Resumo: O ordenamento jurídico brasileiro, por meio da Constituição Federal de 1988, dos tratados internacionais de direitos humanos e da vinculante jurisprudência internacional de direitos humanos, assegura o direito fundamental e humano ao duplo grau de jurisdição, garantindo a toda pessoa a possibilidade de impugnar a decisão judicial que a condena. No entanto, dispositivos legais possibilitam que a condenação seja proferida de forma inédita em segundo grau de jurisdição, após recurso de apelação interposto pelo Ministério Público, querelante ou assistente de acusação, de modo a impedir o acusado de recorrer por meio de instrumento de ampla devolutividade. Por meio de princípios interpretativos constitucionais e de direitos humanos – tais como o pro homine, da supremacia da Constituição e do favor rei –, deve-se reconhecer a inadequação legal do recurso de apelação em face da sentença absolutória.
Palavras-chave: Direito ao duplo grau de jurisdição; recurso de apelação; processo penal; direitos humanos.
Abstract: The Brazilian legal system, through the Federal Constitution of 1988, international human rights treaties and binding international human rights jurisprudence, guarantees the fundamental and human right to a double degree of jurisdiction, It ensures the possibility of challenging the condemnation sentence. However, legal provisions make it possible the condemnation in an unprecedented decision in the second degree of jurisdiction, after an appeal filed by the Public Prosecutor's Office, the plaintiff or assistant to the prosecution, in order to prevent the accused person from appealing through an instrument of ample devolution. Through constitutional and human rights interpretive principles – such as “pro homine”, the supremacy of the Constitution and “favor rei” – the legal inadequacy of the appeal against the acquittal sentence must be recognized.
Keywords: Right to a double degree of jurisdiction; right to appeal; criminal procedure; human rights.
Sumário: 1 Introdução; 2 O duplo grau de jurisdição como direito fundamental e humano da pessoa condenada; 3 O recurso de apelação na legislação processual penal brasileira; 4 A inadequação do recurso de apelação em face da sentença absolutória; 5 Conclusão; Referências bibliográficas.
O presente trabalho foi elaborado para analisar, a partir da Constituição brasileira de 1988, das convenções internacionais ratificadas pelo Brasil – em especial a Convenção Americana de Direitos Humanos e o Pacto Internacional de Direitos Civil e Políticos – e da jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos, a incompatibilidade e a necessidade de readequação do sistema recursal do processo penal brasileiro ao direito fundamental e humano ao duplo grau de jurisdição da pessoa condenada.
O dever estatal de tutela efetiva do direito ao duplo grau de jurisdição exige que se disponha à pessoa acusada, em qualquer hipótese de condenação inédita, um mecanismo processual de impugnação com amplitude ilimitada da matéria a ser devolvida a instância judiciária diversa. O art. 2º da CADH determina que se os direitos e liberdades da pessoa humana ainda não forem garantidas, devem os Estados-Partes adotar, de acordo com as suas normas constitucionais e com as disposições da própria Convenção, as medidas legislativas ou de outra natureza que forem necessárias.
No ordenamento jurídico pátrio, há uma inegável controvérsia com relação à possibilidade legalmente garantida de recurso de apelação pelo órgão acusatório (e ainda pelo querelante ou assistente de acusação) em face da sentença de absolvição. Isso porque, uma vez reformada a decisão e proferida a condenação em segundo grau, resta prejudicado o direito ao duplo grau de jurisdição da pessoa acusada, que não terá à sua disposição a possibilidade de impugnação plena em face condenação inédita.
2 O DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO COMO DIREITO FUNDAMENTAL E HUMANO DA PESSOA CONDENADA
O duplo grau de jurisdição corresponde ao mecanismo processual que possibilita a submissão da decisão judicial inédita à revisão ampla por órgão jurisdicional diverso. A necessidade de reanálise do mérito justifica-se pela falibilidade do julgador e a insatisfação do vencido.
O recurso, por sua vez, é o instrumento que, ordinariamente, viabiliza o trânsito da decisão entre as instâncias, ou seja, a devolução da decisão malquerida ao Poder Judiciário para fins de reanálise. Dentre os pressupostos recursais, verificam-se a adequação, a unirrecorribilidade, a tempestividade, a motivação, a regularidade procedimental e, ainda, em dimensão subjetiva, a legitimidade e o interesse de recorrer[1].
Não viola o duplo grau de jurisdição o sistema que impede a recorribilidade imediata das decisões interlocutórias. Isso porque, em verdade, a despeito do óbice à revisão imediatamente após a prolação da decisão, se ao final o julgamento de mérito for desfavorável, poderá a parte apelar e, no recurso contra a sentença, também apresentar a impugnação da decisão interlocutória anterior[2]. Portanto, mesmo nestes casos as decisões intermediárias devem ser consideradas recorríveis, sendo o retardamento a momento processual posterior e a condição da sucumbência, em verdade, questões relativas ao próprio pressuposto de interesse recursal.
Outro instrumento viável é a regra do reexame necessário, também chamado atecnicamente de “recurso ex officio” ou “recurso de ofício”. Trata-se da determinação legal de decisão subjetivamente complexa, ou seja, que exige manifestação de dois órgãos para que possa produzir todos seus efeitos legais; assim, a reanálise judicial corresponde a uma condição de eficácia da sentença[3]. Distingue-se o reexame necessário do recurso, porém, porque faltam-lhe a voluntariedade, a tipicidade, a dialeticidade, o interesse em recorrer, a legitimidade, a tempestividade e o preparo, características e pressupostos de admissibilidade recursais[4].
O direito processual penal brasileiro prevê o reexame necessário nas seguintes hipóteses: das decisões de primeiro grau que concederem habeas corpus (art. 574, I, do CPP); da decisão que concede a reabilitação (art. 746 do CPP); e da decisão que acolhe pedido de arquivamento de inquérito sobre crime contra a economia popular, da que absolve o réu nesses mesmos crimes, da que acolhe pedido de arquivamento de inquérito sobre crime contra a saúde pública ou que, nesse mesmo crime, profira sentença absolutória (art. 7ºda Lei nº1.521/51)[5]. Conforme se verifica, portanto, quase todas as decisões cuja eficácia encontra-se submetida à reapreciação por outra instância em matéria penal são favoráveis ao réu[6].
Em regra, o órgão jurisdicional revisor corresponde a uma instância superior e de estrutura colegiada[7]. A decisão prolatada pelo colegiado advém de um reforço do caráter da impessoalidade, da independência e da imparcialidade dos membros julgadores do órgão jurisdicional. A abertura a vozes destoantes e a possibilidade desacordo, além de traduzir a complexidade na interpretação do ordenamento jurídico, proporciona maior concretização do princípio constitucional do contraditório, ao viabilizar o alargamento do exercício de argumentação. Assim, a colegialidade amplifica a possibilidade uma decisão mais adequada, por sobrevir ao diálogo, à difusão de novas ideias e à consideração atenta das críticas[8].
Gustavo Badaró indica três fundamentos essenciais para a existência dos recursos[9]. O fundamento psicológico diz respeito à insatisfação natural com o julgamento desfavorável, fruto da consciência da imperfeição humana. O fundamento político tem relação com a necessidade de controle dos atos estatais, no caso, dos atos do Poder Judiciário, uma vez considerado inaceitável no Estado de Direito a existência de uma decisão sob poder ilimitado e absoluto[10]. Por fim, o fundamento jurídico do recurso é o próprio princípio do duplo grau de jurisdição, que assegura o direito ao reexame das decisões por um órgão jurisdicional diverso daquele que proferiu a decisão.
Apesar da Constituição brasileira de 1988 não prever explicitamente o direito ao duplo grau de jurisdição, este decorre de diversas garantias processuais positivadas diretamente no seu texto: o contraditório e a ampla defesa (art. 5º, LV), o devido processo legal (art. 5º, LVI), o juiz natural (art. 5º, LIII), a publicidade e a motivação das decisões judiciais (art. 93, IX), dentre outras[11]. O duplo grau de jurisdição é, ainda, um princípio que decorre da própria estruturação conferida aos órgãos do Poder Judiciário e da repartição de competências jurisdicionais. A Constituição deve ser interpretada como um sistema unitário de normas – regras e princípios –, conforme leciona Gilmar Ferreira Mendes:
“(...) as normas constitucionais devem ser vistas não como normas isoladas, mas como preceitos integrados num sistema unitário de regras e princípios, que é instituída na e pela própria Constituição. Em consequência, a Constituição só pode ser compreendida e interpretada corretamente se nós a entendermos como unidade.”[12]
Ingo Wolfgang Sarlet ressalta que especialmente por meio do reconhecimento dos direitos implícitos é que se percebe o quanto a reconstrução permanente do catálogo constitucional de direitos desnuda o caráter histórico-relativo dos direitos fundamentais[13]. O duplo grau de jurisdição é, sobretudo, a manifestação do paradigma acusatório no sistema processual penal, que corresponde não somente a uma mera disposição jurídica, mas também a uma conquista político-social.
Conforme dispõe o art. 5º, § 2º, da Constituição, os direitos e garantias expressos nela expressos não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte. A partir dessa disposição, há de se reconhecer o direito ao duplo grau de jurisdição como um direito fundamental e humano.
Os direitos fundamentais, previstos na constituição dos países, têm como objetivo proteger o cidadão da ação estatal e garantir os requisitos mínimos para que o indivíduo tenha uma vida digna[14]. Já os direitos humanos guardam relação com os documentos de direito internacional, por referirem-se àquelas posições jurídicas que se reconhecem ao ser humano como tal, independentemente de sua vinculação com determinada ordem constitucional[15]. Pode-se afirmar, de certa forma, que os direitos fundamentais são “os direitos humanos reconhecidos como tais pelas autoridades às quais se atribui o poder político de editar normas, tanto no interior dos Estados quanto no plano internacional”[16].
O Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, adotado pela Assembleia Geral das Nações Unidos e internalizada pelo Decreto nº 592/1992, em seu art. 14.5, estabelece que "toda pessoa declarada culpada por um delito terá o direito de recorrer da sentença condenatória e da pena a uma instância, em conformidade com a lei". De forma semelhante, a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, adotada no âmbito da Organização dos Estados Americanos, em San José da Costa Rica, e internalizada pelo Decreto nº 678/1992, igualmente assegura, no art. 8.2.h, a toda pessoa acusada de um delito "o direito de recorrer da sentença a um juiz ou Tribunal superior".
A Corte Interamericana de Direitos Humanos, ao interpretar o mencionado dispositivo internacional em caso contencioso submetido a sua jurisdição, fixou parâmetros para o conteúdo do direito humano ao recurso[17]: (i) o recurso deve garantia à possibilidade de um exame integral da decisão recorrida; (ii) o recurso deve ser acessível, sem a exigência de complexidades burocráticas que o tornem ilusório, devendo ser mínimas as formalidade exigidas; (iii) deve possibilitar a análise das questões fáticas, probatórias c jurídicas da sentença impugnada, posto que há uma interdependência entre as determinações fáticas e a aplicação do direito, devendo o recurso possibilitar um amplo controle dos aspectos impugnados da sentença condenatória e (iv) o recurso deve respeitar as garantias processuais mínimas que, conforme o art. 8º da CADH sejam relevantes e necessários para decidir as reclamações do recorrente.
Com relação à ampla devolutividade da decisão, faz-se necessário um instrumento processual que permita a máxima impugnação da sentença, ou seja, que possibilite a revisão de todo o seu conteúdo, sejam questões de direito ou de fato. O acusado, diante da sentença condenatória, deve ter a possibilidade de impugnar a decisão por error in procedendo ou por error in judicando, mediante reexame de mérito ilimitado. No ordenamento jurídico pátrio, a apelação é, ordinariamente, o recurso com devolutividade plena cabível contra sentenças terminativas ou satisfativas proferidas pelo juízo[18].
Os recursos extraordinários, especiais ou stricto sensu, a serem interpostos, respectivamente, ao Superior Tribunal de Justiça e ao Supremo Tribunal Federal, são caracterizados pela devolutividade limitada ou parcial, ou seja, só uma parte da sentença é recorrida. O STF editou o enunciado sumular nº 456: “o Supremo Tribunal Federal, conhecendo o recurso extraordinário, julgará a causa, aplicando o direito à espécie”. Em sentido semelhante, dispõe o enunciado nº 7 da súmula do STJ que “a pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial”. Isso porque a esses tribunais de cúpula cabe analisar, conforme determina a Constituição, tão somente a legalidade ou a constitucionalidade da decisão recorrida.
Por fim, deve-se observar que a titularidade do direito humano ao recurso pertence à pessoa formalmente condenada, ou do imputado, nos casos de absolvição ou prescrição. Os dois principais instrumentos internacionais de direitos humanos que impõem ao Estado brasileiro a observância e respeito estatal ao duplo grau de jurisdição indicam tal sistema como um direito subjetivo da pessoa acusada, e não do organismo estatal.
O conceito de direitos humanos configura um limitador ao conceito de soberania. Além de objeto de proteção à dignidade da pessoa humana, os direitos humanos configuram normas estruturais que limitam a liberdade do Estado. Ou seja, a soberania pode ser livremente exercida, desde que respeite integralmente a dignidade da pessoa humana. Portanto, é conseguinte da própria natureza do tratado internacional de direito humanos que a sua interpretação seja realizada “pro homine”: sempre aquela mais favorável ao indivíduo.
Neste sentido, dispõe Julio Maier a respeito do art. 8.2.h da CADH[19]:
“Me parece claro que, ao menos no parágrafo, a Convenção regional não se propõe – nem se pode propor – defender o Estado, mas sim, ao contrário, conceder uma garantia a quem sofre a coação estatal. A Convenção se refere, precisamente, às garantias processuais frente à ação e à força aplicada pelo Estado.”[20]
3 O RECURSO DE APELAÇÃO NA LEGISLAÇÃO PROCESSUAL PENAL BRASILEIRA
A apelação é acolhida pela legislação brasileira como o recurso ordinário por excelência, correspondendo à impugnação com o efeito devolutivo mais amplo e permitindo ao tribunal ad quem o reexame integral das questões julgadas na sentença proferida em primeiro grau de jurisdição. Trata-se, portanto, do instrumento processual que concretiza o princípio do duplo grau de jurisdição, uma vez que possibilita a reapreciação das questões de fato e de direito.
A ressalva à possibilidade de devolução plena do recurso de apelação, previsto no art. 593 do Código de Processo Penal, corresponde à hipótese da sua interposição contra decisões do Tribunal do Júri. Nesse caso, diante da garantia constitucional da soberania dos vereditos (art. 5º, XXXVIII, “c”, da CF), o órgão jurisdicional revisor está, em regra, restrito à reforma da aplicação do direito feita pelo juiz presidente, impedido de alterar a decisão prolatada pelos jurados. Não obstante, caso conclua-se que a decisão do júri foi manifestamente contrária à prova dos autos, a decisão impugnada deve ser rescindida e determinado novo julgamento perante o Tribunal do Júri, com a formação de plenário com jurados distintos.
Há, em verdade, uma adequação entre os direitos fundamentais ao duplo grau de jurisdição e à soberania dos veredictos. Caso prevalecesse totalmente o veredito soberano, não seria possível que um tribunal diverso composto por juízes togados determinasse a realização de novo julgamento, mesmo sob a justificativa de manifesto desrespeito à prova dos autos. Por outro lado, caso fosse observado apenas o duplo grau de jurisdição, o próprio órgão revisor poderia reformar por inteiro o veredito do júri. Prevalece, todavia, a orientação de que é inconcebível que uma decisão manifestamente contrária à prova dos autos não possa ser revista por meio de recurso, e ao mesmo tempo a impossibilidade de um órgão revisor prolatar a decisão que somente pode ser constituída pelo júri. Assim, impera-se, ao fim, a realização de novo julgamento.
As hipóteses em que se admite a interposição de apelação não estão previstas apenas no art. 593 do CPP. O art. 416 do CPP faz menção ao cabimento da apelação contra a absolvição sumária e a decisão de impronúncia, ambos no procedimento do Tribunal do Júri. Por sua vez, a Lei nº 9.099/95, que dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais, também faz menção ao cabimento da apelação.
A hipótese mais comum de cabimento da apelação diz respeito às sentenças definitivas de condenação ou absolvição proferidas por juiz singular (art. 593, I, do CPP). Sentenças absolutórias são aquelas em que o juiz julga improcedente a imputação constante da peça acusatória, tendo como fundamento uma das causas mencionadas no art. 386 do CPP. Na sentença condenatória, o juiz julga procedente, total ou parcialmente, a imputação.
A apelação também é admitida pela legislação infraconstitucional contra a absolvição sumária do art. 397 do CPP, quando o juiz reconhece: a existência manifesta de causa excludente da ilicitude; a existência manifesta de causa excludente da culpabilidade, salvo inimputabilidade; quando concluir que o fato narrado evidentemente não constitui crime. Ressalva-se, no entanto, a hipótese em que tal decisão for proferida em razão do reconhecimento de causa extintiva da punibilidade (art. 397, IV, do CPP); tratando-se, nesse caso, de decisão com natureza declaratória, e não absolutória, a impugnação adequada será o recurso em sentido estrito, nos termos do art. 581, VIII, do CPP.
O art. 593, I, do CPP, condiciona o cabimento da apelação às sentenças proferidas por juiz singular, não sendo cabível a interposição de apelação contra acórdãos condenatórios ou absolutórios nas hipóteses de competência originária dos tribunais.
Segundo o art. 593, inciso II, do CPP, também caberá apelação contra decisões definitivas, ou com força de definitivas, proferidas por juiz singular, que não sejam recorríveis por recurso em sentido estrito. Quando houver previsão expressa de cabimento de recurso em sentido estrito, não será cabível apelação, tal como nos seguintes casos: a rejeição da peça acusatória (art. 581, I, do CPP); o acolhimento de exceção de coisa julgada, de ilegitimidade de parte ou de litispendência (art. 581, III, do CPP); e a extinção da punibilidade (art. 581, VIII, do CPP).
Quanto à legitimidade ativa, o legislador, por meio do art. 577, caput, do CPP, positivou de forma expressa: o recurso poderá ser interposto pelo Ministério Público (órgão estatal acusatório), pelo querelante ou pelo réu, seu procurador ou seu defensor. Em certas hipóteses, possibilita-se ainda ao assistente da acusação a legitimidade para interpô-lo.
Para que o Ministério Público possa recorrer, deve-se observar a configuração da sua sucumbência[21]. Se, diante das suas alegações finais – orais ou por memoriais –, o Ministério Público pleitear a condenação do acusado, sendo proferida, ao revés, sentença absolutória, haverá sucumbência plena, que permitirá, nos termos do CPP, o conhecimento de eventual apelação por ele interposta. A mesma lógica se impõe quando houver o pleito ministerial de absolvição seguido de sentença condenatória, caso em que subsistirá interesse recursal tanto do acusado quanto do Parquet. Por outro lado, se, diante do pleito condenatório, sobrevier sentença condenatória, o Ministério Público poderá resignar-se com a decisão nos seus termos ou, ainda, interpor recurso visando ao aumento da pena fixada.
4 A INADEQUAÇÃO DO RECURSO DE APELAÇÃO EM FACE DA SENTENÇA ABSOLUTÓRIA
O Código de Processo Penal vigente foi promulgado em 3 de outubro de 1941. O seu artigo 593, principal previsão a respeito do recurso de apelação, teve redação alterada pela última vez em 1948. Não é extraordinário conceber que a Constituição Federal de 1988 e tratados internacionais internalizados em 1992 demandam uma revisão atenciosa da lei.
Conforme verificado, o CPP possibilita ao órgão acusatório o recurso de apelação à sentença absolutória. Ocorre que, havendo a revisão da sentença absolutória e a condenação de forma inédita no segundo grau de jurisdição, não dispõe o ordenamento jurídico nenhum recurso de ampla devolutividade ao condenado. Nessas situações, o direito ao recurso em decisão inédita demandaria, ao menos, um meio de impugnação de “terceiro grau”, o qual inexiste com a amplitude necessária no cenário brasileiro.
O CPP prevê ainda a mencionada figura da remessa necessária, em todos os casos diante de decisão favorável ao réu, numa espécie de refúgio ao escuso princípio “in dubio pro societate”[22]. A sistemática se incompatibiliza com o sistema acusatório. No processo penal, a divisão de funções é inequívoca: cabe ao magistrado apenas o julgamento da demanda. A atuação de ofício do juiz de remeter os autos à instância diversa em virtude do reexame necessário importa em violação a esse sistema, porquanto haveria o deslocamento do magistrado de sua inércia natural[23].
Com relação ao reexame necessário, o STF entendeu pela sua subsistência diante da Constituição de 1988. O fato de ser privativa a atribuição do Ministério Público para a propositura da ação penal pública não teria o condão de revogar o recurso de ofício, uma vez que o ordenamento jurídico prevê, inclusive, mecanismos de controle da inércia ministerial, tal como ocorre, por exemplo, nos casos de ação penal privada subsidiária da pública[24].
Já o direito ao recurso no caso de apelação que leva à reforma de absolvição proferida em primeiro grau foi analisado pelo Corte IDH no caso Mohamed vs. Argentina, julgado em 23/11/2012[25]. Carlos Alberto Mohamed, motorista de ônibus, foi processado por crime de homicídio culposo, em razão de um atropelamento, enquanto dirigia na cidade de Buenos Aires. O acusado foi absolvido em primeiro grau, porém, após recurso do Ministério Público, findou-se condenado à pena de 3 anos de prisão, além de 8 anos de suspensão do direito de dirigir. Contra o acórdão condenatório era possível interpor apenas um recurso extraordinário, que não admitia revisão da matéria fática.
Após o processamento do caso, a Corte IDH concluiu pela responsabilidade do Estado argentino em razão da violação ao direito humano ao recurso (art. 8.2.h da CADH). Em acórdão, a Corte IDH determinou: a adoção das medidas necessárias para garantir Sr. Mohamed o direito a recorrer da sentença condenatória; a suspensão dos efeitos da condenação até o julgamento do recurso a ser interposto; e o pagamento de indenizações fixadas.
“Considerando-se que as garantias judiciais buscam evitar a submissão dos acusados em processo penal a decisões arbitrárias, a Corte interpreta que o direito ao recurso da decisão não poderá ser eficaz se não garantido em relação a todos aqueles que sejam condenados, uma vez que a condenação é a própria manifestação do exercício do poder punitivo do Estado. É contrário à finalidade desse direito que não seja assegurado o recurso a quem for condenado por sentença que reforma decisão absolutória. Interpretar de outra forma implicaria deixar o condenado privado de um recurso contra a condenação. Trata-se, em verdade, de uma garantia do indivíduo em face do Estado e não apenas mero guia procedimental que orienta o arranjo dos sistemas de impugnação nos ordenamentos jurídicos dos Estados-Partes da Convenção.”[26]
Conforme se extrai do caso, para a Corte IDH o direito humano ao duplo grau de jurisdição, nos termos do art. 8.2.h da CADH, se impõe a partir da primeira decisão condenatória, mesmo nos casos em que seja esta uma decisão reformadora de absolvição prévia.
A disposição da CADH é distinta, por exemplo, do que prevê a Convenção Europeia dos Direitos do Homem[27]. A CADH estabelece “o direito de recorrer da sentença a juiz ou tribunal” como uma “garantia mínima” de toda pessoa acusada de um delito, sendo inadmissível qualquer condição ou limitação a tal direito. Por sua vez, a CEDH determina que o direito ao recurso “pode ser objeto de exceções em relação a infrações menores, definidas nos termos da lei, ou quando o interessado tenha sido julgado em primeira instância pela mais alta jurisdição ou declarado culpado e condenado no seguimento de recurso contra a sua absolvição” (art. 2.2 do Protocolo nº 7 à CEDH).
No âmbito do sistema global de direitos humanos, há decisões do Comitê de Direitos Humanos da ONU para esclarecer que, também conforme o art. 14.5 do PIDCP, impõe-se a possibilidade de um recurso no caso de reforma da absolvição ensejada por recurso dos acusadores[28]. O dispositivo do PIDCP foi parâmetro, inclusive, utilizado pela Corte IDH no caso Mohamed vs. Argentina.
Na Opinião Consultiva OC-14/94, de 09/12/1994, solicitada pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos, a Corte IDH tratou sobre a responsabilidade internacional pela expedição e aplicação de leis violatórias da CADH. Segundo o órgão, a expedição de uma lei manifestamente contrária às obrigações assumidas por um Estado ao ratificar ou aderir à Convenção constitui uma violação desta e, no caso de essa violação afetar direitos e liberdades protegidos de indivíduos determinados, gera a responsabilidade internacional do Estado.
Nos termos do art. 68 da própria CADH, “os Estados-Partes na Convenção comprometem-se a cumprir a decisão da Corte, em todo caso em que forem partes”. A sentença da Corte IDH, portanto, produz autoridade de coisa julgada internacional, com eficácia vinculante e direta às partes. Todos os órgãos e poderes internos do país encontram-se obrigados a cumprir a sentença.
Aliás, conforme decisão de supervisão de cumprimento de sentença no Caso Gelman vs. Uruguai, a Corte IDH, em interpretação do mencionado dispositivo da CADH, entendeu que sua jurisprudência contenciosa vincula também os Estados que não foram partes materiais no precedente[29]. Foram mencionadas duas dimensões de coisa julgada internacional: subjetiva e direta para as partes na controvérsia internacional e objetiva e indireta para todos os Estados-Partes na CADH. Aliás, por este motivo, o artigo 69 da Convenção estabelece que a sentença da Corte IDH seja notificada não apenas às partes no caso, mas também a todos os demais Estados-Partes.
Em recente decisão do Superior Tribunal de Justiça, a respeito de aplicação de medida provisória estabelecida pela Corte IDH no âmbito interno, foi estabelecido que as autoridades públicas, judiciárias sobretudo, devem exercer o controle de convencionalidade, observando os efeitos das disposições do diploma internacional e adequando sua estrutura interna para garantir o cumprimento total de suas obrigações frente à comunidade internacional, uma vez que os países signatários são guardiões da tutela dos direitos humanos[30]. O Ministro Reynaldo Soares da Fonseca dispôs que “os juízes nacionais devem agir como juízes interamericanos e estabelecer o diálogo entre o direito interno e o direito internacional dos direitos humanos, até mesmo para diminuir violações e abreviar as demandas internacionais”[31].
Neste sentido, o parâmetro do controle de convencionalidade é o bloco de convencionalidade, que inclui não apenas os tratados, mas também outras fontes do Direito Internacional dos Direitos Humanos, como o costume internacional e principalmente a jurisprudência tanto contenciosa quanto consultiva dos tribunais internacionais de direitos humanos.
Toda prática ou normativa interna pode ser objeto de controle de convencionalidade. Qualquer norma de direito interno, independentemente de sua hierarquia (constitucional ou infraconstitucional), pode, pela sua própria existência e aplicabilidade, por si só comprometer a responsabilidade de um Estado-Parte em um tratado de direitos humanos.
É patente, portanto, também no ordenamento jurídico pátrio a inadequação do recurso de apelação em face da sentença absolutória, uma vez inexistente a possibilidade de um recurso ordinário do acusado, com efeito devolutivo das questões fáticas, probatórias e jurídicas, em face de eventual condenação em segundo grau.
Nas antinomias aparentes, os critérios adotados são a hierarquia, a cronologia e a especialidade. Conforme dispõe o art. 2º do Decreto-Lei nº 4.657/1942 (Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro), "não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique ou revogue". Equivalendo a sistemática recursal do CPP, em especial no que diz respeito à possibilidade da apelação em face de sentenças absolutórias, a normas anteriores aos decretos que internalizam a CADH e o PIDCP, inegável se demonstra o instituto da revogação[32].
Ademais, as normas infraconstitucionais anteriores a nova constituição e materialmente compatíveis com ela são recepcionadas pelo Poder Constituinte, que as engloba do mesmo modo que eram, normas infraconstitucionais. Não havendo recepção, por raciocínio óbvio, revogam-se as normas anteriores. Se a Constituição brasileira de 1988 resguarda o sistema acusatório e, ainda que implicitamente, o direito fundamental ao duplo grau de jurisdição ao acusado, não dispondo a respeito da possibilidade de recurso ordinário pelo órgão acusatório, é evidente que também há de se reconhecer a não recepção dos referidos dispositivos do CPP, que priorizam a capacidade recursal do órgão acusatório ao revés do direito fundamental e humano ao duplo grau de jurisdição da pessoa condenada.
O direito fundamental e humano ao duplo grau de jurisdição impõe a possibilidade de um recurso de devolutividade ampla em face da primeira sentença condenatória, seja ela em primeiro ou segundo grau. Assim, observando-se na legislação pátria a possibilidade legal de um recurso de apelação em face da sentença absolutória e o impedimento normativo de novo recurso ordinário em face de decisão reformadora da absolvição, poder-se-ia concluir que, uma vez vinculado o Estado às disposições da jurisprudência internacional da Corte IDH e às normas internacionais da CADH e do PIDCP, a adequada solução seria a criação de um terceiro grau de jurisdição. Porém, tal entendimento não deve prevalecer.
Ocorre que a inadequação no sistema recursal do processo penal brasileiro não é a inexistência de um terceiro grau de jurisdição. Tradicionalmente, enaltece-se o duplo grau de jurisdição como a concretização jurídica e político-social do sistema acusatório. A previsão deste sistema como uma garantia fundamental e um direito humano corresponde à consolidação da possibilidade da impugnação à condenação como um mínimo existencial da pessoa humana e ainda um limite ao poder punitivo do Estado. Assim, o que há de inadequado é o mecanismo que esvazia a substância desse direito fundamental e humano: a possibilidade do recurso de ampla devolutividade conferido ao órgão acusatório diante de sentença absolutória.
O poder constituinte originário estabeleceu na Constituição brasileira de 1988 a estrutura organizacional do Poder Judiciário com a indicação exata dos órgãos e tribunais que o integram e a respectiva repartição de competências jurisdicionais. O princípio da conformidade funcional impede que os órgãos encarregados da interpretação constitucional cheguem a uma leitura normativa que altere a divisão de funções ou invada a repartição de competências atribuída pela Constituição. Não pode também o legislador ampliar, reduzir ou modificar a disposição organizacional do Estado por meio de normas infraconstitucionais, uma vez reconhecida a supremacia da Constituição.
Não foi a vontade política do poder constituinte brasileiro estabelecer um terceiro grau de jurisdição. As competências jurisdicionais do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça estão expressa e delimitadamente previstas em rol taxativo do texto constitucional (arts. 102 e 105). E, sendo inconstitucional a criação de nova instância ou a alargada ampliação de competências dos tribunais de cúpula, não há outra conclusão: é inviável o recurso de apelação pelo Ministério Público, querelante ou assistente de acusação em face da decisão de absolvição. Todas as disposições legais neste sentido devem ser reconhecidas revogadas ou não recepcionadas.
É plenamente possível, diante das disposições constitucionais e convencionais, um sistema que somente admita o recurso pro reo: as sentenças condenatórias seriam apeláveis, mas não caberia recurso das sentenças absolutórias. Aliás, não apenas plenamente possível, mas inevitável, uma vez considerado o princípio interpretativo pro homine dos direitos humanos: uma vez que a Constituição impede um recurso de ampla devolutividade a um terceiro grau de jurisdição, os dispositivos internacionais de direitos humanos que garantem o recurso à decisão de condenação devem se compatibilizados internamente por meio do tratamento mais favorável ao indivíduo.
A paridade de armas não estaria prejudicada, uma vez que toda a persecução penal está sob o poder estatal; em verdade, o recurso de apelação exclusivo do acusado corresponderia ao mais adequado equilíbrio processual no sistema acusatório. Ao Ministério Público, querelante ou assistente de acusação restaria excepcionalmente cabível o recurso de apelação diante da sentença condenatória quando tiver opinado previamente pela absolvição.
Afinal, se há um princípio que favorece a sociedade é o princípio do “favor rei”. No Estado Democrático de Direito, ao réu deve ser dispensado tratamento diferenciado, baseando-se precipuamente na predominância do direito de liberdade, quando em confronto com o direito de punir do Estado.
AROCA, Juan Montero. Proceso Penal y Libertad. Ensayo polémico sobre el nuevo proceso penal. Madrid: Thomson Civitas, 2008.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso em Habeas Corpus n° 136.961-RJ. Relator: Ministro Reynaldo Soares da Fonseca. Brasília, Distrito Federal, 21 de junho de 2021.
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[1] O direito ao duplo grau de jurisdição, a ser exercido por meio do recurso, decerto não é absoluto ou totalmente incondicionado – tal como qualquer direito no ordenamento jurídico –, subordinando-o a lei ao cumprimento de condições e pressupostos.
[2] BADARÓ, Gustavo Henrique. Manual dos recursos penais. 2 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017, p. 44-45.
[3] FÉLIX, Juarez. O duplo grau de jurisdição obrigatório. Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis. Teresa Arruda Alvim Wambier e Nelson Nery Jr. (coord.) São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 428.
[4] NERY JR., Nelson. Teoria geral dos recursos. 7ª edição, revista e atualizada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 91.
[5] Após a entrada em vigor da Lei nº11.689/2008, em 8 de agosto de 2008, o reexame necessário de decisão absolutória sumária proferida em procedimento do Tribunal do Júri que estiver pendente de apreciação não deve ser examinado pelo Tribunal ad quem, mesmo que o encaminhamento da decisão absolutória à instância superior tenha ocorrido antes da entrada em vigor da referida Lei (STJ. 5ª Turma. HC 278124-PI, Rel. Min. Leopoldo de Arruda Raposo, Desembargador convocado do TJ/PE, Rel. para acórdão Min. Felix Fischer, julgado em 9/6/2015).
[6] Houve intensa controvérsia doutrinária acerca da recepção (ou não) do reexame necessário pela Constituição brasileira de 1988. Muitos doutrinadores manifestaram-se no sentido de que, a partir do momento em que a Constituição outorgou ao Ministério Público a titularidade da ação penal pública (art. 129, I), não faria mais sentido a existência de um recurso obrigatório. Além disso, ao adotar o sistema acusatório, o constituinte deixou claro que, no processo penal, há inequívoca divisão de funções, cabendo ao magistrado apenas o julgamento da demanda. Acabou prevalecendo, no entanto, a posição contrária. De fato, na visão da Suprema Corte, subsiste a necessidade do reexame necessário nas hipóteses previstas em lei (STF, 1ª Turma, HC 75.417/DF, Rel. Min. Octavio Gallotti, j. 12/08/1997, DJ 20/03/1998).
[7] No sistema brasileiro de repartição constitucional de competência jurisdicional, os órgãos do Poder Judiciário são independentes entre si, de modo a não existir hierarquia entre juízes, nem mesmo entre juízes ordinários e o Supremo Tribunal Federal. Esse arranjo organizacional, no entanto, não afasta o caráter vinculante de determinadas decisões dos tribunais ou a autoridade para revisão entre órgãos jurisdicionais.
[8] VALADARES, André Garcia Leão Reis. A composição do órgão colegiado e seus efeitos na tomada de decisão. Revista Brasileira de Políticas Públicas, v. 8, n. 2, p. 719-739, 2018, p. 11.
[9] [9] BADARÓ, Gustavo Henrique. Manual dos recursos penais. 2 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017, p. 39-40.
[10] Pode-se acrescentar, ainda, no âmbito do direito processual penal, que o caráter político do duplo grau de jurisdição também se correlaciona com a limitação do poder punitivo estatal, a partir do ganho cognitivo e do reforço à presunção de inocência. Eis a lição de José Frederico Marques: “o processo é instrumento de atuação estatal vinculado, quase sempre, às diretrizes políticas que plasmam a estrutura do Estado. Impossível, por isso, subtrair a norma processual dos princípios que constituem a substância ética do Direito e a exteriorização de seus ideais de justiça. No processo penal, então, em que as formas processuais se destinam a garantir direitos imediatamente tutelados pela Constituição, das diretrizes políticas desta é que partem os postulados informadores da legislação e da sistematização doutrinária” (MARQUES, José Frederico. Elementos de Direito Processual Penal. V. I. 1. ed., São Paulo: Bookseller, 1998., p. 37).
[11] As garantias são os instrumentos através dos quais os cidadãos podem assegurar seus direitos fundamentais. No dizer do professor Paulo Bonavides, são: “(...) um meio de defesa, se coloca então diante do direito, mas com este não se deve confundir” (BONAVIDES, Paulo. Curso de Constitucional. 16º. Ed. Malheiros: São Paulo, 2005, pag. 526). No entanto, há de se reconhecer que as garantias fundamentais também se encaixam na modalidade de direitos, na medida em que o cidadão tem o direito subjetivo de fazer uso desses expedientes.
[12] MENDES, Gilmar Ferreira. COELHO, Inocêncio Mártires. BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional, 3ª Edição, Ed. Saraiva, p. 114.
[13] SARLET, Ingo Wolfgang. Uma Constituição aberta a outros Direitos Fundamentais?. Revista Consultor Jurídico, 13 de março de 2015. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2015-mar-13/direitos-fundamentais-constituicao-aberta-outros-direitos-fundamentais>. Acesso em: 26 de maio de 2022.
[14] Neste sentido: SARLET, Ingo Wolfgang. Eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. 11. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2012, p. 90. / CUNHA JÚNIOR, Dirley da. Curso de Direito Constitucional. 2. ed. Salvador: Juspodivm, 2008, p. 573.
[15] SARLET, Ingo Wolfgang; MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012, p. 249.
[16] COMPARATO, Fábio Konder. A afirmação histórica dos direitos humanos. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 71.
[17] CorteIDH, Caso Mohamed vs. Argentina, Objeções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas, julgado em 23.1I.2012, Série C, nº 255.
[18] Em hipóteses excepcionais, são outros recursos de ampla devolutividade em face de sentenças: o recurso ordinário para o STJ (art. l05, II, da CF) e o recurso ordinário para o STF (art. 102, II, da CF).
[19] “Artigo 8. Garantias judiciais: 2. Toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência enquanto não se comprove legalmente sua culpa. Durante o processo, toda pessoa tem direito, em plena igualdade, às seguintes garantias mínimas: h. direito de recorrer da sentença para juiz ou tribunal superior.”
[20] MAIER, Julio BJ. El recurso del condenado contra la sentencia de condena:¿ una garantía procesal?. In: La aplicación de los tratados sobre derechos humanos por los tribunales locales. Editores del Puerto, 1997. p. 407-428.
[21] Dispõe o art. 577, parágrafo único, do Código de Processo Penal: “não se admitirá, entretanto, recurso da parte que não tiver interesse na reforma ou modificação da decisão”.
[22] O princípio “in dubio pro societate” não tem qualquer guarida constitucional, legal ou convencional. A invocação desse brocardo é inconstitucional, violando a atividade probatória na persecução penal, bem como o contraditório e a ampla defesa. A presunção de inocência – ou o princípio do “in dubio pro reo – está consolidado na Constituição (art. 5º, LVII), bem como na CADH (art. 8.2) e no PIDCP (art. 14.2).
[23] LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal: volume único. 8 ed. Salvador: JusPodivm, 2020, p. 1.743.
[24] STF, 1ª Turma, HC 75.417/DF, Rel. Min. Octavio Gallotti, j. 12/08/1997, DJ 20/03/1998.
[25] CoIDH, Caso Mohamed vs. Argentina, Objeções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas, julgado em 23.1I.2012, Série C, nº 255.
[26] CoIDH, Caso Mohamed vs. Argentina, ..., § 92.
[27] PAIVA, Caio; HEEMANN, Thimotie Aragon. Jurisprudência Internacional de Direitos Humanos. 3ª ed. Belo Horizonte: CEI, 2020, p. 234.
[28] AROCA, Juan Montero. Proceso Penal y Libertad. Ensayo polémico sobre el nuevo proceso penal. Madrid: Thomson Civitas, 2008, p. 481.
[29] CoIDH, Caso Gelman vs. Uruguai, Objeções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas, julgado em 23.1I.2012, Série C, nº 221..
[30] STJ - AgRg no RHC: 136961 RJ 2020/0284469-3, Relator: Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, Data de Julgamento: 15/06/2021, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 21/06/2021.
[31] STJ - AgRg no RHC: 136961 RJ 2020/0284469-3, Relator: Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, Data de Julgamento: 15/06/2021, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 21/06/2021, p. 4.
[32] Conforme se verificará a seguir, nos termos da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, os tratados internacionais sobre direitos humanos internalizados por rito legislativo diverso ao conferido para a edição de emendas constitucionais possuem status de supralegalidade. Portanto, poder-se-ia ainda apontar a hierarquia normativa como critério.
Artigo publicado em 15/06/2022 e republicado em 11/10/2024.
Bacharel em Direito pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Pós-Graduado em Direito e Processo Civil pela Universidade Cândido Mendes (UCAM)
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MOREIRA, Lucas Oliveira da Costa. A apelação da sentença de absolvição e a violação ao direito fundamental e humano ao duplo grau de jurisdição Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 11 out 2024, 04:36. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/58678/a-apelao-da-sentena-de-absolvio-e-a-violao-ao-direito-fundamental-e-humano-ao-duplo-grau-de-jurisdio. Acesso em: 23 dez 2024.
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