da pessoa humana, já o segundo é a contrapartida do Estado para com todos os cidadãos, em outras palavras, é uma obrigação de prestar do Estado, em decorrência daquilo que estabelece a ordem jurídica do Brasil. Sobre tal obrigação do Estado, vejamos como explana o autor, Paulo Gustavo Gonet Branco:
A concepção da Constituição como ordem de valores ganha relevo doutrinário expressivo na Alemanha, a partir do caso Lüth. Dali se espraia pelo continente europeu e pela América Latina. Ganha força a noção de que a Lei Fundamental não é axiologicamente neutra, mas configura um sistema de valores que afeta todo ordenamento jurídico e que enseja a obrigação de o Estado não apenas se abster de interferir no âmbito protegido pelos direitos fundamentais, como também obrar positivamente, fomentando e concretizando tudo o que se preste para a realização máxima desses valores veiculados nas normas jusfundamentais, mesmo que essa ação não seja exigida a partir de uma pretensão decorrente de um direito subjetivo de alguém em concreto. (BRANCO, 2009, p.61) (GRIFO NOSSO)
Sobre o que diz o autor Paulo Gustavo Gonet Branco, pode ser observado que o Estado está na posição de provedor de ações para alcançar o direito do indivíduo, utilizou da palavra fomentar, isto é, criar meios e formas para que os direitos que dependam de sua presteza sejam alcançados por todos os pertencentes da nação.
No tocante a norma constitucional (regras e princípios), é Importante esclarecer, que não há hierarquia entre normas constitucionais, sendo assim, todas as normas constitucionais carregam o mesmo peso no ordenamento jurídico, isto é, não há predominância entre elas, mas sim a aplicação de ambas com proporcionalidade.
Nesse contexto, quando ocorre conflito entre normas constitucionais, torna-se necessário a judicialização de tal conflito para que seja realizado o chamado juízo de ponderação, este tem como finalidade garantir que as normas constitucionais sejam concretizadas ao máximo, sem permitir que haja “hierarquia” entre elas, mas sim a concretude máxima e simultânea de cada uma delas no caso concreto que se insere o conflito. O juízo de ponderação ocorre no controle de constitucionalidade que é realizado pelo poder judiciário no momento de julgar e processar determinadas situações em que há dúvida se houve ou não o exercício do direito constitucional.
A fim de traçar melhor entendimento acerca desse tema, o autor Paulo Gustavo Gonet Branco, diz o conseguinte:
A própria estrutura normativa dos direitos fundamentais, ressalta Sweet, “constitui implícita delegação de enorme autoridade discricionária para os juízes constitucionais” e convida a exercícios de ponderação no momento de “deliberar sobre os limites de um dado direito constitucional de um indivíduo ou um grupo que entra em conflito com outro direito individual ou interesse constitucional do governo”. De fato, o aspecto extremamente aberto de certos direitos fundamentais que as cortes são chamadas a interpretar e aplicar – como o princípio da dignidade da pessoa humana e o direito ao livre desenvolvimento da personalidade – estimulam o poder discricionário da jurisdição constitucional. (BRANCO, 2009, p.45) (GRIFO NOSSO)
Portanto, o judiciário tem um papel muito significante na resolução dos conflitos entre normas, ele é investido de autoridade que advém da Constituição de 1988. Ao judiciário caberá realizar o juízo de ponderação, utilizando dos sistemas de interpretação das normas (hermenêutica) nas tomadas de decisões do caso concreto, com finalidade de trazer a pacificação e a realização dos direitos que permeiam o conflito.
Sendo assim, a figura do juiz aparecerá sempre que houver pretensões resistidas (litígio) entre sujeitos de direitos e suas diversas relações sociais, para restabelecer aquilo que foi proposto pelo legislador no momento da constituinte da ordem jurídica. O autor Paulo Gustavo Gonet Branco, trata dessa relevância do judiciário da seguinte maneira:
[..] Importante para Bachof não é a definição do tipo de mandato que o juiz exerce, mas, antes, ter em conta que ele administra a justiça em nome do povo, em função que se desenrola em constante e contínuo diálogo com as partes litigantes, com os colegas do tribunal, com os inumeráveis outros tribunais, com o mundo técnico-jurídico e com a opinião pública. (BRANCO, 2009, p.63) (GRIFO NOSSO)
Fica claro a importância do poder judiciário, que em conjunto com os poderes legislativo e o executivo, garantem a manifestação da democracia e o equilíbrio da soberania do país (tripartição dos poderes) ao proteger a constituição.
Diante ao exposto, no caso concreto que haja mitigação ao direito de acesso à saúde, e que o Estado se refutou de prestar tal direito, o jurisdicionado será acionado para trazer ao caso uma solução com fundamento no ordenamento jurídico. Portanto, a judicialização torna-se uma esperança para aquele sujeito que necessita da ajuda do Estado, no que tange a manutenção de sua saúde.
Ressalta-se que, o direito de acesso à saúde é bastante abrangente, compreende o fornecimento de medicamento, consultas nas mais variadas áreas desse setor, cirurgias, dentre outras especialidades, que devem ser suportados pelo Estado enquanto garantidor desse direito no intuito de promover a dignidade da pessoa humana, conforme prevê os objetivos fundamentais traçados no artigo 1°, e incisos, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
Nesse sentido, os autores Ada Pellegrine e Kazuo Watanabe descrevem o seguinte:
Daí que o Estado, a par de almejar o atingimento dos objetivos da República, que se dará apenas à luz do princípio da prevalência dos direitos humanos, deve garantir aos cidadãos instrumentos judiciais de busca pelo cumprimento desses seus direitos, deixando de ser um Estado Social de Direito para se tornar um verdadeiro Estado Democrático de Direito. (GRINOVER, WATANABE, 2013, p.79) (GRIFO NOSSO)
É evidente que a Constituição de 1988, trouxe encargos ao Estado a fim de promover a democracia, sendo agora o Estado mais intervencionista naquilo que depende dele para ser exercido e abstencionista quando é necessário para exercício de outro direito, como por exemplo a liberdade de expressão que não depende de ação do Estado.
Assim, não basta apenas coexistir o direito de acesso à saúde, estar escrito na Constituição ou em outras legislações, sua função é produzir efeitos para os sujeitos de direitos, pois esse é motivo de sua criação, foi através de estudos do fato social que o legislador compreendeu que havia necessidade de criar esse direito, para tanto deve ser prestado, disponibilizado, fomentado, e principalmente, exercitado pelo cidadão.
Desse modo, o Estado diante do direito de acesso à saúde e de sua obrigação em prestá-lo, não pode simplesmente negar de fornecer o tratamento ou medicamento que o sujeito ou grupo de sujeitos precisam, isso porque é uma garantia prevista como já falamos na Constituição e fere tantos outros princípios e direitos também constitucionais, cria-se um dilema quando se depara com esta situação, de um lado um ser humano sem condições (financeiras e psicológicas) e do outro o Estado, como garantidor utilizando do argumento de escassez de recurso para atender tal necessidade.
Assim sendo, diante da negativa do Estado o cidadão poderá contestar os argumentos utilizados para fundamentar a negação do exercício de seu direito. Como já falado nesse capitulo, o instrumento para que o indivíduo demonstre que não há outra maneira a não ser utilizar de seu direito por meio de prestação do Estado é propor uma ação no judiciário. Os autores Ada Pellegrine e Kazuo Watanabe, escreveu nos seguintes moldes:
Nossos tribunais assim têm feito: o Supremo Tribunal Federal reconheceu o dever do Estado de fornecer gratuitamente medicação a portadores do vírus HIV, sob o fundamento de que os poderes públicos devem praticar políticas sociais e econômicas que visem aos objetivos proclamados no art.196 da CF, invocando precedentes consolidados da Corte.
O mesmo entendimento foi adotado pelo Superior Tribunal de Justiça em diversas oportunidades, salientando-se o direito à integridade da assistência à saúde a ser prestado pelo Estado, de forma individual ou coletiva. O Tribunal, em outra decisão, afirmou que a Administração Pública se submete ao império da lei, até mesmo no que toca à conveniência e oportunidade do ato administrativo: uma vez demonstrada a necessidade de obras objetivando a recuperação do solo, cumpre ao Poder Judiciário proceder à outorga da tutela específica para que a Administração destine verba própria do orçamento para esse fim. (GRINOVER, WATANABE, 2013, p.130)
E ainda, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a repercussão geral no Recurso Extraordinário n°855.178, Sergipe, tratando em seu tema 793, acerca do dever de prestação ao direito a saúde, como sendo: “a responsabilidade solidária dos entes federados pelo dever de prestar assistência à saúde”. (RE 855.178 RG/SE)
Face ao exposto, o judiciário pauta-se e posiciona-se como guardião da constituição, e diante dos casos concretos baseia-se nas garantias previstas na CR/1988, cuidando impreterivelmente para que não haja lesão ou ameaça à direitos fundamentais, o que configuraria o descumprimento dos mandamentos constitucionais.
Nesse seguimento, o direito de acesso à saúde pode não ser mais importante que outros direitos fundamentais individuais ou coletivos, no entanto, é imprescindível tanto para um indivíduo, quanto para a coletividade, garantindo-o simultaneamente estará exercitando outros direitos, como a vida, a dignidade, inclusive a possibilidade de garantir que tal sujeito ou coletividade em algum momento poderá exercer outros direitos garantidos na constituição indiretamente.
Em suma, os argumentos utilizados pelo executivo para afastar a responsabilidade de cumprir o direito de acesso à saúde não é suficientemente determinante, pois constantemente o fato social, nesse caso a necessidade da sociedade que torna o direito discutido com de natureza pública é suscitada veemente, o autor Gonçalves Corrêa, dispõe:
A fase de implementação é aquela em que regras, rotinas e processos sociais são convertidos de intenções em ações. No Brasil, você pode observar muitos exemplos de “leis que não pegam”, “programas que não vingam” ou projetos de solução a problemas públicos que acabam sendo totalmente desvirtuados no momento da implementação. A importância de estudar a fase de implementação está na possibilidade de visualizar, por meio de instrumentos analíticos mais estruturados, os obstáculos e as falhas que costumam acontecer nessa fase do processo nas diversas áreas de política pública (saúde, habitação, saneamento, políticas de gestão etc.). Mais do que isso, estudar a fase de implementação também significa visualizar erros anteriores à tomada de decisão, a fim de detectar problemas mal formulados, objetivos mal traçados e otimismos exagerados. (CORRÊA,2017, P.66)
Desse modo, o acesso à saúde seria melhor desempenhado pelo Estado, bem como pelos entes federados, isto é, desde que tenha uma atuação mais eficiente, com olhar clínico a todos os procedimentos e etapas até a implementação de políticas públicas somadas as boas decisões. Por fim, é necessário que seja feita uma análise sobre os meios ou métodos para tornar pleno o exercício do direito de acesso à saúde, e consequentemente, irá obter resultados positivos no setor.
O presente trabalho foi desenvolvido com finalidade de proporcionar maior debate acerca dos limites do sistema de saúde e o direito de acesso a saúde no que se refere ao fornecimento, a partir das pesquisas e informações obtidas nas doutrinas aqui trabalhadas, para então ampliar o conhecimento sobre este tema objetivando a construção e inauguração de soluções adequadas a problemática que o país enfrenta no setor da saúde e da política.
Vale destacar, que o tema objeto de nossa pesquisa apresenta grande complexidade ao ponto de termos o dever de esclarecer que para alcançarmos um sistema político mais adequado ao Brasil, bem como a execução das garantias impostas pela Constituição (incluindo o acesso à saúde), é necessário maior aprofundamento nas questões sociais, econômicas e políticas, no sentido de que precisamos estudar pormenorizadamente as estruturas políticas que mais deram certo atualmente, com países semelhantes ao Brasil, em quesitos de população, demografia e, ainda, traçar um comparativo entre nossa Constituição e outras Constituições garantistas que estão em vigência. Desse modo, podemos dizer que os objetivos desta pesquisa científica foram abordados dentro daquilo que foi proposto.
É possível verificar que as limitações do sistema de saúde são reflexos de problemas em sua implementação e, principalmente de sua gestão, pois para que o sistema seja bem gerido, o interesse político deve ser afastado, isto é, não deve ser considerado superior ao direito em acesso à saúde. Desta forma, seria possível ultrapassar muitas dificuldades dentro do sistema, inclusive, questões de estrutura física dos locais em que são prestados os serviços de assistência à saúde.
Nesse sentido, abre destaque também para o fornecimento de medicamentos gratuitos, que desponta tanto do acesso a assistência à saúde, quanto do direito à saúde, quando estes direitos tornam-se inalcançáveis ou impossibilitados de serem exercidos pelo cidadão que diante de sua insuficiência financeira e da promessa constitucional invoca o seu direito em recorrer ao SUS, para concretizar o direito de vida digna, mas se depara com a negativa de seu direito ou diante de uma prestação considerada por ele inadequada, é assim, que irá nascer na sociedade, o sentimento de que o Sistema é ineficiente e de certa forma utilizado pela política como instrumento para propagar a corrupção.
Lado outro, o poder executivo, nas figuras dos prefeitos, governadores e presidente da república, ao se depararem com situações em que o cidadão clama por seu direito à saúde e assistência, buscam fundamentar no sentido de rebater toda essa problemática social, que são fatos decorrentes da insuficiência de recursos, da aplicação da reserva do possível e, sob essa perspectiva o poder executivo diz que os recursos são escassos, que os entes federativos não consegui garantir a superação de todas as mazelas da nação brasileira sem que antes entre em colapso.
Nesse diapasão, nasce no seio social o sentimento de que a Constituição é um desejo ainda não alcançado, pois temos muitas garantias que só serão aplicadas depois de muitos anos de uma luta processual seguida de recursos e mais recursos, até que seja prolatada sentença por determinado magistrado e esta venha ser transitada em julgado, isto é, torna-se uma decisão imutável, e após tudo isso, é que esse cidadão poderá gozar totalmente de sua garantia. Não trata-se apenas de dizer que a nossa Constituição seja utópica, mas sim que talvez demore anos, décadas e/ou até séculos para que os direitos prestacionais sejam ofertados a nação de forma equalizadora.
Para que haja a aplicação do princípio da equidade, é necessário rever não só a implementação do Sistema Único de Saúde, mas fazer uma análise sobre o todo, sobre os orçamentos e distribuição das verbas públicas aos setores, inclusive, examinar meios pelos quais serão alcançados os direitos previstos na Constituição, bem como se é possível elaborar um planejamento político que torne tangível as prestações obrigacionais do Estado.
Através da exposição de ideias neste trabalho, foi possível extrair que existe limitações no exercício do direito à saúde, e essa limitação não está relacionada ao mandamento da lei, daquilo que está posto no ordenamento jurídico, mas sim no momento de exercitar esse direito. Portanto os limites estão nas barreiras levantadas pelo próprio poder público, que obriga o cidadão lutar até o fim de sua vida por um medicamento ou por uma cirurgia, ambas talvez sua única chance de permanecer com vida.
Diante disso, vale destacar que atualmente vivemos em nossa organização federativa, a aplicação do sistema democrático, com fulcro na Carta Magna, que carrega em si o que alguns doutrinadores denominam de rigidez ou super rigidez das normas, significa dizer que para alterar norma constitucional, é preciso um quórum de aprovação da emenda de três quintos, com votação de dois turnos em cada casa do Congresso Nacional (duas vezes no Senado e duas vezes na Câmara dos Deputados), além de possuir alguns artigos espalhados na Constituição que não podem ser alterados substancialmente, chamados de cláusulas pétreas (art.60§4 da CR/1988), ou seja, não é fácil alterar dispositivo constitucional.
Face ao exposto, fica evidente que há uma indispensabilidade dos direitos, principalmente, daqueles que dependem de uma ação positiva do Estado, que caso este fique inerte os direitos nunca serão alcançados. Outro ponto é que o Estado deve responsabilizar-se também pelos outros setores (segurança, educação, etc.), e fazer com que eles sejam eficazes em suas funções exigidas pela sociedade. Portanto, o papel do Estado como garantidor é fundamental, deve ser bem desempenhado, será que os erros estão partindo dessa premissa? Será que o Brasil politicamente é bem organizado?
Talvez desses questionamentos possam surgir algumas soluções para o próprio desenvolvimento do país, na administração e gerência, na organização e planejamento dos orçamentos, nas políticas internas dos órgãos públicos, nas gestões dos órgãos públicos, enfim, em todos os setores é possível perceber que há algo errado, que as execuções das funções de cada setor há uma deficiência e que ao invés de ser erradicada ao longo do tempo, cria-se na verdade um problema crônico que ao final ninguém consegue dizer de onde surgiu ou a origem do emaranhado de problemas em determinado setor.
Se o Estado tem seu papel, suas obrigações para com o cidadão, onde está o papel do cidadão? Além claro de exercitar seu direito de saúde, segurança, educação, moradia, dentre outros. Como o cidadão poderá colaborar na evolução e desenvolvimento de ideias que sejam capazes de alcançar as promessas constitucionais? Bem, assim como o Estado é também imprescindível a participação da nação brasileira para que seja possível tudo que a Constituição prevê para a sociedade.
Ao refletir acerca do papel que deve ser desempenhado por cada cidadão, pode-se dizer que inicia com o direito de exercer seu sufrágio universal (o voto), ao exercer de forma direta e com responsabilidade o voto, nasce sob o aspecto político possibilidades de mudanças. Com esta atitude irá surgir também na sociedade maior debate acerca dos problemas sociais, bem como a conscientização política, no sentido de que todos farão análises de seus candidatos, principalmente sobre sua capacidade de gerir, e após conhecer cada candidato irá depositar seu voto, não se pode afirmar que todos irão agir conforme as expectativas, porém ao logo do tempo esse ciclo irá formar a mentalidade dos próximos candidatos, pois eles surgem da própria sociedade.
Por fim, é evidente que o tema abordado é fruto de grandes questionamentos e possui muita relevância em todos os aspectos, sejam estes sociais, jurídicos ou mesmo econômico-social. Vale dizer que a solução só será alcançada com base em estudos, pesquisas e debates, ou seja, através da busca incessante do conhecimento, e assim, aqueles que se orientam pelo caminho do conhecimento encontrará a resolução do problema de fato, a isso podemos dar o nome de evolução humana, é a sociedade aprendendo com a vida e tudo que há em seu entorno.
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Bacharelanda do curso de Direito pelo Centro Universitário Una Betim - MG.
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