RESUMO: O presente trabalho busca discorrer sobre a colisão entre os direitos de imprensa e privacidade, que mesmo estando presentes no hall dos direitos fundamentais previstos no art. 5º da Constituição Federal de 1988, apresentam discrepâncias entre si, e sabendo que nenhum direito é absoluto e há divergências em se tratando de qual deveria prevalecer em determinados casos concretos, busca uma “solução”. Esse debate é relevante levando em consideração a existência de situações em que conteúdos jornalísticos foram tirados de circulação na internet em nome do respeito à privacidade e à vida pessoal das pessoas e a crescente discussão se os meios de comunicação poderiam ser impedidos de publicar certas notícias previamente sem serem considerados atos de censura. Para tanto, analisará os direitos e garantias das pessoas frente à violação dos mesmos. Pretende-se também ressaltar a relevância social e jurídica do direito à privacidade e suas garantias. Nesse sentido, o presente artigo tem o objetivo de estudar e expor os casos, tanto de colisão quanto de harmonia dos dois direitos em si.
Palavras-Chave: Liberdade de Imprensa. Direito à Privacidade. Liberdade de Expressão. Direitos e Garantias Fundamentais.
Abstract: The present work seeks to discuss the collision between the rights of the press and privacy, which, even though they are present in the hall of fundamental rights provided for in Article 5 of the Federal Constitution of 1988, present discrepancies between them, and knowing that no right is absolute and there are divergences in which one should prevail in certain specific cases, seeks a "solution". This debate is relevant taking into account the existence of situations in which journalistic content was taken from circulation on the Internet in the name of respect for people's privacy and personal life and the growing discussion of whether the media could be prevented from publishing certain news previously without being considered acts of censorship. To this end, it will examine the rights and guarantees of people in the face of their violation. It is also intended to highlight the social and legal relevance of the Right to Privacy and its guarantees. In this sense, this article aims to study and expose the cases of both collision and harmony of the two rights themselves.
Keywords: Freedom of the Press, Right to Privacy, Freedom of Expression, Fundamental Rights and Guarantees.
Sumário: 1. Introdução – 2. Desenvolvimento: 2.1 Liberdade de Imprensa; 2.2 Direito à Privacidade; 2.3 Sobre a Colisão dos Direitos Fundamentais; 2.4 Sobre as circunstâncias no caso concreto. 3. Conclusão. 4. Referências.
INTRODUÇÃO
A liberdade de Imprensa é um dos mais importantes direitos básicos garantidos pela Constituição Federal de 1988, no contexto de um país que tinha acabado de sair de uma ditadura baseada principalmente na censura. Por essa razão, tem sido objeto de muitos debates, especialmente no que concerne ao embate com outros direitos e garantias tão importantes quanto, como por exemplo, o direito à privacidade.
As notícias veiculadas pela mídia são um dos principais objetivos de processos que chegam ao tribunal. De um modo geral, as partes pedem indenização ou a retirada de uma informação, e isso naturalmente causa uma discussão sobre o confronto entre dois direitos fundamentais garantidos pela Constituição.
Por um lado, existem meios de comunicação que defendem o seu direito de saber e de criticar, independentemente de quem se oponha aos meios de comunicação. Se há honra, intimidade, vida privada e imagem de um lado, há liberdade de expressão e informação do outro.
Na opinião da ministra do Superior Tribunal de Justiça Nancy Andrighi, durante o julgamento do REsp 984.803, quando ocorre o confronto entre eles, nenhuma solução pode ser encontrada privando-os desses direitos. Diz ela:
“Ao contrário, cabe ao legislador e ao aplicador da lei buscar o ponto de equilíbrio onde os dois princípios mencionados possam conviver, exercendo verdadeira função harmonizadora”
Há de se destacar que não há direito fundamental mais importante do que o outro, a Constituição atribui valores igualmente proporcionais a todos, o que gera toda discussão em torno do que deve prevalecer em um possível conflito entre eles.
DESENVOLVIMENTO
A liberdade de imprensa é o alicerce de todo país democrático. Por meio dela, as pessoas podem exercer seu direito de conhecer e participar da cidadania e compreender a realidade pública. Por outro lado, por mais básica que seja, a liberdade de informação deve respeitar suas restrições internas e externas, especialmente o direito à igualdade de hierarquia normativa.
No Brasil, a Constituição de 1988 preservou a liberdade de imprensa e informação no rol dos direitos fundamentais, utilizando para sua disciplina o artigo 5º, incisos IV, V, IX, XII e XIV.
É um direito essencial que assume o papel de fiscalizador do Estado, posicionando-se como contraponto ao poder formal e legalmente instituído. A existência de oposição, contradição e desacordo é necessária em qualquer democracia.
O silogismo grego provou o poder do conflito entre pensamento e realidade para alcançar resultados evolutivos e é assim que, a liberdade de imprensa se torna necessária socialmente.
O direito à privacidade está previsto no art. 5.º, inciso X da Constituição, que garante, entre outros, o direito à personalidade, sendo eles: intimidade, vida privada, honra e imagem.
Esta cláusula trata da inviolabilidade desses direitos e do direito à indenização nessas circunstâncias. Eles são indisponíveis, inalienáveis, intransmissíveis, imprescritíveis, irrenunciáveis e impenhoráveis. São também indispensáveis às condições humanas.
A importância da privacidade nos últimos anos é inegável, se trata de um retrato de nossa sociedade atual, dominada pela mídia de massa e das famosas e presentes redes sociais, o que ocasiona uma mudança no conceito de privacidade. Portanto, a lei precisa se ajustar e desenvolver suas ferramentas para melhor compreender e proteger o direito à privacidade.
Além disso, utiliza o direito da personalidade, principalmente como um marco de direitos básicos, e também revela a necessidade de seu tratamento cauteloso e adequado das questões sociais contemporâneas. Este é um problema básico do direito privado moderno, e nem a legislação nem a política pública podem ignorá-lo.
A evolução histórica dos direitos fundamentais experimentou o conceito de dimensões ou gerações. O primeiro termo tem sido utilizado por alguns estudiosos para transmitir a ideia de coexistência de direitos fundamentais.
Portanto, a alegação é que a geração da nomenclatura pode estar erroneamente associada ao ciclo. No entanto, quando se trata de outra geração, os direitos básicos não terminam. Eles simplesmente coexistem. Como mostra Novelino (2008, p. 223):
"Os direitos de defesa caracterizam-se por exigir do Estado, preponderantemente, um dever de abstenção, caráter negativo, no sentido de impedir a ingerência na autonomia dos indivíduos. São direitos que limitam o poder estatal com o intuito de preservar as liberdades individuais, impondo-lhe o dever de não interferir, não intrometer, não reprimir e não censurar.”
O mesmo autor profere lição acerca dos direitos prestacionais, afirmando que eles:
“Possuem um caráter essencialmente positivo, impondo ao Estado o dever de agir. Objetivam a realização de condutas ativas por parte dos poderes públicos, seja para a proteção de certos bens jurídicos contra terceiros, seja para a promoção ou garantia das condições de fruição desses bens. Englobam o direito à prestação materiais e jurídicas”. (NOVELINO, 2008, p. 223).
A discussão entre a liberdade de imprensa e o conflito entre os dois direitos fundamentais da liberdade de informação e o direito da personalidade mostra a importância do equilíbrio em casos específicos.
No entanto, ao analisar teses de estudiosos sobre o peso dos conflitos de direitos fundamentais e soluções judiciais na Europa, especialmente na Itália, eles fizeram uma reflexão mais ampla sobre o tema.
Pode-se agora concluir que esses dois direitos fundamentais podem coexistir e nenhum deles tem precedência sobre o outro. Para alguns doutrinadores, o direito à privacidade inclui um direito mais amplo à intimidade.
André Ramos Tavares (2013, p. 528), por exemplo, entende que o direito à privacidade está ligado ao direito à intimidade, à vida privada, à honra, à imagem das pessoas, à inviolabilidade do domicílio, ao sigilo das comunicações e ao segredo, dentre outros direitos.
Segundo ele, com base no direito à privacidade:
“Apenas ao titular compete a escolha de divulgar ou não seu conjunto de dados, informações, manifestações e referências individuais, e, no caso da divulgação, decidir quando, como, onde e a quem”.
Para o autor, esses elementos são derivados da família ou da vida privada do cidadão, incluindo fatos, hábitos e pensamentos. Segundo Gilmar Mendes (2007, p. 367) privacidade inclui também comportamentos relacionados às relações profissionais e de negócios.
Estes são dados da vida privada que os indivíduos não desejam tornar públicos. Por outro lado, a intimidade está relacionada às relações familiares e amizades mais próximas. José Afonso da Silva (2006, p. 206) também inclui as relações íntimas na privacidade pessoal em sentido geral e amplo.
Ives Gandra Martins (2010, p. 367) , Gilmar Mendes (2010, p. 367) e Carlos Valder do Nascimento (2010, p. 367) acreditam que a privacidade é uma condição para o desenvolvimento da personalidade. É preciso lembrar que, nos debates acadêmicos, jurídicos e políticos, a liberdade de expressão é lembrada há muitos anos como sinônimo de democracia brasileira. Vale também salientar que a liberdade de expressão engloba a liberdade de informação, mas é necessário fazer uma distinção entre elas.
Apesar da aparente conexão existente entre liberdade de expressão e liberdade de informação, a diferença entre uma e outra é importante no debate.
A liberdade de expressão engloba fatos, opiniões, juízo de valor, crenças e pensamentos do jornalista sobre determinado assunto. De acordo com Gilmar Mendes (2008, p. 360):
“A liberdade de expressão abarca: toda opinião, convicção, comentário, avaliação ou julgamento sobre qualquer assunto ou sobre qualquer pessoa, envolvendo tema de interesse público, ou não, de importância e de valor, ou não (...)”.
Um atributo relevante da liberdade de informação é a sua base em notícias e fatos que presumem-se verdadeiros ou ao menos revestidos de veracidade. Pela interpretação da obra de José Afonso da Silva (2010, p. 250), é possível concluir que a liberdade de informação é ampla e não se limita a liberdade do jornalista ou até mesmo do dono da empresa de comunicação:
“A liberdade destes é reflexa no sentido de que ela só existe e se justifica na medida do direito dos indivíduos a uma informação correta e imparcial”.
Com base na doutrina brasileira, Barroso (2013, p. 14) também distingue entre liberdade de informação e liberdade de expressão. Para ele, o primeiro inclui a troca de fatos e o amplo direito de saber.
Segundo Barroso (2013, p. 20), a segunda função é proteger pensamentos, opiniões, juízos de valor e qualquer expressão do pensamento humano. No imaginário da imprensa, a liberdade de expressão e informação é um direito garantido pela Constituição, pelo que não pode ser restringido de forma alguma.
Embora a liberdade de expressão, pensamento e informação muitas vezes seja considerada sinônimo de liberdade e uma sociedade democrática, alguns estudiosos entendem que a Constituição Federal de 1988 restringe a liberdade de expressão. É o caso do ministro Gilmar Mendes.
A existência das redes sociais acentua a discussão em relação à colisão desses dois direitos fundamentais, isso porque se olharmos para realidade social atual, dificilmente encontra-se alguém que não esteja inserido na vida virtual. Ao passo que é benéfico de várias formas, também traz certas discussões em relação à limites.
Muito se falou nos últimos meses em relação à liberdade de expressão nas redes sociais, uma das discussões mais recentes foi o questionamento de uma pessoa influente em relação à liberdade de expressão e a constante tentativa de se convencer que a mesma não engloba discurso de ódio, logo, todo direito, mesmo sendo fundamental, tem suas limitações.
Ainda usando a pauta do discurso de ódio, este é um bom exemplo para demonstrar parâmetros em relação à liberdade de expressão, até que ponto somos livres para falar o que pensamos? E se o que eu penso ferir um direito de outra pessoa? E a imprensa? De que forma esta possui responsabilidade sobre o que é propagado?
Na teoria parece ótimo, mas como mediar, na realidade, o direito das pessoas de manter privada sua intimidade, aquela esfera mais íntima que define seu ser, suas opiniões, suas vontades, seu modo de viver e a liberdade total e irrestrita da imprensa?
A liberdade de imprensa é a possibilidade de jornais, revistas, sites, blogs ou qualquer outro meio de comunicação propagarem notícias sem qualquer restrição ou tipo de censura, e não deixa de fazer parte da liberdade de expressão. É um direito universal.
Vale ressaltar que o direito de expressão se difere do direito de divulgar informações, Jean François Revel (1999, p. 207) faz importante distinção entre a livre manifestação de pensamento e o direito de informar, apontando que a primeira deve ser reconhecida inclusive aos mentirosos e loucos, enquanto o segundo, diferentemente, deve ser objetivo, proporcionando informação exata e séria.
A proteção constitucional à informação é relativa, havendo a necessidade de distinguir as informações de fatos de interesse público, da vulneração de condutas íntimas e pessoais, protegidas pela inviolabilidade à vida privada, e que não podem ser devassadas de forma vexatória ou humilhante.
Uma coisa a destacar é que a liberdade de imprensa é fundamental nas democracias, já que aquele que exerce poder no nosso país, o exerce por delegação, ou seja, dá-se poder e autoridade para que os agentes políticos ajam em nosso nome, e a imprensa faz com que esse trabalho seja feito com mais transparência para exercício de um controle social.
Segundo Celso de Mello (2005, decisão):
“Direito à crítica jornalística é uma prerrogativa constitucional cujo suporte legitimador repousa no pluralismo político e representa um dos fundamentos inerentes ao regime democrático.”
A liberdade de expressar e/ou fazer uma crítica, é notadamente algo de interesse público, e o acesso às informações dão a todos os cidadãos independentemente de sua condição, a possibilidade de formar juízo de valor sobre as coisas que acontecem.
De modo que um possível controle da imprensa se mostra algo preocupante para qualquer democracia, já que flerta com regimes autoritários e totalitários que não medem esforços para censurar e controlar tudo que acontece tanto na esfera pública quanto na esfera privada.
A Constituição se mostra tão protetora do direito fundamental de liberdade de imprensa que resguarda até mesmo o sigilo da fonte, como prevê o art. art. 5º, inciso XIV:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
XIV - é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional;
Como exposto, a imprensa tem liberdade e proteção para divulgar, porém, esse direito encontra limites, como a observação de certa notícia é ou não de interesse público, e mesmo se for, se essa notícia atenta contra uma esfera de individualidade de terceiro.
No entanto, não há o que se considerar certa individualidade em casos de extrema relevância em relação ao interesse público, como quando alguém comete um crime ou se envolve em um escândalo de corrupção, não há o que se considerar na esfera de proteção de imagem e intimidade, já que talvez, a divulgação ofereça uma proteção adicional à sociedade.
Parte da doutrina entende que, levando em consideração figuras públicas como políticos, atletas e artistas “optaram” por uma maior exposição, de forma que sua vida pessoal acaba se tornando naturalmente de interesse das pessoas.
Nesses casos, a liberdade de divulgar informações deve ser ampliada, enquanto o direito à proteção de imagem da vida privada acaba sofrendo uma restrição proporcional, ressaltando que isso não significa que essas pessoas não tenham sua intimidade protegida, já que se alguma informação é divulgada e por acaso acaba não sendo de interesse público ou extremamente vexatória, podem ser resguardadas e aquelas que divulgaram, responsabilizadas.
Esse entendimento acabou prevalecendo, gerando a edição da Súmula 221 do STJ, segundo a qual: “São civilmente responsáveis pelo ressarcimento de dano, decorrente de publicação pela imprensa, tanto o autor do escrito quanto o proprietário do veículo de divulgação”.
Segundo Ramon Daniel Pizarro (1999, p.92), em seu livro "Responsabilidad civil de los medios masivos de comunicación", mesmo que a censura seja proibida, os juízes podem impedir a publicação total ou parcial de certas publicações ou impedir sua distribuição em circunstâncias especiais, para prevenir ataques graves e ataques arbitrários à intimidade, honra ou imagem de uma pessoa.
Isidoro Goldenberg (1993, p.101) aprofundou este entendimento em sua "Indemnización por Danos y Perjuicios". Afirmou que a liberdade de informação se rege pelo princípio da igualdade perante a lei, não absoluta. A imprensa é responsável pelos atos ilícitos cometidos por meio dela, o que torna o direito de prejudicar a honra ou a intimidade através da mídia não existente.
Em um regime pós-ditadura, é necessário garantir que as pessoas tenham acesso à informação como forma de cidadania e participação nas democracias emergentes. Para garantir tal acesso, assegurou-se também a liberdade de imprensa, para que os meios de comunicação pudessem buscar essas informações e as repassar às pessoas sem qualquer limitação.
Tem-se firmado entendimento no sentido de que, havendo antinomia entre os princípios, prevalecem os direitos da personalidade, em especial em virtude do princípio da dignidade da pessoa humana, previsto no artigo 1º, III, da CF, como bem esclarece Pedro Pais Vasconcellos:
“Os direitos da personalidade são supralegais e hierarquicamente superiores aos outros direitos, mesmo em relação aos direitos fundamentais que não sejam direitos da personalidade, como, por exemplo, o direito de imprensa, que não se insere entre os direitos da personalidade. (VASCONCELLOS, Pedro Pais. Proteção de dados pessoais e direito à privacidade. In: Direito da Sociedade da Informação. 1999. v. I., p. 36).”
Neste sentido, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal:
“LIBERDADE DE IMPRENSA. Decisão liminar. Proibição de reprodução de dados relativos ao autor de ação inibitória ajuizada contra empresa jornalística. Ato decisório fundado na expressa invocação da inviolabilidade constitucional de direitos da personalidade, notadamente o da privacidade, mediante proteção de sigilo legal de dados cobertos por segredo de justiça. Contraste teórico entre liberdade de imprensa e os direitos previstos nos arts. 5º, incs. X e XII, e 220, caput, da CF. Ofensa à autoridade do acórdão proferido na ADPF nº 130, que deu por não recebida a Lei de Imprensa. Não ocorrência. Matéria não decidida na ADPF. Processo de reclamação extinto, sem julgamento de mérito. Votos vencidos. Não ofende a autoridade do acórdão proferido na ADPF nº 130, a decisão que, proibindo a jornal a publicação de fatos relativos ao autor de ação inibitória, se fundou, de maneira expressa, na inviolabilidade constitucional de direitos da personalidade, notadamente o da privacidade, mediante proteção de sigilo legal de dados cobertos por segredo de justiça. O Tribunal, por maioria, não conheceu do pedido, julgando extinto processo sem julgamento de mérito, contra os votos dos Senhores Ministros Carlos Britto, Cármen Lúcia e Celso de Mello. Votou o Presidente, Ministro Gilmar Mendes. Não votou o Senhor Ministro Marco Aurélio por ter-se ausentado ocasionalmente. Ausente, licenciado, o Senhor Ministro Joaquim Barbosa. Plenário, 10.12.2009. (STF –Tribunal Pleno – rel. ministro Cezar Peluso – Rcl 9428/DF)”
Os direitos à intimidade e à vida privada também são invocados pelo ministro Joaquim Barbosa como limitação para a liberdade de comunicação social. Ele menciona o inciso X, do art. 5º, da Constituição que prevê a inviolabilidade da intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas. Como bem atesta o mestre Pontes de Miranda (1995, p. 5):
“(…) no suporte fático do fato jurídico de que surge direito de personalidade, o elemento objetivo é ser humano e não ainda pessoa: a personalidade resulta da entrada do ser humano no mundo jurídico.”
No caso de violação de privacidade, Gilmar Mendes (2010, p.75) e José Afonso da Silva (2010, p. 75) destacaram que quem busca órgãos judiciais têm direito a indenização nos termos da Constituição. A legislação penal brasileira prevê o direito ao esquecimento para proteger as pessoas que foram condenadas e cumprem penas.
O Artigo 93 do Código Penal estipula que os criminosos têm o direito de se reformar depois de cumprir sua pena ou depois que a pena for removida. O artigo 748 da Lei de Processo Penal estipula que os antecedentes dos reabilitados não devem referir-se a condenações anteriores: “ou a provas retiradas dos livros do tribunal, a não ser que sejam solicitadas pelo juiz criminal”.
É importante enfatizar que as circunstâncias de um caso específico são relevantes. Quando há conflito de direitos fundamentais, é necessário considerar o que prevalece quando os dois direitos fundamentais são ameaçados. Gilmar Mendes lida com julgamentos de peso na busca de soluções.
Este juízo, de acordo com o ministro, está ligado ao princípio da proporcionalidade e pode ser feito tanto pelo juiz quanto pelo legislador. André Ramos Tavares (2013, p.257) lembra que o Direito brasileiro não prevê expressamente o critério da proporcionalidade. Mas afirma que este critério tem base jurídica no art. 5º, parágrafo 2º, da Constituição de 1988. Diz o dispositivo:
“Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”.
Segundo André Ramos Tavares (2013, p.75), o critério da proporcionalidade tem função relevante para a racionalidade do Estado Democrático de Direito. Isso porque “garante o núcleo essencial dos direitos fundamentais através da acomodação dos diversos interesses em jogo em uma sociedade”.
Para ele, este critério é um instrumento importante de solução de conflitos porque otimiza princípios. Segundo o autor, é relevante um só pensamento de princípios quando há conflitos no caso concreto. Paulo Bonavides (1998, p. 231) também trata do critério da proporcionalidade quando há a colisão de dois direitos fundamentais.
Um dos fatores a ser ponderado, para Gilmar Mendes (2008, p. 30), é o peso abstrato do direito em questão. Ele entende que a prevalência de um direito sobre outro tem sua base nas peculiaridades do caso concreto. Afirma ainda que, em um confronto de princípios sobre um caso concreto, é preciso buscar a conciliação entre eles.
O exemplo usado pelo ministro é o de uma notícia sobre a vida de alguém. Neste cenário, dois direitos fundamentais podem entrar em atrito: privacidade e liberdade de expressão. Para o ministro, é preciso considerar as circunstâncias do caso concreto e os interesses em conflito.
Sobre o tema mencionado, ele diz que se o personagem retratado na notícia tiver vida pública ativa, é mais provável que a sua vida particular seja prestigiada. E isso não irá significar “recusa do direito à privacidade à personalidade pública”.
CONCLUSÃO
Como exposto ao longo do artigo, direitos constitucionalmente assegurados também podem estar sujeitos a colisões e relativizações, exemplo é o assunto apresentado, a liberdade de imprensa e o direito à privacidade, os quais têm colidido excessivamente nos últimos tempos.
O direito à privacidade é imanente da personalidade humana, ou seja, é aquele que se constitui pelo simples fato de ser o homem ser humano, na realidade são efeitos do fato jurídico personalidade.
Por outro lado, a liberdade de imprensa encontra um descanso no pensamento, “portanto, envolve o primeiro momento interno de formação do pensamento e outro momento externo em que o pensamento se manifesta”, incluindo a liberdade de pensamento e a liberdade de pensamento.
Idealmente, não só a imprensa é eficaz, mas também aqueles que fornecem à imprensa informações que se transformarão em notícia, devem ter em mente a necessidade de proteger os direitos das pessoas envolvidas na história e, pelo menos, investigá-los antes de publicar a notícia.
Uma mídia livre e questionadora é essencial para uma sociedade democrática, mas se não respeitar a dignidade humana, nenhuma sociedade pode ser chamada de desprovida de apoio, porque se não respeitar os indivíduos que a constituem, poderá até ter um corpo que aparentemente garanta sua estrutura, mas este corpo estará desprovido de alma.
Na sua essência, o conflito de direitos fundamentais ocorre no âmbito dos princípios, pois "os direitos fundamentais são conferidos por normas jurídicas que são essencialmente características de princípios", e não são resolvidos pelo padrão do conflito de normas; não há o que falar sobre eficácia ou o princípio da invalidez.
Portanto, a sua resolução se faz pela ponderação dos direitos postos em situação de conflito, com base nos princípios da Unidade da Constituição, da Proporcionalidade e da Razoabilidade.
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Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: COSTA, Ryane Munhoz de Almeida. Liberdade de imprensa x direito à privacidade Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 08 dez 2021, 04:07. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/57856/liberdade-de-imprensa-x-direito-privacidade. Acesso em: 23 dez 2024.
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