JULIANA SILVA AMORA[1]
(coautora)
BÁRBARA HELEN ABREU VALADARES[2]
(Orientadora)
RESUMO: A multiparentalidade surgiu no sistema jurídico em 2016, a partir da repercussão geral 622 do Supremo Tribunal Federal (STF), que reconheceu o instituto da multiparentalidade, após haver vários pedidos de reconhecimento nos cartórios de todo o Brasil. Com isso, é possível reconhecer um vínculo estabelecido a partir da relação afetiva, para além da biológica. Portanto, o fenômeno da multiparentalidade permite que o menor tenha em seu registro civil, dois pais, duas mães ou ambos. Não obstante, a regulamentação no campo do registro civil, outras importantes questões jurídicas, decorrentes do reconhecimento da multiparentalidade, não foram devidamente enfrentadas e criaram uma lacuna jurídica, como é o caso da sucessão. Pensando nisso, o objetivo central desta pesquisa, é discutir a viabilidade de dupla sucessão em famílias que se enquadram no determinado instituto reconhecido. Nesse sentido, adotando-se Flávio Tartuce (2017 e 2019), como referencial teórico, tem-se o afastamento de qualquer interpretação apta a ensejar a hierarquização dos vínculos biológicos e socioafetivos. A partir da metodologia de revisão bibliográfica, a pesquisa teórica foi desenvolvida por meio de método científico hipotético-dedutivo, apresentando conceitos gerais e hipóteses. Conclui-se com o presente trabalho que o filho será sucessor de seus pais e, estes, serão sucessores do filho, não havendo hierarquia entre os pais biológicos e socioafetivos. Sendo assim, percebe-se como resultado, que o reconhecimento da multiparentalidade trouxe para o ordenamento jurídico uma modalidade diferente de família, mas com os mesmos procedimentos sucessórios que os demais tipos de família.
Palavras-chave: Direito de Família. Multiparentalidade. Sucessão. Filiação.
ABSTRACT: Multiparentality emerged in the legal system in 2016, from the general repercussion 622 of the Supreme Federal Court (STF), which recognized the multiparentality institute, after several requests for recognition in registries all over Brazil. With this it is possible to recognize a bond established from the affective relationship, in addition to the biological one. Therefore, the phenomenon of multiparentality allows the minor to have two fathers, two mothers or both in their civil registry. Despite regulations in the field of civil registration, other important legal issues, arising from the recognition of multiparentality, were not properly addressed and created a legal gap, as is the case with succession. With this in mind, the central objective of this research is to discuss the feasibility of double succession in families that fall within the recognized institute. In this sense, Flávio Tartuce (2017 e 2019), as a theoretical reference, demonstrates the departure from any interpretation capable of giving rise to the hierarchy of biological and socio-affective bonds. Based on the literature review methodology, the theoretical research was developed through a hypothetical-deductive scientific method, presenting general concepts and hypotheses. It is concluded with the present work that the son will be the successor of his parents and, these, will be successors of the son, with no hierarchy between biological and socio-affective parents. As a result, it is perceived as a result that the recognition of multiparentality has brought a different type of family to the legal system, but with the same succession procedures as other types of family.
Keywords: Family Rights. Multiparentality. Succession. Filiation.
SUMÁRIO: Introdução. 1. Conceito evolução de direito de família. 2. Tipos de famílias. 2.1 Família monoparental. 2.2 Família anaparental. 2.3 Família matrimonial/Tradicional/Nuclear. 2.4 Família informal/União estável. 2.5 Família unipessoal. 2.6 Família reconstituída/Multiparental/Mosaico. 3. A concomitância familiar. 4. Sucessão familiar. 4.1 Efeitos da sucessão após a concomitância das filiações. 5. Reconhecimento do ordenamento jurídico brasileiro. Conclusão. Referências bibliográficas.
INTRODUÇÃO
A multiparentalidade é uma modalidade de família, reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) mediante repercussão geral n.º 622, devido à alta demanda de pedidos para o registro de outros pais em concomitância com os já registrados em cartório, visando o direito à convivência familiar, a afetividade e a dignidade humana.
Pelo fato de a legislação não apresentar dispositivo específico sobre a multiparentalidade, há muito que ser analisado e sanado pela doutrina e pela jurisprudência, quanto aos direitos e às obrigações no presente instituto, principalmente quanto aos efeitos sucessórios, para que sejam evitadas eventuais divergências.
Entretanto, não tendo o legislador previsto, expressamente, a sucessão em tal situação, pretende-se analisar a possibilidade de os direitos e obrigações na multiparentalidade serem duplicados, no que diz respeito aos efeitos sucessórios.
Destarte, este estudo adotará como marco teórico a compreensão de Flávio Tartuce (2017 e 2019), exposta no livro “Direito Civil: Direito de Família”, a qual contribuirá para o estudo da multiparentalidade, em seu conceito e reconhecimento pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Sobre o reconhecimento da multiparentalidade, o autor esclarece:
A multiparentalidade está limitada a quatro pais no total, sendo apenas vedado que o reconhecimento bilateral ocorra de uma só vez. [...]Por fim, a norma estabelece que o reconhecimento espontâneo da paternidade ou maternidade socioafetiva não obstaculizará a discussão judicial sobre a verdade biológica, para os fins jurídicos próprios, inclusive familiares e sucessórios, na linha da tão comentada decisão do STF (Art.15 do Provimento 63 do CNJ). (TARTUCE, 2019, p.483).
Deste modo, a respeito da citação supracitada, resta claro que, ao ser reconhecida a paternidade ou maternidade socioafetiva, de forma livre e espontânea, não haverá problemas no que toca à verdade biológica, para os fins jurídicos.
Outrossim, ainda sobre o reconhecimento e a hierarquia na multiparentalidade, o STF, ao julgar o recurso extraordinário n.º 898.060, com repercussão geral reconhecida, admitiu a coexistência entre as paternidades biológica e a socioafetiva, afastando qualquer interpretação apta a ensejar a hierarquização dos vínculos. (TARTUCE, 2019, p.231).
Ademais, pode-se citar a questão suscitada por Flávio Tartuce, no dia 22/09/2016, a respeito da decisão do STF acima mencionada, na esteira do julgamento do Recurso Extraordinário 898.060 e da análise da Repercussão Geral 622, em que foi aprovado o reconhecimento da multiparentalidade.
Como se sabe, a corte decidiu, por maioria, que “a paternidade socioafetiva, declarada ou não em registro, não impede o reconhecimento do vínculo de filiação concomitante, baseada na origem biológica, com os efeitos jurídicos próprios”.[1] De uma só tacada, o STF (a) reconheceu o instituto da paternidade socioafetiva mesmo à falta de registro – tema que ainda encontrava resistência em parte da doutrina de direito de família –; (b) afirmou que a paternidade socioafetiva não representa uma paternidade de segunda categoria diante da paternidade biológica; e (c) abriu as portas do sistema jurídico brasileiro para a chamada “multiparentalidade”. (TARTUCE, 2016, s.p.).
Destarte, é possível afirmar que, o reconhecimento do STF no que tange ao instituto da paternidade socioafetiva, ainda que sem registro, não representa uma paternidade inferior à biológica. Deste modo, surgiu a oportunidade de discutir, no ordenamento jurídico brasileiro, a respeito da multiparentalidade.
Além disso, Tartuce (2019) aborda ainda sobre a sucessão de pais biológicos e socioafetivos, o qual expõe que, “É possível que alguém herde de dois pais e uma mãe ou de um pai e duas mães. Dois pais – o biológico e o socioafetivo – também podem herdar concomitantemente de um mesmo filho, não tendo o nosso legislador previsto tal situação expressamente.” (TARTUCE, 2019, p.230)
Diante o exposto, entende- se que a sucessão será feita conforme os ditames jurídicos já estabelecidos no ordenamento, portanto, o filho herdará tanto dos pais biológicos quanto do socioafetivos e, estes, herdarão simultaneamente do mesmo filho.
Importante destacar, como se vê, que o tema proposto neste trabalho conduz a um caminho reflexivo analítico alicerçado ao seguinte problema de pesquisa: Os direitos na multiparentalidade serão duplicados, quanto aos efeitos sucessórios?
Desse modo a presente investigação se dedicará a: (i) analisar se há eventual hierarquia entre o vínculo socioafetivo e o biológico; (ii) examinar os efeitos para a sucessão, no caso de ausência de hierarquia; e (iii) apresentar o conceito de multiparentalidade e parentalidade socioafetiva.
Para tanto, no capítulo 2 apresenta-se o conceito e a evolução do Direito de Família, no capítulo 3 são caracterizados os tipos de família existentes, em seguida, o capítulo 4 dispõe sobre o entendimento acerca da concomitância familiar, no capítulo 5 são expostas as características e os requisitos para a sucessão familiar, adiante, no capítulo 6 são apresentados os efeitos da sucessão após a concomitância das filiações, no capítulo 7 explana-se sobre o reconhecimento da multiparentalidade no ordenamento jurídico brasileiro e, por fim a conclusão.
Insta salientar que o tema objeto deste projeto é recente e ainda necessita de pesquisas que explorem a matéria. Dessa forma, dada à incipiência de pesquisas sobre a temática, o presente trabalho se justifica e poderá servir como mais uma fonte para ampliação dos debates no campo do Direito das Famílias. Além das doutrinas referenciadas, serão analisadas as legislações pertinentes e julgados de tribunais de justiça, os quais poderão iluminar a pesquisa proposta.
1 CONCEITO E EVOLUÇÃO DE DIREITO DE FAMÍLIA
O Direito de Família sofreu diversas mudanças no decorrer dos anos, diante do reconhecimento de vários direitos que antigamente não eram recepcionados pela Constituição Federal Brasileira, e devido ao surgimento de outros tipos de relações familiares.
O direito de família é, de todos os ramos do direito, o mais intimamente ligado à própria vida, uma vez que, de modo geral, as pessoas provêm de um organismo familiar e a ele conservam-se vinculadas durante a sua existência, mesmo que venham a constituir nova família pelo casamento ou pela união estável.[...] A Constituição Federal e o Código Civil a ela se reportam e estabelecem a sua estrutura, sem no entanto defini-la, uma vez que não há identidade de conceitos tanto no direito como na sociologia. Dentro do próprio direito a sua natureza e a sua extensão variam, conforme o ramo. (GONÇALVES, 2012, p. 23)
Segundo o entendimento de Gonçalves, não há uma definição expressa do conceito de Direito de Família no ordenamento jurídico, pelo fato de haver mudanças sociais frequentes que trazem com sigo uma extensa variedade de concepção de família.
De outro modo, para Flávio Tartuce, o Direito de Família pode ser conceituado como:
O ramo do Direito Civil que tem como conteúdo o estudo dos seguintes institutos jurídicos: a) casamento; b) união estável; c) relações de parentesco; d) filiação; e) alimentos; f) bem de família; g) tutela, curatela e guarda. Como se pode perceber, tornou-se comum na doutrina conceituar o Direito de Família relacionando-o aos institutos que são estudados por esse ramo do Direito Privado.[...] Além desse conteúdo, constante do atual Código Civil, acrescente-se a investigação contemporânea das novas manifestações familiares (novas famílias).[...] (TARTUCE, 2017, p. 01).
Portanto, o conceito de Direito de Família se faz através da abrangência de diversos institutos jurídicos correlacionados, que demonstram a concepção da relação familiar conforme as mudanças sofridas.
Antes da década de 80, quando se falava em família, as pessoas se referiam logo ao modelo de família patriarcal, de caráter econômico.
O núcleo familiar dispunha de perfil hierarquizado e patriarcal, cujos membros representavam força de trabalho. Esse quadro não resistiu à revolução industrial, que fez aumentar a necessidade de mão de obra. Foi assim que a mulher ingressou no mercado de trabalho, deixando o homem de ser a única fonte de subsistência da família. (VIEGAS; POLI; SILVA, 2019, p. 4)
Entretanto, a partir da evolução social, em que ocorreram mudanças no núcleo familiar, foram surgindo outros tipos familiares no ordenamento jurídico, como, por exemplo, a família monoparental, homoafetiva, socioafetiva, dentre tantas outras.
Desta forma, ainda que cada um desses modelos familiares possuam características distintas, há entre eles um grande ponto em comum, qual seja, a afetividade. O afeto é a nova referência no âmbito familiar, e o que se pode observar é que o conceito de família se amplia cada vez mais, trazendo consigo este vínculo afetivo e excluindo outros vínculos que, com o passar dos anos, importam menos, como o vínculo sanguíneo.
Além do mais, no que se refere ao processo de evolução de família na contemporaneidade, Rodrigo da Cunha Pereira e Maria Berenice Dias mencionam que:
A travessia para o novo milênio transporta valores totalmente diferentes, mas traz como valor maior uma conquista: a família não é mais um núcleo econômico e de reprodução, onde sempre esteve instalada a suposta superioridade masculina. Passou a ser muito mais um espaço para o desenvolvimento do companheirismo, do amor, e, acima de tudo, o núcleo formador da pessoa e elemento fundante do próprio sujeito. (PEREIRA; DIAS, 2003, p. 14).
Destarte, de acordo com o entendimento dos doutrinadores supracitados, resta clara a evolução e transformação das famílias contemporâneas, em especial, no que tange à distinção de deveres e tarefas entre o homem e a mulher. Isto é, no decorrer dos anos, o companheirismo entre o casal se tornou cada vez mais presente, minimizando o que se pode chamar de superioridade masculina.
Nesse sentido:
A Constituição Federal, ao eleger como princípio a liberdade de planejamento familiar e o pluralismo das entidades familiares, sem distinção ou hierarquia, todas merecedoras de proteção estatal, alargou o conceito de família, que não ocorre mais apenas no modelo jurídico do casamento, que se constitui previamente pela celebração, ou na filiação biológica. Também se constitui pela situação de fato, consistente na convivência socioafetiva, no querer recíproco de seus membros nucleares em ser família, de desenvolver um projeto de vida comum, independentemente de qualquer ato formal de constituição. (CARVALHO, 2015, p. 54).
Deste modo, devido às inúmeras mudanças sociais, houve a adequação no ordenamento jurídico em relação à família tradicional. Ou seja, é possível observar que, com o passar dos anos, funções hierarquizadas e patriarcais, começaram a dar lugar para a afetividade, deixando de lado quaisquer distinções ou discussões no que diz respeito a sexo ou consanguinidade.
É válido mencionar ainda, a respeito deste assunto, um breve comentário feito por Maria Berenice Dias: “(...) o princípio da afetividade é hoje o norteador do direito das famílias” (2016, p.56). Isto é, atualmente, a afetividade se faz cada vez mais presente no âmbito familiar, excluindo qualquer diferença ou preconceito.
Ademais, outro fator considerado de grande evolução nas famílias é que, no Código Civil de 1916, a família tradicional era conceituada pelo parentesco consanguíneo e reconhecida pelo casamento formal, o qual possuía um sistema patriarcal e era considerado como unidade de produção. Vejamos:
Art. 380. Durante o casamento compete o pátrio poder aos pais, exercendo-o o marido com a colaboração da mulher. Na falta ou impedimento de um dos progenitores, passará o outro a exercê-lo com exclusividade. (Redação dada pela Lei nº 4.121, de 1962.)
Parágrafo único. Divergindo os progenitores quanto ao exercício do pátrio poder, prevalecerá a decisão do pai, ressalvado à mãe o direito de recorrer ao juiz, para solução da divergência. (BRASIL, 1916).
Todavia, diferentemente da conceituação exposta, o conceito de família, segundo a Constituição Federal Brasileira de 1988 (CF/1988), passa a englobar maior número de possibilidades para a formação de entidade familiar, tendo em vista a valorização jurídica das relações unidas com base no afeto.
Salienta-se que, além da igualdade entre homem e mulher, a Constituição Federal expõe em seu artigo 227, §6º, a igualdade entre filhos biológicos e socioafetivos, todos com os mesmos direitos e qualificações, sendo proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.
Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.
§ 1º O casamento é civil e gratuita a celebração.
§ 2º O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei.
§ 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.
§ 4º Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes.
§ 5º Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher.
§ 6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio. (Redação dada Pela Emenda Constitucional nº 66, de 2010)
§ 7º Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas.
§ 8º O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações. (BRASIL, 1988).
Logo, o sistema jurídico reconheceu outros tipos de família, além da matrimonial heteroafetiva, como a homoafetiva, a união estável, a anaparental, que serão investigadas em tópico próprio, mas apenas três são explícitas na Constituição Brasileira de 1988, sendo estas: o casamento; a união estável; e a família monoparental.
Em suma, a falta de inclusão das outras modalidades na Carta Magna não prejudica a aplicação das demais entidades, devendo ser consideradas, pois pautam-se na afetividade, sendo este, deveres impostos aos pais em relação aos filhos e podendo ser, também, os laços criados entre os familiares; na estabilidade, tempo de convivência de durabilidade extensa e; na ostensibilidade, que é o intuito de formar uma família.
Como se vê, portanto, há, na contemporaneidade a possibilidade de diferentes tipos de entidade familiar.
2 TIPOS DE FAMÍLIA
Há diversos tipos de família reconhecidos pelo ordenamento jurídico brasileiro, que possuem vínculos estruturados a partir do afeto. O que se pode observar, é que as famílias da atualidade se amplificaram para além dos preceitos constitucionais, tendo em vista que os novos modelos de família encontram-se sob o pilar da afetividade.
A respeito dessa temática, Rolf Madaleno:
A família do passado não tinha preocupações com o afeto e a felicidade das pessoas que formavam seu principal núcleo, pois eram os interesses de ordem econômica que gravitavam em torno daquelas instâncias de núcleos familiares construídos com suporte na aquisição de patrimônio. [...] E, se a família tem atualmente outro perfil que se alargou para além das fronteiras enlaçadas pela Constituição Federal com o casamento (CF, art. 226, § 1º); a união estável (CF, art. 226, § 3º) e a família monoparental, representada pela comunidade formada por qualquer dos pais com seus descendentes (CF, art. 226, § 4º), cumpre então localizar essas famílias denominadas plurais e concluir sobre suas formações e seus efeitos. (MADALENO, 2017, p. 3)
Portanto, com a evolução das famílias no ordenamento jurídico brasileiro, explica-se, a seguir, os principais tipos familiares existentes, quais sejam: família monoparental; família anaparental; família matrimonial, tradicional ou nuclear; família informal ou em união estável; família unipessoal e família reconstituída, multiparental ou mosaico.
2.1 Família monoparental
A família monoparental está fundamentada no artigo 226, §4º, da Constituição Federal de 1988: “A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. §4º Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes". (BRASIL, 1988).
A monoparentalidade tem origem a partir do falecimento do pai ou da mãe, ou na separação ou divórcio dos pais. A respeito desse assunto, o autor Rolf Madaleno expõe:
[…] é fruto, sobretudo, das uniões desfeitas pelo divórcio, pela separação judicial, pelo abandono, morte, pela dissolução de uma estável união, quando decorrente da adoção unilateral, ou ainda da opção de mães ou pais solteiros que decidem criar sua prole apartada da convivência com o outro genitor. (MADALENO, 2015, p.36)
Contudo, existem ainda diversas situações em que podem ser consideradas como monoparentalidade, quais sejam: a inseminação artificial pela mulher solteira, ou a fertilização artificial, quando ocorre o falecimento do marido; a adoção por pessoa solteira; a entidade familiar orientada por parente que não seja o pai ou a mãe; e as estruturas de convívio formadas por uma pessoa que não seja parente, mas que tenha sob sua guarda crianças ou adolescentes.
Neste sentido, a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 227, §6º, determinou os mesmos direitos e qualificações aos filhos havidos ou não do casamento e proibiu qualquer tipo de discriminação.
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
§6º. Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação. (BRASIL, 1988)
Visto isso, pode-se dizer que todos os filhos são iguais perante a lei, independentemente da forma de aquisição destes. Além disso, não se faz necessária a consanguinidade para constituir a família monoparental, tendo como requisito, que haja a presença de um dos pais e seu filho.
A respeito deste assunto, o autor Rolf Madaleno expõe o seguinte:
Outro fator responsável pela disseminação do modelo monoparental de família certamente origina do reconhecimento constitucional da igualdade da filiação, encerrando o execrável ciclo da legitimidade da prole em razão do casamento e discriminando os filhos do amor, porque adotivos, naturais, incestuosos ou extraconjugais. (MADALENO, 2021, p.39)
Deste modo, de acordo com Madaleno, deve haver um reconhecimento igualitário na filiação, sem qualquer distinção ou discriminação.
Insta salientar que, para que uma família seja considerada monoparental, é necessário que exista uma distinção de gerações entre um de seus membros e os demais, contanto que não haja relacionamento de forma sexual entre eles. Ademais, é válido ressaltar que não é a existência de menores de idade que permite o reconhecimento da família como monoparental, uma vez que a maioridade dos descendentes não interfere nesse modelo familiar.
2.2 Família anaparental
A família anaparental, embora não encontrada na letra da lei, é reconhecida como entidade familiar pelo ordenamento jurídico, através da seguinte jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça:
EXECUÇÃO. EMBARGOS DE TERCEIRO. LEI 8009/90. IMPENHORABILIDADE. MORADIA DA FAMÍLIA. IRMÃOS SOLTEIROS. OS IRMÃOS SOLTEIROS QUE RESIDEM NO IMOVEL COMUM CONSTITUEM UMA ENTIDADE FAMILIAR E POR ISSO O APARTAMENTO ONDE MORAM GOZA DA PROTEÇÃO DE IMPENHORABILIDADE, PREVISTA NA LEI 8009/90, NÃO PODENDO SER PENHORADO NA EXECUÇÃO DE DÍVIDA ASSUMIDA POR UM DELES. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.” (STJ. REsp 159851/SP, Rel. Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR, QUARTA TURMA, julgado em 19/03/1998, DJ 22/06/1998 p. 100).
Deste modo, de acordo com a jurisprudência supracitada, é válido salientar que uma família pode ser composta por dois irmãos solteiros que residem em um mesmo imóvel, constituindo entidade familiar, sendo esta, uma modalidade de família anaparental.
Ademais, o Supremo Tribunal de Justiça determinou ainda: “[…] Nessa senda, a chamada família anaparental sem a presença de um ascendente, quando constatado os vínculos subjetivos que remetem à família, merece o reconhecimento e igual status […]” (STJ, REsp 1217415 RS, Rel.ª Min.ª Nancy Andrighi, 3ª T., publ. 28/06/2012).
Portanto, foi reconhecida a constituição de entidade familiar entre irmãos solteiros, para que possam gozar dos direitos estabelecidos em lei, como, por exemplo, a impenhorabilidade do bem de família, uma vez que estes possuem vínculos subjetivos.
Ainda, a respeito desse modelo familiar, é importante mencionar uma reflexão feita por Maria Berenice Dias:
Mesmo que a Constituição tenha alargado o conceito de família, ainda assim não enumerou todas as conformações familiares que existem. A diferença de gerações não pode servir de parâmetro para o reconhecimento de uma estrutura familiar. Não é a verticalidade dos vínculos parentais em dois planos que autoriza reconhecer a presença de uma família merecedora da proteção jurídica. No entanto, olvidou-se o legislador de regular essas entidades familiares. A convivência entre parentes ou entre pessoas, ainda que não parentes, dentro de uma estruturação com identidade de propósito, impõe o reconhecimento da existência de entidade familiar batizada com o nome de família parental ou anaparental. (DIAS, 2015, p. 140)
Destarte, pode-se dizer que um núcleo constituído por irmãos ou primos que vivem em família, compõe uma família anaparental. Ainda, pode-se definir a família anaparental como o ente familiar que decorre da convivência entre pessoas, ainda que não sejam parentes, unidas por vínculo de afetividade. Sendo assim, uma família anaparental pode incluir primos, irmãos e até mesmo amigos que vivem juntos, compondo uma estrutura familiar.
Conclui-se, então, que esse tipo de família consiste na falta da figura dos pais, em que os filhos são criados por parentes colaterais ou outro indivíduo que tenha a finalidade de manter uma relação familiar e que tenha como base, a afetividade.
2.3 Família matrimonial/Tradicional/Nuclear
O tipo de família matrimonial, também chamado de família tradicional ou nuclear, é o modelo familiar mais conhecido no país e foi o primeiro a surgir na sociedade após secularização do casamento, pelo Decreto n. 181, de 1890 que dispunha de lei sobre o casamento civil.
Logo, foi regulamentado no ordenamento jurídico brasileiro pela Constituição Federal de 1891, o qual expunha em seu artigo 72, § 4º, tal entidade como a única forma de família:
Art. 72- A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros residentes no Brasil a inviolabilidade dos direitos concernentes à liberdade, a segurança individual e a propriedade, nos termos seguintes:
A República só reconhece o casamento civil, cuja celebração será gratuita.” (BRASIL, 1891)
Em seguida, foi regulamentado pelo Código Civil de 1916 os aspectos para a formalização da família matrimonial, sendo determinado em um de seus artigos o seguinte: “Art. 229. Criando a família legítima, o casamento legitima os filhos comuns, antes dele nascidos ou concebidos”. (BRASIL, 1916)
Ademais, o ordenamento jurídico passou por diversas modificações devido às alterações no seio da sociedade e o modelo de família matrimonial, consiste a partir da oficialização da união, através do casamento civil entre duas pessoas. Assim, sobre o conceito de família, o autor Rolf Madaleno determina suas alterações:
A família matrimonializada, patriarcal, hierarquizada, heteroparental, biológica, institucional vista como unidade de produção cedeu lugar para uma família pluralizada, democrática, igualitária, hetero ou homoparental, biológica ou socioafetiva, construída com base na afetividade e de caráter instrumental. (MADALENO, 2015, p.36)
Na atualidade, esta modalidade abrange tanto casais heterossexuais, quanto casais homoafetivos, conforme o determinado pela Resolução Nº 175 de 14/05/2013: “É vedada às autoridades competentes a recusa de habilitação, celebração de casamento civil ou de conversão de união estável em casamento entre pessoas de mesmo sexo”. Além disso, visa a igualdade de direitos e responsabilidades sem nenhuma distinção, gerando efeitos jurídicos de sucessão e de regime de bens.
Com isso, sendo a modalidade mais comum de família, a partir do matrimônio, ambos devem contribuir na administração da família, como a educação, a vivência, o sustento, de forma que prevaleça a igualdade de todos.
2.4 Família informal/União estável
Antes da chegada da Constituição Federal de 1988 e do Código Civil de 2002, não havia disposição legal para a união estável, fato este que pode ser observado no Código Civil de 1916, em que nada se falava sobre o tema, a não ser a respeito de normas restritivas impostas aos concubinatos, expressão que se referia a uma situação em que o homem ou a mulher mantinham, fora do casamento, um outro relacionamento, e esta terceira pessoa envolvida denominava-se concubina ou concubino.
A respeito do concubinato, o autor Carlos Roberto Gonçalves esclarece:
Malgrado a impropriedade da expressão utilizada, deve-se entender que nem todos os impedidos de casar são concubinos, pois o Parágrafo 1º do art. 1.723 trata como união estável a convivência pública e duradoura entre pessoas separadas de fato e que mantêm o vínculo de casamento, não sendo separadas de direito. (GONÇALVES, 2008, p. 606)
Destarte, a união estável é constituída por casal sem oficialização da união, tendo em vista a convivência contínua e duradoura para sua formação e reconhecimento, requisito este, previsto no artigo 1.723 do Código Civil 2002, em que “é reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família”. (BRASIL, 2002).
Outrossim, sobre esse tipo familiar, é válido mencionar que a Constituição Federal de 1988 inovou ao reconhecer, em seu artigo 226, §3º, a ”união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”. (BRASIL, 1988).
Ainda, pode-se dizer que é requisito para a caracterização da união estável a diversidade de sexo entre os companheiros, de acordo com o artigo 226, §3º da Constituição Federal e artigo 1.723 do Código Civil, supracitados. Ademais, o autor Carlos Roberto Gonçalves comenta a respeito do tema: “por se tratar de modo de constituição de família que se assemelha ao casamento, apenas com a diferença de não exigir a formalidade da celebração, a união estável só pode decorrer de relacionamento de pessoas de sexo diferente”. (GONÇALVES, 2008, p. 552)
Além disso, para que a união estável seja reconhecida, não se faz necessário estar o casal morando na mesma casa, assim como estabelece o enunciado da Súmula nº 382 do STF, que diz: “A vida em comum sob o mesmo teto, more uxório, não é indispensável à caracterização do concubinato (expressão que, à época, era entendido como sinônimo de união estável)”. Ainda, é válido mencionar que não será reconhecida a união estável apenas em razão do nascimento de um filho.
Deste modo, salienta-se que o tipo de família informal ou união estável, é semelhante à família matrimonial, inclusive em relação aos direitos, porém, não há a oficialização, o registro legal da união entre o casal.
2.5 Família unipessoal
A família unipessoal apesar de não possuir o requisito da afetividade para se caracterizar como entidade familiar, é reconhecida pelo ordenamento jurídico como família, visando a proteção dos bens e moradia da pessoa que vive sozinha, ou seja, tornando-os impenhoráveis.
Tal entendimento foi acolhido pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça), que editou a Súmula nº 364, determinando que "o conceito de impenhorabilidade de bem de família abrange também o imóvel pertencente a pessoas solteiras, separadas e viúvas", portanto, os bens necessários para a subsistência da família unipessoal, equiparam-se ao dos demais tipos de família. Ainda, o autor Álvaro Villaça Azevedo expõe sobre o bem de família: “Assim, o bem de família unipessoal protege a pessoa que vive solitariamente. Todo ser humano necessita de proteção, no seu lar, não podendo ficar excluído porque optou por viver sozinho.” (AZEVEDO, 2019, p. 353)
Destarte, é importante ressaltar que, a constituição da família unipessoal possui sua origem em fato jurídico. Isto é, ela começa em um grupo familiar, bem como os previstos nos artigos 1.591 a 1.595 do Código Civil de 2002. Entretanto, ela se transforma, em razão de um fato jurídico, como o falecimento de um ou mais membros que antes faziam parte dela, em uma família unipessoal, por passar a existir somente com uma pessoa.
Além disso, é válido acrescentar o conceito de família unipessoal feito pelo autor Cleyson de Morais Mello:
[...] aquela composta por apenas uma pessoa; apesar do uso da expressão “família unipessoal” é necessário esclarecer que inexiste família monolítica, ou seja, família de uma só pessoa. O termo família é plural, não se concebendo que uma pessoa sozinha possa ser família de si mesmo. O que se pode entender é que as pessoas que moram sozinhas tenham a mesma proteção estatal que as entidades familiares. (MELLO, 2017, p.139)
Desta forma, insta salientar que este tipo familiar é composto por uma pessoa que, sozinha, representa a memória de uma família, sem que haja a necessidade de se relacionar com outras pessoas.
2.6 Família reconstituída/Multiparental/Mosaico
Por fim, esta modalidade, objeto da pesquisa, se trata de família constituída a partir da união de um casal, em que pelo menos um deles possui filho de outro relacionamento.
Ademais, pelo fato da convivência regular com o enteado, alguns pais socioafetivos criam laços afetivos fortes, o que faz com que passem a considerá-los como se filhos biológicos fossem. Visto isso, esses pais querem fazer parte do registro civil da criança ao lado dos pais biológicos.
Outrossim, o ordenamento jurídico através da repercussão geral 622 do STF (Supremo Tribunal Federal) determinou: “a paternidade socioafetiva, declarada ou não em registro, não impede o reconhecimento do vínculo de filiação concomitante, baseada na origem biológica, com os efeitos jurídicos próprios” (Recurso Extraordinário 898.060/ SC, 2016, publicado no seu Informativo n. 840), ou seja, decidiu reconhecer esta modalidade de família, visando o direito à convivência familiar, a afetividade e a dignidade humana, sendo possível o reconhecimento do vínculo estabelecido a partir da relação afetiva, além da biológica.
Assim, o autor Flávio Tartuce expõe, sobre o reconhecimento da entidade familiar:
[...] passou a ser admitida pelo Direito brasileiro, mesmo que contra a vontade do pai biológico. Ficou claro, pelo julgamento, que o reconhecimento do vínculo concomitante é para todos os fins, inclusive alimentares e sucessórios. Quanto aos efeitos sucessórios, na VIII Jornada de Direito Civil, promovida pelo Conselho da Justiça Federal em abril de 2018, aprovou-se o Enunciado n. 632, segundo o qual, “nos casos de reconhecimento de multiparentalidade paterna ou materna, o filho terá direito à participação na herança de todos os ascendentes reconhecidos”. Sem dúvida, teremos grandes desafios com essas afirmações, mas é tarefa da doutrina, da jurisprudência e dos aplicadores do Direito resolver os problemas que surgem, de acordo com o caso concreto. (TARTUCE, 2020, p.511)
Portanto, a multiparentalidade não depende de interesse da parte biológica, sendo reconhecida a partir da análise da convivência e afeto entre as partes. Contudo, o filho reconhecido por mais de dois pais, terá direito a participação na herança de todos os pais registrados no assento de registro civil, sem exceção.
Além disso, é importante mencionar, conforme o teor do artigo 14 do Provimento 63/2017, “o reconhecimento da paternidade ou maternidade socioafetiva somente poderá ser realizado de forma unilateral e não implicará o registro de mais de dois pais e de duas mães no campo FILIAÇÃO no assento de nascimento”.
Ainda, sobre a o reconhecimento da multiparentalidade, Flávio Tartuce entende que:
A multiparentalidade está limitada a quatro pais no total, sendo apenas vedado que o reconhecimento bilateral ocorra de uma só vez.
Por fim, a norma estabelece que o reconhecimento espontâneo da paternidade ou maternidade socioafetiva não obstaculizará a discussão judicial sobre a verdade biológica, para os fins jurídicos próprios, inclusive familiares e sucessórios, na linha da tão comentada decisão do STF (art.15 do Provimento 63 do CNJ). (TARTUCE, 2019, p.483-484)
Em síntese, há na multiparentalidade a possibilidade de o menor ter em seu registro civil, pais socioafetivos em concomitância com os biológicos, mas com registro máximo de 04 (quatro) pais, mantendo intacto seus fins jurídicos próprios com relação a todos os pais, sejam biológicos ou socioafetivos.
3 A CONCOMITÂNCIA FAMILIAR
Conforme citado anteriormente, a multiparentalidade, também conhecida como pluriparentalidade, é formada pela paternidade estruturada pela presença de dois representantes paternos e ou duas representantes maternas. Normalmente, consiste na presença concomitante de uma mãe ou um pai biológico e de uma mãe ou um pai socioafetivo, tendo o limite de 04 (quatro) registros por pessoa, estabelecido pelo artigo 14 do Provimento 63/2017: “Art. 14. O reconhecimento da paternidade ou maternidade socioafetiva somente poderá ser realizado de forma unilateral e não implicará o registro de mais de dois pais e de duas mães no campo FILIAÇÃO no assento de nascimento”. (BRASIL, 2017).
É importante ressaltar, que a multiparentalidade é um fato social que ocorre quando o filho ou a filha reconhece como seu pai ou sua mãe, mais de uma pessoa. Isso acontece em razão dos vínculos afetivos que resultam de determinados modelos familiares, em concomitância com os biológicos.
Neste sentido, a respeito da multiparentalidade ou pluriparentalidade, Maria Berenice Dias relata: “Pluriparentalidade é reconhecer a existência de múltiplos vínculos de filiação em que todos os pais assumem os encargos decorrentes do poder familiar e o filho os direitos em relação a todos, no âmbito do direito das famílias e sucessões”. (DIAS, 2015, p. 31).
Sobre este assunto, no dia 22 de setembro de 2016, o STF considerou uma tese prevendo a possibilidade de registro da paternidade biológica, sem repulsão da paternidade socioafetiva e igualando o reconhecimento dos efeitos patrimoniais acarretados por esse registro. Destarte, a tese foi determinada em julgamento ao Recurso Especial n. 898.060/SC e expõe que: “A paternidade socioafetiva, declarada ou não em registro público, não impede o reconhecimento do vínculo de filiação concomitante baseado na origem biológica, com os efeitos jurídicos próprios.” (BRASIL, 2016).
Ademais, é válido expor a opinião da autora Silvana do Monte Moreira, que apresenta projeções para o futuro das famílias e das decisões judiciais provenientes de avanços:
Nada impedirá que, em breve, uma criança tenha dois pais e duas mães, pois, a diversidade dos modelos familiares não parará em apenas 3 membros. Nada impede que essa comunidade viva e plural continue a alterar-se constantemente, agregando, cada vez mais, componentes pelo afeto. (MOREIRA, 2015, p. 359)
Além disso, é importante mencionar que, com a multiparentalidade, surgem novos e diversos tipos de relações. Onde os cônjuges ou companheiros passam a ter novos parentes por afinidade, os filhos passam a ter novos irmãos, novos pais, dentre outras variadas situações. Diante dessas relações e entre os integrantes dessas relações, são desenvolvidos novos vínculos que nem sempre são biológicos, mas também, afetivos, onde o amor e o cuidado fazem nascer uma relação de parentalidade socioafetiva.
Por fim, ressalta-se que a relação consanguínea não mais é suficiente para assegurar a maternidade e a paternidade, ou até mesmo um vínculo jurídico, uma vez que o sustento está, em primeiro lugar, no afeto.
4 SUCESSÃO FAMILIAR
A sucessão é o procedimento pelo qual se faz a transmissão dos bens de uma pessoa à outra, no caso de seu falecimento, tendo em vista, as relações de parentesco entre pessoas que mantêm entre si um vínculo familiar e, principalmente, de afetividade, devendo-se observar a ordem de vocação hereditária, conforme se expressa o artigo 1.829 do Código Civil:
Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:
I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;
II - aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;
III - ao cônjuge sobrevivente;
IV - aos colaterais.(BRASIL, 2002).
Além da ordem de vocação elencada no Código Civil, é levado em consideração ainda três tipos de parentesco, quais sejam, consanguíneo, civil e por afinidade, sendo todos equiparados no momento da sucessão. Assim, o parentesco consanguíneo, se caracteriza pelo vínculo biológico ou de sangue, diferente do parentesco por afinidade, que tem em vista os ascendentes, descendentes e os irmãos do cônjuge ou companheiro, segundo estabelece o artigo 1.595, §1º do Código Civil.
Ainda, há o parentesco civil, que conforme o artigo 1.593 do Código Civil, resulta de outra origem, como por exemplo, a multiparentalidade, em razão do reconhecimento de filiação socioafetiva, bem como, a adoção e à técnica de reprodução assistida heteróloga, os quais têm como princípio o melhor interesse do filho.
Ademais, de acordo com o entendimento de Cristiano Chaves de Farias juntamente com Nelson Rosenvald, sobre o termo filiação:
Sob o ponto de vista técnico jurídico, a filiação é a relação de parentesco, estabelecidas entre pessoas que estão em primeiro grau em linha reta entre uma pessoa e aqueles que a geraram ou que a acolheram e criaram, com base no afeto e na solidariedade, almejando o desenvolvimento da personalidade e a realização pessoal. (FARIAS, ROSENVALD, 2015, p. 543)
Em síntese, a filiação é designada de acordo com o grau de parentesco em linha reta, em que se têm por base o afeto e a solidariedade entre as pessoas. No mais, para suceder uma pessoa não se faz necessário ser parente de sangue, podendo também, haver um parentesco por afinidade ou civil.
4.1 Efeitos da sucessão após a concomitância das filiações
Por certo, em relação a sucessão em famílias caracterizadas pela multiparentalidade, esta não há distinção quanto aos direitos e procedimentos utilizados em famílias tradicionais, tendo em vista que a Constituição Federal proíbe a discriminação dos filhos em seu artigo 227, §6º: “Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação”. (BRASIL, 1988).
Ainda, tratando-se de família multiparental constituída por um vínculo familiar, com base na afetividade e na posse de estado do filho, este vínculo gerará relações de parentesco, assim como Maria Berenice Dias relata: “A paternidade deriva do estado de filiação independentemente se sua origem é biológica ou afetiva. A ideia de paternidade está fundada muito mais no amor do que submetida a determinismos biológicos” (DIAS, 2015, p. 363).
Portanto, os pais da criança não serão indicados apenas pelo vínculo sanguíneo, mas sim, em razão daquele que exerce a paternidade com amor e cuidado, tendo em vista a busca pela felicidade e o melhor interesse da criança, bem como, a dignidade da pessoa humana.
Visto isso, sendo a multiparentalidade apenas reconhecida pelo STF, a partir de uma Repercussão Geral, como mais um tipo de família, este não há, até o momento, normas específicas quanto à sucessão e demais direitos. Porém, é previsto pelo Enunciado n. 632, da VIII Jornada de Direito Civil, promovida pelo Conselho da Justiça Federal em abril de 2018, que, “Nos casos de reconhecimento de multiparentalidade paterna ou materna, o filho terá direito à participação na herança de todos os ascendentes reconhecidos”. Outrossim, sobre a hierarquização dos vínculos, o Supremo Tribunal Federal proferiu nos termos de sua ementa:
O Supremo Tribunal Federal, ao julgar o recurso extraordinário nº 898.060, com repercussão geral reconhecida, admitiu a coexistência entre as paternidades biológica e a socioafetiva, afastando qualquer interpretação apta a ensejar a hierarquização dos vínculos. (STJ - REsp 1.618.230/RS, 3.ª Turma, Rel. Min. RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Data do Julgamento: 28/03/2017, Data da Publicação: 10/05/2017)
Desta forma, não havendo nenhuma hierarquização entre as paternidades biológicas e socioafetivas, os efeitos da sucessão após a concomitância das filiações, serão os mesmos obtidos nas sucessões decorrentes de famílias tradicionais, devendo ser seguido as normas de sucessão estabelecidas pelo Código Civil. Contudo, deve-se contrariar certas partes do Código Civil de modo a equiparar os quinhões dos ascendentes, tendo em vista que todos os pais e mães, por estarem em mesmo grau de linha sucessória, estes herdarão igualmente. Assim, estabeleceu o Enunciado 642 do Conselho Federal de Justiça na VIII Jornada de Direito Civil:
Nas hipóteses de multiparentalidade, havendo o falecimento do descendente com o chamamento de seus ascendentes à sucessão legítima, se houver igualdade em grau e diversidade em linha entre os ascendentes convocados a herdar, a herança deverá ser dividida em tantas linhas quantos sejam os genitores (CONSELHO FEDERAL, Enunciado 642, 2018).
Visto isso, caso ocorra concorrência entre múltiplos ascendentes de mesmo grau e o cônjuge ou companheiro do falecido, este deverá ter sua quota parte preservada de acordo com o artigo 1.837 do Código Civil, ou seja, “Concorrendo com ascendente em primeiro grau, ao cônjuge tocará um terço da herança; caber-lhe-á a metade desta se houver um só ascendente, ou se maior for aquele grau” (BRASIL, 2002), já os demais ascendentes, terão a partilha de forma igualitária.
Neste sentido, Christiano Cassettari, expõe que, “Acreditamos que nesse caso a divisão igualitária se impõe, devendo a lei ser flexibilizada em razão do caso específico, já que as regras sucessórias não estavam preparadas para a multiparentalidade”. (CASSETTARI, 2017, p. 264), ou seja, deve ser observado sempre o princípio da razoabilidade e proporcionalidade.
Ademais, a herança também deverá ser igualitária entre os filhos, conforme posicionamento de Tartuce a respeito deste assunto, em que expõe: “[...] Com isso, preserva-se, para ele, a igualdade entre os filhos, consagrada no art. 227, § 6º, da Constituição Federal e no art. 1.832 do Código Civil em relação à divisão igualitária entre os descendentes”. (TARTUCE, 2019, p. 211).
Portanto, a respeito dos efeitos da sucessão após a concomitância das filiações, Flávio Tartuce expõe também: “É possível que alguém herde de dois pais e uma mãe ou de um pai e duas mães[...]. Dois pais – o biológico e o socioafetivo – também podem herdar concomitantemente de um mesmo filho, não tendo o nosso legislador previsto tal situação expressamente.” (TARTUCE, 2019, p. 230).
Em suma, pode-se afirmar, então, que a sucessão será feita conforme os ditames jurídicos já estabelecidos no ordenamento, sendo o filho herdeiro de seus pais, e estes serão herdeiros de seus filhos, sejam eles biológicos ou afetivos, não havendo quaisquer distinções ou hierarquia entre eles.
5 RECONHECIMENTO DO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO
Como já mencionado anteriormente, não há atualmente uma legislação especial sobre a multiparentalidade ou pluriparentalidade. Porém, ainda que não haja esta legislação específica, há entendimentos doutrinários, jurisprudenciais e dispositivos legais já existentes sobre o presente assunto, em que são utilizadas algumas normas do Código Civil Brasileiro de 2002 e da Constituição Federal de 1988, de forma a defender este tema.
O reconhecimento da multiparentalidade no ordenamento jurídico brasileiro, mostra uma grande evolução do Direito de Família no país, uma vez que legitima o princípio da dignidade da pessoa humana, e demonstra respeito pelo princípio da afetividade.
Além disso, é importante que sejam analisados os efeitos da multiparentalidade, para que a sua legitimidade seja reafirmada, sendo esta, uma maneira justa de determinação do elo de filiação, onde o elo biológico e o afetivo estão pareados e que, diversas vezes, é priorizado o elo construído na essência pela afetividade.
Nesta senda, a CF/88, em seu artigo 227, caput e parágrafo 6º, dispõe a respeito do dever da família em relação à criança, ao adolescente e ao jovem:
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (Redação dada Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010)
§ 6º: Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação. (BRASIL, 1988).
Deste modo, o artigo 1.596 do Código Civil possui uma grande relação com o artigo da Constituição Federal supracitado, que estabelece o seguinte: “Os filhos, havidos ou não da relação de casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação”. (BRASIL, 2002)
Nesta perspectiva, é válido acrescentar um julgado que menciona o dispositivo legal supracitado, o qual, trata-se de um recurso de apelação cível e refere-se a uma ação de investigação de paternidade, onde há a presença da relação de socioafetividade.
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE. PRESENÇA DA RELAÇÃO DE SOCIOAFETIVIDADE. DETERMINAÇÃO DO PAI BIOLÓGICO ATRAVÉS DO EXAME DE DNA. MANUTENÇÃO DO REGISTRO COM A DECLARAÇÃO DA PATERNIDADE BIOLÓGICA. POSSIBILIDADE. TEORIA TRIDIMENSIONAL. Mesmo havendo pai registral, o filho tem o direito constitucional de buscar sua filiação biológica (CF, § 6º do art. 227), pelo princípio da dignidade da pessoa humana. O estado de filiação é a qualificação jurídica da relação de parentesco entre pai e filho que estabelece um complexo de direitos e deveres reciprocamente considerados. Constitui-se em decorrência da lei (artigos 1.593, 1.596 e 1.597 do Código Civil, e 227 da Constituição Federal), ou em razão da posse do estado de filho advinda da convivência familiar. Nem a paternidade socioafetiva e nem a paternidade biológica podem se sobrepor uma à outra. Ambas as paternidades são iguais, não havendo prevalência de nenhuma delas porque fazem parte da condição humana tridimensional, que é genética, afetiva e ontológica. APELO PROVIDO. (TJRS; APELAÇÃO CÍVEL 70029363918; OITAVA CÂMARA CÍVEL; REL. DES. CLAUDIR FIDÉLIS FACCENDA; J. 7.5.2009).
Em resumo, a respeito do referido julgado, foi reconhecida a multiparentalidade, pelo Juiz da 2ª Vara da Infância e Juventude de Recife, ao invés de admitir a adoção unilateral da madrasta, autorizando que uma criança de 4 (quatro) anos fosse registrada no nome dos pais biológicos e no nome da companheira do pai, que o criava desde o seu nascimento, em razão da falta da mãe biológica.
Desta forma, levando em consideração o princípio do melhor interesse da criança, ficou determinado pelo juiz, que o menor teria duas mães jurídicas e um pai, por não enxergar razões para que o vínculo com a mãe biológica fosse destruído.
É importante mencionar ainda, que a Lei nº 6.015, de 1973 (Lei de Registros Públicos), em seu artigo 54, itens 7º e 8º, dispõe que deverão constar no registro do filho, os nomes e prenomes dos pais e dos avós. Deste modo, constará os nomes dos pais biológicos, do pai e ou da mãe socioafetivos, e ainda, constarão como avós todos os ascendentes destes. Sendo assim, o filho poderá utilizar o nome de todos os pais.
Outrossim, o artigo 47, § 4º da Lei nº 8.069, de 1990, que dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), determina que, a respeito da adoção, não constará quaisquer observações no registro sobre o ato. Desta maneira, o filho continuará com as relações de parentesco com a família dos pais biológicos, e passará a ter relações de parentesco com a família dos pais socioafetivos.
Por outro lado, foi determinado um limite referente a quantidade de registros parentais permitidos por pessoa, assim como explica Flávio Tartuce:
Restou esclarecido pelo então Corregedor-Geral de Justiça, Ministro João Otávio de Noronha, que a multiparentalidade está limitada a quatro pais no total, sendo apenas vedado que o reconhecimento bilateral ocorra de uma só vez. Por fim, a norma estabelece que o reconhecimento espontâneo da paternidade ou maternidade socioafetiva não obstaculizará a discussão judicial sobre a verdade biológica, para os fins jurídicos próprios, inclusive familiares e sucessórios, na linha da tão comentada decisão do STF.” (art.15 do Provimento 63 do CNJ). (TARTUCE, 2019, p. 483)
Destarte, o artigo 14 do provimento 63 da Corregedoria Nacional de Justiça prevê o limite máximo de quatro pais no campo filiação, ou seja, poderá ocorrer o registro de apenas um pai e uma mãe socioafetivos, e um pai e uma mãe biológicos. Entretanto, deve-se observar a regra do reconhecimento ser realizado apenas de forma unilateral, bem como maiores de 12 (doze) anos promoverão o registro por via extrajudicial, enquanto os que possuem idade inferior, deverão se utilizar da via judicial.
Ademais, o reconhecimento da multiparentalidade surgiu a partir do Supremo Tribunal Federal no dia 22/09/2016, que ao julgar o Recurso Extraordinário n. 898.060, fixou em repercussão geral de nº 622 a seguinte tese: "A paternidade socioafetiva, declarada ou não em registro, não impede o reconhecimento do vínculo de filiação concomitante, baseada na origem biológica, com os efeitos jurídicos próprios.”
No mais, a multiparentalidade tornou-se uma realidade jurídica da filiação, o qual produz efeitos na vida cotidiana da família, bem como efeitos jurídicos. Portanto, o reconhecimento deste tipo de família apenas regularizou o que já existia na realidade fática, incluindo apenas efeitos jurídicos como os da sucessão, alimentos, entre outros, tratando-se de igualdade de direitos e deveres parentais.
CONCLUSÃO
Diante de todo o exposto no presente artigo, pode-se afirmar, então, que a Multiparentalidade prevê a igualdade de direitos e deveres, tanto no que concerne aos pais biológicos quanto aos socioafetivos, inclusive no que diz respeito à prestação alimentícia e ao direito sucessório, não havendo, portanto, hierarquia entre eles.
Assim, devido à ausência de hierarquia entre os pais, quanto aos efeitos da sucessão após a concomitância das filiações, o filho será sucessor de ambos os pais e estes seriam sucessores do filho, não havendo distinção quanto aos direitos e procedimentos utilizados em famílias tradicionais, devendo ser seguido as normas de sucessão estabelecidas pelo Código Civil. Entretanto, o ordenamento entende que se deve contrariar uma parte do Código Civil, de modo a equiparar os quinhões dos ascendentes, pois todos os pais e mães se encontram no mesmo grau de linha sucessória.
Outrossim, com base na pesquisa realizada, afirma-se que a parentalidade socioafetiva, em sentido literal, trata-se da afetividade criada em um âmbito social. Em suma, é a constituição de uma sociedade familiar baseada no afeto, sendo este, capaz de construir vínculos entre as pessoas.
Agora, a multiparentalidade, refere-se à paternidade constituída pela presença de dois pais e ou duas mães, normalmente, a presença concomitante de um pai ou mãe biológico (a) e de um pai ou mãe socioafetivo (a), ressaltando que só é possível o registro com até 4 (quatro) pais. Essa situação é comum nos casos em que o casal que gerou o filho, deixam de ter um convívio juntos e cada um forma uma nova família, concedendo ao filho a oportunidade de conviver com um novo pai ou nova mãe, isto é, o pai ou mãe socioafetivo (a).
Ademais, sobre os assuntos analisados, ficou perceptível a importância do afeto como elemento principal a ser considerado em cada caso. Destarte, o presente artigo visou, especialmente, convidar à reflexão a respeito de uma temática contemporânea, ainda que já existente há décadas, conforme exposto nas pesquisas aqui presentes.
Além disso, foi possível concluir sobre a importância, para toda sociedade, em entender um pouco mais sobre um tema tão relevante como a Multiparentalidade, tendo em vista que engloba as questões jurídicas, bem como as questões particulares da vida do ser humano, uma vez que trata-se de um ponto relacionado ao interior de uma pessoa, que é o afeto, elemento esse que une as pessoas e vai além do vínculo sanguíneo.
Viu-se, também, de acordo com alguns julgados apresentados no decorrer da pesquisa, que é possível a coexistência dos nomes do pai e da mãe biológicos, bem como do nome do pai e da mãe socioafetivos, no registro de nascimento do filho ou da filha. Vale ressaltar que esses pais podem fazer parte de relações matrimoniais, união estável, homoafetivas, socioafetivas, dentre outras.
Por fim, sobre a os efeitos sucessórios, após minuciosa pesquisa, pode-se afirmar que tal direito será duplicado, podendo o filho ser sucessor de todos os pais presentes no assento de registro civil, bem como, ambos os pais, biológicos ou socioafetivos, podem herdar concomitantemente do mesmo filho, sem nenhuma hierarquia entre estes.
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[1] Graduanda em Direito pelo Centro Universitário UNA. r
[2] Bárbara Helen Abreu Valadares. Orientadora. Doutoranda em Educação pela PUC Minas. Mestra em Direito Privado pela PUC Minas. Educadora. Professora de Direito do Centro Universitário UNA. Professora da Pós-Graduação da PUC Minas Virtual. Presidente da Comissão OAB Diversidade, Gênero e Vulnerabilidades da 197ª Subseção da OAB/MG, na qual também é membro do Conselho Deliberativo. Advogada.
Graduanda em Direito pelo Centro Universitário UNA de Belo Horizonte/MG, já atuou na área de Direito Penal na Delegacia Regional de Polícia Civil/Barreiro.
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