Uma questão de extrema importância para a estabilidade das instituições é a forma de investidura nos Tribunais. O leigo imagina que os Tribunais são compostos de juízes e deles esperam profundo conhecimento da matéria, especialmente, que seja feita justiça.
Quem militou mais de cinquenta anos na área jurídica, como Juiz, como professor e como advogado, sabe que as coisas são mais complexas do que se imagina.
Em primeiro lugar o direito não é uma ciência exata. Muitas pessoas esperam que o juiz simplesmente aplique a lei. Quem vai julgar, no entanto, deve inteirar-se da verdade, no caso concreto, e tentar interpretar e aplicar uma lei às vezes centenária. O nosso Código Comercial tem 170 anos, o Código Civil, quase CEM ANOS e o Código Penal 80 anos.
Ao interpretar e aplicar a lei o julgador não consegue impedir de influenciar-se por sua formação jurídica, étnica, religiosa, filosófica, familiar, etc. Sua decisão será melhor aceita, ou repudiada, na medida em que esteja sintonizada, ou não, com o pensamento da sociedade. Não faz muito nosso Código Penal previa como crime a sedução e o adultério. Imagina um juiz criado nas areias de Copacabana vir julgar um caso numa pequena cidade do interior do Rio Grande do Sul de rígidas regras sociais.
Os juízes são submetidos a difíceis concursos públicos e tem avaliados, não só seus conhecimentos jurídicos, mas é submetido a severas provas psicológicas, analisados especialmente seu equilíbrio, vocação e capacidade de decidir.
Iniciam sua carreira como juízes substitutos e atuam em comarcas menores, progredindo para comarcas intermediárias e finais, adquirindo experiência como julgadores, culminando com seu acesso aos Tribunais Estaduais.
Mesmo nestes há formas de investidura que, mesmo justificadas com ricos argumentos, sofrem alguma restrição. Um quinto das vagas é reservada ao Ministério Púbico e à classe dos advogados, ou seja, após longa carreira como acusador, o Promotor passa a atuar como Juiz. Já o experiente advogado, habituado a olhar e defender o lado de seu cliente, passa a atuar como julgador. Muitas vezes o nomeado não consegue atuar na área em que tem conhecimento e experiência e se submete a atuar em outra Câmara do Tribunal, de competência diversa, com evidente dificuldade.
O mesmo ocorre nos tribunais superiores, onde as indicações exigem apoio de grupos políticos ou econômicos. É óbvio que nem sempre chegam os melhores e mais preparados. Muitos não conseguem se desvincular completamente de suas bancas de advocacia, onde ficam filhos, esposa e associados que continuam advogando perante o Tribunal. Alguns, completado o tempo mínimo na nova função, retornam à sua banca, aposentados com a soma do tempo da advocacia.
A indicação ao Supremo Tribunal Federal gera a pior composição, pois de indicação meramente política, bastando ter reputação ilibada e notório saber jurídico. A sabatina e aprovação pelo Senado Federal gera uma aparente segurança ao sistema de indicação, mas não há na história recente caso de não aprovação.
A investidura vitalícia, e a elevação da idade de aposentadoria compulsória para 75 anos, levaram o STF a ter uma composição ideológica muito definida, por indicação de juristas simpáticos, e às vezes até atuantes, de uma facção política.
A história recente mostra que não há como evitar que tais comprometimentos influenciem nas decisões da Corte, que não está submetida a controle algum, salvo o dos senadores, muitos com problemas pessoais de malfeitos submetidos ao mesmo Tribunal.
Quando iniciei minha carreira como juiz, em 1975, ouvi de meu, pai, que era oficial de justiça, que o Juiz tinha muito poder, mas que nunca deveria usar todo o poder que tem. Uma hora dessas poderia ter que usar mesmo... e descobrir que já não tinha mais.
O poder do Juiz é tão grande, e difícil de neutralizar, que o descontrole de uma pessoa despreparada, e deslumbrada por seu próprio poder, pode gerar grande prejuízo à democracia e até o descrédito do Judiciário.
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