KAROLINE SILVA COSTA [1]
(orientadora)
RESUMO: A presente pesquisa, em linhas gerais, pretende apresentar discussões e informações sobre a violência de gênero ocorrida durante a pandemia de Covid-19 nos anos de 2020 e 2021, na cidade de Imperatriz/MA, buscando identificar de que forma a rede de proteção à mulher se adaptou nesse período para combater esse tipo de violência. Desse modo, o estudo foi estruturado com o intuito de ressaltar e apresentar algumas nuances de fundamental importância, como os conceitos de violência e gênero, alterações legislativas e ampliativas reconhecidas pelo Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça, bem como o de informar os órgãos e entidades participantes da rede de apoio e de enfrentamento da violência doméstica e familiar contra a mulher e os mecanismos utilizados no município de Imperatriz por essa rede no contexto pandêmico. Para isso, a metodologia inserida neste estudo contou com uma abordagem dedutiva, bibliográfica e documental, por meio de artigos científicos, e-books digitais, sites da prefeitura de Imperatriz do Maranhão, somada ainda com um levantamento quanti-qualitativo dos dados da violência contra a mulher e, sobretudo, com a elaboração de um questionário no tocante aos mecanismos aplicados pelo Centro de Referência e Atendimento à Mulher e Vara da Mulher, ambas do município de Imperatriz/MA.
Palavras–Chave: Violência doméstica. Covid-19. Tecnologias. Rede de proteção.
ABSTRACT: This research in general aims to present discussions and information about gender violence that occurred during the pandemic of Covid-19 (2020/2021), in the city of Imperatriz/MA, seeking to identify how the women's protection network has adapted in this period, to combat this type of violence. Furthermore, this study was structured in order to highlight and present some nuances of fundamental importance as the concepts of violence and gender, legislative and ampliative changes recognized by the Federal Supreme Court and Superior Court of Justice, in addition to informing the agencies and entities participating in the network of support and confrontation of domestic and family violence against women and the mechanisms used in the city of Imperatriz by this network in the pandemic context. Therefore, the methodology used in this study relied on a deductive, bibliographic and documental approach, through scientific articles, digital e-books, and websites of the city hall of Imperatriz Maranhão, in addition to a quantitative and qualitative survey of data on violence against women and, mainly, with the elaboration of a questionnaire regarding the mechanisms applied by the Center of Reference and Assistance to Women and the Women's Court, both in the city of Imperatriz/MA.
Keywords: Domestic violence. Covid-19. Technologies. Protection network.
1 INTRODUÇÃO
Muito se discute sobre a violência de gênero na pandemia, tanto no cenário histórico nacional, quanto mundial, principalmente em razão das medidas adotadas durante o isolamento social como forma de conter o avanço da covid-19[2]. Nesse contexto, figura como objeto da presente pesquisa o estudo acerca de como a rede de proteção à mulher e enfrentamento a violências praticadas no município de Imperatriz/MA passaram a atuar no contexto pandêmico, de modo a continuarem dando o devido suporte às mulheres.
Em primeiro momento, este documento apresenta de forma detalhada alguns pontos, como os conceitos de violência de gênero contra a mulher, focando, em especial, na violência doméstica e familiar; citando ainda as recentes ampliações legislativas e a compreensão dos tribunais para aplicação da Lei 11.340/2006 (Lei Maria da Penha). São apresentados, ainda, os órgãos de apoio e de enfrentamento que contemplam a rede de proteção neste município.
Para a elaboração do presente trabalho, a metodologia abordada envolveu procedimento bibliográfico e documental baseado em textos normativos, artigos científicos, entendimento jurisprudencial, e-books e sites da prefeitura de Imperatriz do Maranhão, por meio de um levantamento quanti-qualitativo dos dados da violência contra a mulher e, principalmente, com a elaboração de um questionário no tocante aos mecanismos aplicados pelo Centro de Referência e Atendimento à Mulher e Vara da Mulher, ambas do município de Imperatriz/MA.
Diante do exposto, espera-se que a contribuição ensejada nesta pesquisa seja agraciada pelos discentes e docentes de forma geral, a fim de proporcionar ao arcabouço jurídico a inquirição de novas fontes de pesquisa sobre o tema, haja vista a necessidade de sempre rediscutir assuntos que possibilitam a reconstrução mental, intelectual, bem como cultural, sobre os preceitos fundamentais da dignidade humana aliados ao respeito à legislação especial da mulher.
2 Violência e gênero na pandemia
Inicialmente, faz-se importante entender a origem da Lei n° 11.340/2006, conhecida como Lei Maria da Penha. Essa lei foi sancionada em 7 de agosto de 2006 e o nome faz referência a uma enfermeira homônima cruelmente agredida pelo próprio marido, a ponto de ficar paraplégica. A série de violências sofridas ganhou repercussão internacional e o caso, inclusive, chegou à Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA), que recomendou ao Brasil o desenvolvimento de uma legislação específica sobre violência doméstica. Atualmente, Maria é ativista da causa e é considerada símbolo da luta pelo fim da violência contra as mulheres.
Em seu bojo, especificadamente no artigo 5º, caput, a Lei Maria da Penha define a violência doméstica e familiar contra a mulher como “qualquer ação ou omissão baseada no gênero, que cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial”. Quanto a isso, é pacífico o entendimento de que esses atos podem advir dentro do convívio doméstico e familiar ou fora dele, e configurar-se-á quando envolver questões de afeto ou quando a ação ou a omissão for decorrente do gênero ou da condição de mulher.
Em 2020, o surgimento de uma doença até então desconhecida causada pelo vírus SARS-CoV-2 colocou o mundo em alerta. Em meados de março daquele ano, a Organização Mundial de Saúde (OMS) declarou situação de pandemia provocada pelo revelado “novo coronavírus”.
O advento da Covid-19 acarretou a adoção de medidas governamentais de bloqueio do avanço da transmissão da doença, destacando-se a necessidade de isolamento social. Nesse panorama, Maria Clarisse Martins Queiroz (2021) aduz que as mulheres, as quais sempre estiveram em situação de vulnerabilidade no que diz respeito às violências existentes, passaram a conviver muito mais com os seus agressores, dado o confinamento diário, o que corroborou com o cerceamento de outros direitos fundamentais, a exemplo, o de liberdade, previsto no artigo 5º, caput, da Constituição Federal. Assim, o isolamento social ficou marcado como um dos fatores determinantes para a crescente ascensão da violência contra a mulher durante a pandemia.
Nas lições de Queiroz, evidencia-se que a constrição social foi fundamental para a contenção da doença, especialmente durante o período de 2020 a 2021, auge das contaminações. Todavia, nota-se que o cenário pandêmico levou muitas pessoas ao desemprego, motivando problemas que não se restringiram à saúde ou a finanças, mas que alcançaram até mesmo o ambiente intrafamiliar, visto que agressores e iminentes agressores passaram a ter maior controle sobre a liberdade de suas companheiras.
Cabe destacar que na Lei Maria da Penha o legislador detalhou no inciso II, caput do artigo 5º, que a prática da violência doméstica e familiar costuma ocorrer dentro do âmbito da unidade doméstica. Esse ambiente, por sua vez, pode ser compreendido como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, não se exigindo que haja coabitação, e sim, no mínimo, relação íntima de afeto.
No mesmo sentido é o inciso III, do caput do artigo 5°, da Lei Maria da Penha, que denota que ações ou omissões que causem ofensa física, sexual, psicológica, patrimonial ou moral contra a mulher “em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação” implica na aplicabilidade dessa legislação especial.
Observa-se, portanto, que qualquer conduta (ação ou omissão) baseada no gênero ou se referindo à condição de gênero, não importando a orientação sexual de quem a praticar, perpetrada contra mulher, terá como consequência a aplicação da Lei 11.304/2006. Aliás, conforme jurisprudência dominante nos tribunais, a Lei Maria da Penha se aplica igualmente às mulheres transexuais, pois não se trata de uma lei de sexo, mas de gênero.
A seu turno, Queiroz (2021, pág. 9), quanto às violências contra a mulher, evidenciou que essa, costumeiramente “[...] abrange relações domésticas de descendentes, ascendentes, irmãos e a mais comum atualmente, entre cônjuges com maior relevância e trivialidade a violência doméstica contra as mulheres”.
Importante salientar que a Lei 11.340/2006 tratou genericamente no seu artigo 5º sobre como se configuraria violência doméstica e familiar contra a mulher, não especificando, contudo, as possíveis formas de violência praticadas. Isso porque, objetivando possibilitar uma melhor identificação dos tipos de agressões cometidas, cuidou de elencá-los em um artigo próprio, o 7º, em um rol exemplificativo. Nesse seguimento, observa-se que o legislador da Lei Maria da Penha, no artigo 7º, inciso I, conceituou a violência física praticada em face da mulher como qualquer conduta que ofenda a sua integridade ou a sua saúde corporal.
Ademais, salienta-se que as agressões contra as mulheres nem sempre deixarão marcas visíveis, podendo atingir, também, a saúde corporal e mental da vítima, resultando em uma violência psicológica, por exemplo. Esse tipo de agressão é detalhado no artigo 7º, inciso II, da Lei Maria da Penha. Diante disso, percebe-se que a violência psicológica apresenta diversos termos que a caracterizam, e nessa pandemia, a partir do momento em que se adotou a constrição social, essa violência provavelmente aumentaria, dada a possibilidade de o agressor ter maior controle sobre a vítima dentro do ambiente familiar.
Emerge, ainda, da Lei 11.340 de 2006 a conceituação de violência sexual, prevista no artigo 7, inciso III:
[...] qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, seja ela mediante intimidação, ameaça, coação ou pelo uso da força, sobretudo que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos (BRASIL, 2006).
Subentende-se dessa espécie de violência que a liberdade da mulher em consentir deve ser respeitada e essa manifestação de vontade deve ser bem compreendida pelo agressor, pois “não é não”, e o desrespeito desse preceito legal acarreta na violação deste inciso. Aliás, denota-se desse dispositivo que não é preciso preencher todas as condutas para que o agressor seja responsabilizado, bastando uma só para a aplicabilidade da lei.
Cumpre ainda constatar o conceito de violência patrimonial, inserido no artigo 7º, inciso IV:
[...] qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades (BRASIL, 2006).
Depreende-se que o fato de ter sido adotada a constrição social no município de Imperatriz, a exemplo do que ocorreu em todo o país, desencadeou promoção de alternativas de trabalho, como por exemplo, o trabalho remoto, em que algumas mulheres poderiam figurar como vítimas ao terem seus bens pessoais retidos, destruídos parcial ou totalmente, principalmente sendo esses objetos utilizados para fins de desempenho laboral.
Outra forma de violência, a moral, acentuada no artigo 7º, inciso V, da mesma lei, é vista como “qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria”. Percebe-se, então, que a calunia, difamação ou injúria só serão aplicadas se dirigidas à mulher, conforme o caput do artigo 5°, desde que exista motivo de gênero ou em razão da condição de gênero.
Nesse pensamento, Cinthia de Cassia Catoia, Fabiana Cristina Sever e Inara Flora Cipriano Firmino (2020, pag. 3), apontam que a violência de gênero apresenta atitudes discriminatórias dirigida à mulher, uma vez que “[...] a violência baseada no gênero é uma forma de discriminação dirigida às mulheres pelo fato de serem mulheres ou que as afeta desproporcionalmente, impedindo-as de gozar dos direitos em igualdade com os homens [...]”. Diante desse conjunto de terminologias, ainda é possível constatar que a Lei Maria da Penha ressalta a asseveração dos autores no artigo 5º, quando menciona a configuração da violência doméstica e familiar contra a mulher quando há a prática de qualquer ação ou omissão assentada no gênero, diante de circunstâncias que provoque ou cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial.
Em conformidade com o aludido, está a jurisprudência da Corte Superior do Tribunal de Justiça manifestada em decisão monocrática no Recurso Especial n° 1929133-GO (2021/XXXXX-o), pela relatora, ministra Laurita Vaz: “[...] não basta que o crime seja praticado contra mulher no âmbito doméstico ou familiar, exigindo-se que a motivação do acusado seja de gênero, ou que a vulnerabilidade da ofendida seja decorrente da sua condição de mulher (STJ. 2021, ON-LINE)”. Observa-se que o entendimento de gênero requer algumas especificidades, como a que a motivação e a condição sejam em razão do gênero ou do fato de o sujeito passivo ser mulher. Convém ressaltar que atualmente foi ampliado no Recurso Especial n° 1977124 – a aplicação da lei Maria da Penha às mulheres transexuais, desde que verificada as condições (motivação do acusado seja de gênero; ou que a vulnerabilidade seja decorrente da condição de mulher).
Vale citar ainda incorporação da Lei 14.022, de 07 de julho de 2020, que “altera a Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, passando a dispor sobre as medidas de enfrentamento à violência doméstica e familiar contra a mulher [...]”, em que entre as inclusões do §7° e seus incisos, do artigo 3°, os processos de violência doméstica e familiar contra a mulher não serão afetados pela suspensão processual diante do coronavírus.
Além disso, algumas inclusões na lei 11.340/2006, foram feitas no ano de 2020, para garantir uma maior proteção as vítimas de violência, dentre eles os incisos VI e VII do artigo 22, que discorre sobre as medidas protetivas de urgência, inseridas pela lei 13.984, de 03 de abril de 2020. Concomitantemente a isso, também foi incorporado na lei Maria da Penha, o artigo 12-C, trazida pela lei 14.188, de 28 de julho de 2021, em que possibilita o afastamento do agressor do convívio intrafamiliar dado não só a prática da violência como também de sua iminência. Tal incorporação, também foi responsável pela política de cooperação do sinal vermelho na mão, como forma de combater esse tipo de violência.
Segundo Simone da Silva Costa (2020, pág. 927), um fato que acentuou os números da violência contra a mulher no âmbito doméstico e familiar foi o crescente salto de desemprego no país. Essa tendência, aparentemente exaltou ânimos e atitudes interpessoais começaram a ficar desgastadas fazendo emergir não só o estresse com a rotina parada repentinamente, mas outras condutas, como o consumo de bebidas alcoólicas. Consequência disso ainda a questão da falta de circulação de dinheiro entre as famílias.
Diante desses fatos, Ana Andreza Albuquerque Medeiro, et al (2021, p.4), explica que o “[...] isolamento social causado pela pandemia do novo coronavírus levou ao aumento do convívio, expandindo as chances de causar estresse nas relações interpessoais e estimular os desgastes familiares, inclusive da mulher com o agressor”. Esse contexto de violência provocado pelo isolamento social não ficou restrito somente ao estado brasileiro, pois a Organização das Nações Unidas chamou a atenção dos órgãos internacionais para tutelar os direitos dessas vítimas, já que, como aduz o artigo 6º da lei 11.340/2006, “a violência doméstica e familiar contra a mulher constitui uma das formas de violação dos direitos humanos”.
Nessa ótica é o entendimento de Pamela Rocha Vieira (2020, pág. 2):
Embora as evidências a respeito dos impactos do isolamento sobre a violência doméstica e familiar sejam incipientes, notícias divulgadas na mídia e relatórios de organizações internacionais apontam para o aumento desse tipo de violência (VIEIRA; GARCIA; MARCIEL, 2020, p.2).
Subtende-se de Vieira, que, o mecanismo para chamar a atenção do mundo como um todo foi a mídia, possibilitando o surgimento de outras medidas fundamentais de combate à violência e gênero. Nesse pensamento, como a Corte Internacional dos direitos Humanos busca reprimir essa conduta, não resta dúvida do seu papel de informação e vigilância. Aliado a isso, Vieira et al (2021, p.5), acrescenta, ainda, a informação do apoio praticado pelas entidades públicas e privadas do país:
Empresas do Brasil também criaram formas diferentes para auxiliar a mulher a fazer as denúncias, a partir de produtos, canais de comunicação em sites, boots em aplicativos, entre outras formas que trouxessem alguma forma de amparo as vítimas, durante a quarentena.
Essa inovação, como explanado por Vieira, buscou uma colaboração da sociedade, tendo fundamental importância para dirimir essa barbárie, possibilitando, inclusive, um apoio imediato, enquanto as entidades de proteção e acolhimento à mulher programavam medidas essenciais para solucionar meios de acessos às diversas classes sociais. Dentre algumas medidas criadas, a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) uniram forças para lançar a campanha Sinal Vermelho, contra a violência doméstica, e como forma de facilitar essa compreensão, muitas empresas brasileiras começaram a introduzir instrumentos e meios digitais para ajudar e disseminar esse laço de solidariedade em plena pandemia.
3 Rede de proteção à mulher no município de Imperatriz na pandemia
Diante do contexto pandêmico, o município de Imperatriz - localizado a oeste do Estado do Maranhão, cuja população é estimada em 259.980 (duzentos e cinquenta e nove milhões e novecentos e oitenta mil) pessoas, considerada a segunda maior cidade do Maranhão, apresenta uma rede de órgãos de apoio, proteção e acolhimento à mulher, onde iniciou-se campanhas internas e externas com o objetivo de conscientizar a sociedade imperatrizense sobre a violência doméstica e familiar contra a mulher, nessa pandemia. Incute-se disso quatro principais setores da Política Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres: combate, prevenção, assistência e garantia de direitos, todas relacionadas a violência.
Destaca-se que a atuação da rede de proteção ocorre por meios estratégicos, efetivos e preventivos, diante de políticas públicas, a fim de conceder e garantir o empoderamento das mulheres e a construção da autonomia, seja ela financeira ou profissional, promovendo uma autoacepção dos seus direitos.
Com a inovação trazida pela Lei 13.871, de 17 de setembro de 2019, foram inseridos os parágrafos 4°, 5° e 6°, no artigo 9, da Lei Maria da Penha, passando a ser aplicada aos agressores a responsabilização financeira em custear os cofres do Sistema Único de Saúde (SUS) e os dispositivos de segurança por elas utilizados, por qualquer ação ou omissão ou se causar lesão, violência física, sexual ou psicológica e dano moral ou patrimonial à mulher. A seguir serão apresentadas as instituições e órgãos que já faziam parte da rede de proteção no município, mas que na pandemia se intensificaram com medidas alternativas e meios tecnológicos, no intuito de garantir uma tutela célere à mulher.
3.1 Centro de Referência e Atendimento à Mulher (CRAM)
O Centro de Referência e Atendimento à Mulher (CRAM) atua como um órgão responsável por conceder um atendimento multidisciplinar às mulheres que se encontram em situação de violência, garantindo atendimento psicológico e social e, sobretudo, promovendo orientação e acolhimento às vítimas, e possibilitando, inclusive, assessoramento jurídico necessário para superação da violência e fortalecimento da mulher. Vale destacar que em decorrência do confinamento social vivido nacionalmente, o CRAM passou a realizar atendimento remoto. Com esse órgão e outros mecanismos de ajuda psicossocial, mulheres agredidas têm a chance de se reestruturarem psicologicamente, e com o apoio de outras entidades, como a Casa Abrigo Doutora Ruth Noleto, possuírem uma boa estrutura, de âmbito profissional.
3.2 Casa Abrigo Doutora Ruth Noleto
A instituição Casa Abrigo Doutora Ruth Noleto tem o seu endereço mantido em sigilo e de responsabilidade da prefeitura de Imperatriz. O atendimento costuma ocorrer de forma presencial e em colaboração a outros órgãos, como por exemplo, o disque 190, delegacias da mulher, Patrulha Maria da Penha, Centros de Referência e Atendimento à Mulher e a Casa da Mulher Maranhense em Imperatriz, Secretaria Municipal de Políticas para as Mulheres (SMPM). Essa casa, por sua vez, auxilia na cooperação com uma estrutura de ponta, já que conta com vários profissionais como servidores, pedagogos, assistentes sociais, psicólogos, auxiliares administrativos, equipes especializadas no atendimento e com ambiente com capacitação profissional às vítimas.
3.3 Secretaria Municipal de Políticas para a Mulher (SMPM)
A Secretaria Municipal de Políticas para a Mulher, por sua vez, funciona 24 (vinte e quatro) horas por dia e disponibiliza atendimento via e-mail ([email protected]).
Dentre as ações promovidas pela SMPM destacam-se políticas públicas objetivando articular meios de adesão social, seja por meio de projetos, planos e programas, a fim de que os direitos das mulheres sejam respeitados e, principalmente, de modo que haja a aplicabilidade da dignidade da pessoa humana, preconizada no artigo 1º, inciso III da Constituição Federal de 1988. Além disso, a SMPM, é responsável por encontrar parceiros, privados, públicos e sociedades em geral, uma vez que almeja combater e prevenir todas as formas de violação contra as mulheres.
3.4 Centro de Referência da Assistência Social (CRAS)
Soma-se ainda ao arcabouço especializado de proteção a mulher o Centro de Referência da Assistência Social (CRAS), que atua de maneira descentralizada, por meio de políticas de assistência social, sendo diversas unidades que abarcam este município como os localizados nos bairros seguintes: Santa Rita; Bom Jesus; Povoado Coquelândia; Santa Lúcia; Bacuri e Cafeteira.
Todos os CRAS supramencionados fazem e mantêm como função essencial a oferta e proteção dos preceitos básicos da constituição, visto que buscam prevenir todas as possíveis situações de risco em seu território de abrangência, fortalecendo vínculos familiares e comunitários. Dessa maneira, esse atendimento imediato faz com que seja articulado com as vítimas um acolhimento para que se sintam mais seguras enquanto aguardam o apoio das demais entidades, como o da Polícia Militar ou da Patrulha Maria da Penha.
3.5 Hospital Municipal de Imperatriz (HMI)
O Hospital Municipal de Imperatriz (HMI) também integra essa rede de enfrentamento à agressões contra as mulheres, porque mantém o primeiro contato ao socorrer as vítimas de violências mais graves, fazendo logo o diagnóstico, e informando, em seguida, às demais unidades, como a Polícia Militar – Patrulha Maria da Penha, para averiguação do local. Assim, havendo suspeitas de possíveis violências físicas e abusos, inicia-se a mobilização das redes de proteção para o acolhimento e possíveis orientações para combater e reprimir essa situação no estado.
3.6 Delegacia Especializada da Mulher (DEM)
Cita-se, também, a Delegacia Especializada da Mulher (DEM), cujo atendimento, em regra, ocorre de maneira presencial, mas pode ocorrer ainda pelo e-mail ([email protected]) ou pelo telefone n° 190. Liga-se a isso, para a atuação do órgão o trabalho da polícia civil do maranhão, principalmente nessa pandemia com ações de prevenção, investigação e proteção, cuja previsão legal tanto na Lei Maria da Penha quanto na lei do minuto seguinte e do feminicídio.
3.7 Defensoria Pública Estadual/Maranhão
A Defensoria Pública Estadual também se inclui nessa rede de apoio que busca a tutela dos direitos individuais ou coletivos dos cidadãos em situação de vulnerabilidade econômica ou social, principalmente no tocante às mulheres que vêm sendo vítimas de violência doméstica e familiar nessa pandemia. A assistência pública, entretanto, não se resume apenas à orientação jurídica, mas também na representação dos beneficiários diante do Poder Judiciário.
3.8 Casa da Mulher Maranhense
Outrossim, a cidade de Imperatriz conta com um aparato inovador que é a Casa da Mulher Maranhense, cujo atendimento ocorre todos os dias da semana, 24 (vinte e quatro) horas por dia, contando com uma assistência humanizada com salas de acolhimento, recepção, abrigo de passagem com alojamentos, brinquedoteca e demais dependências, reunindo todos os órgãos da Rede de Enfretamento à violência contra as mulheres, como Apoio Psicossocial, Delegacia, Patrulha Maria da Penha, Juizado, Ministério Público e a Defensoria Pública do Maranhão. Vale acrescentar, que a casa cuida de promover uma inclusão das mulheres no mercado de trabalho através dos serviços sine mulher.
3.9 Vara Especial de Violência Doméstica e Familiar contra à Mulher de Imperatriz
Contempla ainda as instituições de enfrentamento, a Vara Especial de Violência Doméstica e Familiar contra à Mulher de Imperatriz, cujo atendimento faz-se pelo e-mail [email protected] ou dirigindo-se até a Secretaria da Vara, para orientações e informações. Essa Vara promove com celeridade e urgência as movimentações judiciais para agilizar na manifestação do juízo. Posto isto, a unidade da mulher possui colaboradores capacitados para dirigir as vítimas ou a população as orientações solicitadas.
4.0 Política de Atenção Integral da Saúde da Mulher
Por fim, a Política de Atenção Integral da Saúde da Mulher – PAISM possui como objetivo geral no Governo brasileiro prevenir, promover, assistir e recuperar a saúde da mulher, visando quebrar o ciclo da violência em situações evitáveis, principalmente, a fim de reduzir tanto a morbidade, quanto a mortalidade feminina no município e nacionalmente.
De início, todos esses órgãos tiveram participações primordiais na pandemia, uma vez que a própria prefeitura de Imperatriz, por meio da Secretaria Municipal de Políticas para Mulher – SMPM, em parceria com o Imperial Shopping e com a Faculdade de Educação Santa Terezinha – FEST promoveram debates sobre o combate à violência doméstica em tempos de pandemia através de lives ocorrida no dia 02 de junho, às 16hs, do ano de 2020, pelas redes sociais oficiais da Prefeitura e do Shopping, que obteve apoio da rede lojista do local. Já na faculdade, ocorriam orientação e reabilitação dos agressores, porém, em razão da pandemia, os atendimentos ficaram parados temporariamente, mas logo retornaram.
Cumpre realçar que essa iniciativa busca criar e fortalecer um laço de apoio social de enfrentamento à violência contra as mulheres e apresentar meios de solicitação de atendimento diante das medidas de constrição social adotadas. Nesse contexto, o processo de assimilação do período que só decorreu e se intensificou após o alerta mundial promovido pelo Secretário-Geral da Organização das Nações Unidas, segundo Deisemara Teiratti Langoski (2021, pág. 10), na qual, advertiu as autoridades políticas, sanitárias e organizações sociais sobre a forma como a pandemia da Covid-19 e o isolamento social poderiam afetar as mulheres - tanto através da sobrecarga de trabalho como através do incremento dos índices de violência doméstica e diminuição de acesso a serviços de atendimento, por essa razão, orientou segundo Langoski (2021, pág. 10), a implementação de investimento em serviços online de assistência, garantia célere nos sistemas jurídicos e sobretudo na acessibilidade de toda a organização civil.
No início da Covid-19, não havia um aparato tecnológico para suprir a necessidade do município e redondezas que abarcasse a sociedade imperatrizense, muito menos as mulheres mais vulneráveis, o que fez com que essas frentes intensificassem as medidas de conscientização social, não somente nos próprios órgãos de apoio, como na praça de Fátima, Imperial shopping, escolas e faculdades desta cidade, contando também com a divulgação de folders para orientar a sociedade e informar sobre os meios de proteção através dos contatos, endereços de toda a rede de apoio e por meios de atendimento no Whatsapp, dentre outros acessos, como o Disque 180, bem como o 190, da Polícia Militar.
No que tange às medidas aplicadas, deve-se compreender que não estavam dando somente atenção à tutela da mulher, mas também ao controle da proliferação da Covid-19, na qual se almejava evitar o colapso do sistema de saúde pública na cidade de Imperatriz. Desse modo, a rede de proteção à mulher nesta cidade percebeu que o confinamento seria a ponta do iceberg para o aumento a violência e gênero contra a mulher. Dessa maneira, uma das medidas emergenciais para se buscar ajuda foi o uso do acesso telefônico, conforme aludem Langoski; Pedroso e Toniolo: “Nessa perspectiva, relata-se o temerário cenário para que as vítimas utilizem as linhas telefônicas como forma principal de encontrar o caminho para a denúncia, na medida em que se encontram em contexto de confinamento domiciliar (2021, pág. 5)”.
Essa viabilidade, acessível à sociedade pelo Disque 180, 190 e outros meios citados acima evidenciou um aumento da violência doméstica e familiar contra a mulher, alertada por estudiosos e organizações internacionais, e por essa razão o município de Imperatriz adotou a causa com a campanha desde a pandemia de combate à violência contra a mulher. Assim sendo, a preparação dos adeptos à campanha encontrou força com a adesão da sociedade civil e em redes de acesso remoto por meio da Delegacia online-MA, meios pelos quais é possível fazer o registro de ocorrência via site (https://delegaciaonline.ssp.ma.gov.br/) e denunciar possíveis violências contra as mulheres pelo Disque 180.
4 A reinvenção no contexto de proteção à mulher no período de pandemia no município de Imperatriz
A forma de combate à violência doméstica e familiar contra a mulher no município de Imperatriz, durante a pandemia, teve que passar por algumas mudanças. Isso porque, os órgãos de apoio e enfrentamento precisaram se adaptar de forma urgente, dado o avanço da Covid-19. Em consequência, foram levantados alguns questionamentos diretamente aos órgãos da rede, a fim de identificar os mecanismos utilizados em prol dessa classe durante a crise sanitária.
Assim, buscou-se perante os órgãos do Centro de Referência e Atendimento à Mulher (CRAM) e a Vara da Mulher do município de Imperatriz, obter-se respostas a questionamentos, como o exposto a seguir: De que forma a unidade de proteção à mulher se adaptou ao período de pandemia para conceder amparo às vítimas de violência? Explicando inclusive o que foi criado ou se houve legislações eventualmente implantadas no município, bem como mecanismos que foram melhorados para dar maior acessibilidade e agilidade às mulheres na busca por proteção e justiça.
Em resposta, o CRAM informou que teve uma remodelação nos atendimentos, pois, em regra, estes eram feitos de forma presencial, mas diante do novo contexto passaram a ser feitos de forma remota, por meio do telefone, via ligação (até mesmo a cobrar), além de mensagens pelo aplicativo Whatsapp[3], mecanismo primordial ao momento estabelecido. Referente a isso, explicou também que os encaminhamentos promovidos pela Delegacia da Mulher (DEM) continuaram sendo feitos da forma como eram, via e-mail.
[...] o CRAM continuou recebendo todos os encaminhamentos encaminhados pela Delegacia da Mulher (DEM), com relação aos registros feitos no mesmo dia e todas as cópias de Boletim de Ocorrência (BO), chegavam para o CRAM por e-mail, o qual continha telefone, endereço, assim o CRAM criava a lista e ligavam para todas as mulheres (CRAM, IMPERATRIZ, 2022).
Vale ressaltar, ainda, que os registros promovidos na Delegacia da Mulher eram encaminhados no mesmo dia ao Centro de Referência e Atendimento à Mulher, que iniciava o primeiro contato com as vítimas, se apresentando e se colocando à disposição dessas mulheres. Ademais, a lista criada pelo centro de referência constava todas as informações essenciais para agilizar e viabilizar os demais atendimentos, que eram agendados por horário e realizados virtualmente, como forma de manter o controle dos setores social e psicológico, bem como respeitar todas as medidas sanitárias decorrentes da pandemia:
Durante o período mais intenso da pandemia esse atendimento foi feito de forma virtual, daí depois que eram agendados atendimentos psicológicos esse atendimento era feito por chamada de vídeo, assim como era no setor social, porém com as psicólogas eram mais frequentes esses atendimentos, assim a profissional conseguia ver o rosto das mulheres e essas das profissionais (CRAM, IMPERATRIZ, 2022).
Denota-se dessa asseveração que a viabilidade tecnológica e logística se tornou primordial para o sistema de tutela das mulheres, que diariamente vêm sofrendo violências no seio familiar e/ou doméstico. Desse modo, a reinvenção nesses atendimentos se deu com os aprimoramentos de cunho tecnológico e de capacitação profissional, diante dos novos sentidos e formas de justificativas para ludibriar os profissionais sem esse preparo. Nessa ocasião, os atendimentos por videochamada, fizeram com que as profissionais estivessem mais atentas e mais preparadas.
No tocante à Vara da Mulher, em resposta a primeira asseveração contextualizada com o segundo apontamento, informou que no município de Imperatriz, foi criado em 2021 o aplicativo “Salve Maria”, disponível para todos os celulares androids[4], de forma gratuita, tal ferramenta “[...] utiliza-se de tecnologia de georreferenciamento para localizar vítimas de violência doméstica e, assim, encaminhar imediatamente o apoio policial (VARA DA MULHER, IMPERATRIZ, 2022)”. Essa tecnologia, também conhecida como o botão de emergência, tem sido um diferencial nessa reformulação a qual busca proteger as vítimas de violência, haja vista que quando acionado “[...] encaminha uma mensagem com localização para o CIOPS, que encaminhará imediatamente uma viatura policial ao local (VARA DA MULHER, IMPERATRIZ, 2022)”. Dessa maneira, essa ferramenta, em regra, vem garantindo às mulheres uma maior proteção, tendo em vista que essa celeridade, agilidade e eficiência tem sido uma das pautas a serem resolvidas de imediato, tanto pela rede de apoio quanto pela rede de enfrentamento.
Acrescenta-se ainda como alternativa de viabilidade à informação acima da Vara da Mulher, que a Delegacia da Mulher disponibilizou o contato telefônico[5] a fim de garantir uma maior acessibilidade das mulheres denunciarem seus agressores, pela via Whatsapp ou pedindo apoio aos órgãos de segurança diante de uma possível violência doméstica. Sobretudo, quanto ao Poder Judiciário, o sistema jurídico não parou, ele continuou sendo realizado de forma remota, por agendamento, de acordo com o apresentado pelo setor: “[...] foram realizadas por videoconferência audiências de instrução e julgamento no âmbito de ações penais) e de audiências de justificação (realizadas no âmbito das Medidas Protetivas de Urgência) (VARA DA MULHER, IMPERATRIZ, 2022).
Analisando a segunda pergunta do primeiro questionamento, foi informado pelo Centro de referência e Atendimento à Mulher as ferramentas utilizadas para ajudar na celeridade dos casos, atender a demanda emergente e demais procedimentos administrativos de praxe como (agendamento com o setor psicossocial) e, sobretudo, para corroborar com os profissionais presentes para combater à violência.
Pontuou ainda o CRAM, que:
[...] relação ao suporte houve na época da pandemia, dois celulares para o CRAM fazer esse serviço/trabalho, era dividido entre as profissionais e também em alguns casos as próprias profissionais usavam os seus telefones para poder fazer esse atendimento (CRAM, IMPERATRIZ, 2022).
Nessa situação, nota-se que diante da reformulação houve a necessidade do uso de telefones e em algumas situações a necessidade de as profissionais utilizarem seus próprios celulares para dinamizar o atendimento. Mesmo diante da disponibilização desses dois aparelhos, o Centro de Referência se sentiu limitado quanto a isso, pois todos os setores administrativos necessitavam dessa tecnologia, conforme pontuaram:
[...] o CRAM, também ficou limitado porque como eram duas assistentes sociais atendendo, um advogado e duas psicólogas terminou que ficou meio complicado, mas as profissionais aceitaram a disponibilizar o número delas pessoal para fazer esse contato, daí elas conseguiam fazer esse atendimento, claro que não um atendimento a contento porque pelo fato de ser por telefone já inibe um pouco (CRAM, IMPERATRIZ, 2022).
Compreende-se dessa informação, essa dificuldade no compartilhamento desses celulares dado a eficiência que tal procedimento exige, assim alguns profissionais compartilharam seus números particulares no objetivo de agilizar o atendimento, ganhar a confiança e acolher essas vítimas. Nesse viés, tal “atendimento virtual ele durou por toda a pandemia” e sobretudo perdura “como alternativa”, nesse atual momento. Por fim, não foi informado se houve legislações criadas nesse objetivo nesta cidade.
Foi perguntado ainda se o Centro de Referência e Atendimento à Mulher poderia explicar se houve reinvenção de aparatos tecnológicos para garantir maior acessibilidade as mulheres vítimas de violência em restrição social, apontando inclusive quais foram e o que foi melhorado? E explicando também as medidas criadas para as vítimas que não tem esse acesso à tecnologia?
Sobre essa objeção, acrescentou que “[...] não teve nenhuma medida que tornasse viável ou mais fácil o acesso a esses mecanismos de denúncia por exemplo não teve um canal aberto em que as mulheres pudessem ligar gratuitamente para os serviços, não teve nenhum 0800, nada disso” (CRAM, IMPERARIZ, 2022. Diante disso, subentende-se desse questionamento que o aprimoramento utilizado na pandemia não assistiu todas as mulheres do município, haja vista que uma parcela dessas possuem dificuldade quanto aos recursos financeiros para ter crédito e acesso à internet, conforme bem salientado pelo centro:
[...], ainda houve muita dificuldade em relação a isso, porque muitas mulheres infelizmente em situações de violência os agressores quebram os celulares dessas mulheres e quando eles não quebram não dão dinheiro para essas mulheres e também elas não têm como prover esses recursos para colocar crédito, até porque ter dinheiro e comprar um café da manhã ou o almoço para os filhos e colocar crédito, elas preferem manter à alimentação dos filhos (CRAM, IMPERATRIZ, 2022).
Essa percepção de subsistência faz com que muitas vítimas permaneçam nesse ciclo de violência doméstica e familiar necessitando de uma orientação e apoio que vem sendo dinamizado pelos órgãos para combater essa violação de direitos humanos, assim expresso no artigo 6 da lei 11.340/2006. No entanto, essas vítimas desprovidas desses meios digitais necessitam do apoio social para que as entidades de apoio e enfrentamento tenha conhecimento e faça o atendimento.
Aliado ainda a isso foi questionado se no município de Imperatriz foram disseminadas campanhas em apoio à mulher no período pandêmico? Inclusive se foi feito algum estudo ou balanço social dos órgãos de proteção e acolhimento a mulher para saber qual o horário as campanhas veiculadas alcançariam um maior número de ouvintes? Em resposta a essa inquirição, obteve-se que:
[...] na cidade de Imperatriz foram feitas algumas campanhas nacionais como a campanha do X na mão – que era um alerta, inclusive para os estabelecimentos farmacêuticos representando um pedido de ajuda. Foi feito também, campanhas para fortalecer e divulgar os contatos da rede – “formas de denúncias” foi criada na época inclusive também o “salve maria” (é um aplicativo que foi criado no período da pandemia) (CRAM, IMPERATRIZ, 2022).
Além disso, contou com a publicização periódica dos boletins que era uma forma de “prestação de conta do trabalho que estava sendo feito durante a pandemia para que as pessoas soubessem que o serviço não tinha parado”. Inclusive, foi massificado nos meios de comunicação social “por meio de entrevistas, rádio, tvs, nas mídias sociais, para que pudesse incentivar [...]” (CRAM, IMPERATRIZ, 2022), as mulheres a terem coragem de fazer essa denúncia e sobretudo divulgar os canais de serviços pois:
[...] o CRAM produziu cartazes informativos e conseguiu disseminar bastante isso, e viralizar nas redes sociais e nos meios de comunicação de forma geral como portal da prefeitura essas formas de denúncia e essas formas de acesso aos serviços (CRAM, IMPERATRIZ, 2022).
Denota-se que todas essas medidas profiláticas de divulgação, demonstração, acolhimento e de orientação remota visual, foram primordiais nesse combate à violência, haja vista que, tal prática foi aderida pela população imperatrizense e trouxe segundo o CRAM “[...] retorno porque o órgão teve muitos atendimentos espontâneos inclusive de mulheres que não haviam denunciados na delegacia e nem online, mais que procuraram os serviços mesmo assim [...]” (CRAM, IMPERATRIZ, 2022). Diante disso, a rede de apoio e de enfretamento obteve bons resultados, no tocante a disseminação e adesão dessas políticas implantadas de conscientização informacional.
Somado a isso, há também a questão do estudo ou balanço social feito pelos órgãos de proteção e acolhimento a mulher para saber qual o horário as campanhas foram veiculadas a fim de alcançar um maior número de ouvintes. Em resposta, informou que “[...] não pode garantir se houve um estudo específico de qual horário seria melhor para alcançar o público alvo [...] (CRAM, IMPERATRIZ, 2022)”, mas que a iniciativa foi tomada pelo Ministério Público que “[...] utilizou o horário nobre da TV para divulgar os serviços, telefones, incentivar as mulheres a fazer as denúncias ou pelo menos buscar os serviços para serem bem orientadas e acolhidas (CRAM, IMPERATRIZ, 2022)”. Analisando essa ideia, as entidades de apoio por mais que não tenha feito uma análise desse estudo, percebe-se que tal mecanismo foi de total importância para atender o público imperatrizense.
Diante desses fatos, foi questionado ainda ao Centro de Referência e Atendimento à Mulher se houve integralização da rede de apoio e acolhimento a mulher com outros órgãos privados e/ou públicos e não governamentais neste município? Se possível aponte quais entidades fizeram parte dessa corrente de proteção?
O CRAM apontou que a integralização vinha sendo realizada não pela inserção de novos órgãos privados e/ou públicos e não governamentais, mas sim em relação aos serviços, conforme explicita que: “[...] houve uma integralidade maior dos serviços da rede de atendimento, a qual contou também com o apoio da rede de enfretamento que engloba todos os serviços que acolhe mulheres em situação de violência e crianças [...] (CRAM, IMPERATRIZ, 2022)”. Nesse sentido, denota-se dessa observação que houve uma integralidade no atendimento de forma mais precisa na pandemia, no entanto, não dar forma fundamental como bem comunicado pelo centro “[...] recebendo a mulher, encaminhando a mulher, deixando-a no espaço, levando e trazendo essa mulher aos serviços essenciais, dando esse suporte necessário [...] (CRAM, IMPERATRIZ, 2022)”. Isso não foi possível, dado aos meios logísticos da unidade da qual só possuíam um veículo na época da pandemia para executar atividades de atendimento e acolhimento dessas vítimas, assim só foi feito apenas o possível.
Por fim, também foi questionado ao CRAM, se com o início da pandemia (2020 a 2021) a violência contra a mulher aumentou ou diminuiu? E entre os anos de 2021 a 2022, como ficou esse levantamento, após a estruturação de proteção no município?
Inicialmente, foi informado que a pandemia expos a população a conhecer mais os seus direitos e essa visibilidade juntamente com o conhecimento pode refletir nos números, no entanto [...] o CRAM acredita que não houve aumento como em nenhum momento da história pode afirmar que houve aumento dessa violência contra a mulher [...] (CRAM, IMPERATRIZ, 2022)”. Desse modo, acrescentou “[...] o que houve foi uma visibilidade maior da violência doméstica e familiar contra a mulher inclusive no período da pandemia [...] (CRAM, IMPERATRIZ, 2022)”. Isso, decorreu da medida adotada do isolamento social, em que as mulheres passaram a ficar mais tempo com os agressores e principalmente sobre o controle do mesmo.
Há ainda uma preocupação do CRAM desse número de vítimas serem bem maiores do que o esperado, pois muitas dessas, ficaram impedidas de acessarem os serviços digitais e ainda de buscar a ajuda dos vizinhos, dado a esse contato direto com o agressor.
Desse modo, essa preocupação do centro é refletida nos dados disponibilizados pela Vara da Mulher de Imperatriz, em que no ano de 2020, houve 1170 (um mil cento e setenta) solicitações de medidas protetivas de urgência, no ano de 2021, 1107 (um mil cento e sete) e no ano de 2022 até o dia 24/06/2022 foram 551 (quinhentos e cinquenta e uma). Fazendo uma análise, das informações evidenciadas a variação desses números continuou constante, conforme a asseveração apresentada pelo CRAM, em que pontuou que tal ascensão nos dados se daria diante do acesso as orientações e conhecimento dos próprios direitos, pois acredita que essa violência ocorrera em proporções bem mais alarmantes.
Vale apresentar também a quantidade de processos que foram distribuídos nesses anos, haja vista que em 2020, houve 1716 (um mil setecentos e dezesseis) distribuições de processos relacionados a violência doméstica e familiar contra a mulher, desses 1378 foram julgados e 1056 processos arquivados, comparado este ao ano de 2019, que houve 1606 (um mil seiscentos e seis) distribuições 1377 (um mil trezentos e setenta e sete) julgados e apenas 930 julgados. Denota-se que, durante o coronavírus e inclusive as medidas adotadas as distribuições processuais no Município de Imperatriz tiveram um pequeno acréscimo e muito disso reflete nos mecanismos adotados pela rede de apoio e de enfrentamento nesta cidade.
Consequentemente, em 2021, foram distribuídos 1607, novos processos sendo que 1572 foram julgados e somado com os processos remanescentes em contabilizou 2020 arquivamentos. Ademais, neste ano de 2022, já foi distribuído 1493 novos processos sendo que 1352 processos já foram julgados, sendo arquivado neste ano 1618 processos.
Essas informações demonstram o quanto a rede de apoio e de enfrentamento esteve atuante neste município buscando proteger os direitos das mulheres, nesta cidade. Sendo assim, todos os mecanismos de atendimento continuam sendo prestados à comunidade de forma a somar com as garantias constitucionais e sociais principalmente respeitando preceitos internacionais dos direitos humanos.
5.CONCLUSÃO
A presente pesquisa buscou apresentar discussões e informações a respeito da violência de gênero na pandemia, destacando a reinvenção na rede de proteção à mulher no município de Imperatriz/MA, no novo contexto social inserido pela pandemia da Covid-19. Isso porque, as medidas sanitárias adotadas, decorrentes do isolamento social, buscavam conter o avanço da doença e evitar uma arrebentação do sistema de saúde. Porém, outras situações advindas dessa medida acabaram surgindo, como o aumento dos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, que alarmou não só o estado brasileiro como também toda a comunidade internacional, após a comunicação do Secretário-Geral da Organização das Nações Unidas, solicitando medidas de tutela dessa classe.
Diante dessa situação adotada na pandemia, buscou-se neste estudo apresentar conceitos de violência e gênero, analisando a Lei 11.340/2006, no tocante a compreensão sobre cada espécie desta, ocorrida dentro do ambiente doméstico e familiar. Além deste, também foi citado a compreensão atual do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça quanto a aplicabilidade da Lei Maria da Penha, visto que não será todos os casos de violência que obrigará a aplicação desta legislação, pois já foi consolidado pela jurisprudência que o fato exige que a motivação seja em razão do gênero ou que a vulnerabilidade da vítima seja decorrente da condição de mulher.
Acrescenta-se ainda a ampliação legislativa do Recurso Especial n° 1977124, que permite a aplicação da Lei Maria da Penha - as mulheres trans. Ademais, foi apresentado os principais órgãos da rede de proteção no município de Imperatriz, segundo o site da prefeitura do município. Somado a isso, buscou-se identificar de que forma a rede de proteção a mulher se adaptou ao contexto pandêmico da Covid-19 (2020/2021), para combater esse tipo de violência no município de Imperatriz/MA. Para tanto, foi elaborado um questionário a fim de constatar como ocorreu esse estudo e se houve eficácia e eficiência nos meios adotados.
Diante disso, percebeu-se quanto aos atendimentos e os dados da violência, em relação aos processos distribuídos entre 2020 e 2021, que os números tiveram pequenas alterações o que não permite concluir que, de fato, houve ineficácia no atendimento, comparando-se com períodos anteriores. Já em relação aos atendimentos, levando em consideração o isolamento social, este teve uma eficiência a partir de campanhas publicitárias aplicadas mesmo com a limitação tecnológica. Essa reinvenção no atendimento garantiu a plena tutela de garantias fundamentais das frentes de combate à violência.
Diante desses fatos, ainda é importante acrescentar que todos os atendimentos proporcionados pelo Centro de Referência e Atendimento à Mulher e a Vara da Mulher de Imperatriz, permanecem sendo ofertados das duas formas, remota e presencial. Além disso, os órgãos disponibilizaram formas variadas de atendimento, acolhimento e acesso, como por exemplo o e-mail, ligação telefônica, Whatsapp (mensagens instantâneas, chamadas de vídeo), boletim online, botão de emergência pelo aplicativo Salve Maria. Logo, os mecanismos de tecnologia disponibilizado foram essenciais para o combate à violência na pandemia, pois foi responsável pelo objetivo de garantir o mais amplo acesso a tutela de direitos e garantias.
A estrutura metodológica desta pesquisa, se estruturou em uma análise bibliográfica e documental sob o método de abordagem qualitativo, pois foi utilizado artigos científicos, e-books, site da Prefeitura de Imperatriz do Maranhão, além do que foi elaborado um questionário a respeito dos mecanismos de adaptação aplicados pelo Centro de Referência e pelo Atendimento à Mulher e Vara da Mulher de Imperatriz contando ainda com uma abordagem quantitativa, uma vez que foi realizado um levantamento de dados referentes à violência contra a mulher na cidade.
Sendo assim, este estudo, de certa forma não vem no sentido de dirimir todas as questões sociais relativas à violência e gênero, mas de agregar informações reais do que aconteceu durante o período mais intenso da pandemia do Covid-19 (2020/2021), diante do isolamento social. Cabe ressaltar ainda, que o alcance da política de proteção de combate à violência só foi possível graças aos suportes tecnológicos disponibilizados pela rede de proteção no município de Imperatriz, com formas variadas de atendimento online. Sendo assim, espera-se que esta pesquisa seja de grande valia para os futuros pesquisadores não só da cidade de Imperatriz, mas de todo leitor e pesquisador, principalmente para os discentes e docentes que se enveredaram pelo campo de pesquisa.
REFERÊNCIAS
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BRASIL. Lei n. 14.022, de 7 de julho de 2020. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/lei/L14022.htm>. Acesso em: 03 set. 2022.
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[1] Professora Karoline Silva Costa (Direito Penal/IESMA/Unisulma). Mestra em Sociologia (PPGS/UFMA); especialista em Direito Penal (FDDJ) e especialista em Gestão Pública (UEMA).
[2] A Covid-19 é uma infecção respiratória aguda causada pelo coronavírus SARS-CoV-2, potencialmente grave, de elevada transmissibilidade e de distribuição global. Essa transmissibilidade pode ocorrer com simples um aperto de mão (seguido do toque nos olhos, nariz ou boca), por meio da tosse, espirro e gotículas respiratórias contendo o vírus. Diante da gravidade e expansão da doença, alguns estados brasileiros adotaram medidas como o isolamento social involuntário, para evita não só o alastramento mais rápido dessa infecção, mas também o colapso do sistema de saúde.
[3] WhatsApp - é um aplicativo multiplataforma de mensagens instantâneas, chamadas de voz para smartphones, mensagens de texto, possibilita o envio de imagens, vídeos e documentos, além de realizar ligações grátis por meio de uma conexão com a internet.
[4] O sistema Operacional Android - trata-se de um software cujo objetivo é gerenciar as atividades dos aparelhos digitais, permitindo a comunicação instantânea entre eles mediante acesso a internet, possui inclusive uma interface intuitiva e simples de utilizar.
[5] Delegacia da Mulher - Número (99) 98448 – 2836 (Whatsapp).
Graduando do curso de Direito do Instituto de Ensino Superior do Sul do Maranhão – IESMA/Unisulma.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: GOMES, JHON KENNEDY DA SILVA. Violência e gênero na pandemia: a reinvenção no contexto de proteção à mulher no período pandêmico no município de Imperatriz. Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 27 out 2022, 04:43. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/59670/violncia-e-gnero-na-pandemia-a-reinveno-no-contexto-de-proteo-mulher-no-perodo-pandmico-no-municpio-de-imperatriz. Acesso em: 22 nov 2024.
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