ANTONIO JOSÉ CACHEADO LOUREIRO
(coautor)
Resumo: Pensar a política de cotas é pensar em soluções para uma desigualdade social latente, frente a isso, cabem críticas ao texto legal com o propósito de evitar que grupos não vulneráveis vejam a lei como um instrumento para alcançar seus objetivos. É necessário defender a alteração do texto para que se previna o oportunismo social. Com base nisso, o objetivo deste trabalho é esclarecer alguns pontos pouco explanados da Lei de Cotas, e centrar o debate em dois grupos: os que concluíram o ensino médio em escolas públicas e os que se autodeclaram pardos. Utilizou-se, para tanto, fontes bibliográficas, doutrinárias, legais e multidisciplinares, além de notícias. Por fim, concluiu-se que a Lei de Cotas apresenta dissonâncias em seu texto que impossibilitam a efetividade e consciência plena da finalidade dessa ação afirmativa, e por isso que deve ocorrer uma mudança legislativa, a fim de evitar o chamado “jeitinho brasileiro”.
Palavras-chave: Ação Afirmativa; Lei de Cotas; Sociedade.
Abstract: Thinking about the quota policy is thinking about solutions for a latent social inequality, in view of this, the legal text must be criticized in order to prevent non-vulnerable groups from seeing the law as an instrument to achieve their goals. It is necessary to defend the amendment of the text to prevent social opportunism. Based on this, the objective of this work is to clarify some poorly explained points of the Quota Law, and focus the debate on two groups: those who completed high school in public schools and those who declared themselves brown. For this purpose, bibliographic, doctrinal, legal and multidisciplinary sources were used, as well as news. Finally, it was concluded that the Quota Law presents dissonances in its text that make it impossible to be effective and fully aware of the purpose of this affirmative action, and that is why a legislative change must occur, in order to avoid the so-called “Brazilian way”.
Keywords: Affirmative Action; Quota Law; Society.
Sumário: Introdução. 1. Ação Afirmativa e Normas Pertinentes à Lei de Cotas. 1.1 Ação Afirmativa. 1.2 Normas Pertinentes 1.2.1 Lei de Cotas 1.2.2 Decreto Regulamentador da Lei de Cotas 1.2.3 Portaria Normativa nº 18 do Ministério da Educação (MEC). 2. Abordagem Crítica: Hierarquia Normativa e Intenção do PL nº 79/1999. 2.1 Das Cotas Sociais: dos que Concluíram o Ensino Médio na Rede Pública. 2.2 Das Cotas Raciais: dos que se Autodeclaram Pardos. 2.2.1 Quem Pode Ser Considerado Pardo? 2.2.2 Identificação Étnico-Racial 2.2.3 Abordagem Jurídica da Lei de Cotas 2.3 Abordagem da Intenção do Projeto de Lei nº 73/1999 frente à Lei de Cotas e às Condutas Sociais2.3.1 Não Alcance da Intenção do Projeto de Lei. 2.3.2 Comportamento Social e a Lei de Cotas. 3. Ação Afirmativa Pragmática Depende de Mudanças na Lei. Considerações Finais. Referências.
INTRODUÇÃO
A discussão sobre as ações afirmativas no Brasil ainda é alvo de certos tabus, não por menos, a bagagem informativa desse conteúdo é pouco divulgada, não há o delineamento correto, inexistem esclarecimentos acerca dos porquês de cada grupo incluído e beneficiado pela Lei nº 12.711 de 2012 (chamada de “Lei de Cotas”) e das ações afirmativas como um todo.
Comum é ver notícias relacionadas ao tema, nos primeiros meses de 2020 (principalmente) e 2021 a exposições nas redes sociais de supostos fraudadores de cotas foi bastante retratada. Outrossim, “chuvas” de comentários e até nas próprias postagens as palavras usadas fundiam cor e pertencimento étnico-racial. A maioria dos casos, pelas leituras desses conteúdos, eram em relação aos pardos, desse assunto os expositores demonstravam certo “domínio”. Mas centrava-se aí, raríssimo era encontrar nos noticiários alguma denúncia em relação às cotas sociais, o predomínio dos pardos ofuscou e ofusca as outras subdivisões da própria Lei (pretos, baixa renda, egressos somente do ensino médio em escolas públicas, deficientes e indígenas).
Por conta disso é que se fazem necessárias elucidações sobre a Lei e a realidade social, este é o objetivo desse trabalho, propiciar um esclarecimento sobre as conjunturas que envolvem tanto as cotas sociais, para os que concluíram o ensino médio em rede pública, quanto as raciais, aos que se autodeclaram pertencentes ao grupo étnico pardo.
A metodologia empregada toma por base os diplomas normativos que regulamentam e direcionam a matéria, incluindo pesquisas e posicionamentos de órgãos estatais. Baseando-se também em bibliografias multidisciplinares, doutrinárias e notícias. Buscou-se observar, semelhantemente, como o Poder Legislativo reage a esses entraves e qual perspectiva de futuro pode-se esperar por meio das propostas de projetos de lei, tanto da Câmara dos Deputados como do Senado Federal, utilizou-se a expressão “lei de cotas” para a busca dessas proposições, obtendo o auxílio dos filtros que redirecionavam a busca à área “educação”, nos sites de ambas as Casas Legislativas.
Com o ânimo de tornar clara a intenção deste trabalho, é necessário que se diga que os autores não consideram as fraudes e os oportunismos uma atitude única no âmbito da lei objeto desse estudo, mas, por ser o foco do trabalho, a narrativa pode soar de modo absoluto, o que se pretende evitar. Ainda com o propósito de elucidar o desenvolvimento da pesquisa, inicialmente tratar-se-á das definições essenciais à compreensão das ações afirmativas, suas especificidades e finalidades como também a explanação de trechos das normas regulamentadoras pertinentes. Posteriormente, apresentar-se-á críticas à inefetividade da ação afirmativa pela ausência de critérios claros e objetivos na Lei, esclarecer-se-á o que é ser pardo e os meios de identificação étnico-racial, ademais, mostrar-se-á as disparidades normativas frente aos critérios utilizados nas cotas raciais, da mesma forma expor-se-á as desinteligências frente a intenção do projeto de lei que resultou na atual Lei de Cotas, bem como ante às condutas características do povo brasileiro. Por fim, mostrar-se-á algumas propostas na tentativa solucionar os problemas discorridos.
1. AÇÃO AFIRMATIVA E NORMAS PERTINENTES À LEI DE COTAS
1.1 Ação Afirmativa
Gustavo Kenner Alcântara (2012, p. 46) leciona que as ações afirmativas são políticas públicas, e por isso, entende obrigatória a apresentação conceitual destas. De acordo com o artigo 1º, parágrafo único, inciso V do Estatuto da Igualdade Racial (2010), as políticas públicas são “as ações, iniciativas e programas adotados pelo Estado no cumprimento de suas atribuições institucionais”. A par desse conceito, o citado diploma legal também estabelece a definição de ações afirmativas no mesmo artigo, no inciso VI do parágrafo único, esclarecendo serem “os programas e medidas especiais adotados pelo Estado e pela iniciativa privada para a correção das desigualdades raciais e para a promoção da igualdade de oportunidades” (ESTATUTO, 2010). Incompleto seria trabalhar apenas essa classificação, logo, explana-se a significação atribuída por Flávia Piovesan (2013, p. 266):
As ações afirmativas constituem medidas especiais e temporárias que, buscando remediar um passado discriminatório, objetivam acelerar o processo de igualdade, com o alcance da igualdade substantiva por parte de grupos socialmente vulneráveis, como as minorias étnicas e raciais, dentre outros grupos. Enquanto políticas compensatórias adotadas para aliviar e remediar as condições resultantes de um passado discriminatório, as ações afirmativas objetivam transformar a igualdade formal em igualdade material e substantiva, assegurando a diversidade e a pluralidade social.
Ciente do exposto, Alcântara adverte ser importante assinalar que “ação afirmativa não se confunde com a política de cotas”, sendo esta “uma das espécies do gênero de ação afirmativa, que possui várias outras espécies”. O autor desenvolve ainda os critérios em que se baseiam as políticas de cotas, dentre esses tem-se: o pessoal, o material, o espacial e o temporal. No primeiro critério, “a política é gerida a partir de elementos subjetivos, que identificam características de um grupo de pessoas”, por exemplo, as cotas para negros (racial) e mulheres (sexual). No segundo, podem ser considerados a renda e os estudantes de instituições públicas. Já o terceiro, “leva em consideração regiões que portem características que exigem tratamento especial”. No último critério, “em virtude de determinado período, justifica-se a discriminação positiva em favor daquele grupo. É o caso em que há catástrofes naturais, em que o poder público implementa diversas ações com o fim de amenizar os danos ocorridos às populações” (2012, p. 47-50).
1.2. Normas Pertinentes.
Um adendo é necessário, a exposição normativa referente ao trabalho tratar-se-á apenas das disposições concernentes às reservas de vagas nas universidades federais, haja vista nessas normas também conter informações quanto ao ingresso em institutos federais.
1.2.1. Lei de Cotas
O texto legal informativo sobre a política de cotas é a Lei nº 12. 711, de 29 de agosto de 2012, que utiliza os critérios pessoal e material e indica o quantitativo de vagas destinadas em seus artigos 1º e 3º (2012):
Art. 1º As instituições federais de educação superior vinculadas ao Ministério da Educação reservarão, em cada concurso seletivo para ingresso nos cursos de graduação, por curso e turno, no mínimo 50% (cinquenta por cento) de suas vagas para estudantes que tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas.
Parágrafo único. No preenchimento das vagas de que trata o caput deste artigo, 50% (cinquenta por cento) deverão ser reservados aos estudantes oriundos de famílias com renda igual ou inferior a 1,5 salário-mínimo (um salário-mínimo e meio) per capita.
(...)
Art. 3º Em cada instituição federal de ensino superior, as vagas de que trata o art. 1º desta Lei serão preenchidas, por curso e turno, por autodeclarados pretos, pardos e indígenas e por pessoas com deficiência, nos termos da legislação, em proporção ao total de vagas no mínimo igual à proporção respectiva de pretos, pardos, indígenas e pessoas com deficiência na população da unidade da Federação onde está instalada a instituição, segundo o último censo da Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE.
Parágrafo único. No caso de não preenchimento das vagas segundo os critérios estabelecidos no caput deste artigo, aquelas remanescentes deverão ser completadas por estudantes que tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas.
1.2.2. Decreto Regulamentador da Lei de Cotas
O Decreto nº 7.824, de 11 de outubro de 2012, regulamenta a Lei nº 12.711/2012, e em seus artigos 2º e 4º expõe (2012):
Art. 2º As instituições federais vinculadas ao Ministério da Educação que ofertam vagas de educação superior reservarão, em cada concurso seletivo para ingresso nos cursos de graduação, por curso e turno, no mínimo cinquenta por cento de suas vagas para estudantes que tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas, inclusive em cursos de educação profissional técnica, observadas as seguintes condições:
I - no mínimo cinquenta por cento das vagas de que trata o caput serão reservadas a estudantes com renda familiar bruta igual ou inferior a um inteiro e cinco décimos salário-mínimo per capita; e
II - as vagas de que trata o art. 1º da Lei nº 12.711, de 2012, serão preenchidas, por curso e turno, por autodeclarados pretos, pardos e indígenas e por pessoas com deficiência, nos termos da legislação pertinente, em proporção ao total de vagas, no mínimo, igual à proporção respectiva de pretos, pardos, indígenas e pessoas com deficiência na população da unidade federativa onde está instalada a instituição, segundo o último censo da Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE. (Redação dada pelo Decreto nº 9.034, de 2017)
Parágrafo único. Para os fins deste Decreto, consideram-se escolas públicas as instituições de ensino de que trata o inciso I do caput do art. 19 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996.
(...)
Art. 4º Somente poderão concorrer às vagas reservadas de que tratam os arts. 2º e 3º:
I - para os cursos de graduação, os estudantes que:
a) tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas, em cursos regulares ou no âmbito da modalidade de Educação de Jovens e Adultos; ou
b) tenham obtido certificado de conclusão com base no resultado do Exame Nacional do Ensino Médio - ENEM, de exame nacional para certificação de competências de jovens e adultos ou de exames de certificação de competência ou de avaliação de jovens e adultos realizados pelos sistemas estaduais de ensino; (grifos do autor).
No artigo 2º, parágrafo único do referido texto normativo, informa-se que serão consideradas escolas públicas as instituições compreendidas no artigo 19, inciso I, da Lei nº 9.394, que delimita serem instituições públicas as “assim entendidas as criadas ou incorporadas, mantidas e administradas pelo Poder Público” (1996).
1.2.3. Portaria Normativa nº 18 do Ministério da Educação (MEC)
A Portaria Normativa nº 18, de 11 de outubro de 2012, regulamenta a Lei nº 12.711 (Lei de Cotas) e o Decreto nº 7.824, e delibera sobre a implementação das reservas de vagas nas instituições federais de ensino superior. Sabida a finalidade da norma, expor-se-ão seus artigos 3º (que trata das modalidades de reserva de vagas) e 14º (que disserta sobre o preenchimento das vagas reservadas) (2012):
Art. 3º - As instituições federais vinculadas ao Ministério da Educação - MEC que ofertam vagas de educação superior reservarão, em cada concurso seletivo para ingresso nos cursos de graduação, por curso e turno, no mínimo 50% (cinquenta por cento) de suas vagas para estudantes que tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas, inclusive em cursos de educação profissional técnica, observadas as seguintes condições:
I - no mínimo 50% (cinquenta por cento) das vagas de que trata o caput serão reservadas aos estudantes com renda familiar bruta igual ou inferior a 1,5 (um vírgula cinco) salário-mínimo per capita; e
II - proporção de vagas no mínimo igual à da soma de pretos, pardos e indígenas na população da unidade da Federação do local de oferta de vagas da instituição, segundo o último Censo Demográfico divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE, será reservada, por curso e turno, aos autodeclarados pretos, pardos e indígenas.
Parágrafo único - Os resultados obtidos pelos estudantes no Exame Nacional do Ensino Médio - Enem poderão ser utilizados como critério de seleção para as vagas mencionadas neste artigo. (...)
(...)
Art. 14 - As vagas reservadas serão preenchidas segundo a ordem de classificação, de acordo com as notas obtidas pelos estudantes, dentro de cada um dos seguintes grupos de inscritos:
I - estudantes egressos de escola pública, com renda familiar bruta igual ou inferior a 1,5 (um vírgula cinco) salário-mínimo per capita:
a) que se autodeclararam pretos, pardos e indígenas;
b) que não se autodeclararam pretos, pardos e indígenas.
II - estudantes egressos de escolas públicas, com renda familiar bruta superior a 1,5 (um vírgula cinco) salário-mínimo per capita:
a) que se autodeclararam pretos, pardos e indígenas;
b) que não se autodeclararam pretos, pardos e indígenas.
III - demais estudantes.
Parágrafo único - Assegurado o número mínimo de vagas de que trata o art. 10 e no exercício de sua autonomia, as instituições federais de ensino poderão, em seus concursos seletivos, adotar sistemática de preenchimento de vagas que contemple primeiramente a classificação geral por notas e, posteriormente, a classificação dentro de cada um dos grupos indicados nos incisos do caput.
2. ABORDAGEM CRÍTICA: HIERARQUIA NORMATIVA E INTENÇÃO DO PL Nº 73/1999.
2.1 Das Cotas Sociais: dos que Concluíram o Ensino Médio na Rede Pública.
Uma matéria do jornal Gazeta do Povo, baseada em uma entrevista ao portal de notícias G1, expõe Clara Menegucci, de 19 anos, aprovada em medicina na USP, em 2018, por meio do sistema de cotas. No início da notícia, assevera-se que ela é “filha de um médico e de uma engenheira, estudou a maior parte da vida em escolas privadas e fez cursinho particular. Ainda assim, beneficiou-se com o sistema de cotas – sem infringir nenhuma lei”. E continua, enunciando que Menegucci “cursou o ensino fundamental em escolas particulares e o ensino médio no Instituto Federal do Espírito Santo (Ifes)”. Além disso, logo no subtítulo da matéria, o autor opina sobre o caso, afirmando que este “escancara o retrato de uma elite que, sem burlar qualquer lei, acaba beneficiada diretamente por um sistema que não deveria beneficiá-la” (BASSO, 2018).
Não bastasse o comportamento de Clara, tem-se uma conjuntura social posterior à Lei de Cotas que também atua dessa forma, de acordo com a conclusão de Thiago Guimarães Cardoso (2016, p. 59), quando a Lei de Cotas destina 50% das vagas aos alunos provenientes de ensino médio completo em escolas públicas, ela estimula estudantes de escolas particulares que estão no último ano do ensino fundamental a deslocarem-se para escolas públicas logo no primeiro ano do ensino médio. Para chegar a esse entendimento, Cardoso fez uma pesquisa com foco nos Estados de São Paulo e Minas Gerais, tendo isso em vista, complementa (2016, p. 59):
Minas Gerais, estado com maior parcela de alunos de universidades públicas matriculados em instituições federais e onde a Lei representa uma mudança institucional significativa no acesso ao ensino superior público, a probabilidade de migração para a rede pública dos alunos matriculados no último ano do ensino fundamental aumenta cerca de 2,2 p.p, um aumento de 20% em relação ao período anterior à Lei. Já em São Paulo, onde a Lei não acarreta em mudanças no mesmo grau, já que as universidades estaduais, que não são afetadas pela Lei de Cotas, representam a maior parcela do sistema público, o aumento estimado é de apenas 8%.
Antes desse fenômeno, alguns projetos de lei propostos na Câmara dos Deputados, diferentemente da atual Lei de Cotas, exigiam do aluno mais tempo em rede pública, não somente o ensino médio. Infelizmente, essas proposições não estão mais tramitando, são elas: o PL nº 1141/ 2003, que logo em seu artigo 1º, estabelecia: “As Universidades Públicas Federais reservarão, anualmente, 50% das suas vagas, por curso, aos alunos que tenham cursado, integralmente, os ensinos fundamental e médio em escola pública” (grifo nosso) (DUARTE, 2003, p. 1); o PL nº 6036/2005, também no artigo 1º, determinava: “Ficam as universidades públicas, obrigadas a reservarem 50% (cinqüenta por cento) de suas vagas aos alunos que tenham cursado todas as séries da rede pública de ensino Fundamental e Médio” (grifo nosso) (NADER, 2005, p. 1); e, por fim, o PL nº 1736/ 2007 (CD), que no artigo 1º, declarava o seguinte (FRAGA, 2007, p. 1):
As instituições públicas federais de ensino técnico, agrotécnico, tecnológico e científico, em quaisquer de seus níveis – médio e superior -, e em qualquer especialidade, reservarão, em cada concurso de seleção para ingresso em seus cursos, no mínimo cinqüenta por cento de suas vagas para estudantes que tenham cursado integralmente o ensino público (grifo nosso).
2.2 Das Cotas Raciais: dos que se Autodeclaram Pardos.
2.2.1 Quem pode ser considerado pardo?
O pardo é “a pessoa que possui ascendência étnica de mais de um grupo, ou seja, mestiça”. E a partir dessa miscigenação, tem-se: os descendentes de negros e brancos; de negros e indígenas e de índios com brancos (MENEZES, 2020).
2.2.2 Identificação Étnico-Racial.
Consoante aponta o pesquisador do IPEA, Rafael Osório, há três formas de se fazer a identificação étnico-racial, a saber: a “autoatribuição de pertença ou autoidentificação: o próprio sujeito identifica o grupo ao qual se considera membro”; a “heteroatribuição de pertença ou heteroidentificação: outra pessoa identifica o grupo ao qual o sujeito pertence”, e, a “identificação biológica: feita por meio de análise genética” (MENEZES, 2020).
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em parte da resposta dada por meio do Sistema Eletrônico do Serviço de Informação ao Cidadão (e-SIC) em relação a várias perguntas sobre as classificações que utiliza referentes a “cor ou raça”, explicou que (2015):
O critério adotado é a “autodeclaração” em cinco categorias de cor ou raça: “branca”, “preta”, “parda”, “amarela” e “indígena”. Vale considerar também que, pois são pesquisas domiciliares, o respondente responde por si (se morador) e pode também responder por membros do domicílio não presentes no momento da pesquisa. Não há instrução para o entrevistador se valer da heteroclassificação. Mais especificamente quanto ao termo de cor ou raça “parda”, considerado “termo residual” por especialistas (Cf. Petruccelli, 2007), em investigações no IBGE até os anos 2000, houve instrução para coletar nessa categoria “pessoa que se enquadrar como parda ou se declarar como mulata, cabocla, cafuza, mameluca ou mestiça”. Essa definição foi retirada do manual de coleta do Censo Demográfico 2010 e pesquisas mais recentes, pois inclui termos desatualizados e conceitos ambíguos, tais como o de “mestiçagem”. A instrução para a categoria de cor ou raça “parda” no Censo Demográfico 2010 é para ser assinalada para “pessoa que se declara como parda”. Como dito, trata-se de uma categoria de uso corrente, já aplicada há mais de um século e com a qual as pessoas se identificam, tendo-se em mente que a identificação étnico-racial é uma interação social e socialmente construída; vai além da cor da pele ou da ancestralidade de cada pessoa. Inclusive, o quesito das pesquisas do IBGE é denominado "cor ou raça" e não apenas "cor" ou apenas "raça", exatamente porque as categorias que englobam podem ser entendidas pelo entrevistado de forma bastante diversa.
O critério definidor da identidade racial nas universidades federais, em consonância com a Lei de Cotas (LEI nº 12.711), com o Decreto regulador (nº 7.824) e com a Portaria Normativa do MEC (nº 18), é a autodeclaração; esta que, de acordo com a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), significa “um documento assinado pelo candidato que afirma sua identidade étnico-racial” (2020).
Diante disso, tem-se também a análise por identificação racial nas universidades federais após a autodeclaração, conforme aponta Denise Goes, coordenadora do comitê de avaliação de denúncias da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), ocorre da seguinte maneira: “Por causa da forma como o racismo funciona no país, diz, a identificação para avaliar se alguém está apto para ocupar as vagas destinadas aos negros é feita com base no fenótipo, não com base em questões culturais ou ancestralidade” (MORI, 2020). Ainda, Marcelo Pádua, coordenador do comitê de heteroidentificação da UFRJ, justifica a adoção do critério, afirmando que "historicamente o racismo no Brasil é baseado no fenótipo, ou seja, nas características aparentes das pessoas, como cor de pele, traços e cabelo”, e acrescenta, “quanto mais características que identificam uma pessoa como negra, mais chances de sofrer com o racismo. Quanto mais características brancas, maiores as chances de inclusão social" (MORI, 2020).
Por todo o exposto, cabe um breve “parênteses” para determinar o conceito de “fenótipo”, que para entendê-lo, deve-se compreender também o conceito de “genótipo”. Este é “a constituição genética de um organismo, ou seja, o conjunto de genes que um indivíduo possui. Essa constituição genética é proveniente dos ancestrais que esse ser possui”. Já o fenótipo é “a expressão do genótipo mais a interação do ambiente. Quando falamos da cor da pele de uma pessoa, estamos falando de uma característica que surgiu em decorrência de informações presentes em seu DNA, entretanto, essa mesma pessoa pode expor-se ao sol por várias horas durante o dia, causando alterações em seu tom de pele. É por isso que dizemos que o fenótipo é igual ao genótipo mais influências do meio” (SANTOS, 2020).
Com base no que foi explanado, deve-se ter em mente que a avaliação fenotípica usada nas instituições federais de ensino superior é em consonância com a aparência do candidato, e é feita depois dele se autodeclarar pertencente a determinado grupo étnico, por meio da atuação das chamadas “comissões de heteroidentificação”.
Tanto é assim, que está em tramitação na Câmara dos Deputados o PL nº 461/2020, visando proibir a realização de procedimentos de heteroatribuição de pertencimento racial, e uma das leis que ele pretende alterar é a Lei de Cotas, instituindo nessa o artigo 6-A, no qual determina o seguinte: “Fica vedada a realização de qualquer procedimento de heteroidentificação com o objetivo de identificação racial nas universidades federais e nas instituições federais de ensino técnico de nível médio” (HATTEM, FONTEYNE, POIT, GANIME, MARTINS, 2020, p. 1). Em parte da justificativa, os autores da proposta descrevem a atuação dessas comissões (2020, p. 2):
Pessoas que se declararam negras, para fazer jus às vagas reservadas a candidatos negros, têm sido obrigadas a passar por uma comissão de heteroidentificação racial na qual são avaliadas características como a cor da pele (melanoderma, feoderma ou leucoderma), o tipo de nariz (curto, largo ou chato), além de lábios grossos, mucosas roxas, dentes muitos alvos e oblíquos, crânio dolicocélico, tipo de maxilar, cabelo crespo ou encarapinhado, pouca barba e arcos zigomáticos proeminentes.
2.2.3 Abordagem Jurídica da Lei de Cotas
Michel Temer (2007, p. 146), ilustra o seguinte:
Sabemos que há um escalonamento de normas. A lei de submete à Constituição, o regulamento se submete à lei, a instrução do Ministro se submete ao decreto, a resolução do Secretário de Estado se submete ao decreto do Governador, a portaria do chefe de seção se submete à resolução secretarial. Há hierarquia de atos normativos, e no ápice do sistema está a Constituição.
Perante o exposto, pode-se sustentar a falta de concordância legal na criação e definição dos critérios das comissões de heteroidentificação. Nem na Lei de Cotas, nem em seu Decreto nº 7.824, nem na Portaria Normativa nº 18 do MEC, que regulamenta os primeiros, encontra-se qualquer resquício de definição ou implantação dessas comissões, não longe dessa linha, também não se depara com quaisquer orientação acerca da autodeclaração, quais critérios deve ela basear-se e que consciência deve ter o indivíduo que se autodeclara, muito menos exibe-se, nas normas citadas – a possibilidade de regulamentação ou implementação de novas perspectivas ou invencionices diversas do estabelecido em seus textos.
Ainda, carece de congruência as práticas das comissões de heteroatribuição de pertença, que, ao tornarem criteriosa a verificação ou a validação da autoatribuição, conflitam com a primeira etapa da aplicação desta ação afirmativa que é a própria autodeclaração, esta que está em aberto na legislação e que deixa ao arbítrio dos candidatos às vagas a verificação pessoal de inclusão. Por isso, quando se mostram conflitantes os atos normativos, deve-se prevalecer os superiores, haja vista, conforme apresentado, tratar-se de uma hierarquia normativa.
Consoante esse raciocínio é o julgamento do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), que prima pela autodeclaração (ALMEIDA, 2018):
Em que pese os traços fenótipos serem critérios primordiais para a aferição da validade da autodeclaração, não se olvida que a primazia da autodeclaração busca justamente assegurar ao indivíduo que, ainda que não detenha traços externos marcantes, tenha experimentado os efeitos nefastos do preconceito racial durante seu desenvolvimento humano. Não se está a admitir, como não se admite pela legislação, que a hereditariedade seja critério subsidiário a tanto. Mas que, em hipóteses para as quais os traços fenótipos sejam objeto de controvérsia, é dizer, que a heteroidentificação realizada pela Administração vá de encontro ao conteúdo da autodeclaração do candidato, seja permitido que este demonstre que, a despeito da controvérsia concreta acerca da fenotipia.
Ao tratar do julgado supracitado, Jomar Martins, explica (2020):
Com a prevalência deste entendimento, a 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) declarou nula a decisão da Comissão Permanente de Verificação da Autodeclaração Étnico-Racial da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) que não homologou a autodeclaração de uma candidata. Com o provimento da apelação, por maioria, a autora teve reconhecido o direito à matrícula na condição de cotista étnico.
Nessa direção, pode-se citar a decisão do Ministério Público Federal no Espírito Santo (MPF/ES) de arquivar a representação criminal, em face das denúncias das possíveis incidências no crime de falsidade ideológica pelos aprovados no vestibular da Universidade Federal do Espírito Santo, em 2016. A deliberação tem como parâmetro a Lei nº 12.711 e o edital do Vestibular da referida universidade, que estabelecem unicamente o critério autodeclaratório para o enquadramento nas cotas raciais, e a inexistência de “quaisquer critérios fenotípicos, genotípicos e de qualquer outra natureza, para a identificação de pardos, negros ou índios” impede uma posterior comprovação (MPF, 2016). A esse respeito, o procurador da República, Flávio Bhering Leite Praça, disserta (MPF, 2016):
A pessoa pode ser loira dos olhos azuis. Mas se ela se autodeclara parda, por exemplo, não há irregularidade em âmbito criminal, uma vez que não há como confrontar o conteúdo dessa autodeclaração, quando utilizada como critério único num processo seletivo.
O mais próximo que se chegou de uma alteração na Lei de Cotas no sentido de tentar inviabilizar tais “arbítrios autodeclaratórios” foi com a proposição do PL nº 6473/ 2016 na Câmara dos Deputados, que previa no artigo 3º da referida lei, o § 1º, esclarecendo: “A autodeclaração prevista no caput deste artigo poderá sujeitar se a comprovação por meio de documentos originais e/ou entrevista pessoal” (FLORIANO, 2016, p. 1). Por mais nobre que fosse a intenção do legislador, peca terrivelmente ao não estabelecer critérios para autoatribuição, mas não por desconhecimento dessa falha legislativa, pois ele reconhece a existência de divergências com base nessa lacuna logo na justificativa da proposta (FLORIANO, 2016, p. 2).
E também, a vagueza desse texto alterador tornaria o debate sobre essa “monitoria” objeto de insegurança jurídica pela hermenêutica aplicada, pois não há parâmetros autodeclaratórios, irá se comprovar o que com documentos e entrevistas? Que o candidato à vaga reconhece-se como integrante de um grupo social e sabe assinar um papel formalizando esse reconhecimento? A atividade comprobatória dividir-se-ia entre averiguação e convalidação de um ato exclusivamente subjetivo, e poderia até resultar em devaneios fiscalizatórios pela ausência de metodologia e instrução normativa suficientes. Essas lacunas legais é que deixam ao bel-prazer dos avaliadores a definição de quem se autodeclarou “corretamente” ou não, e isso é um bom motivo para se desejar a extinção desses ofícios, como ocorre atualmente com as comissões de heteroidentificação, que de acordo com a justificativa do PL nº 461/2020, que visa proibir essas atuações na Lei de Cotas, explana (HATTEM, FONTEYNE, POIT, GANIME, MARTINS, 2020, p. 2):
As decisões das comissões de verificação da autodeclaração racial são baseadas em regras subjetivas e ideológicas e, por isso, ultrapassam os limites de conveniência e oportunidade do ato discricionário da administração pública, resultando inevitavelmente em decisões ilegais e arbitrárias, centradas em concepções e convicções pessoais de seus membros, que acabam por ocasionar inúmeras injustiças e distorções.
Nessa esteira de instabilidades estão as pessoas que se consideram pardas, seguindo a linha do que foi mostrado, o pardo é aquele descendente de mais de um grupo étnico, e, existem três formas de se avaliar essa identidade étnico-racial.
A lei é clara quando define o critério autodeclaratório (que para o pardo basta comprovar a descendência, sem delineamentos fenotípicos atrelados), mas falha ao não especificar em que essa autoatribuição deve basear-se, pois, existem os parâmetros que delimitam o ser pardo e existe a finalidade das ações afirmativas, que é propiciar uma igualdade material (esta segundo José Afonso da Silva (2005, p. 213-214), consiste em reconhecer a existência de desigualdades e “realizar a igualização das condições desiguais”), como também tentar abrandar um passado e presente discriminatórios, e especificamente em relação à política de cotas raciais, elas servem para o enquadramento de indivíduos com características fenotípicas específicas de um grupo estigmatizado e segregado socialmente, deve-se deixar isso explícito e autoexplicativo na redação legal, não se pode propor qualquer letra de lei para uma política pública tão séria e essencial como esta.
Implantar uma atividade monitória sem corrigir os erros da avaliação primária torna inviável o esclarecimento desse imbróglio de subjetividade, a averiguação probatória de uma autoidentificação sem limitações seria no mínimo ilógica, para não dizer incabível. Adicionalmente, a ausência de clarificação para a ocorrência da autodeclaração torna a atividade das comissões terrivelmente arbitrárias, pois sem parâmetro algum, principalmente de conhecimento prévio do inscrito, essas operações podem ocasionar o cancelamento da matrícula do candidato, considerando a “incongruência na declaração” (UFAM, 2020). A única avaliação coerente, pela falta de orientações e pela interpretação literal da Lei, seria a verificação da descendência do candidato, haja vista esta ser pressuposto para o enquadramento da pessoa à identidade étnico-racial parda.
2.3 Abordagem da Intenção do Projeto de Lei nº 73/1999 frente à Lei de Cotas e às Condutas Sociais.
2.3.1 A Intenção do Projeto de Lei nº 73/1999.
Na justificativa do PL nº 73/1999, atual Lei de Cotas, Nice Lobão assegura (1999, p. 78-79):
Nossa intenção é a de gestar os fundamentos do surgimento de uma verdadeira elite acadêmica (com “e” maiúsculo e não no sentido pejorativo dos que excluem a maioria da cidadania, mas, ao contrário, dos que apostam decisivamente na sua integração efetiva na sociedade com vistas a alcançar o bem-estar social).
Diante disso, faz-se necessária a definição do termo “elite”, consoante afirma Norberto Bobbio, Nicola Matteucci e Gianfranco Pasquino (1998, p. 385):
Por teoria das Elites ou elitista — de onde também o nome de elitismo — se entende a teoria segundo a qual, em toda a sociedade, existe, sempre e apenas, uma minoria que, por várias formas, é detentora do poder, em contraposição a uma maioria que dele está privada. Uma vez que, entre todas as formas de poder (entre aquelas que, socialmente ou estrategicamente, são mais importantes estão o poder econômico, o poder ideológico e o poder político), a teoria das Elites nasceu e se desenvolveu por uma especial relação com o estudo das Elites políticas, ela pode ser redefinida como a teoria segundo a qual, em cada sociedade, o poder político pertence sempre a um restrito círculo de pessoas: o poder de tomar e de impor decisões válidas para todos os membros do grupo, mesmo que tenha de recorrer à força, em última instância.
Essa classificação, indubitavelmente, não se adequa ao contexto entendido na justificativa do citado projeto de lei, isso, claro, em uma interpretação literal, que por certo não é adequada. Quando se constata a intenção de formar uma elite acadêmica, sem ser a elite que exclui a cidadania, está-se diante de um termo ainda não esclarecido: cidadania. No ensinamento de José Afonso da Silva (2005, p. 345-346), a cidadania “qualifica os participantes da vida do Estado, é atributo das pessoas integradas na sociedade estatal, atributo político decorrente do direito de participar no governo e direito de ser ouvido pela representação política”. Essa “versão” jurídica do vocábulo ainda é pouco esclarecedora, ciente disso, essencial torna-se a qualificação atribuída por Maria de Lourdes Manzini Covre (2002, p. 8-9):
Para muita gente, ser cidadão confunde-se com o direito de votar. Mas quem já teve alguma experiência política – no bairro, igreja, escola, sindicato etc. – sabe que o ato de votar não garante nenhuma cidadania, se não vier acompanhado de determinadas condições de nível econômico, político, social e cultural.
Podemos afirmar que ser cidadão significa ter direitos e deveres, ser súdito e soberano. Tal situação está descrita na Carta de Direitos da Organização das Nações Unidas (ONU), de 1948, que tem suas primeiras matrizes marcantes nas cartas de Direito dos Estados Unidos (1776) e da Revolução Francesa (1798). Sua proposta mais funda de cidadania é a de que todos os homens são iguais ainda que perante a lei, sem discriminação de raça, credo ou cor. E ainda: a todos cabem o domínio sobre seu corpo e sua vida, o acesso a um salário condizente para promover a própria vida, o direito à educação, à saúde, à habitação, ao lazer. E mais: é direito de todos poder expressar-se livremente, militar em partidos políticos e sindicatos, fomentar movimentos sociais, lutar por seus valores. Enfim, o direito de ter uma vida digna, de ser homem.
Com base nessa elucidação, pode-se atingir a seguinte conclusão da justificativa exposta – sem usar da interpretação literal – se elite é uma minoria poderosa e cidadania é uma coleção de direitos e deveres, dentre os direitos, a educação, convergem-se à ideia de que o quantitativo usado para implantação da política de cotas pretendia gerar educação à uma minoria quase sem cidadania completa, e essa negação à elite que corrompe parte da cidadania seria o entendimento de que a finalidade da ação afirmativa é promover espaços a grupos discriminados e/ou marginalizados, sem contrastar ou impedir a cidadania alheia, apostando, como diz o texto, numa integração à sociedade com vistas a atingir um bem-estar social. Nesse sentido intencional do projeto é que se deve entender a finalidade da já pronta e vigente Lei de Cotas. Porém, como trata-se de parte de uma política pública, a intenção deveria estar atrelada à realidade social, influindo de modo pragmático, todavia, não conseguiu efetividade plena na cultura local, conforme exposição seguinte.
2.3.2 Comportamento Social e a Lei de Cotas.
Miguel Reale diferencia algumas condutas, dentre elas a moral, que segundo o autor (1999, p. 396):
A direção que seguimos brota do que há de mais singular e recôndito em nosso ser. Praticamos determinado ato e sentimos que é reflexo ou expressão de nossa personalidade, e que, por conseguinte, o motivo de nosso agir é um motivo que se põe radicalmente em nós. A instância última do agir é o homem na sua subjetividade consciente. Quando a ação se dirige para um valor, cuja instância é dada por nossa própria subjetividade, estamos perante um ato de natureza moral.
O que distingue a conduta moral é esta pertinência da estimativa ao sujeito mesmo da ação. De certa forma, poderíamos dizer que no plano da conduta moral o homem tende a ser o legislador de si mesmo.
E continua o mencionado autor, determinando o que vem a ser conduta jurídica (REALE, 1999, p. 403):
Aquilo que para os demais homens é uma simples convenção ou costume, para determinado campo da atividade humana passa a ser obrigação jurídica. A medida deste comportamento, porém, não é dada nem pelo sujeito que age, nem pelo outro sujeito a que se destina, mas é dada por algo que os entrelaça em uma objetividade discriminadora de pretensões, muitas vezes, mas nem sempre e necessariamente, recíprocas.
A razão de medir do Direito não se polariza em um sujeito ou no outro sujeito, mas é transubjetiva. A relação jurídica apresenta sempre a característica de unir duas pessoas entre si, em razão de algo que atribui às duas certo comportamento e certas exigibilidades. O enlace objetivo de conduta que constitui e delimita exigibilidades entre dois ou mais sujeitos, ambos integrados por algo que os supera, é o que chamamos de bilateralidade atributiva. A essência do fenômeno jurídico é dada por esse elemento que se não encontra nas outras formas de conduta.
Nessa lógica, uma contextualização da sociedade nacional é válida, em conformidade com Rachel Sheherazade (2015, p. 77-78):
Quando pensamos em identidade nacional, logo nos vêm à mente elementos como o futebol e o carnaval. Na área dos valores, porém, o que automaticamente nos ocorre é o famigerado “jeitinho brasileiro”. A expressão remete à prática comum da desonestidade, suavizada por um eufemismo diminutivo e até carinhoso. O “jeitinho brasileiro” nada mais é do que a quebra das regras sociais, o atropelo das leis e a tolerância com a corrupção, desde que ela nos favoreça ou aos nossos.
Rachel Sheherazade (apud GNOATO, 2015, p. 78), aduz ser o “jeitinho” uma “categoria intermediária que se situa entre a honestidade e a marginalidade, pois é justamente este o lugar do malandro, o ‘profissional do jeitinho’”. Ademais, esse ator intermediário localiza-se entre o lícito e o ilícito, onde a legalidade seria relativizada. “Essa relativização ocorreria porque, dependendo do contexto em que elas se encontram ou da identidade dos envolvidos, podem ou não valer” (SHEHERAZADE, 2015, p. 78). E prossegue, afirmando que a partir desse cenário de “expertise” “surgiu a figura do “malandro”, o sujeito astuto, que não trabalha e vive de bicos, agiotagem, trambiques e delitos; que dribla as regras de convivência e dá as costas para as leis” (SHEHERAZADE, 2015, p. 79).
A atuação do Poder Legislativo frente às condutas sociais é justamente criar leis que impeçam tamanho arbítrio, tamanha subjetividade, pois como foi exposto, na conduta moral o homem é o legislador de si, e em uma sociedade com um órgão legiferante a nível nacional, e funcionando, não cabe a indivíduos isolados definir por si as normas vigentes. As normas devem ser gerais, devem ultrapassar a circunscrição individual, sobressair-se, ocorrendo a transindividualização das leis, e assim, contribuir para contenção de atitudes que vão de encontro ao regramento legal e propiciar um cenário com condutas jurídicas bem definidas.
Quando se percebe que uma das características sociais de um povo é justamente a capacidade de não seguir regras, ou melhor, de “obedecer não obedecendo”, de usar a lei em seu favor, a atividade legiferante deve trazer para si – com supedâneo na consciência social – a árdua tarefa de controlar essa população e evitar, ao máximo, pelas leis criadas, a possibilidade de ocorrência do “jeitinho”. Mas não, a representatividade popular do parlamento atingiu seu ápice quando oportunizou a realização de atitudes tão desprezíveis, isto é, quando permitiu que estudantes de escolas particulares no 9º ano do ensino fundamental migrassem para escolas públicas para cursar o ensino médio, e, automaticamente, cumprissem um requisito qualificador para a condição de cotista, sabendo que o Congresso Nacional criou uma lei que não prevê essas condutas, e como se não bastasse, indiretamente, o referido órgão entendeu que esses ex-alunos de instituições privadas estão necessitando de cotas sociais porque concluíram sua jornada acadêmica em escola pública. A indiferença do legislativo nacional demonstra a “importância” que se dá à educação e à inclusão social, pois mesmo tendo conhecimento de atos imorais, permanece apático.
No contexto das cotas raciais, o jeitinho segue em evidência, com nomenclatura adequada a ocasião: “afroconvenientes”. Aproveitando-se da liberalidade legal que proporciona uma autodeclaração sem observâncias, esses, consoante aponta Adriano Lesmo e Érica Caetano (2016):
Que omitiam a presença de alguma hereditariedade afrodescendente passaram a mencionar a possível herança negra, principalmente em concursos de vestibulares, criando uma nova nomenclatura não oficial para esses casos, os “afroconvenientes”.
Geralmente, os “afroconvenientes” são pessoas pardas, ou seja, que possuem alguma miscigenação racial ligada aos negros, e, por conveniência, já que não assumiam ser dessa etnia anteriormente, tentam ou desfrutam de todos os benefícios da chamada “democracia racial”.
Consoante o exposto, independente do que pensam e fazem essas instituições, existe uma primazia da autoidentificação, ainda, uma simples leitura da Lei faz-se chegar a esse entendimento. Quando se tem críticas às atividades das comissões de heteroatribuição de pertença, elas são, de longe, amplamente válidas, o subjetivismo é a peça chave do processo de ingresso por autodeclaração nas universidades pela Lei, mas essas conseguem hierarquizar a subjetividade e sem legitimidade, definir que o seu subjetivismo tem força normativa superior. Nessa questão, fazem-se presentes e importantes: a conduta moral e a conduta jurídica; aquela quando não definida em diploma normativo de nada vale, por isso, não adianta ir de encontro às práticas imorais sem pleitear mudança legislativa, seja dos atos dos “afroconvenientes”, seja dos atos dos ex-alunos de escolas particulares, se a Lei continua incólume e o entendimento que se tem é de que o oportunismo é legalizado.
Foram mais de 13 anos de tramitação do PL 73/1999, parece até que todos os legisladores que o aprovaram não tinham bagagem social alguma. O diploma normativo carece de objetividade, de previsibilidade social, de prevenção e proteção finalística dessa política pública, porém, sobram textos mal formulados e lacunas que tornam inefetiva a Lei nº 12.711/2012 - não em sua plenitude - e os prejudicados com essa norma, que aparenta nunca ter deixado de ser um mero projeto, são aqueles grupos citados em seu texto, mais de uma década tramitando para formar um documento legal “para inglês ver”, não integra e não proporciona educação a quem deveria. O sonho da elite acadêmica com “e” maiúsculo permanece rascunhado.
3. AÇÃO AFIRMATIVA PRAGMÁTICA DEPENDE DE MUDANÇAS NA LEI.
Seguindo o raciocínio de Cármen Lúcia Antunes Rocha (1996, p. 7):
Se a igualdade jurídica fosse apenas a vedação de tratamentos discriminatórios, o princípio seria absolutamente insuficiente para possibilitar a realização dos objetivos fundamentais da República constitucionalmente definidos.
Pois daqui para a frente, nas novas leis e comportamentos regulados pelo Direito, apenas seriam impedidas manifestações de preconceitos ou cometimentos discriminatórios. Mas como mudar, então, tudo o que se tem e se sedimentou na história política, social e econômica nacional? Somente a ação afirmativa, vale dizer, a atuação transformadora, igualadora pelo e segundo o Direito possibilita a verdade do princípio da igualdade, para se chegar à igualdade que a Constituição brasileira garante como direito fundamental de todos.
Nessa esteira, entende-se necessária a atualização dessa atual espécie de ação afirmativa, para propiciar um cenário mais igualador e menos discriminatório, e também, menos possibilitador da perpetuação dessa desigualdade, pois é ignóbil o panorama atual da política de cotas, mais vil é saber que existem parlamentares que em vez de buscar solucionar o problema, aperfeiçoar o texto legal e criar mecanismos para impedir a inviabilização total dessa política pública, preferem abandoná-la, mas não por completo.
O PL nº 1443/2019, da Câmara dos Deputados (CD), pedia a revogação total da Lei nº 12.711/2012, mas a autora o retirou de tramitação, afirmando no Requerimento de Retirada que “seu texto apresenta erro que distorce o real propósito do Projeto, que é revogar tão somente as Cotas Raciais” (PIMENTEL, 2019, p. 1). A mesma autora da proposta supracitada não desistiu, e propôs outro projeto, o PL nº 1531/2019 (CD), que diz na ementa que pretende alterar a Lei de Cotas para “retirar o mecanismo de subcotas raciais para ingresso nas instituições federais de ensino superior e de ensino técnico de nível médio” (PIMENTEL, 2019).
Enquanto os projetos supracitados pedem a abolição das ações afirmativas, o PL nº 5384/2020 (CD) propõe uma mudança na redação do artigo 7º da atual Lei para mantê-la definitivamente, dizendo na proposta que “o programa especial para o acesso às instituições federais de educação previstos nesta Lei é permanente, sendo garantido o serviço de assistência estudantil para aqueles estudantes que assim o necessitarem para a realização e conclusão de seu curso” (ROSÁRIO, SILVA B., FELICIANO, VICENTINHO, PINDARÉ, MELCHIONNA, CAROLINA, SILVA O., 2020).
Seguindo a lógica de prorrogação da vigência da ação afirmativa, o PL nº 1788/2021 (CD) também quer alterar o artigo 7º da Lei de Cotas, aumentando de 10, para 30 anos o prazo de revisão, instituindo o seguinte (PINDARÉ, 2021):
Art. 7º No prazo de 30 (trinta) anos a contar da data de publicação desta Lei, será promovida a revisão do programa especial para o acesso às instituições de educação superior de estudantes pretos, pardos e indígenas e de pessoas com deficiência, bem como daqueles que tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas. (grifos nossos)
Nesse mesmo sentido é o PL nº 5303/2019 (CD), que pretende alterar artigos da Lei nº 12.711/2012, “retirando a menção às cotas raciais para o ingresso em instituições federais de ensino” (JAZIEL, 2019). Ainda, existe o PL nº 461/2020 (CD), que pretende “vedar a realização de procedimentos de heteroidentificação racial” na (não somente) Lei de Cotas (HATTEM, FONTEYNE, POIT, GANIME, MARTINS, 2020). Exclusivamente um projeto, o PL nº 6473/2016 (CD), não pretendeu anular essa ação afirmativa por inefetividade ou questões políticas, ele tentou atualizar a Lei para impedir absurdos, dizendo na ementa que (FLORIANO, 2016):
Altera a Lei nº 12.711, de 29 de agosto de 2012, que dispõe sobre o ingresso nas universidades federais e nas instituições federais de ensino técnico de nível médio e dá outras providências, para possibilitar a comprovação da autodeclaração por meio de documentos originais e/ou entrevista pessoal.
Na justificativa do PL nº 461/2020 (CD), discorre-se o seguinte (HATTEM, FONTEYNE, POIT, GANIME, MARTINS, 2020, p. 2):
Apesar de a lei prever apenas a necessidade da autodeclaração do candidato para que faça jus às vagas destinadas a candidatos negros e embora não haja previsão legal para a criação dessas comissões no âmbito das instituições federais de ensino, os comitês de heteroidentificação racial estão funcionando a pleno vapor no Brasil. Por isso, faz-se necessária a aprovação da presente proposição legislativa para que tribunais raciais sejam proibidos no Brasil.
Na outra casa legislativa, o Senado Federal (SF), o PL nº 4656/2020 afirma que a depender da proporção do preenchimento de vagas para pretos, pardos, indígenas e pessoas com deficiência, pode aumentar ou diminuir o prazo de vigência da Lei de Cotas. Se inferior à proporção de vagas, fica a Lei vigente por mais 10 anos, se superior, por mais 5 anos, cabendo a aplicação da Lei no caso de redução da proporção após a suspensão (PAIM, 2020).
Por mais crítica que seja a ausência de previsão legal para os trabalhos das comissões de heteroidentificação, elas são necessárias, e em vez de criar um projeto para proibir o que, legalmente, não existe, deveria haver esforços no sentido de incluir as comissões na Lei. Além disso, o Supremo Tribunal Federal (STF) entendeu constitucional as diligências dessas comissões, no julgamento sobre a política de cotas raciais da Universidade de Brasília (UnB), na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 186. Explana o ministro Ricardo Lewandowski (apud IKAWA, 2012, p. 83-84):
A identificação deve ocorrer primariamente pelo próprio indivíduo, no intuito de evitar identificações externas voltadas à discriminação negativa e de fortalecer o reconhecimento da diferença. Contudo, tendo em vista o grau mediano de mestiçagem (por fenótipo) e as incertezas por ela geradas – há (...) um grau de consistência entre autoidentificação e identificação por terceiros no patamar de 79% -, essa identificação não precisa ser feita exclusivamente pelo próprio indivíduo. Para se coibir possíveis fraudes na identificação no que se refere à obtenção de benefícios e no intuito de delinear o direito à redistribuição da forma mais estreita possível (...), alguns mecanismos adicionais podem ser utilizados como: (1) a elaboração de formulários com múltiplas questões sobre a raça (para se averiguar a coerência da autoclassificação); (2) o requerimento de declarações assinadas; (3) o uso de entrevistas (...); (4) a exigência de fotos; e (5) a formação de comitês posteriores à autoidentificação pelo candidato.
A possibilidade de seleção por comitês é a alternativa mais controversa das apresentadas (...). Essa classificação pode ser aceita respeitadas as seguintes condições: (a) a classificação pelo comitê deve ser feita posteriormente à autoidentificação do candidato como negro (preto ou pardo), para se coibir a predominância de uma classificação por terceiros; (b) o julgamento deve ser realizado por fenótipo e não por ascendência; (c) o grupo de candidatos a concorrer por vagas separadas deve ser composto por todos os que se tiverem classificado por uma banca também (por foto ou entrevista) como pardos ou pretos, nas combinações: pardo-pardo, pardo-preto ou preto-preto; (d) o comitê deve ser composto tomando-se em consideração a diversidade de raça, de classe econômica, de orientação sexual e de gênero e deve ter mandatos curtos (grifos do autor).
Lewandowski continua, defendendo a constitucionalidade da prática (2012, p. 84):
Tanto a autoidentificação, quanto a heteroidentificação, ou ambos os sistemas de seleção combinados, desde que observem, o tanto quanto possível, os critérios acima explicitados e jamais deixem de respeitar a dignidade pessoal dos candidatos, são, a meu ver, plenamente aceitáveis do ponto de vista constitucional (grifo do autor).
Com o propósito de rebater o argumento de que essas comissões seriam um “Tribunal Racial”, o citado ministro do STF profere (LEWANDOWSKI, 2012, p. 119):
Também não acolho a impugnação de que a existência de uma comissão responsável por avaliar a idoneidade da declaração do candidato cotista configure um “Tribunal Racial”. O tom pejorativo e ofensivo empregado pelo partido requerente não condiz com a seriedade e cautela dos instrumentos utilizados pela UnB para evitar fraudes à sua política de ação afirmativa. A referida banca não tem por propósito definir quem é ou não negro no Brasil. Trata-se, antes de tudo, de um esforço da universidade para que o respectivo programa inclusivo cumpra efetivamente seus desideratos, beneficiando seus reais destinatários, e não indivíduos oportunistas que, sem qualquer identificação étnica com a causa racial, pretendem ter acesso privilegiado ao ensino público superior. (grifos nossos)
Considerando as informações acima, não se pode manter a Lei de Cotas como está, deve-se sustentar a atualização legislativa em relação às cotas raciais, a definição de critérios gerais na Lei de Cotas deixando a liberdade de classificações específicas posteriores ou a fixação de todos os critérios que se deseja usar a nível nacional, que se redefina ou haja cientificação da finalidade da Lei, que exista instruções suficientes para uma “perfeita” autoatribuição. Do mesmo modo, na autodeclaração e na fiscalização posterior desse ato, deve-se explicar ao máximo que o ser “pardo” citado na legislação não é literalmente o conhecido geneticamente, os fins dessa ação afirmativa impedem uma conclusão genotípica do termo, sendo essencial ao conhecimento público que não se levará em conta a definição literal dessa palavra, mas sim os aspectos fenotípicos dos indivíduos, pois esses são alvo de discriminação e são essas pessoas que a política de cotas tem de abarcar, consoante disserta Lewandowski (2012, p. 119):
A discriminação e o preconceito existentes na sociedade não têm origem em supostas diferenças no genótipo humano. Baseiam-se, ao revés, em elementos fenotípicos de indivíduos e grupos sociais. São esses traços objetivamente identificáveis que informam e alimentam as práticas insidiosas de hierarquização racial ainda existentes no Brasil. (grifo nosso)
Ainda, faz-se necessária também um atualização legislativa em relação às cotas sociais, para censurar comportamentos hostis com o intuito de ingressar em instituições federais de ensino superior como cotista, até porque, o público que a Lei tenta alcançar é o vulnerável que não acessa tantos espaços sociais como a “elite”. Ela serve para atestar a fragilidade de um público em face de outro, e garantir o acesso dessa minoria ao ensino superior, ela não pode ser vista como um processo que, basta segui-lo para “virar um cotista”, o propósito da Lei não é criar vulneráveis de fachada para perpetuar privilégios sociais, ela quer proporcionar chances de cidadania plena a grupos excluídos, e com o ânimo de enfrentar o oportunismo é a justificativa do PL nº 2384/2019 (SF), tramitando atualmente no Senado Federal (CONTARATO, 2019, p. 6-7):
Nesse aspecto, o que se observa é que muitas famílias abastadas têm matriculado seus filhos em escolas particulares durante todo o ensino fundamental e, com o intuito de burlar o espírito da Lei nº 12.711, de 29 de agosto de 2012, matriculam seus filhos no ensino médio da rede pública, para que tenham mais fácil acesso às universidades públicas.
Contudo, as famílias que se valem desse ardil, complementarmente, têm pago para seus filhos cursos preparatórios para vestibulares de ponta, com alto valor.
Ora, assim agindo, conseguem somar o melhor dos dois mundos. Isso porque há acesso facilitado para a entrada em universidades públicas via cotas e há a preparação de elite, nos mesmos moldes em que ocorreria em uma escola particular.
O Estado não pode ser tolerante com isso, haja vista que ninguém pode ser beneficiar da própria torpeza. Para a própria legitimidade das ações afirmativas, que se criem balizas bem definidas para impedir esse tipo de conduta.
Por essa razão, é necessário incluir a exigência de cumprimento integral do ensino fundamental para o acesso às cotas, de modo que se garanta o efetivo destino das vagas de cotas à parcela mais pobre da sociedade (grifos nossos).
Esse PL possui o enquadramento necessário e a direção correta à impedir o proveito das classe mais abastadas, pode não solucionar o problema mas ao menos está ilustrando uma nova ótica à temática, as cotas sociais vieram com o fim de auxiliar os socialmente vulneráveis, entre eles os estudantes de escolas públicas no Brasil, levando-se em conta o público e todas as suas peculiaridades, são sim pessoas que merecem ser incluídas e que devem ter seus direitos respeitados. O PL citado é o único de todos os mostrados neste trabalho que, visando ampliar o período em escolas públicas para além do ensino médio, continua tramitando na sua respectiva Casa Legislativa.
Seguindo um ideário marxista, quando os congressistas arquivam projetos que buscam facilitar o ingresso de um público marginalizado eles apoiam esse cenário de escárnio a essa parcela da população, e além disso, apoiam o favorecimento de classes e grupos não necessitados dessa ação afirmativa, se a maioria no Legislativo delibera e/ou denega proposições, e esse poder está mantendo um “status quo”, é nesse sentido que deduz-se que “as ideias dominantes de uma época sempre foram as ideias da classe dominante” (MARX; ENGELS, 2008, p. 42). Ademais, referindo-se aos pequenos burgueses, Karl Marx e Friedrich Engels (1850, p. 3), afirmaram que esses “confiam em corromper os operários com esmolas mais ou menos veladas e debilitar sua força revolucionária por meio da melhoria temporária de sua situação”, entendimento quase parafraseado seria a posição do legislador, que institui uma política pública que deveria favorecer totalmente alguns grupos, mas acabar por ser benevolente – injusta e imoralmente – com outros personagens sociais, em conclusão da paráfrase chega-se ao ponto de se criar essa Lei somente para acalmar os ânimos de uma minoria excluída, formalmente essencial para garantir um “silêncio” (cobrança) temporário.
Logo no artigo 1º do PL nº 2384/2019 (SF), assegura-se (CONTARATO, 2019, p. 2):
Art. 1º As instituições federais de educação superior vinculadas ao Ministério da Educação reservarão, em cada processo seletivo para ingresso nos cursos de graduação, por curso e turno, no mínimo cinquenta por cento de suas vagas para estudantes que tenham cursado todo o período dos ensinos fundamental e médio em escolas públicas (grifo nosso).
A proposta legislativa tem o apoio dos autores, pois além de buscar coibir ações degradantes, é revolucionária ao continuar tramitando e ser uma luz mutante em meio a anos de morosidade e desleixo. Por mais inteligente que seja o estabelecimento de um período de 10 anos para revisão da Lei de Cotas, os aviltamentos a ela persistem e já deveriam ter sido corrigidos antes mesmo do período proposto. Sendo assim, conclui-se o desenvolvimento deste trabalho com o pensamento de Cármen Lúcia (1996, p. 13):
A ação afirmativa é um dos instrumentos possibilitadores da superação do problema do não-cidadão, daquele que não participa política e democraticamente como lhe é, na letra da lei fundamental, assegurado, porque não se lhe reconhecem os meios efetivos para se igualar com os demais. Cidadania não combina com desigualdade. República não combina com preconceito. Democracia não combina com discriminação. E, no entanto, no Brasil que se diz querer republicano e democrático, o cidadão ainda é uma elite, pela multiplicidade de preconceitos que subsistem, mesmo sob o manto fácil do silêncio branco com os negros, da palavra gentil com as mulheres, da esmola superior com os pobres, da frase lida para os analfabetos... Nesse cenário sócio-político e econômico, não seria verdadeiramente democrática a leitura superficial e preconceituosa da Constituição, nem seria verdadeiramente cidadão o leitor que não lhe rebuscasse a alma, apregoando o discurso fácil dos igualados superiormente em nossa história feita pelas mãos calejadas dos discriminados (grifo do autor).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao passo que se ia sedimentando novos conceitos, percebia-se as disparidades sociais e legais frente a essa ação afirmativa, os desentendimentos são claros, uma lei distante da sociedade e uma sociedade distante da lei. A perspectiva que orienta a interpretação pode levar a equívocos, mas são olhares que encontram um mesmo ponto: a promoção de igualdade.
Mostrou-se que a definição de quem é ou não pardo pode ser realizada por vários meios de identificação étnico-racial, também concluiu-se que a finalidade das cotas raciais é incluir grupos discriminados pelo fenótipo, e isso, por mais que geneticamente o cidadão seja pardo, o enquadramento a essa ação afirmativa obedece outro requisito, e este não é explanado como deveria, o que resulta em um processo de (não) ingresso nas universidades arbitrário, pois é excluída a matrícula de uma pessoa com base na subjetividade de outras, constatando-se a inconsistência legal desses atos pela lógica da hierarquia normativa.
Porém, não se pode olvidar da imprescindibilidade das comissões de heteroidentificação, por mais arbitrárias que sejam atualmente, são indispensáveis à efetivação dessa ação afirmativa e devem ser proporcionados os subsídios necessários a uma atuação legítima e coerente com os propósitos legais.
Outra interessante conclusão foi a permissividade da Lei com os candidatos que, aproveitando-se exclusivamente de sua letra, ingressam em universidades públicas como cotistas sociais, saindo de suas escolas particulares para cursar somente o ensino médio na rede pública.
Desde 2012, quando a Lei foi criada, conforme consta nessa pesquisa, 5 propostas de alteração legislativa tramitam na Câmara dos Deputados, a saber: duas pedem a revogação das cotas raciais, uma quer vedar a atividade das comissões de heteroidentificação, outra que tornar a Lei permanente, e a última, quer aumentar o prazo de revisão para 30 anos. No Senado Federal, desde a criação da Lei, apenas duas propostas seguem tramitando, uma fala sobre a prorrogação da vigência e a outra que considerar cotista social quem estudou no ensino fundamental e médio em rede pública. Ou seja, dos 7 projetos de lei que tramitam atualmente no Congresso Nacional, apenas 4 pensam em aperfeiçoar a ação afirmativa, essa indiferença frente a desigualdade social no país é uma barreira para alcançar a efetividade plena dessa Lei.
Deve-se, contudo, reconhecer que mesmo com as falhas a Lei de Cotas tem que existir, não se pode fazer como propõem alguns legisladores e eliminar o problema junto com a ação afirmativa, abandonar tão nobre intenção seria abandonar grande parte da população brasileira necessitada e inviabilizada. O “jeitinho brasileiro” precisa ser minimizado com leis mais previsíveis e fiscalizações adequadas, pois a Lei de Cotas não é um instrumento a ser usado por oportunistas, ela serve para reconhecer vulnerabilidades, e a partir disso, garantir parte da cidadania com a promoção da educação.
REFERÊNCIAS
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