É princípio básico de direito que cabe ao autor provar suas alegações (actori incumbit probatio). No processo penal a acusação é feita pelo Ministério Público, que tem a iniciativa e o domínio da ação penal. Ao acusador incumbe, portanto, provar a alegação, demonstrando, acima de qualquer dúvida, a culpa do acusado, como prevê o art. 156 do CPP.
Isso não impede que o juiz determine diligências para esclarecer ponto relevante, porquanto ele é o destinatário da prova, ou seja, deve formar seu convencimento para bem julgar a causa (art. 156, II, do CPP).
Ao réu basta negar, ou permanecer em silêncio, sem que isso possa redundar em prejuízo à sua defesa, como garante o art. 5º, Inciso LXIII, da Constituição.
Em geral são admissíveis todo o tipo de provas, porém deverão ser produzidas de forma lícita, sob o crivo do contraditório (art. 155 do CPP), salvo as pré-constituídas e não repetíveis.
São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais, como dispõe o art. 157 do CPP.
A norma decorre do art. 5º, Incisos LV e LVI, da Constituição, que assegura o devido processo legal, o contraditório, a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes, e impede as provas obtidas por meios ilícitos.
O sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, é garantido pela Constituição e sua violação, além de constituir crime, impede o uso de prova assim obtida, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer, para fins de investigação criminal ou instrução processual penal.
A obtenção ilícita da prova impede sua utilização em juízo, sendo, também, inadmissíveis as provas derivadas, ou seja, obtidas a partir da primeira, a teor do art. 157, § 1º, do CPP.
A Teoria dos frutos da árvore envenenada surgiu no direito norte-americano. Ali estabelecido que toda prova produzida em consequência de uma descoberta obtida por meio ilícito, como uma busca ilegal, estará contaminada pela ilicitude, considerada ilícita por derivação.
Segundo a regra do art. 5º, XI, Da Constituição, a casa é o asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial. O ingresso pela autoridade, sem mandado judicial, portanto, salvo nos casos excepcionados, contamina de ilicitude qualquer apreensão.
O Código de Manu (Índia, séc. XIII a.C.), já estabelecia que "não se adentrará uma vila ou uma casa, exceto pelo portão...". (Art. 73, Cap. IV), assim como também o Código de Hamurabi (Babilônia, 2.500 a.C.), trazia normas que visavam manter a intimidade. Até mesmo o Velho Testamento traz um alerta contra a intromissão indesejada no lar alheio:
"Põe raramente o teu pé em casa do teu próximo, para que ele não se enfade de ti, e te aborreça". (Provérbios, 25:17).
A evolução da humanidade levou a uma preocupação cada vez maior com a preservação da intimidade. Hoje, as Constituições da maioria dos países garante o direito à privacidade e protege esse direito.
A ação persecutória do Estado, para revestir-se de legitimidade, não pode apoiar-se em elementos probatórios ilicitamente obtidos. Qualquer prova cuja obtenção, pelo Poder Público, derive de transgressão à ordem constitucional, deve ser repelida, mesmo que cause perplexidade, por exemplo, a invasão ilegal e injustificada de uma residência e a surpreendente apreensão de droga ilícita.
Ninguém pode ser condenado com base em provas ilícitas, seja por ilicitude originária ou por derivação. Isso significa que qualquer prova, produzida posteriormente de modo válido, não pode ter fundamento causal, nem derivar de prova obtida ilicitamente, como a apreensão de drogas em busca ilícita e a interceptação telefônica não autorizada.
A ilicitude por derivação, como "frutos da árvore envenenada", afasta sua utilização, mesmo produzidos, validamente, em momento posterior, pois afetados pelo vício da ilicitude originária.
A proibição de utilizar a prova ilícita pode ser encontrada no Direito Italiano, art. 191, 1, do CPP, e de Portugal, onde a Constituição (1976), em seu art. 32, proíbe expressamente todas as provas obtidas mediante tortura, coação grave, ofensa da integridade física ou moral da pessoa, abusiva intromissão na vida privada, no domicílio, na correspondência ou nas telecomunicações.
“A absoluta invalidade da prova ilícita infirma-lhe, de modo radical, a eficácia demonstrativa dos fatos e eventos cuja realidade material ela pretende evidenciar... A prova ilícita é prova inidônea. Mais do que isso, prova ilícita é prova imprestável...” (Ministro Celso de Mello - AÇÃO PENAL N. 307-3 - DISTRITO FEDERAL).
"A inadmissibilidade processual da prova ilícita torna-se absoluta, sempre que a ilicitude consista na violação de uma norma constitucional, em prejuízo das partes ou de terceiros” (Ada Pellegrini Grinover (Liberdades públicas e processo penal, 2. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1982, p. 151 e 166)
Segundo o Supremo Tribunal Federal alemão – BGH (Bundesgerichtshof) –, "no Estado de Direito existem limites intransponíveis à busca da verdade processual: não é nenhum princípio da ordenação processual que a verdade tenha de ser investigada a todo preço; o objetivo de esclarecimento e punição dos crimes é, seguramente, do mais elevado significado; mas ele não pode representar sempre, nem sob todas as circunstâncias, o interesse prevalente do Estado”.
Foi o abuso do Estado, violando a privacidade do cidadão, que levou a Justiça Americana à construção do princípio “fruits of the poisonous tree”. Declarar inválidas as provas obtidas a partir da prova ilícita, porquanto restaram também contaminadas, por serem fruto da árvore venenosa.
Mesmo que algumas decisões judiciais possam surpreender ao leigo, ao desconsiderar provas evidentes de crimes, não se pode tergiversar com princípios constitucionais elementares dos direitos e garantias individuais.
A inviolabilidade do domicilio, o sigilo da correspondência e das comunicações; a liberdade individual e de informação; o direito ao silêncio e contra a autoincriminação; a presunção de inocência e o tempo razoável do processo e da prisão, são princípios que urge relembrar nos conturbados tempos que estamos vivendo em que, sem existência de denúncia pelo titular da ação penal, prende-se sem prazo limite, confisca-se e suprime-se a liberdade de opinião e de informação.
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