ANA PATRÍCIA RODRIGUES PIMENTEL[1]
(orientadora)
RESUMO: A presente pesquisa busca analisar o contrato de trabalho da pessoa com deficiência – PcD, quanto suas garantias de inclusão social e de acessibilidade para o bom desempenho das suas funções enquanto empregado. Nesse contexto surge o seguinte problema: Quais aspectos jurídicos relacionados ao contrato de trabalho da pessoa com deficiência no ordenamento jurídico pátrio? A partir de referências bibliográficas, artigos e legislações que abordem a estruturação desse contrato e o perfil da PcD, disponíveis por meio de buscas em endereços eletrônicos oficiais e em revistas cientificas reconhecidas, como por exemplo o site do Governo Federal (Planalto) e os sítios eletrônicos dos tribunais superiores. Este estudo é preponderantemente descritivo, mas conterá uma dimensão explicativa. Será de natureza básica e aplicada, com a abordagem quali-quantitativa, e será realizado a partir de pesquisa bibliográfica e documental, por meio do método dedutivo. Ao final desse trabalho de pesquisa fica possível a resposta da problemática, construir algumas reflexões sobre a inclusão da pessoa com deficiência no mercado de trabalho.
Palavras-Chave: Acessibilidade. Contrato de trabalho da pessoa com deficiência. Inclusão social. Legislação brasileira.
abstract: This research seeks to analyze the employment contract of people with disabilities - PwD, as to their guarantees of social inclusion and accessibility for the good performance of their functions as a job. In this context, the following problem arises: What legal aspects are related to the employment contract of people with disabilities in the Brazilian legal system? From bibliographical references, articles and legislation that address the structuring of the contract and the profile of the PCD, available through searches in official electronic addresses and in recognized scientific journals, such as the Federal Government website (Planalto) and websites electronics of the higher courts. This study is predominantly descriptive, but will contain an explanatory dimension. It will be of basic and applied nature, with a quali-quantitative approach, and will be carried out from bibliographical and documentary research, through the deductive method. At the end of this research work, an answer to the problem is possible, building some reflections on the inclusion of people with disabilities in the labor market.
Keywords: Accessibility. Employment contract of the disabled person. Social inclusion. Brazilian legislation.
sumário: 1 introdução. 2 PESSOAS COM DEFICIÊNCIA: DEFINIÇÃO E CONTEXTO NORMATIVO. 3 ENTENDIMENTOS DOS TRIBUNAIS SUPERIORES QUANTO À PROTEÇÃO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA. 4 AS GARANTIAS DE INCLUSÃO SOCIAL E ACESSIBILIDADE LABORAL A PESSOA COM DEFICIÊNCIA. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS. REFERÊNCIAS.
1 INTRODUÇÃO
A presente pesquisa possui como tema o contrato de trabalho sendo que sua delimitação consiste em estudar o contrato de trabalho da Pessoa com Deficiência - PcD[2], principalmente nas suas contribuições para a inclusão social e a acessibilidade, tendo como base as normas federais e os entendimentos jurisprudenciais dos Tribunais Superiores.
Contextualizando, o contrato de trabalho vai além da clássica noção Contratualistas, ele é o instrumento que tutela uma série de prerrogativas conquistadas pela classe trabalhadora ao longo dos anos. A definição legal, no que lhe concerne, está prevista no art. 442, caput, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), portanto um marco legislativo na proteção dos interesses trabalhistas. No entanto, tornou-se uma definição rudimentar, pois não se expressa de maneira abrangente e necessária para as diversas categorias de pessoas.
Nesse conjunto, os objetivos específicos dos estudo consistem em analisar a definição jurídica inerente às pessoas com deficiência; explicitar as garantias de inclusão social e acessibilidade da pessoa com deficiência no mercado de trabalho e explanar acerca da legislação e entendimentos judiciais acerca da temática proposta.
No primeiro momento será discutido a abordagem dada às pessoas com deficiência para posteriormente tratar-se do contexto legislativo e o conceito de contrato de trabalho. Mais tarde dar-se-á a análise das normas federais vigentes que versam sobre a inclusão da PcD no mercado de trabalho e das jurisprudências do Supremo Tribunal Federal (STF), Superior Tribunal de Justiça (STJ) e Tribunal Superior do Trabalho (TST), onde se encontram os fundamentos legais usados pelo poder judiciário, com o objetivo de realizar um estudo jurisprudencial, normativo e social da inclusão da PcD no mercado de trabalho.
A PcD ganhou uma maior evidência no ordenamento jurídico com o advento da Constituição de 1988, onde deixou de ser um grupo segregado e passou a estar incluído no direito material coletivo, sendo nivelado ao estado de direito fundamental, mais precisamente no art. 7º, XXXI, onde proíbe a discriminação na contratação da pessoa com deficiência para o trabalho. As disposições contidas na Lei nº 7.853 de 24 de outubro de 1989, estabeleceu normas gerais que asseguram o pleno exercício dos direitos individuais e sociais da PcD e a sua efetiva integração social.
O trabalho em si, como maneira de participação social na produção econômica de nossa sociedade capitalista, é instrumento que aufere estima ao trabalhador, essencialmente por permitir ao empregado a dignidade de poder comprar seus itens com seu próprio esforço e a integração social com os colegas e colaboradores do serviço. E partindo desta perspectiva é que a presente pesquisa se caracteriza relevante para a comunidade civil, uma vez que o caminho para que a maioria das pessoas alcancem oportunidades sem distinções é com a regulamentação do Estado e com a aplicabilidade desses comandos normativos.
No contrato de trabalho, para exemplificar, também há a proteção a PcD quando a norma determina que as empresas que possuem 100 (cem) ou mais funcionários devem preencher de 2% (dois por cento) a 5% (cinco por cento) de seus cargos com PcD ou beneficiários da Previdência Social reabilitados, prevista no art. 93 da Lei nº 8.213/91 e no art. 36 do Decreto nº 3.298/99.
A problemática deste assunto advém de muitas perspectivas, uma delas é a ausência da garantia de inclusão e acessibilidade para desenvolvimento das atividades laborais garantidas pelas leis federais para a PcD. Ressalta-se que com a disseminação da legislação pátria para a população geral, uma sociedade pode alcançar uma maior inserção social de determinados nichos populacionais. Partindo disso, a adversidade tratada na pesquisa consiste nas determinações do ordenamento jurídico federal brasileiro, que preconizem o contrato de trabalho da pessoa com deficiência (PcD) essencialmente quanto a inserção na atividade trabalhista.
2 PESSOAS COM DEFICIÊNCIA: DEFINIÇÃO E CONTEXTO NORMATIVO
A pessoa com deficiência consiste, segundo a Convenção dos Direitos da Pessoa com Deficiência, proclamada pela ONU em 2006, seu artigo 1º, são aquelas que: “têm impedimentos de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interações com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade com as demais pessoas” (MONTEIRO, 2011, p. 2)
Uma vez assumida a responsabilidade protecionista com o lado mais fragilizado das relações trabalhistas, emerge para o Estado, outros participantes que precisam de tratamento distinto conforme as suas peculiaridades. Carecido de cautelas e incentivo para o ingresso no mercado de trabalho, a pessoa com deficiência - PcD é um agente que na maioria das vezes se torna invisível ao olhar do empresário na busca por um funcionário.
A definição legal de quem se enquadraria como uma PcD, Monteiro et. al. (2011, p. 02) salienta que:
Na categoria deficiência física permaneceram os sujeitos que possuem alterações parciais ou completas em um ou mais segmentos do corpo humano
A deficiência, pode ocorrer na forma física, na perda de membros, na ‘‘deficiência mental e/ou intelectual, fazendo com que haja a perda ou a diminuição em sua participação na sociedade’’ (CUNHA, 2018, p. 45).
Não se deve confundir deficiência com incapacidade para o trabalho. A primeira é atributo do indivíduo e impõe ao mesmo, comprometimento em sua capacidade funcional, ‘’enquanto a incapacidade é o comprometimento total em relação às exigências de determinada atividade na avaliação da capacidade funcional residual’’ (REBELLO, 2018, p. 23).
A trajetória das pessoas com deficiência é marcada por uma grande rejeição, não apenas em nosso país, mas também no mundo. Incorporar a PcD como um indivíduo capaz e possuidor de garantias legislativas denota-se um processo recente.
Durante o apogeu da civilização grega, bebês deficientes eram sacrificados e por isso, Platão e Aristóteles, propuseram ao currículo de planejamento urbano grego, eliminar todos disformes que nasciam. Em contrapartida, Homero, um dos mais famosos poetas gregos, autor de Ilíada e Odisseia, era cego. O que comprova o tamanho do paradoxo que é o julgamento prévio de uma pessoa com deficiência como incapaz no trabalho ou para a vida social e afetiva (CUNHA, 2018).
Apenas no século XX, a Declaração Universal dos Direitos Humanos adotada pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 1948 que se incorporou os princípios da liberdade, dignidade e direitos iguais inerentes a todos os seres humanos. No que diz respeito ao direito do trabalho, desde 1925, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) preconiza a qualificação profissional e a reabilitação de pessoas com deficiência em sua recomendação nº 22 (OIT). Desde então, a inclusão das pessoas com deficiência na economia e no social tem se tornado um tema crescente em nossa convivência, especialmente nas empresas.
Conforme a Constituição Federal de 1988 e o seu conceito estruturante de Estado Democrático de Direito, deve-se incentivar a sociedade civil e as empresas privadas a serem democráticas e inclusivas. Instigar a criação de mecanismos inclusivos e benéficos aos trabalhadores, como por exemplo as cotas no Direito do Trabalho do país em favor de grupos de pessoas, é uma dinâmica para o aperfeiçoamento democrático e inclusivo do sistema social, profissional, econômico, cultural brasileiro.
Após a promulgação da Constituição Cidadã, como dito anteriormente, houve o incremento da Lei nº 8.213 /1991 em nosso arcabouço normativo. Isso garantiu ao profissional portador de deficiência uma segurança maior ao conseguir o vínculo empregatício. No art. 93, § 1º, do referido dispositivo, temos a previsão de que, a demissão de pessoa com deficiência ou beneficiário reabilitado da Previdência Social ao encerramento do contrato por prazo determinado de mais de 90 (noventa) dias e a dispensa sem motivo em contrato por prazo indeterminado apenas poderá acontecer após a contratação de outro trabalhador com deficiência ou beneficiário reabilitado da Previdência Social.
A trajetória normativa sobre a PcD no mercado de trabalho teve outros pontos importantes, dos quais destaca-se o lançamento do Plano Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência – Viver Sem Limites, instituída pelo Decreto nº 7.612/2011, mantido com verbas destinadas ao aumento da performance de programas já existentes, além de incentivar novos projetos durante 2011 e 2014. Este Plano foi estruturado em cima de quatro fases: Acesso à Educação; Inclusão Social (Inserção no Trabalho); Atenção à Saúde e Acessibilidade.
Como observa Garcia (2014), é importante ter-se em mente que questões culturais demoram a ser modificadas, mas esse é o movimento que tem sido empreendido pelas pessoas com deficiência e suas organizações representativas nas últimas décadas.
As pessoas com algum tipo de deficiência correspondem a mais de um bilhão de pessoas no mundo, o que representa 15% da população mundial, sendo que cerca de 80% delas residem em países em desenvolvimento e aproximadamente 200 milhões experimentam dificuldades funcionais consideráveis (WHO & WORLD BANK, 2011).
A contratação trabalhista da pessoa com deficiência é um assunto muito pertinente e atual dentro do Direito. Isso ocorre porque o número de PcD está crescendo de uma maneira vertiginosa, ainda de acordo com o relatório da WHO & The World Bank, de 2011, tem-se que o número de pessoas com deficiências está aumentando, uma vez que está havendo crescimento demográfico, as populações estão envelhecendo – e o risco de deficiência em idosos é maior – e há um aumento de doenças crônicas, como diabetes, doenças cardiovasculares, câncer e distúrbios mentais. Mesmo com as diversas melhorias realizadas nas condições sociais e econômicas dessas pessoas, há diversos empecilhos a serem superados.
Em julho de 2015, o Brasil promulgou a “Lei da Inclusão da Pessoa com Deficiência” (LBI), também conhecida como “Estatuto da Pessoa com Deficiência”. Os direitos previstos nesse regulamento abrangem saúde, educação, trabalho, assistência social, esporte, previdência social, transporte e outros campos, além de estabelecerem a autonomia dessas pessoas em igualdade de condições com as demais. Outrossim, no que diz respeito ao preconceito e suas faces discriminatórias, a lei estipula que quem lesar, afastar ou cancelar o reconhecimento ou a aplicação dos direitos e liberdades das pessoas com deficiência será multado, podendo ser punido com pena de um a três anos de prisão.
3 ENTENDIMENTOS DOS TRIBUNAIS SUPERIORES QUANTO À PROTEÇÃO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA
O art. 442 da Consolidação das Leis Trabalhistas define contrato de trabalho como “o acordo tácito ou expresso, correspondente à relação de emprego”.
O ínclito Mauricio Godinho Delgado leciona que definir um fenômeno consiste na:
Atividade intelectual de apreensão e desvelamento dos elementos componentes desse fenômeno e do nexo lógico que os mantém integrados. A definição é, pois, uma declaração da essência e composição de um determinado fenômeno: supõe, desse modo, o enunciado não só de seus elementos integrantes como do vínculo que os mantém unidos (DELGADO, 2016, p. 559).
É imprescindível observar os elementos, a forma, os requisitos e tudo que compõe e que caracteriza o contrato de trabalho, para se chegar a uma melhor compreensão acerca do conceito. Levando-se em consideração o acordo que as partes firmarão, as partes de comum acordo irão decidir qual forma vai ser utilizado. Os direitos e deveres dos indivíduos que irão acordar devem ser mútuos, uma vez que cada parte terá que cumprir com o acordo.
Em que pese a proteção proporcionada pelo contrato de trabalho, um dos obstáculos enfrentados pelas PcD, é justamente a dificuldade da inclusão no mercado de trabalho formal, isto é, aquela atividade laborativa que preserva todos os direitos trabalhistas perante o Estado. Sobre o ingresso no ambiente laborativo, Carla Tereza Martins Romar leciona que:
Podemos definir o contrato de trabalho como sendo o acordo de vontades, manifestado de forma expressa (verbalmente ou por escrito) ou de forma tácita, por meio do qual uma pessoa física (empregado) se compromete a prestar pessoalmente e de forma subordinada serviços contínuos a uma outra pessoa física, a uma pessoa jurídica ou a um ente sem personalidade jurídica (empregador), mediante remuneração (ROMAR, 2017, p. 180).
Conforme a legislação trabalhista, no art. 442 da CLT, o contrato de trabalho pode ser entendido como um acordo efetivado entre a contratante e o contratado. Este vínculo consegue ser feito de forma escrita ou verbal, por tempo determinado ou indeterminado e sua finalidade é firmar a relação empregatícia que será criada, ou seja, oficializar o vínculo entre a pessoa física e o contratante, seja esta última pessoa jurídica ou não. Mas, além disso, também serve como um documento no qual deverá conter uma série de informações referentes ao colaborador e às tarefas que ele irá exercer na organização.
Atualmente, em que pese destacar, ações discriminativas e exclusivas ainda possuem espaço em nossa sociedade. À título de exemplo pode-se citar a existência de locais públicos sem as devidas rampas para cadeirantes ou ainda, a ausência de uma educação em libras para que o atendimento ao público inclua os surdos e mudos.
Com o passar dos anos as sociedades avançaram seus debates em temáticas interligadas à saúde e aos direitos humanos. O que ocasionou, seguramente, uma nova perspectiva em relação às pessoas com deficiência e sua qualidade de vida. Diante desse aspecto, é compreensivo que as relações interpessoais ainda não estejam em um nível adequado para os indivíduos com deficiências, afinal, este tratamento desigual foi estigmatizado e construído culturalmente durante muito tempo. Refletindo inclusive nos usos costumeiros de termos como “deficientes” e “incapacitados”.
Os direitos fundamentais, portanto, nasceram para garantir os interesses do cidadão frente ao Estado. Porém Afonso da Silva, afirma:
[...] visão limitada provou-se rapidamente insuficiente, pois se percebeu que, sobretudo em países democráticos, nem sempre é o Estado que significa a maior ameaça aos particulares, mas sim outros particulares, especialmente aqueles dotados de algum poder social ou econômico (SILVA, 2015, p. 67).
O judiciário está cada vez mais atuante no combate à discriminação e na salvaguarda dos direitos das pessoas com deficiências. No julgamento do REsp 1.733.468, de junho de 2018, o Superior Tribunal de Justiça manteve a condenação de uma empresa de Minas Gerais a pagar R$ 25 mil como compensação por danos morais a um portador de distrofia muscular progressiva, haja vista que a empresa em comento estaria "negligenciado e discriminado enquanto pessoa com deficiência física motora na utilização de ônibus do transporte coletivo urbano". O que se pode destacar é que “essas barreiras, na maioria dos casos, ocorrem devido à falta de informações sobre a deficiência, o que acaba gerando dúvidas acerca da absorção desses profissionais pelas empresas” (COSTA, 2019, p. 16).
A proteção ao trabalhador não está restrita às posições jurídicas de caráter laboral, pois há direitos humanos e fundamentais que, embora não sejam tipicamente trabalhistas, também são aplicáveis às relações de trabalho, como os direitos da personalidade, dentre os quais se destacam a privacidade, a intimidade, a imagem e a honra.
Ressalta-se a decisão do Supremo Tribunal Federal, ao garantir aposentadoria especial de pessoa com deficiência, conforme se verifica a seguir:
EMENTA: MANDADO DE INJUNÇÃO. SERVIDOR PÚBLICO PORTADOR DE DEFICIÊNCIA. DIREITO PÚBLICO SUBJETIVO À APOSENTADORIA ESPECIAL (CF, ART. 40, § 4º, I). INJUSTA FRUSTRAÇÃO DESSE DIREITO EM DECORRÊNCIA DE INCONSTITUCIONAL, PROLONGADA E LESIVA OMISSÃO IMPUTÁVEL A ÓRGÃOS ESTATAIS DA UNIÃO FEDERAL. CORRELAÇÃO ENTRE A IMPOSIÇÃO CONSTITUCIONAL DE LEGISLAR E O RECONHECIMENTO DO DIREITO SUBJETIVO À LEGISLAÇÃO. DESCUMPRIMENTO DE IMPOSIÇÃO CONSTITUCIONAL LEGIFERANTE E DESVALORIZAÇÃO FUNCIONAL DA CONSTITUIÇÃO ESCRITA. MANDADO DE INJUNÇÃO CONHECIDO E DEFERIDO. (STF, MI 1.967 / DF)
A posição do Supremo Tribunal Federal coroa o fenômeno da constitucionalização do Direito do Trabalho, que tem por finalidade evitar que o homem-trabalhador seja tratado simplesmente como uma mercadoria num possível embate entre o dirigente e o subordinado. É necessário olhar o direito do trabalho como um paradigma dos direitos fundamentais, para que com base nesses direitos, haja promoção da dignidade da pessoa humana nas relações de trabalho.
Segundo o Tribunal Superior do Trabalho, em caso de demissão de pessoa com deficiência, nos termos do § 1º do artigo 93, da Lei nº 8.213/91, outra pessoa também com deficiência deverá ser contratada para a vaga, garantindo a cota:
DISPENSA DE EMPREGADO DEFICIENTE FÍSICO. O § 1º do artigo 93, da Lei nº 8.213/91 prescreve que a dispensa só poderá ocorrer após a contratação de outro trabalhador na mesma condição do dispensado. No entanto, por obedecido o número mínimo de empregados, conforme disposto no caput do referido artigo, afastada a exigência de nova contratação. O banco empregador dispensou o reclamante sem justa causa, exercendo o poder potestativo de dispensa, não se observando qualquer irregularidade sob o aspecto analisado.(TRT-1 - RO: 00011651020125010002 RJ, Relator: Mirian Lippi Pacheco, Data de Julgamento: 27/08/2013, Quinta Turma, Data de Publicação: 24/09/2013)
A atividade laborativa pode ser descrita como uma fonte de dignidade para o homem e que, por consequência, torna o trabalhador autônomo, estimulando que suas ações perante a sociedade sejam pautadas pelos valores e princípios éticos individuais.
A dignidade humana é um dos imperativos basilares do nosso ordenamento jurídico, estando previsto na Constituição Federal de 1988 em seu art. 1°, inciso III. Vale-se mencionar que para o dicionário Aurélio, dignidade tem vários significados, tais como: honestidade, merecedor, apropriado, função, título etc. Porém esta definição é muito aquém do verdadeiro sentido do princípio. Vejamos então o entendimento de Celso Ribeiro Bastos:
Embora dignidade tenha um conteúdo moral, parece que a preocupação do legislador constituinte foi mais de ordem material, ou seja, a de proporcionar às pessoas condições para uma vida digna, principalmente no que tange ao fator econômico. (BASTOS; 2012, p. 166).
Sobre os direitos de personalidade que resguardam a dignidade da pessoa humana, leciona Maria Helena Diniz que:
São direitos subjetivos da pessoa de defender o que lhe é próprio, ou seja, a sua integridade física (vida, alimentos, próprio corpo vivo ou morto, corpo alheio vivo ou morto, partes separadas do corpo vivo ou morto); a sua integridade intelectual (liberdade de pensamento, autoria científica, artística e literária) e sua integridade moral (honra, recato, segredo pessoal, profissional e doméstico, imagem, identidade pessoal, familiar e social). (DINIZ, 2018, p. 142.)
Conforme Nascimento (2014, p.468), os direitos de personalidade são “aqueles de natureza extrapatrimonial que se referem aos atributos essenciais definidores da pessoa, e dentre todos os direitos são aqueles que mais perto procuram valorizar a dignidade do ser humano”, devendo este ser respeito em sua integralidade, concernindo suas limitações e possibilitando acesso de pessoas com deficiência ao mercado de trabalho. São direitos de que o indivíduo necessita para preservar sua integridade física, intelectual e moral.
É através do trabalho que o ser humano busca não só a autonomia financeira e os meios para sua sobrevivência, como também, as condições para se desenvolver socialmente, culturalmente e realizar seus projetos de vida. Dessa maneira, o ambiente do labor sadio é componente primordial para que o trabalhador tenha saúde psíquica e física para realizar-se no seu meio social, familiar e cultural.
Para que haja a contratação de um profissional para uma vaga, há determinados quesitos a serem preenchidos, como habilidades com manuseio de equipamentos ou ainda experiência na área pretendida. Assim, a capacitação de um deficiente não é uma tarefa fácil, afinal cada um apresenta sua limitação e essas características tendem a ser trabalhadas de forma individualizada para facilitar o aprendizado da pessoa com deficiência.
As empresas devem estar adequadas às pessoas com deficiência, fazendo os ajustes necessários nos equipamentos, postos e organização do trabalho com a finalidade de minimizar ou excluir os possíveis riscos ocupacionais; essas medidas devem ser especiais promovendo a acessibilidade e ajustes na organização do trabalho atendendo as necessidades especificas, visando estabelecer igualdade de oportunidade e tratamento no trabalho, para não expor o deficiente a descriminação perante aos demais trabalhadores (SANTOS, 2016).
Apoios especiais que permitem compensar uma ou mais limitações da pessoa com deficiência podem focar na orientação, supervisão e ajudas técnicas, dentre outros, de modo a superar barreiras da mobilidade e comunicação, possibilitando ao portador da deficiência plena utilização de suas capacidades e condições de normalidade, como descrito na Instrução normativa nº 20/01 da Secretária da Inspeção do Trabalho do MTE. Pode-se ter como exemplos serviços de mensagens e vibracall em telefones para deficientes auditivos, folheadores eletrônicos para tetraplégicos, impressão em braile, sinalização e alarmes sonoros, corrimão para auxiliar a locomoção e algumas tecnologias de acesso ao computador e a internet como, sintetizadores de voz e livros falados para os deficientes visuais, interprete em libras ou até mesmo banheiros adaptados para cadeirantes (TANAKA; RODRIGUES, 2013).
Apesar da legislação admitir preferências para as pessoas com necessidades especiais na ocupação de um percentual variável de vagas no serviço público e privado, o princípio norteador é a tentativa de assegurar a igualdade de oportunidades de acesso ao mercado de trabalho a essas pessoas, e não apenas impor procedimentos assistencialistas às empresas. As pessoas com necessidades especiais precisam ter qualificação e aptidão física para ocupar as vagas a elas destinadas.
O preparo de pessoas com necessidades especiais para o mercado de trabalho demanda a construção de programas específicos que tenham como principal objetivo a adoção de práticas que possibilitem a entrada dessas pessoas no mercado de trabalho de forma competitiva.
Desenvolver este estudo possibilitou o aprofundamento nesse conteúdo, e, os seus resultados levaram a questionamentos que, desvendaram caminhos, com algumas novas respostas e com mais clareza na dinâmica de suas dimensões.
A pesquisa realizada, possibilitou desenvolver novos questionamentos e reflexões sobre a inclusão da pessoa com deficiência no trabalho, pretendeu-se favorecer o desenvolvimento de mais uma forma de intervenção no trabalho do psicólogo, de outros profissionais da área da saúde, e da dinâmica das próprias organizações. Porém, diante de todas as leituras realizadas e analisadas evidencia-se que ainda vivemos em uma sociedade não muito inclusiva, que tem muito a melhorar, principalmente no setor trabalhista, fazendo cumprir-se as normas.
Destaca-se neste trabalho que apesar do avanço conquistado pelos deficientes físicos, ainda há uma necessidade imensa de melhoria, para que não sejam vistos como diferentes e incapacitados no desenvolvimento da força de trabalho. Para se ter uma sociedade inclusiva, é necessária uma grande dedicação à educação e informação, com o intuito de esclarecer a visão das pessoas sobre as causas da deficiência e sua etiologia. Dessa forma, tendo uma boa educação formal para os próprios deficientes, preparando-os para o mercado e mobilizando atenção sobre este fato, podem-se marchar rumo a construção de uma sociedade mais justa e igualitária.
Nesse contexto a proposta do estudo consistiu em servir de apoio para os indivíduos que buscam conhecer melhor a legislação brasileira sobre as pessoas com deficiência e quais são os dispositivos que delimitam os direitos dessa camada populacional, pois possui materiais apropriados para oferecer embasamento a teorização do estudo proposto. Além disso, busca apreciar ou destacar as ações estatais que versam sobre o assunto, para que possa despertar a ponderação crítica ao leitor.
Quando o consumidor interage com pessoas portadoras de alguma espécie de deficiência em lojas ou repartições, surge uma noção de participação na sociedade contagiante e demonstra que a nossa coletividade está mais aberta as pessoas desprivilegiadas, forçando assim uma mudança de mentalidade nos demais que ainda persistem com seus preconceitos.
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[1] Graduada em Direito pela Universidade Regional de Gurupi (2003). Especialista em Direito Tributário; Em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho; Em Direito civil e Processo Civil, ambos pela Fundação Universidade do Tocantins – UNITINS. Mestre em Prestação Jurisdicional e Direitos Humanos pela Universidade Federal do Tocantins – UFT. Professora Adjunta, vinculada mediante concurso público a Universidade Federal do Tocantins – UFT. E-mail: [email protected]. ORCID ID https://orcide.org/000-0002-79225725. Endereço de correspondência: Quadra 208 Sul (ARSE 23), Alameda 01, Lote 07, Residencial das Artes, Apartamento 303 – B, CEP 77.020-558, Palmas – TO.
[2] Doravante será utilizado o termo “PcD” para se referir a Pessoa com deficiência, conforme a aprovação da Convenção da ONU, em 2006.
Bacharelando em Direito pela Universidade Federal do Tocantins. Fui estagiário na 5ª Vara Cível da Justiça Federal (TRF1); na Defensoria Pública da União e no escritório de advocacia Solano Donato & Advogados Associados.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, Matheus de Lima. O contrato de trabalho da pessoa com deficiência no ordenamento jurídico pátrio: inclusão social e acessibilidade Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 14 set 2021, 04:19. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/57196/o-contrato-de-trabalho-da-pessoa-com-deficincia-no-ordenamento-jurdico-ptrio-incluso-social-e-acessibilidade. Acesso em: 23 dez 2024.
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