RESUMO: O artigo analisará a violência obstétrica sobre os aspectos da violação dos direitos fundamentais da mulher parturiente, pois durante o processo gravídico, a mulher e o nascituro se encontram em um estado vulnerável, e é essencial que sejam respeitados os direitos fundamentais, como dignidade da pessoa humana, direito a saúde física e mental. A violência obstétrica pode ocorrer durante o processo gravídico, puerperal e abortivo, e podem acontecer de várias maneiras como violência física, verbal, psicológica, sexual e institucional. Apesar de haver uma grade evolução referente aos estudos relacionado a prática de violência obstétrica, O Brasil não possui uma lei especifica sobre o assunto, mas os atos enquadrados como violência obstétrica podem ser correspondidos em crimes já previstos na legislação brasileira, como lesão corporal, importunação sexual e imputação de responsabilidade civil. Contudo, a falta de legislação referente ao tema no Código Penal e não haver lei federal referente ao assunto, não há a possibilidade de prisão, nestes casos.
Palavras-chave: Violência Obstétrica; Direitos Fundamentais; Direito da Mulher.
ABSTRACT: The article will analyze obstetric violence on the aspects of violation of the fundamental rights of the parturient woman, because during the pregnancy process, the woman and the unborn child are in a vulnerable state, and it is essential that fundamental rights are respected, such as the dignity of the person human right to physical and mental health. Obstetric violence can occur during the pregnancy, puerperal and abortion process, and can happen in different ways, such as physical, verbal, psychological, sexual and institutional violence. Although there is a great evolution regarding studies related to the practice of obstetric violence, Brazil does not have a specific law on the subject, but acts classified as obstetric violence can be corresponded to crimes already provided for in Brazilian legislation, such as bodily injury, harassment sex and attribution of civil liability. However, the lack of legislation on the subject in the Penal Code and the lack of federal law on the subject, there is no possibility of imprisonment in these cases.
Keywords: Obstetric Violence; Fundamental rights; Women's Right.
SUMÁRIO: INTRODUÇÃO. 1. OS DIREITOS FUNDAMENTAIS DA MULHER PARTURIENTE . 1.1. Dignidade da pessoa humana. 1.2. Direitos à saúde. 1.3. Violência obstétrica. 1.4. Perspectiva histórica. 1.5. Identificação Da violência obstétrica. 1.6. 2. O TRATAMENTO LEGAL DA VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA NO BRASIL. CONCLUSÃO. REFERÊNCIAS.
INTRODUÇÃO
Os direitos fundamentais são garantias que todos os indivíduos possuem a partir do momento em que nascem e qualquer violação há estas garantias fundamentais fere benefícios garantidos por lei pela Constituição Federal.
A garantia aos direitos fundamentais deve ser resguardada em todos os âmbitos da vida do indivíduo, mas muitas vezes ocorre a violação desse direito durante o processo reprodutivo dá-se o nome de violência obstétrica. Então entendemos como violência obstétrica sendo toda ação ou omissão que prejudique a mulher durante o processo reprodutivo. A violência obstétrica se apresenta de várias formas sendo elas: verbal, física, psicológica, sexual e institucional.
Refletindo sobre as identificações tratadas sobre violência obstétrica, podemos perceber que o problema causado pela violência obstétrica traz causas estruturais que rodeiam tanto as relações sociais quanto as pessoas que estão envolvidas. Desse modo, percebe-se que a violência obstétrica está muito incorporada a violência institucional pois é um processo recorrente nas práticas de sistema médico-hospitalar
Logo após a globalização dos Direitos Humanos, ocorrida depois de 1948, foi estabelecido um procedimento de introdução de diversas deliberações internacionais, que acontecia através de declarações, convenções, conferências entre outras declarações. Então a partir de 1948 que a mulher passa a ter seu direito de igualdade reconhecido, promovendo assim sua tutela perante a sociedade.
De acordo com a evolução dos Direitos Humanos, as mulheres também foram adquirindo seus direitos em face da sociedade, e processo foi sendo implementado de políticas e práticas que ajudam a tutelar os direitos das mulheres. Então a partir dos anos 90, começa os questionamentos sobre as políticas públicas a respeito da saúde da mulher parturiente. Em 2005 entra em vigor a lei n° 11.108, que visa garantir às parturientes o direito à presença de acompanhante durante o trabalho de parto, parto e pós-parto imediato, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), mas com a Resolução Normativa – RN n° 167, de 9 de janeiro de 2007 regulamento que os planos de saúde também deveriam se adequar a esta norma.
Então tratar a violência obstétrica é uma prioridade, como as mulheres geralmente não sabem que estão sendo abusadas, elas não têm controle sobre seus corpos e nem noção da gravidade do abuso sofrido. Portanto, há cada vez menos denúncia dessa prática rotineira. Observa-se a necessidade de uma discussão mais ampla sobre o assunto, não apenas para disseminar compreensão contemporânea, mas também para entender como a jurisprudência brasileira está posicionada e como as mulheres são protegidas.
Portanto, o objetivo geral e analisar a conduta da violência obstétricas e as condições que apresentam está característica, sob a interpretação da violação dos direitos fundamentais relacionados a Constituição Federal de 1988.
Por tanto, aplicou-se a método dedutivo como para composição teórica, dispondo de pesquisa documental e bibliográfica. Consultou-se não apenas o entendimento dos doutrinadores e citou-se outros dispositivos legais relevantes: direito penal, direito civil, constituição federal e projetos de lei que norteiam o assunto.
1 Os direitos fundamentais da mulher parturiente
No momento da chegada de um filho, é um período mais marcante na vida de uma mulher, ocasionando um momento especial e emotivo. Assim como sua mãe, o filho a partir do momento que nasce também terá direitos fundamentais que são garantidos a todos os indivíduos para usufruir de uma vida digna. Como podemos destacar a dignidade da pessoa humana, direito a saúde e proteção à maternidade e a infância.
A dignidade humana é um princípio básico que torna cada indivíduo parte de um todo. Delimitando uma estrutura de tratamento digno para cada pessoa, que não possibilite um tratamento degradante e assegurando condições básicas de sobrevivência.
Discorrendo sobre a violência obstétrica em relação ao princípio da dignidade da pessoa humana. É correto afirmar que há a violação dos direitos fundamentais a vida, à igualdade, às integridades físicas, morais e psíquicas quando ocorre uma violência obstétrica, devido os princípios fundamentais serem inseridos a dignidade da pessoa humana. Um exemplo prático da violência obstétrica ocorre quando há a realização de procedimentos invasivos de forma desnecessária, acarretando problemas de saúde e alguma vezes o obtido da paciente ou do bebe, são exemplos de violências físicas; quando ocorre ofensas que afetem o psicológico da parturiente, abuso sexual durante a assistência gravídica entre outros.
O Estado tem o papel de garantir os direitos fundamentais básicos para cada indivíduo, operando com autonomia, respeitando e priorizado os direitos fundamentas para que cada cidadão seja assistido adequadamente.
Não mais se concebe o direito à igualdade como tão somente o tratamento previsto em lei, mas sim que o Estado deveria atentar para as diferentes realidades sociais vividas por todos os seus cidadãos e adotar medidas de forma a garantir que estes pudessem, de fato, ter igual acesso a direitos e bens da vida. (ALMEIDA, 2017, p. 100 – 101)
Com base nisso, o Governo Federal propõe ações de prevenção e assistência à saúde de gestantes, parturientes e recém-nascidas, garantindo o acesso e a qualidade a assistência, Política Nacional de Atenção Obstétrica e Neonatal, (BRASIL, 2011).
O acesso a saúde é uma das garantias do SUS, Sistema Único de Saúde. Portanto, toda brasileira gestante tem direito a uma assistência de qualidade e humanizada, ou seja, que respeite seus direitos e necessidades (UNICEF, 2011).
1.1 Dignidade da pessoa humana
Conforme cita Paulo Gonet Branco (2014, p. 231) o direito constitucional consistente hoje é parte da afirmação dos direitos fundamentais que focam a proteção da dignidade da pessoa humana é da compreensão de que a Constituição é o meio adequado para afirmar tais normas. A Constituição é reconhecida como norma suprema do ordenamento jurídico e tem a percepção de que os valores mais importantes do ser humano devem estar resguardados em um documento jurídico com força vinculante máxima.
A dignidade é uma qualidade ou atributo fundamentada na própria origem do homem como pessoa humana, que o torna credor de igual consideração e respeito por parte de seus semelhantes. Trata-se, portanto, de um princípio do ordenamento jurídico brasileiro com previsão constitucional, além disso, é, também, um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito pátrio (BRASIL, 1988).
O indivíduo está em constante aprendizado e em relacionamento com o meio em que está inserido. Pensando nisso, o equilíbrio existente entre a convivência social e a individualidade esta pautada na dignidade de cada indivíduo.
Desse modo, Dallari (2002, p. 8) descreve:
Constitui a dignidade um valor universal, não obstante as diversidades socioculturais dos povos. A despeito de todas as suas diferenças físicas, intelectuais, psicológicas, as pessoas são detentoras de igual dignidade. Embora diferentes em sua individualidade, apresentam, pela sua humana condição, as mesmas necessidades e faculdades vitais.
Assim sendo, evidenciamos que a dignidade e um bem irrenunciável, compondo um elemento essencial ao ser humano de tal forma que não possa ser descartado. Segundo Sarlet, Ingo (2002, p. 143) descreve:
Qualidade integrante e irrenunciável da própria condição humana, pode (e deve) ser reconhecida, respeitada, promovida e protegida, não podendo, contudo, (no sentido ora empregado) ser criada, concedida ou retirada, já que existe em cada ser humano como algo que lhe é inerente.
Uma vez que, a dignidade é um bem de personalidade deve ser protegido e garantido, como um dos princípios do Estado e de Direito Democrático, sendo um elemento representativo para a interpretação e aplicação das normas jurídicas.
1.2 Direitos à saúde
Um dos elementos essenciais para a vida do ser humano é a saúde, sendo ela também um dos princípios fundamentais garantidos na Constituição Federal e pela Declaração dos Direitos Humanos.
Moreno e Vendrame (2011, p. 34) assim cita:
[...] apontam que o direito à saúde é consagrado como direito dever, em que o Estado tem o dever de prestar dignamente e eficazmente por meio de políticas públicas o acesso à saúde com qualidade, o qual assegure a dignidade humana, compreendendo a sociedade de modo universal, posto que seja uma obrigação do Estado e direito da população.
A Constituição apresenta fundamentos jurídicos que devem ser cumpridas pelo Estado e a sociedade para o desenvolvimento de ações que proporcionem à promoção, à proteção e à recuperação da saúde no país.
Entre as normas legais que protegem o direito à saúde, a Lei Federal nº 8.080 de 19 de setembro de 1990 e a Lei Federal nº 8.142, de 28 de dezembro de 1990 regulamentaram o Sistema Único de Saúde (SUS) em nível nacional.
O SUS, Sistema Único de Saúde, prevê em sua legislação que toda mulher tem direito a realização de exames de acompanhamento pré-natal, ter acompanhamento no parto com segurança e proteção a amamentação de seu filho. O conhecimento das mães em relação a estes direitos é uma arma fundamental para que este não sejam violados.
As gestantes têm direito à supervisão profissional durante a gravidez garantido pela Lei nº 9.263 de 1996. Todos os ciclos de vida, incluindo concepção e contracepção, cuidados pré-natais e nascimento, cuidados pós-natais e cuidados neonatais como atividades. Segundo orientações do Ministério da Saúde e da Agência Nacional de Medicina Complementar (ANS), o parto normal é o mais recomendado, o mais seguro e deve ser disponibilizado a todos os recursos (BRASIL, 1996).
1.3 Violência obstétrica
Considera-se como violência obstétrica toda forma de violência sofrida pela mulher antes, durante ou pós-parto. Pois neste momento, a parturiente encontra-se em um momento de extrema vulnerabilidade, no contexto de violência obstétrica, o corpo da mulher não concernir seu valor, sendo impostas práticas hostis, manobras proibidas, seja desprezando a sua vontade, sendo proferidas injurias e afins. Essas práticas podem ocorrem de várias formas, tendo um caráter vergonhoso, humilhante e traumáticos.
Nesse cenário, ela é entendida como:
[...] intervenção institucional indevida, não autorizada ou sequer informada, até mesmo abusiva, sobre o corpo ou processo reprodutivo da mulher, que violam sua autonomia, informação, liberdade de escolha e participação nas decisões sobre o seu próprio corpo. (MARIANI e NASCIMENTO, 2016, p. 51)
A mulher e seu corpo são desumanizados e objetivados, tirando sua liberdade de escolha e vontade. A violência obstétrica por ser somente acometida sobre mulheres é caracterizada como uma violência de gênero.
Identificar e entender que a mulher sofreu violência obstétrica, continua sendo uma questão complexa, pois quase sempre é perpetrada por profissionais da área da saúde que todos acreditamos ter o direito de fazer. Devido ser realizado por um profissional, o procedimento praticado é tido como necessário e a dor imposta como inevitável.
De outra forma, é necessário especificar que a violência obstétrica pode ser perpetrada por outros profissionais além de médicos. Porque, além da violência moldada pela negligencia do Estado, a violência obstétrica também pode advir de qualquer outro profissional ou pessoa envolvida com a obstetrícia. Como por exemplo, enfermeiras, técnicos de enfermagem, etc.
Segundo AGUIAR:
[...] a violência dentro dos serviços de saúde de uma forma geral é identificada a um mau atendimento que inclui: fala grosseira, negligência, abandono, ofensa moral; não ter paciência, gritar, empurrar; não dar informações ao paciente e tratá-lo com indiferença; fazer algum procedimento ou exame sem consentimento, inadequado ou desrespeitosamente; discriminação por condição social ou cor e a violência física. (AGUIAR, 2010, p. 149)
Observa-se que, a violência obstétrica se apresenta de diversas formas. É um atentado aos direitos fundamentais da parturiente e do nascituro, desacatando ao seu corpo e a vida da parturiente com utilização de procedimentos dolorosos e desnecessários. É por serem propostos por profissionais em atendimento não são questionados ou então são induzidos para que o atendimento seja mais rápido, como uma cesariana desnecessária ou invés de um parto normal humanizado.
1.4 Perspectiva histórica
A medicina obstétrica no passado era pratica por parteiras, mas com a evolução da medicina os médicos se aprimoraram para a realização de partos o que acarretou também na redução da mortalidade infantil.
Desse modo, a viabilidade da prática do controle do período gravídico puerperal por médicos, tornou o parto uma vivencia compartilhada com muitos profissionais da saúde, feita em instituições públicas ou privadas. Tirando todo o processo natura, privado e familiar do parto.(OSAVA, 2007).
É verdade que, o progresso da medicina vemavançando durante todo esse tempo. E isso, trouxe inúmeras melhorias para casos em que não há a possibilidade de um parto normal o que acarretava a mortalidade do bebê e da mãe. Mas por outro ângulo, embora os avanços na medicina trouxeram várias vantagens para a mulher, também acarretou que a mulher perdesse seu papel de figura principal e também seu controle de decisão. Tendo em conta, que os procedimentos têm se tornado gradativamente mais invasivos, muitas vezes desnecessários, privando-a a parturiente do direito de expressar sua opinião em um momento de suma importância para uma mãe.
1.5 Identificação da violência obstétrica
A violência obstétrica se manifesta de várias formas sendo elas violência física, verbal, psicológica, sexual, institucional, midiático. Sendouma das mais comuns a violência física, que segundo(CIELLO, 2012) se define por todas as ações que atentam contra a integridade física da parturiente, não possuem recomendação baseada em evidências cientificas, isto é, sem que exista indícios razoáveis para corroborar sua precisão, que lhe causam incomodo ou dor e são realizadas sem o seu consentimento
Um exemplo bem conhecido de violência obstétrica física, como descrito por (CIELLO, 2012) estão a falta de alimento, uso de fórceps, obstrução da movimentação da parturiente, uso frequente de ocitocina – hormônio que tem a função de promover contrações uterinas, a recusa na aplicação de anestesia indicada, manobra de Kristeller, cesariana sem indicação clínica e episiotomia.
Sendo estes doisúltimos a Manobra de Kristelles e episiotomia os mais comuns. A Manobra de Kristelles consiste no ato do médico, enfermeiro de pressionar a parte superior do útero que tem a intenção de ajudar na saída do bebê.
Especialistas garantem que o perigo da pratica desse método “incluem a ruptura uterina, lesão do esfíncter anal, fraturas em recém-nascidos ou dano cerebral, dentre outros” (LEAL, et al, 2014, p. 43).
A episiotomia é uma incisão na genitália feminina que pode ajudar na remoção do bebê. Este método não é um método tolerado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), como muitas vezes é realizada sem o consentimento da paciente sem anestesia, e por ser considerado como uma violência deve ser anotado no portuário médico.
Pode ser retrata que a violência obstétrica psicológica como “todo tipo de colocação verbal ou comportamental que venha causar na gestante sentimento de inferioridade, vulnerabilidade, abandono, instabilidade emocional, medo, acuação, insegurança, dissuasão, alienação, perda de integridade, dignidade e prestígio”. (Ciello et al, p. 60).
Também se caracteriza como violência obstétrica verbal ou comportamental o ato que proporcione a mulher um “ameaças, mentiras, chacotas, piadas, humilhações, grosserias, chantagens, ofensas, omissão de informações, informações prestadas em linguagem pouco acessível, desrespeito ou desconsideração de seus padrões culturais”. (2016, p. 108).
Já a violência obstétrica sexual descreve o controle da sexualidade da parturiente. Com descreve FRANCO; MACHADO:
Já a violência sexual enquanto violência obstétrica está ligada ao controle da sexualidade da mulher, através do abuso da posição de poder e confiança, utilizando-se de assédio sexual, contatos físicos forçados, insinuações ou incitações sexuais e até mutilações genitais. (FRANCO; MACHADO, 2016, p. 105).
SOUZA, (2014) define a violência obstétrica institucional da seguinte forma:
(...)A violência institucional decorre das relações sociais marcadas pelo descaso com os aspectos humanísticos do cuidado, da rigidez hierárquica nas relações dos profissionais de saúde com os pacientes/clientes, das falhas no processo de comunicação, da mecanização do cuidado, do uso inadequado da tecnologia, do não compromisso dos profissionais com o processo de cuidar.
Logo, podemos observar que inúmeras são os exemplos de violência obstétrica e muitos exemplos poder ser empregados em mais de uma característica apresentadas aqui.
2 O tratamento legal da violência obstétrica no Brasil
Ainda que seja um fato comum no Brasil a prática da violência obstétrica, ainda não existe uma tipologia para esta questão na no âmbito do direito penal e nem no âmbito de lei federal, que seja especifica e que trate da violência obstétrica no Brasil. No entanto, deve-se notar que as leis gerais são aplicadas para punir os atos lesivos contra as parturientes, pois o atentado aos direitos fundamentais deve ser entendido considerando os princípios jurídicos e as garantias do nosso ordenamento jurídico.
Assim, mesmo sem tipologia própria, a violência obstétrica ainda é um ato ilícito, negligente e é uma violência contra a integridade física da mulher, e por esse motivo prevê regras adequadas para o tratamento desta matéria. São eles: direito penal, constituição federal, direito civil, código de defesa do consumidor, decretos que regulamentam a assistência médica entre outras, sendo uma delas a lei 11.108/2005 que garante os direitos do acompanhante antes, durante e pós-parto.
Conforme mencionado anteriormente, por não haver regulamentação especifica sobre o assunto, citaremos alguns projetos de lei que correm tramitam com a intensão de resguardar o direito da parturiente. E de fato, é uma questão que reconhece a violência obstétrica e garante verdadeiramente os direitos da mulher e do bebê.
O projeto de Lei n° 7.633/2014 propõe identificar a violência obstétrica, presente no art. 13, com:
Art. 13 – Caracteriza-se a violência obstétrica como a apropriação do corpo e dos processos reprodutivos das mulheres pelos(as) profissionais de saúde, através do tratamento desumanizado, abuso da medicalização e patologização dos processos naturais, que cause a perda da autonomia e capacidade das mulheres de decidir livremente sobre seus corpos e sua sexualidade, impactando negativamente na qualidade de vida das mulheres. (BRASIL PROJETO DE LEI Nº 7.633/2014).
Observa-se que o parágrafo único da lei, igualmente identifica a violência em casos de aborto. Da mesma forma, as proposituras legislativas em discussão, apresentam como um destaque no seu art. 3°, §II, aplicação de condutas menos agressivas como um dos princípios do cuidado humanizado. Na pratica, isso é de suma importância, pois muitas vezes as mulheres passam por cesárias sem ao menos entender os motivos de tais atos.
No que diz respeito às operações cesarianas, o art. 14 da mesma lei, exemplifica a atuação de procedimentos que são considerados como violência obstétrica, como a pratica de cesarianas indevidas, desconhecendo os riscos reais do procedimento, somente por interesse médico, envolvendo opiniões desagradáveis, banalização da dor e a recusa do acompanhante (já regulamentada pela Lei n° 11.108/205).
O Projeto de Lei n° 7.867/2017 apresenta no seu art. 3° a definição de violência obstétrica,como o procedimento realizado pelo ‘‘membro da equipe de saúde, do hospital ou por terceiros, em desacordo com as normas regulamentadoras ou que ofenda verbal ou fisicamente as mulheres gestantes, parturientes ou puérperas’’.
Uma legislação que defina as práticas de violência obstétrica é de extrema necessidade na sociedade. Pois de acordo com que os tratamentos obstétricos se tornam mais humanizados, é essencial que haja uma legislação que compreenda e estabeleça os limites que violem os direitos das parturientes e do bebe.
Quando ocorre a prática de violência obstétrica o profissional ira ser responsabilizado civilmente sobre procedimentos e práticas utilizados em paciente que não estão de acordo com os parâmetros pertencentes ao código de ética de cada profissional. Sendo assim, qualquer violação de direitos da parturiente, ocasionará a violação do direito, cabendo indenização a vítima.
Pode-se notar também que o Código Penal não cita a violência obstétrica, mas é importante enunciar que este crime pode ser correspondido com outras ações já existentes no ordenamento jurídico. Que variam de lesão corporal constante no art. 129 do CP, e lesão corporal de natureza grave constante no art. 129, §1°, quando acontece a celeridade do parto.
Além dos crimes mencionados acima, também pode constituir crime de injúria constante no art. 140 do CP e quando a grávida se queixa de dor durante o parto, e escuta comentários maldosos e constrangedores, neste ato imputa-se o crime de constrangimento ilegal constante no art. 146 do CP.
Diante do exposto, observa-se que a violência obstétrica ainda é muito presente na vida de várias parturientes e acarretando um dano emocional em um momento que e tão importante e sublime na vida de uma mulher.
CONCLUSÃO
A violência obstétrica é uma violação das garantias e direitos fundamentais da mulher parturiente, uma violação de seu direito à integridade física e de tomar decisões sobre seu próprio corpo, seus direitos reprodutivos e sexuais e seu direito à livre escolha. Apesar de a Constituição Federal consagrar a autonomia e a independência da mulher em diversas instituições, a mulher ainda é vista como inferiorizada, principalmente no que diz respeito à violência sexual e doméstica, e a mulher como vítima social, revelando que o domínio masculino é enfatizado em detrimento da hiper vulnerabilidade.
A violência obstétrica é, portanto, perpetrada contra a mulher em ambiente hospitalar antes, durante ou pós-parto. São praticadas de diversas formas física, verbal, psicológica, sexual e institucional. Estes procedimentos são dolorosos, sem o consentimento da paciente, sem informação, a recusa na aplicação de anestesia quando solicitado, negligência, recusa ou impedimento da entrada do acompanhante no hospital(Lei 11.108/2005). Violência psicológica (tratamento ofensivo, discriminatório, desrespeitoso ou depreciativo com base na cor, orientação sexual, número de filhos, etc.); obstrução do contato com bebê e a mãe posterior ao parto, pratica de cesariana não consensual, entre outros.
Observa-se que, com o tempo, o parto tornou-se um processo institucionalizado, deixando de lado aquele aspecto que tinha anteriormente onde a mulher era uma peça principal, tinha autonomia e liberdade para conduzir seu parto.
Verifica-se que a violência obstétrica e uma prática comum, e por não haver nenhum dispositivo judicial ou lei federal específica que trate do assunto, há apenas projetos de lei tratando do assunto e, portanto, as discriminações aplicadas nos casos de violência obstétrica, são conseguintes as regras gerais adequadas aos casos nos âmbitos do direito civil, administrativo e penal. Que tem como objetivo de impedir e punir esses procedimentos que tanto agridem a integridade e os direitos da mulher e de seu bebê.
Portanto, a fim de evitar abusos relacionados a violência obstétrica, é necessário não só aplicação de políticas públicas de sensibilização a respeito do assunto, como a identificação da violência e orientações sobre o direito que tem a parturiente caso haja a prática de violência obstétrica. As leis em propositura visam proteger juridicamente o bem ferido, a dignidade da mulher, a violação de sua saúde, de seu corpo. Além de respaldar e regulamentar o que é a pratica de violência obstétrica e penalidades para os infratores.
REFERÊNCIAS
AGUIAR, J. M. Violência institucional em maternidades públicas: hostilidade ao invés de acolhimento como uma questão de gênero. 2010. Tese (Doutorado) - Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010.
ALMEIDA, Guilherme Assis de. Direito à igualdade e formas de discriminação contra a mulher.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. VadeMecum Saraiva. 34. ed. São Paulo: Saraiva, 2022.
BRASIL. Decreto nº 1973, de 1º de agosto de 1996. Promulga a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, concluída em Belém do Pará, em 9 de junho de 1994. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1996/d1973.htm>. Acesso em: 13 agos 2022.
BRASIL, Projeto de lei nº 7.633, de 2014. Dispõe sobre a humanização da assistência à mulher e ao neonato durante o ciclo gravídico-puerperal e dá outras providências. Disponível em: <https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=494BE22BE379353C5C7EFAC1AE2BBB16.proposicoesWeb2?codteor=1261087&filename=Avulso+-PL+7633/2014>. Acesso em: 14 out 2022.
BRASIL. Recomendações da OMS. Disponível em: <http://www.amigasdoparto .com.br/oms.html>. Acesso em: 28 maio. 2022.
CIELLO, Cariny et al. Parto do princípio. Mulheres em Rede pela Maternidade Ativa. Dossiê da Violência Obstétrica "Parirás com dor". Disponível em: <https://www.senado.gov.br/comissoes/documentos/SSCEPI/DOC%20VCM%20367.pdf>. Acesso em 28 maio. 2022
COSTA, Laís Bianchin da; CHERON, Cibele. Violência Obstétrica, Direitos Sexuais e Reprodutivos, Subjetividade Feminina, Direitos Humanos das Mulheres. In: Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress, 2017, Florianópolis. (Anais Eletrônicos), http://www.en.wwc2017.eventos.dype.com.br/resources/anais/1499483168_ARQUIVO_ArtigoLaiseCibe.pdf. Acesso em: 16 de setembro de 2022.
DALLARI, Dalmo de Abreu. Direitos Humanos e Cidadania, 2002.
FRANCO. Luciele Mariel. MACHADO. Isadora Vier. Contornos de opressão: história passada e presente das mulheres. Caxias do Sul, RS: Educs, 2016. Disponível em: https://www.ucs.br/site/midia/arquivos/ebook-contornos_2.pdf. PDF. Acesso em: 7 maio 2020
FERRAZ, Carolina Valença (Coord.). Manual dos direitos da mulher. São Paulo: Saraiva, 2017. 707p.
LEAL, M. C., Pereira, A. P., Domingues, R. M., Theme, M. M., Dias, M. A., Nakamura-Pereira, M et al. Intervenções obstétricas durante o trabalho de parto e parto em mulheres brasileiras de risco habitual. Cadernos de Saúde Pública, 30(Supl. 1), S17-S32. 2014. Disponível em <http://dx.doi. org/10.1590/0102-311X00151513>. Acesso em 05 junh de 2022.
MARIANI, Adriana; NASCIMENTO NETO, José Osório do. Violência obstétrica como violência de gênero e violência institucionalizada: breves considerações a partir dos direitos humanos e do respeito às mulheres. Cad. Esc. Dir. Rel. Int. (Unibrasil), Curitiba-PR, vol. 2, n. 25, p. 48-60, jul/dez 2016. Disponível em: https://portaldeperiodicos.unibrasil.com.br/index.php/cadernosdireito/article/view/3060/2630. Acesso em: 19de agosto de 2022.
MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 9. ed., São Paulo: Saraiva, 2014, p.271.
Ministério da Saúde. Diretrizes de Atenção à Gestante: a operação cesariana. Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (CONITEC) – Brasília, DF.2015. Disponível em < http://conitec. gov.br/images/Consultas/ Relatorios/2015/Relatorio_ PCDTCesariana_CP.pdf>. Acesso em 05 abr. 2022.
ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE. Prevenção e eliminação de abusos, desrespeito e maus-tratos durante o parto em instituições de saúde. Disponível em: <http://apps.who.int/iris/bitstream/handle/10665/134588/WHO_RHR_14.23_por.pdf;jsessionid=8DFFC71C35759CDDE9FD44BB3DC9548D?sequence=3>. Acesso em: 30 out 2022.
OSAVA, Ruth Hitomi. Assistência ao parto no Brasil: o lugar do não-médico. Departamento de saúde Materno-Infantil da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2007.
SOUZA, Karina Junqueira de. Violência institucional na atenção obstétrica: proposta de modelo preditivo para depressão pós-parto. 2014. 106 f. Dissertação (Mestrado em Saúde Coletiva) – Pós-Graduação em Saúde Coletiva, Universidade de Brasília, Brasília, 2014.
MORENO, Jamile Coelho; VENDRAME, Alan. Saúde como direito fundamental: Uma perspectiva da evolução constitucional e histórica das políticas públicas. In Siqueira, Dirceu Pereira; LEÃO JÚNIOR, Teófilo Marcelo de Arêa. Direitos Sociais: uma abordagem quanto à (in) efetivadade desses direitos – a Constituição de 1988 e suas previsões sociais. Birigui: Boreal Editora, 2011.
SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituição Federal de 1988. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2002.
UNICEF, Fundo das Nações Unidas para a Infância. Guia dos Direitos da Gestante e do Bebê. São Paulo: Globo, 2011.
Graduanda no curso de Direito pelo Centro Universitário Faculdade Metropolitana de Manaus - FAMETRO
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SOUZA, Vanda Ramos de. Análise da violência obstétrica como elemento de violação dos direitos fundamentais da parturiente Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 12 dez 2022, 04:08. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/60530/anlise-da-violncia-obsttrica-como-elemento-de-violao-dos-direitos-fundamentais-da-parturiente. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: LUIZ ANTONIO DE SOUZA SARAIVA
Por: Thiago Filipe Consolação
Por: Michel Lima Sleiman Amud
Por: Helena Vaz de Figueiredo
Precisa estar logado para fazer comentários.