GLAUCILENE MENDES CARDOSO
(orientadora)
RESUMO: O novo coronavírus é considerada uma doença infecciosa com identificação no mês de dezembro do ano de 2019. Com a pandemia tendo apresentação de maneira repentina, as lideranças políticas, assim como os legisladores se viram numa necessidade de elaborar soluções para sua contenção nas esferas civil, administrativa e penal. Nesse contexto, na utilização das conceituações do direito penal para que seja cumprido o esquema de regulação, estas ofensas ficam sujeitas aos princípios legais de direito penal, descrevendo definindo e limitando as sanções. Desta forma, o presente trabalho tem como objetivo identificar as impossibilidades jurídicas de responsabilização penal decorrendo do não cumprimento das medidas sanitárias com definição pelo governo. Conclui-se que, as medidas sanitárias em que o não cumprimento poderá ter configuração o crime com tipificação no artigo 268 do Código de Processo Penal são o isolamento individualista dos indivíduos doentes ou que apresentam-se em contaminação, além dos objetos e animais que foram afetados; a quarentena individual, que tem consistência em separar indivíduos suspeitos contaminados de indivíduos que não apresentam doença; e a restrição de entrar e sair do Brasil. Por fim, fiscalizar que as medidas sanitárias sejam cumpridas poderá ter realização partindo das entidades policiais, entretanto, eventuais desatendimentos a ordens em que o conteúdo seja a observância desta norma, apenas terá configuração como crime de desobediência caso não existam sanções administrativas cominadas para a hipótese.
Palavras-chave: Pandemia. Direito Penal. Consequência. Coronavírus.
O novo coronavírus é considerada uma doença infecciosa com identificação no mês de dezembro do ano de 2019. O coronavírus é considerada uma família de vírus que causam infecções respiratórias. Atualmente, a população encontra-se em processo de vacinação, entretanto, não existe um tratamento em especificidade para a doença, além do controle dos seus sintomas.
Com a pandemia tendo apresentação de maneira repentina, as lideranças políticas, assim como os legisladores se viram numa necessidade de elaborar soluções para sua contenção nas esferas civil, administrativa e penal. Estas derrogações quanto as regras processuais normalmente com aplicação nas questões de crimes foram tomadas, especialmente por motivos óbvios de saúde, no intuito da redução dos contatos físicos, mas ainda para a garantia do funcionamento em continuidade do sistema de justiça público, um servidor que, no interim do serviço mínimo devido para toda a sociedade, não poderá acabar se dando ao luxo de parar de forma completa.
A Portaria Interministerial nº 05/2020, com emissão partindo do Ministério da Saúde e da Justiça e Segurança Pública do Brasil, fez o estabelecimento do caráter obrigatório das medidas com previsão na Lei Federal nº 13.979/2020, com promulgação para que seja enfrentada a atual emergência de saúde pública. A presente legislação faz previsão das medidas para combater à emergência de saúde pública com causa pela Covid-19, e teve sua regulamentação pela Portaria nº 356/2020 do Ministério da Saúde.
As presentes portarias com associação a Lei Federal nº 13.979/2020 não fazem estabelecimento de quais as penalidades ficariam sujeitas para aqueles que não acabarem cumprindo as regras. Esses atos somente fazem o estabelecimento que os infratores serão responsáveis civil, de forma administrativa e criminal.
A crise do novo coronavírus se tornou um lembrete acerca da importância da garantia de um processo duradouro em relação ao gozo dos direitos sociais, especialmente partindo do desenvolvimento de serviços universais de saúde pública. Inclusive, a pandemia demostra em terminologias práticas as indivisibilidades dos direitos humanos.
Nesse contexto, na utilização das conceituações do direito penal para que seja cumprido o esquema de regulação, estas ofensas ficam sujeitas aos princípios legais de direito penal, descrevendo definindo e limitando as sanções.
Desta forma, o presente trabalho tem como objetivo identificar as impossibilidades jurídicas de responsabilização penal decorrendo do não cumprimento das medidas sanitárias com definição pelo governo.
Para tanto, foi utilizada a pesquisa bibliográfica, onde foi buscado investigar o maior número de conhecimento técnico à disposição nessa área e em posicionamento sobre o tema. A pesquisa bibliográfica consiste no exame da bibliografia, para o levantamento e análise do que já foi produzido sobre o tema que foi assumido como tema de pesquisa científica (RUIZ, 1992).
A disseminação do Covid-19 em proporções globais acabou transformando a vida de milhões de indivíduos no mundo inteiro. No Brasil, de forma mais específica no começo do corrente ano, existiu o decreto da pandeia, fato esse que alterou a rotina da população.
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), medidas de prevenção tiveram adoção no intuito da redução da contaminação, dentre aquelas de maior importância apresenta-se o isolamento, o distanciamento social, a higienização das mãos e objetos, a utilização obrigatória de máscara e a suspensão das aulas e atividades. Nesse contexto, em certos estados e municípios houve a necessidade de tomar ações mais enérgicas para coibição da desobediência das recomendações sanitárias.
Com isso, para enfrentar a pandemia, de maneira repressiva, é fundamental a aplicação do Direito Penal. Como sedimentado na parte doutrinária e jurisprudencial, o poder de punição estatal apenas precisa ter emprego como ultima ratio, isto é, nos casos de extrema necessidade para o resguardo do bem jurídico de maior importância. Em outros dizeres, a Lei Penal tem condicionamento ao princípio da intervenção mínima.
Nesse contexto, Dobjenski e Dobjenski (2021) pontuam que, é notado que o descumprimento das determinações com imposição para combater o vírus, propicia risco e perigo ao bem mais fundamental da pessoa, que é a vida. Para isso, o Código Penal faz a tipificação das condutas representantes de alguma maneira ameaça ou atentam contra o direito fundamental, na previsão de penas severas a sua violação.
O Direito Penal tem consideração a segmentação do Direito Público que faz a regulação do poder de punição do Estado. Ele é detentor da competência de seleção das condutas humanas que são consideradas indesejadas, que possuem determinada gravidade e reprovação social, e com capacidade colocar em risco a convivência em sociedade (BECCARIA, 2011).
Cabe ao Direito Penal, ainda segundo Bittencourt (2012), o estabelecimento das penas que serão cominadas aos agentes infratores, com respeito, todavia, os princípios da Constituição.
Com isso, a função do Direito Penal é proteger os bens jurídicos fundamentais, isto é, a vida, o patrimônio, a honra, a integridade física, psíquica e orgânica, a imagem, a paz, e outros. Por este motivo, é revelado fundamental, ao se deparar com um tipo penal (crime), a identificação de qual bem jurídico está tendo proteção para que seja possível a aplicação dos princípios penais.
O estudo relacionado com as funções desta importante área do Direito fica em volta, de forma básica, de duas vertentes do funcionalismo: o teleológico e o sistêmico. O primeiro faz afirmação que, a principal função do Direito Penal seria a proteção dos bens jurídicos de alta importância para a regulação da convivência social, pois, a seleção desses bens alteraria com a natural evolução dos interesses sociais. Bens outrora importantes acabaram passando, com o decurso do tempo, a ter irrelevância perante os olhos do Direito Penal, com guia partindo do princípio da intervenção mínima, bem como os valores antes desprezados, fizeram o recebimento, de forma posterior, a guarida dessa área da ciência jurídica (GRECO, 2010).
Já o funcionalismo sistêmico, com criação partindo de Gunther Jakobs, leva em consideração que resta ao Direito Penal, tão apenas, ter serventia de guardião do sistema normativo posto. Com isso, Jakobs considera que a atuação do Direito Penal tem sua pauta numa anterior violação do bem jurídico-penal, não tendo serventia aquele para tutelar os bens de valia, mas sim para a busca de reafirmações da autoridade da lei peal, com violação com a prática do delito (GRECO, 2010).
As instituições policiais passaram a fazer a fiscalização do cumprimento das medidas legais, levando em conta que, seu não cumprimento teria possibilidade de configuração da prática de crimes de não cumprimento das medidas sanitárias preventivas ou desobediências.
Além do mais, os artigos 4º e 5º relacionados com a Portaria Interministerial nº 5/2020 fazem o estabelecimento que, o não cumprimento das medidas de isolamento e quarentena com prevenção no artigo 3º, I e II na Lei nº 13.979/2020, tem possibilidades de sujeitas aqueles que infringiram as sanções penais com presença nos artigos 268 e 330 do Código Penal (CP).
Art. 3º Para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus, poderão ser adotadas, entre outras, as seguintes medidas:
I - isolamento;
II - quarentena;
Entretanto, Parente (2020) afirma que, as classificações de fatos como um delito não têm decorrência de forças normativas de uma portaria. Estas classificações jurídicas são resultantes das correspondências dos fatos com hipóteses com definição na lei penal, e não toda definição com implementação por atos do Poder Executivo. Assim, análises acerca da tipicidade do fato precisam ter realização de forma direta relacionado ao tipo penal, conforme adiante.
O artigo 268 do CP faz definição do crime de não cumprimento das medidas sanitárias preventivas como o ato de infringir determinações do poder público, com destinação ao impedimento de introduzir ou propagar uma doença considerada contagiosa. Essa, tem consideração como uma lei penal em branco, sendo que, a determinação do poder público tem estabelecimentos nos atos de normas complementares. Segundo Nucci (2020), os textos normativos complementares apresentam-se na Lei nº 13.979/2020, e os conteúdos dos elementos do tipo “determinação do poder público” possuem definição nos seus artigos 2º e 3º, da presente maneira:
O isolamento dos indivíduos que apresentam doenças e tiveram contaminação torna-se uma medida que tem sua abrangência individualmente, com determinação partindo da prescrição medida, e onde a validade tem condicionamento com a notificação do indivíduo a partir de termo de consentimento;
O isolamento dos objetos e animais que foram afetados, e a quarentena pessoal, tem consistência em separar os indivíduos, além dos objetos e animais que são sujeitos de contaminação, de indivíduos que se apresentem com doença. Essa ainda também tem consideração como uma medida que abrange individualmente, onde sua implementação precisa ter realização de acordo com protocolos clínicos;
Restrições para entrar e sair do Brasil são consideradas medidas que abrangem o coletivo, e que teve regulamentação por várias portarias;
Os textos desses complementos à lei penal tiveram implementação partindo de instrumentos idôneos para esse intuito, e tem suficiente determinação, mesmo que sua complexidade possa dificultar o conhecimento voltado ao seu conteúdo pelos destinatários das normas. Entretanto, relacionado com as medidas de natureza legal da quarentena, com consistência nas restrições das atividades, e das limitações para as locomoções, existem omissões de complementos da lei penal, impedindo sua aplicabilidade.
Leite (2020) pontua que, as legislações federais não fizeram definição de quais são as atividades com restrição, e ainda não fez o estabelecimento de limitações para as locomoções. Assim, na Lei nº 13.979/2020 não existem complementações com suficiência ao tipo para especificações de quais “determinações do poder público” seriam infringidas nesses casos.
Relacionado com a quarenta por restrições das atividades, Leite (2020) pontua que, o conteúdo tipo não é de forma suficiente determinado, devido ao fato que, a lei não acaba especificando quais atividades apresentam restrições, e nem de qual maneira. Assim, não tem identificação a medida que possa ser descumprida pelos destinatárias da normativa. Isso não viabilização a configuração de hipóteses delitivas, sendo que, as restrições com menção não possuíram a definição de seu objeto. Isto é, mesmo que se tenha previsão de forma formal a existência da medida, a lei não fez definição de qual seria essa medida.
Apenas a previsão legal da medida de quarentena com restrições das atividades, sem que tenham especificação quais são essas atividades, torna-se uma disposição bastante vaga, não satisfazendo as requisições de certeza do princípio de legalidade. Assim, não é possível o complemento de uma lei penal em branco, nem a produção de efeitos penais.
Cangussu (2020) pontua que, um outro problema é possível encontrar voltado com a medida do distanciamento social. Mesmo de ter determinação de forma suficiente o objeto da presente medida, a Lei nº 13.979/2020 não fez atribuição ao Ministério da Saúde a competência para que sejam criadas outras medidas sanitárias em complemento, diferentes daquelas com definição nos artigos 2º e 3º da presente lei. A competência ministerial com definição voltado com os textos das medidas sanitárias tem consistência nas disposições relativas com a fixação das condições e dos prazos das medidas de isolamento.
Como a presente medida teve instituição partindo de portaria, sem que a lei relacionada fez atribuições de maneira expressa a competência dos emissores dos atos para sua implementação, essa disposição não poderá acabar complementando uma lei em branco, por causa do princípio da legalidade com definição no artigo 1º do CP.
Por isso, Cunha (2020) pontua que, independente de valorizar os textos do ato, e das possibilidades jurídicas dos efeitos administrativos, a medida sanitária do distanciamento social não poderá acabar complementando uma lei penal. Entretanto, as medidas que podem trazer grandes dificuldades para a aplicabilidade no contexto penal são do “isolamento horizontal”, com estabelecimento pelos atos normativos estaduais e municipais.
A Lei nº 13.979/2020, no seu artigo 3º, § 7º, II, acabou possibilitando que os gestores locais da área da saúde adotassem medidas com relação aos incisos I, II e VI, do artigo 3º, entretanto, não foram definidas outras medidas diferentes daquelas. Mas, diversas medidas tiveram implementação por distintos Estados e Municípios, onde os textos são distintos da definição feita pela presente lei, e que possuem abrangências de maiores restrições.
Art. 3º Para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus, poderão ser adotadas, entre outras, as seguintes medidas:
[...]
VI - restrição excepcional e temporária de entrada e saída do País, conforme recomendação técnica e fundamentada da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), por rodovias, portos ou aeroportos;
O grande problema é de que, o artigo 22, I, da Constituição de 1988 faz o estabelecimento de forma expressa que: é de competência de forma privativa da União a legislação perante o direito penal. De forma consequente, não é de maneira jurídica possível o uso dos decretos estaduais e municipais para a integração de uma lei penal em branco.
Cangussu (2020) pontua que, esse veto da Constituição faz garantias da uniformidade do Direito Penal no Brasil, e caso não tivesse essa reserva de competência, um mesmo fato teria possibilidades de ter consideração crime numa cidade, mas não em outra. Se isso viesse a ocorrer, teria apresentação de uma legislação penal de forma completa caótica no Brasil, devido ao fato que, cada Estado e Município fez a restrição de distintas atividades, de várias maneiras, e com prazos diferentes.
Assim, eventuais descumprimentos das medidas sanitárias com implementação partindo da regulamentação estadual e municipal que não sejam correspondentes de forma exata aos textos com especificação na Lei nº 13.979/2020, não pode ter classificação como fatos típicos nas terminologias do artigo 268 do CP.
Nesse contexto, Panoeiro e Neves (2020) pontua que, as medidas sanitárias onde os textos podem ter correspondência a determinações do poder público para configurar a hipótese com previsão no artigo 269 do CP, são apenas aquelas com definição nos artigos 2º e 3º da presente lei. Em outros casos, caso a normativa que faz a imposição das respectivas medidas sanitárias se tornar válida, seus efeitos se tornaram restritos no contexto administrativo, e suas eventuais consequências jurídicas possuirão esse mesmo caráter.
Quanto ao crime de resistência, o artigo 330 do CP faz sua definição como a desobediência da ordem legal de funcionário público. O elemento “ordem” tem correspondência com comandos pessoais, que profere de maneira direta por um indivíduo que possua a qualidade de funcionário público, e dirigido de forma específica para outro indivíduo individualizado.
A denominada “ordem” não deve ter confusões com comandos gerais, abstratos e impessoais, que maneira os conteúdos de uma norma jurídica, caso não fosse dessa maneira, as condutas ilegais teriam classificação como “desobediências”. Assim proibições, com estabelecimento por lei ou decreto, não tem consideração “ordem” (CARDOSO, 2020).
Como se exemplo é possível citar um indivíduo caminhando e tiver abordagem pela entidade policial. O fato do indivíduo não estar cumprindo uma normativa jurídica geral com implementação por decretos na imposição do “isolamento social”, poderá ter configuração como infração administrativa, entretanto, ela não descumpre a ordem com emissão pela entidade pública, e de forma direta com endereçamento a ela.
Segundo Silver (2000), as desobediências apenas poderão ter configuração para a polícia fizesse ordenação de maneira pessoal cessar as atividades proibidas impostas por decreto, e o indivíduo não cumprisse essa ordem de maneira imediata. Entretanto, apenas exercer atividades proibidas por decreto não tem configuração desobedecer a ordem. Assim, o fato não torna-se típico relacionado a essa norma penal.
De toda maneira, mesmo nos casos do não cumprimento da ordem que foi proferida pela entidade policial, existe uma requisição estruturalista adicional à classificação desse fato como sendo delito. É tratado da não existência de sanções administrativas com aplicação pelas infrações cometidas. Se o não cumprimento das medidas sanitárias ensejem incidência de sanções administrativas, os desatendimentos a ordem de uma entidade policial que faça existência do não cumprimento, não fará a produção de efeitos penais.
Assim, caso existam previsões das sanções administrativas pelo não cumprimento das medidas sanitárias, onde a observação do policial fez determinação ao proferir a ordem, a infração não fará ensejos da incidência das consequências penais, apenas administrativas.
A responsabilização penal da pessoa que, ignora o estado de quarentena com imposição em vários estados, transmita o vírus e o resultado disto for a morte, é fundamental que seja provado que este era o intuito inicial. Assim, Vital e Rofer (2020) entendem como pouco provável que seja configurado o homicídio, mas possível se de forma efetiva ter comprovação que certo indivíduo - com ciência não apenas de sua contaminação, mas também e condições tornem a vítima propensa à morte, se viver contrair a doença -, transmitir a enfermidade no intuito de matar.
Nos casos de morte, o art. 267 do CP parece aquele que melhor amolda a conduta do que o homicídio, especialmente em casos relacionados ao coronavírus. A pena do art. 267, até mesmo, tem maior gravidade do que a do homicídio simples. No caso da ocorrência de morte, a pena é dobrada, indo de 20 a 30 anos.
Vital e Rofer (2020) pontuam que, caso a intenção for de forma efetiva de contágio e não de causar a morte, terá incidência a disposição do art. 131 do CP, onde a pena já é considerada bem alta.
Segundo Dobjenski e Dobjenski (2020), não basta violar genericamente a situação de calamidade pública para enquadramento penal da conduta, é fundamental a especificação de qual ato ordinatório com destinação a realizar impedimentos da introdução ou propagação da doença contagiosa sofreu violação. Isto é, fundamental grande atenção às normas de caráter administrativa e sanitária que fazem complemento do tipo penal.
Muitos ainda colocam em dúvida se a aplicação do Direito Penal tem consideração como uma resposta com coerência para tempos de pandemia, especialmente diante das tentativas de reduzir a população carcerária e da restrição de funcionamento e circulação em fóruns e tribunais.
Vital e Rofer (2020) pontua que, o direito penal até pode ter aplicação em certos casos, entretanto, não possui amplitude e capacidade do combate do espraiamento da pandemia. Medidas pedagógicas, como a propaganda intensiva, e sanções administrativas, como as multas, tornam-se bem mais eficazes devido ao fato de terem aplicação mais e eficaz.
Além do mais, Faccini Neto (2020) pontua que, mesmo exista uma natureza emergencial advinda da crise do coronavírus, é fundamental que seja tomado cuidado para não se precipitar a usar, de maneira indiscriminada a imputação de determinados tipos penais para responsabilização dos indivíduos que porventura não respeitarem as determinações do Poder Público de isolamento e quarentena.
Nesse contexto, Dobjenski e Dobjenski (2021) pontuam que, o Direito Penal não é considerado a melhor solução para esta crise. O próprio encarceramento ameaça a eficácia do combate sistemático à pandemia, dado o deplorável estado do sistema prisional brasileiro.
Já Vital e Rofer (2020) faz apontamentos para a responsabilização civil, como mais eficaz instrumento para a coibição dos abusos. A tutela civil do dano acaba se mostrando bem mais eficaz e com utilidade em casos de transmissão ilícita do vírus do que a simples responsabilização penal, sendo que, a quantia em pecúnia arbitrada terá serventia como reparação pelos prejuízos materialistas sofridos (como é possível citar, gastos com medicamentos, lucros cessantes, entre outros), além das compensações por eventuais danos extrapatrimoniais experimentados pela vítima.
Em hipóteses do agente possuir ciência que está contaminado com moléstia grave, e mesmo assim fazer a prática de ato com capacidade de produção do contágio, incorrerá nas penas do crime com previsão no art. 131 do CP:
Art. 131 - Praticar, com o fim de transmitir a outrem moléstia grave de que está contaminado, ato capaz de produzir o contágio:
Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.
Nunes (2020) pontua que, neste caso, o crime é doloso e apenas poderá ser perpetrado com a presença de elemento subjetivo especial ou fim especial de agir, não tendo punição nos casos de dolo eventual, decorrendo de motivações em especificidade com previsão no tipo.
Neste caso, é possível citar o indivíduo que acaba se dirigindo a um ambiente fechado, possuindo o objetivo direto da transmissão do vírus para terceiros.
É preciso destacar também que, é um delito formal, não havendo necessidade, para sua consumação, a incidência de resultado naturalístico, que seria o efetivo contágio das vítimas situadas no local.
Relacionado com a tipificação do delito de perigo para a vida ou saúde de outrem, faz prescrição do Código Penal:
Art. 132 - Expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente:
Pena - detenção, de três meses a um ano, se o fato não constitui crime mais grave.
Parágrafo único. A pena é aumentada de um sexto a um terço se a exposição da vida ou da saúde de outrem a perigo decorre do transporte de pessoas para a prestação de serviços em estabelecimentos de qualquer natureza, em desacordo com as normas legais. (Incluído pela Lei nº 9.777, de 1998).
Nunes (2020) pontua que, o delito é de perigo concreto e doloso, consumando com a conduta voltada às exposições da vida ou saúde de terceiros. É o caso dos agentes que, tendo conhecimento de seu contágio, resolve não cumprir a determinação médica e legal de isolamento, e venha a se deslocar para locais públicas onde há aglomeração de indivíduos, expondo-as à perigo direto e iminente de contágio ou assumindo o risco de produção do resultado.
Inclusive, o tipo penal possui caráter subsidiário, porquanto apenas tem incidência em hipóteses onde o comportamento do agente não ter constituição de delito mais grave.
Nesse contexto, Vital e Rofer (2020) citam que, o ministro Marco Aurélio do STF, fez o arquivamento de notícia-crime contra Jair Bolsonaro, presidente da República. Na presente petição, um advogado fazia acusações contra o presidente de cometer crimes de desobediência e causar epidemia, com previsão nos arts. 267 e 330 do CP. O ministro teve entendimento que, a conduta não configuraria como crime, sendo que, o crime de causar epidemia é requerente de dolo, e não existiam notícias de que Jair Bolsonaro teria sido infectado.
Inclusive, existem outras 5 representações contra Jair Bolsonaro devido suas condutas na pandemia. Dentre elas apresenta-se a do deputado federal Reginaldo Lopes, acusando Jair da prática de crime com previsão no art. 268 do CP, de infringir determinações do poder público, com destinação a realizar impedimentos da introdução ou propagação de doença contagiosa. Vital e Rofer (2020) pontuam que, este crime tem consideração de perigo abstrato, não havendo necessidade para sua configuração e eficaz comprovação introdução ou propagação de doença contagiosa.
Como foi possível ver, as medidas sanitárias em que o não cumprimento poderá ter configuração o crime com tipificação no artigo 268 do CPP são o isolamento individualista dos indivíduos doentes ou que se apresentam em contaminação, além dos objetos e animais que foram afetados; a quarentena individual, que tem consistência em separar indivíduos suspeitos contaminados de indivíduos que não apresentam doença; e a restrição de entrar e sair do Brasil.
Vem sendo comumente em grandes áreas infectadas pelo coronavírus a restrição do acesso. Países inteiros estão apresentando políticas de isolação. Nos casos das determinações desta similaridade no Brasil, tem incidência no artigo 268 o agente que, com ciência desses impedimentos de entrada e saída, mesmo assim o faz independentemente de estar ou não com sintomas do coronavírus, uma vez que declarada a pandemia por órgão mundial competente tem em seu significado pontuar que todas as áreas do planeta apresentam-se perante risco, isto é, se o país faz imposição dessas restrições de acesso logo esta será um medida para que seja evitada a propagação ou disseminação da doença contagiosa, o agente que assim faz, tendo conhecimento da proibição, precisa responder também pelo artigo 268 do CP (CANGUSSU, 2020).
Entretanto, nesses casos, é comumente alegações do não conhecimento da lei, sendo que, essa medida a restrição de entrada e saída do país pode não ter transmissão de forma massiva especialmente para aqueles que estão no estrangeiro e desejam entrar no Brasil, sendo assim, há a exclusão do dolo e de forma consequente a tipicidade (CANGUSSO, 2020).
As medidas que possuem relação com a quarentena, onde o objeto e restringir as atividades, e restringir as locomoções interestaduais e intermunicipais pelas rodovias, portos ou aeroportos, não tiveram definição nas regulamentações federais.
Além do mais, eventuais medidas adicionais com produção pelos órgãos estaduais ou municipais, não acabam produzindo efeitos no contexto penal, mesmo que seja possível a produção de efeitos jurídicos no contexto administrativo.
Por fim, fiscalizar que as medidas sanitárias sejam cumpridas poderá ter realização partindo das entidades policiais, entretanto, eventuais desatendimentos a ordens em que o conteúdo seja a observância desta norma, apenas terá configuração como crime de desobediência caso não existam sanções administrativas cominadas para a hipótese.
BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. 6. ed. São Paulo: Martin Claret, 2011.
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Bacharelando em Direito pela Faculdade UNA Betim / MG.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SOUZA, Francis Júnio Marques Medeiros de. O uso do Direito Penal diante da pandemia do novo coronavírus: as consequências penais do não cumprimento das medidas sanitárias Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 11 jun 2021, 04:20. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/56739/o-uso-do-direito-penal-diante-da-pandemia-do-novo-coronavrus-as-consequncias-penais-do-no-cumprimento-das-medidas-sanitrias. Acesso em: 23 dez 2024.
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