FERNANDO QUEIROZ POLETTO[1]
(orientador).
RESUMO: Com o aumento do adoecimento psicológico das pessoas, muitas vezes decorrente do desempenho de sua atividade laboral, os trabalhadores as vezes precisam se ausentar de seus postos de trabalho, necessitando, nos casos mais graves, de afastamento por longos períodos. Nesse contexto, a Depressão se apresenta como uma das doenças comuns na sociedade brasileira, cujas causas podem sofrer influências laborais. Marcada pelo desânimo e tristeza profunda do indivíduo, entre tantos outros sintomas, é uma doença que afeta significativamente o trabalho, levando à ausência no posto, causando prejuízos materiais e morais para os envolvidos na relação laboral. Por tal motivo, esta pesquisa analisa a depressão como doença ocupacional segundo os critérios estabelecidos na legislação trabalhista em vigor. O método adotado consiste na realização de pesquisa bibliográfica, realizada em materiais obtidos por meio gratuito e oneroso, posicionamentos doutrinários e jurisprudenciais, com resultados apresentados na forma textual, partindo de premissa genérica acerca das doenças ocupacionais admitidas no ordenamento jurídico brasileiro, para concluir especificamente sobre a possibilidade de a depressão ser assim considerada, com destaque para a exposição dos efeitos decorrentes dessa caracterização como doença laboral, principalmente a estabilidade provisória que impede a demissão sem justa causa do empregado pelo período de um ano.
Palavras-chave: Depressão. Doença Ocupacional. Caracterização. Efeitos. Estabilidade.
ABSTRACT: With the increase in people's psychological illness, often resulting from the performance of their work activity, workers sometimes need to be absent from their jobs, requiring, in the most serious cases, leave for long periods. In this context, Depression is one of the common illnesses in Brazilian society, whose causes may be influenced by work. Marked by the individual's discouragement and deep sadness, among many other symptoms, it is a disease that significantly affects work, leading to absence from work, causing material and moral damage to those involved in the employment relationship. For this reason, this research analyzes depression as an occupational disease according to the criteria established in the current labor legislation. The method adopted consists of carrying out a bibliographical research, carried out on materials obtained free of charge and at a cost, doctrinal and jurisprudential positions, with results presented in textual form, starting from a generic premise about the occupational diseases admitted in the Brazilian legal system, to conclude specifically on the possibility of depression being thus considered, highlighting the exposition of the effects resulting from this characterization as an occupational disease, mainly the provisional stability that prevents the dismissal without just cause of the employee for a period of one year.
Keywords: Depression. Occupational disease. Description. Effects. Stability.
Sumário: Introdução. Material e Métodos. 1. A Saúde do Trabalhador: o direito ao meio ambiente laboral saudável. 2. As Doenças Ocupacionais e do Trabalho. 3. A Depressão como Doença Ocupacional. 3.1. Diagnóstico e Sintomas da Depressão. 3.2. A caracterização da depressão ocupacional. 4. Efeitos da Depressão Ocupacional: afastamento laboral e estabilidade provisória do trabalhador. Considerações Finais. Referências.
INTRODUÇÃO
A regulamentação constitucional e infraconstitucional da proteção dos trabalhadores, principalmente com a garantia de proteção à sua saúde em ambientes laborais, é resultado da evolução constante da sociedade, cabendo aos operadores do direito realizar o acompanhamento das mudanças sociais a fim de que a aplicação das leis se mantenha eficaz diante dos casos concretos apresentados ao Poder Judiciário.
Certo é que, dentre as demandas laborais em destaque na atualidade, o crescimento dos diagnósticos de trabalhadores ocasiona uma preocupação quanto ao desenvolvimento do trabalho de forma saudável.
Isto porque, apesar de haver o ideal de cumprimento integral da jornada de trabalho contratada, infelizmente, muitas doenças levam à incapacidade do empregado, seja temporária ou definitiva, parcial ou total, levando às faltas laborais.
É direito do trabalhador justificar a ausência com a apresentação de atestado médico comprovando a sua patologia. Ocorre que, as doenças, que não se limitam às questões de ordem física, mas também são psíquicas, com consequências reais na vida do empregado muitas vezes se originam em razão do próprio labor.
Neste contexto, é inegável o aumento dos diagnósticos da doença de Depressão na sociedade. Decorrente de várias situações anteriores e questões pessoais, o trabalho desempenhado pode ser fator determinante para o diagnóstico do trabalhador, especialmente quando as condições laborais levam a situações que desencadeiam a ocorrência dos sintomas, etc.
Diante de tais situações, é crescente o entendimento de que a Depressão, assim como várias outras, pode ser considerada uma doença laboral, o que surte efeitos não apenas para o trabalhador, mas também para o seu empregador, que pode vir a ser responsabilizado em caso de uma dispensa indevida, por exemplo.
No Brasil, para proteger o empregado das dispensas ilegais do trabalho, a legislação brasileira prevê a responsabilidade do empregador pela doença ocupacional, surgida ou agravada em razão do trabalho desempenhado.
Nesse contexto, considerando que a depressão tem como consequência real a incapacidade do trabalhador em executar suas atividades diárias, é importante analisar a possibilidade de ser ela considerada uma doença ocupacional. Dado a relevância do assunto e a sua atualidade, esse tema é o objeto desta pesquisa científica.
MATERIAIS E MÉTODOS
Elaborada na cidade de Gurupi-TO, a pesquisa desenvolvida no primeiro semestre de 2023, tem como alvo de estudo a população trabalhadora diagnosticada com depressão.
Se classifica como bibliográfica porque resulta da consulta a livros jurídicos, dissertações e artigos científicos publicados no Brasil, cuja escolha se atribui à necessidade de compreender o que determina a legislação trabalhista sobre as doenças ocupacionais.
Em relação aos objetivos, a classificação da pesquisa é exploratória porque consiste no aprofundamento do tema que cerca a depressão de trabalhadores, com exposição não apenas de determinações legais, mas principalmente de entendimentos doutrinários e jurisprudenciais.
Os dados e informações coletados na bibliografia selecionada foram selecionados mediante a implantação de técnicas de análise qualitativa do texto (análise de conteúdo, análise do discurso, confrontamento de informações), em razão de se tratar matéria com controvérsia na doutrina e jurisprudência pátria, principalmente sobre a caracterização do nexo causal.
Qualificada como revisão de literatura, os resultados obtidos são apresentados na forma textual e no decorrer da presente pesquisa científica.
1 A SAÚDE DO TRABALHADOR: O DIREITO AO MEIO AMBIENTE LABORAL SAUDÁVEL
Está certo no ordenamento jurídico que todo indivíduo é dotado de direitos fundamentais que não podem ser violados, nem mesmo em prol do recebimento de uma remuneração. Com isso, diz a legislação que o empregado tem direito a preservação de sua saúde e integridade física no seu ambiente de trabalho.
Diz a Constituição de 1988, artigo 7º, inciso XXII, que é direito do trabalhador a “redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança” (BRASIL, 1988). A partir dessa norma, tem-se que o empregador tem o dever de proporcionar condições de trabalho saudável e livre de riscos à integridade do trabalhador.
Tais garantias são efeitos do direito ao meio ambiente laboral saudável, que, nas palavras de Sidney Machado, “compreende-se como meio ambiente de trabalho o conjunto das condições internas e externas do local de trabalho e sua relação com a saúde dos trabalhadores.” (2001, p. 66)
Em outras palavras, leciona Leila Maria de Souza Jardim, apontando o motivo de ser indispensável a tutela jurídica sobre o meio ambiente laboral:
O meio ambiente laboral é o lugar onde as pessoas passam uma parcela considerável de suas vidas. Os efeitos das atividades desenvolvidas transcende a esfera de trabalho atingindo diretamente as demais áreas de convivência e à qualidade de sua vida enquanto laboradores.
Desse modo, torna-se imprescindível voltar o olhar para a importância de ser-lhe dada tutela jurídica, a fim garantir condições mínimas de dignidade para o bom desempenho do trabalho, devendo ser desenvolvido de forma hígida e salubre, visando à incolumidade física e psíquica daquele que labora (JARDIM, 2015, p. 01).
Ante a previsão legal e opinião doutrinária, entende-se que a saúde do trabalhador não deve ser ignorada pelo empregador, aqui compreendidos não apenas os aspectos físicos do empregado, mas também a sua condição psíquica, sob pena de por vir a ser responsabilizado se comprovado a negligência do contratante.
A jurisprudência do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região, é pacífica quanto ao dever do empregador em contribuir para a saúde mental dos trabalhadores:
AMBIENTE SAUDÁVEL DE TRABALHO. DEVER DO EMPREGADOR – “MEIO AMBIENTE DO TRABALHO. SAÚDE MENTAL. DEVER DO EMPREGADOR. É dever do empregador e do tomador de serviços zelar por um ambiente de trabalho saudável também do ponto de vista da saúde, coibindo práticas tendentes ou aptas a gerar danos de natureza moral ou emocional aos seus trabalhadores, passíveis de indenização” (Enunciado nº 39, da 1ª Jornada de Direito material e Processual na Justiça do Trabalho, 2007). ASSÉDIO MORAL. CONFIGURAÇÃO. INDENIZAÇÃO. No que interessa ao Direito do Trabalho, define-se o assédio moral – ou mobbing – como atitude abusiva, de índole psicológica, que ofende repetidamente a dignidade psóquica do indíviduo, com o intento de eliminá-lo do ambiente laboral ou de diminuí-lo. O dano moral em si – a dor e abalo moral – não é passível de prova. Uma vez provado o fato ensejador do dano moral e a culpa do agente, resta configurada a obrigação de indenizar. Recurso da reclamada parcialmente conhecido e desprovido. (Tribunal Regional do Travalho da 10ª Região TRT-10 – Recurso Ordinário Trabalhista: RO XXXXX-04.2015.5.10.0811 DF – 1ª Turma/2016 Recurso ordinário 1009).
Assim, o meio ambiente do laboral saudável não se resume ao trabalho,uma vez que assegura a saúde e a segurança do trabalhador no ambiente em que exerce sua função, impactando também a vida dos familiares do indivíduo e a sociedade (FONSECA e ROBERTI, 2016).
Considerando o direito em questão, prevendo situações em que o empregado seja acometido por uma doença decorrente do trabalho desempenhado, existe previsão legal das doenças ocupacionais e os seus efeitos no contrato de trabalho.
2 AS DOENÇAS OCUPACIONAIS E DO TRABALHO
Dentre os temas de maior relevância atual no direito do trabalho encontram-se as doenças ocupacionais, posto que, segundo estudo de Jéssica da Silva Fonseca e Eduardo Torres Roberti (2016), o Brasil encontra-se entre os países de maiores índices de doenças ocupacionais, com o número de vítimas de acidente ou doença decorrente do trabalho crescendo a cada ano.
No dia a dia laboral, é possível que o empregado não consiga desempenhar suas atividades em razão de encontrar-se com sua saúde abalada. O motivo da incapacidade pode ser diverso, seja por questão pessoal, caso fortuito ou força maior, etc. Nessas situações, a suspensão do trabalho pode ocorrer, restando o dano ao empregador e ao empregado.
Ocorre que, diante do dever patronal de fornecimento de meio ambiente saudável, havendo culpa do patrão, o trabalhador não pode ser prejudicado. Para saber se a enfermidade pode ensejar a responsabilização do empregador, é preciso compreender se se trata de uma doença caracterizada como ocupacional.
As doenças ocupacionais são aquelas que foram adquiridas ou provocadas, direta ou indiretamente, pelo exercício da atividade profissional. Ou seja, elas surgem por meio das ações que o trabalhador desempenha todos os dias ou podem ser causadas de forma indireta pelas condições que uma pessoa executa o seu trabalho (BARROS, 2020, p.1).
Para além da conceituação doutrinária, a definição legal de doença ocupacional está contida na Lei n°. 8.213, de 24 de julho de 1991, que em seu artigo 20, a insere dentre as espécies de acidente de trabalho:
Art. 20. Consideram-se acidente do trabalho, nos termos do artigo anterior, as seguintes entidades mórbidas:
I - doença profissional, assim entendida a produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade e constante da respectiva relação elaborada pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social;
II - doença do trabalho, assim entendida a adquirida ou desencadeada em função de condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relacione diretamente, constante da relação mencionada no inciso I.
§ 1º Não são consideradas como doença do trabalho:
c) a que não produza incapacidade laborativa;
d) a doença endêmica adquirida por segurado habitante de região em que ela se desenvolva, salvo comprovação de que é resultante de exposição ou contato direto determinado pela natureza do trabalho.
§ 2º Em caso excepcional, constatando-se que a doença não incluída na relação prevista nos incisos I e II deste artigo resultou das condições especiais em que o trabalho é executado e com ele se relaciona diretamente, a Previdência Social deve considerá-la acidente do trabalho (BRASIL, 1991).
Conforme se observa dos incisos I e II do artigo transcrito, as doenças ocupacionais podem se dar de vários tipos, não apenas fisicamente, mas também afetam a saúde psicológica do trabalhador. Neste sentido, os abalos morais acabam por desencadear o adoecimento do empregado.
Situações como a alta demanda de trabalho, muita pressão psicológica, o assédio sofrido internamente, as agressões verbais e o medo de perder o trabalho provocam um esgotamento mental que prejudica a saúde do trabalhador e leva ao afastamento. (BARROS, 2020, p. 1).
Deste modo, tendo em vista os acontecimentos recentes, aqui compreendidas as notícias recorrentes de adoecimento mental de trabalhadores, comprovado mediante o aumento da depressão, de agora em diante, se analisa a possibilidade de caracterização desta patologia como uma doença ocupacional.
3 A DEPRESSÃO COMO DOENÇA OCUPACIONAL
Com o crescimento das doenças psicológicas, agravadas pelos problemas que a convivência em ambiente de trabalho pode causar aos envolvidos, várias doenças passaram a ser reconhecidas como doenças laborais, gerando a responsabilização do empregador pelos danos causados aos trabalhadores.
Neste ponto, com o aumento dos diagnósticos de depressão, agravados pela sujeição do trabalhador a situações de estresse extremo, assédio no local de trabalho, cobranças excessivas e demais situações que podem aumentar o sofrimento do indivíduo, questiona-se se a depressão pode ou não ser considerada uma doença ocupacional.
Antes de adentrar no centro desta pesquisa, é relevante analisar o diagnóstico e os sintomas da depressão.
3.1 DIAGNÓSTICO E SINTOMAS DA DEPRESSÃO
Consubstanciada no sofrimento individual, a depressão é uma doença que merece ser analisada não apenas sob a ótica da medicina, mas também segundo a legislação. Contudo, importa caracterizar essa patologia, registrada no CID (Classificação Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde).
A depressão, por possuir várias diferenciações diante do caso concreto, atualmente está presente no CID 10 – F33, sendo assim definida por especialistas:
Depressão (CID 10 – F33) é uma doença psiquiátrica crônica e recorrente que produz uma alteração do humor caracterizada por uma tristeza profunda, sem fim, associada a sentimentos de dor, amargura, desencanto, desesperança, baixa autoestima e culpa, assim como a distúrbios do sono e do apetite. (VARELLA BRUNA, 2023, p. 01)
O Doutor Nikolas Keine afirma que “a Depressão é uma doença psiquiátrica extremamente séria que afeta muitas pessoas no Brasil e no mundo. Pode desencadear sintomas leves, moderados e graves que afetam tanto o psicológico, quanto o físico” (2023, p. 01).
Trata-se de doença cujos principais sintomas estão presentes os seguintes: tristeza; choro fácil; perda de interesse por coisas que gostava; distúrbios no sono; Alterações no apetite; pensamentos de ruína, sem esperança de melhora; entre outros (KEINE, 2023).
Tratam-se de sintomas que poderiam ser confundidos com a tristeza transitória, que pode acometer os indivíduos em várias situações de seu cotidiano, entretanto, existe diferenciação entre tais situações.
É importante distinguir a tristeza patológica daquela transitória provocada por acontecimentos difíceis e desagradáveis, mas que são inerentes à vida de todas as pessoas, como a morte de um ente querido, a perda de emprego, os desencontros amorosos, os desentendimentos familiares, as dificuldades econômicas etc.
Diante das adversidades, as pessoas sem a doença sofrem, ficam tristes, mas encontram uma forma de superá-las. Nos quadros de depressão, a tristeza não dá tréguas, mesmo que não haja uma causa aparente. O humor permanece deprimido praticamente o tempo todo, por dias e dias seguidos. Desaparece o interesse pelas atividades que antes davam satisfação e prazer e a pessoa não tem perspectiva de que algo possa ser feito para que seu quadro melhore (VARELLA BRUNA, 2023, p. 01).
De acordo com o Instituto Pro Vida, “o diagnóstico da depressão é clínico e somente pode ser dado por um médico especialista, no caso o psiquiatra, que é responsável por tratar pessoas com transtornos mentais. ” (PRO VIDA, 2019, p. 01).
Ao compartilhar informações prestadas pelo Governo Federal, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal também aponta o tratamento utilizado em combate à depressão:
O tratamento da depressão é essencialmente medicamentoso. Existem mais de 30 antidepressivos disponíveis. Ao contrário do que alguns temem, essas medicações não são como drogas, que deixam a pessoa eufórica e provocam vício.
A terapia é simples e, de modo geral, não incapacita ou entorpece o paciente. Alguns pacientes precisam de tratamento de manutenção ou preventivo, que pode levar anos ou a vida inteira, para evitar o aparecimento de novos episódios.
A psicoterapia auxilia na reestruturação psicológica do indivíduo, além de aumentar sua compreensão sobre o processo de depressão e na resolução de conflitos, o que diminui o impacto provocado pelo estresse.
A depressão não tem tempo para passar. Pode durar dias, semanas, meses ou anos (PRO VIDA, 2019, p. 01).
Feitas as considerações gerais sobre a doença, a pesquisa passa a análise da depressão sob a ótica do ambiente de trabalho, haja vista a existência recorrente de sua caracterização como doença ocupacional.
3.2 A CARACTERIZAÇÃO DA DEPRESSÃO OCUPACIONAL
Considerada pela Organização Mundial de Saúde como a “doença do século” (PRO VIDA, 2019), não são poucas as situações em que o trabalhador necessita se ausentar do seu ambiente de trabalho.
Dentre as doenças psicossociais, a depressão tem se tornado comum dentre as pessoas, especialmente no ambiente de trabalho, tendo sido reconhecida recentemente como uma doença laboral pela Organização Mundial de Saúde (OMS).
Em relatório apresentado em 2017, a Organização Mundial de Saúde (OMS) classificou a depressão como uma das maiores causas de incapacidade para o trabalho do mundo. Categorizada como a doença do século, o transtorno depressivo afeta mais de 5% da população brasileira, sendo a segunda maior causa de afastamento do trabalho no Brasil.
Embora o transtorno depressivo possa ser desencadeado por diversos fatores concomitantes, há casos em que o exercício do labor se demonstra como causa determinante para o desenvolvimento ou agravamento da doença, configurando-a como doença ocupacional (FIGUEIREDO JULIO, 2021, p. 1).
No ambiente laboral, indica-se a tomada de providencias por parte dos empregadores para impedir o surgimento dessa doença no decorrer do contrato de trabalho.
A depressão, uma das mais graves doenças psicossociais, já foi até vista como o mal do século — apesar de existir há centenas de anos — é considerada um problema de saúde pública. Para preveni-la, algumas medidas devem ser observadas com atenção:
· alinhamento das expectativas do trabalho. Muitos trabalhadores se sentem pressionados com metas inalcançáveis, por isso, é importante alinhar à realidade da entrega com condições de trabalho favoráveis e o volume de demandas;
· programas de repressão à violência verbal, psicológica e ao assédio, tanto entre líderes e colaboradores, quando entre os colegas de trabalho;
· promoção de um clima organizacional saudável;
· controle da jornada dos trabalhadores para que não haja sobrecarga;
· apoio psicológico para profissionais que lidam diretamente com situações de estresse, como atendentes de telemarketing e policiais, e com o sofrimento de terceiros, como assistentes sociais e profissionais da saúde (BARROS, 2020, p. 1).
O motivo da orientação patronal advém do fato de que pode ser responsabilizado pelos abalos à saúde do trabalhador, ante ao direito de ingressar judicialmente em busca da caracterização de adoecimento do trabalhador.
Na jurisprudência, apesar de ser considerada uma espécie de doença ocupacional, são raras as situações em que o trabalhador consegue comprovar o nexo causal necessário à responsabilização do empregador:
RECURSO ORDINÁRIO. DEPRESSÃO. DOENÇA OCUPACIONAL. NÃO CONFIGURADA. DANOS MORAIS. INEXISTENTES. Sendo insuficientes as provas nos autos para demonstrar que o transtorno psiquiátrico surgiu na vigência do contrato de trabalho e teve como origem o estresse causado no meio ambiente do trabalho, tem-se por inexistente o nexo causal e, por consequência, ausente o direito à indenização por danos morais. Recurso ordinário do autor a que se nega provimento. RECURSO ORDINÁRIO DO ESTADO DE PERNAMBUCO. CONDENAÇÃO SOLIDÁRIA. Comprovado o ato ilícito perpetrado, a culpa da tomadora de serviços e da prestadora contratada, impõe-se a responsabilização solidária dos reclamados, nos termos do artigo 942 do Código Civil, pelos danos morais sofridos pelo ex-empregado. (TRT-6. Processo: ROT – XXXXX-52.2017.5.06.0002, Redator: Mayard de Franca Saboya Albuquerque, Data de julgamento: 10/10/2019, Quarta Turma, Data da assinatura: 10/10/2019.)
Apesar da dificuldade apontada, na prática, apesar de excepcional, a concausa foi reconhecida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 24ª região, caracterizando como ocupacional a depressão de uma trabalhadora:
DEPRESSÃO. CONCAUSA. DOENÇA OCUPACIONAL. 1. A empresa, após vários afastamentos da autora (licença maternidade e auxílio doença), por represália, alterou sua função, sem proceder ao prévio e necessário treinamento adequadamente. 2. Por conta do desconhecimento dos procedimentos de suas atividades, a autora cometia desacertos, passando a sofrer cobranças da empresa, bem como constrangimentos. 3. Como consequência, houve agravamento do distúrbio psicológico da autora, depressão, evidenciando concausa. 4. Recurso a que se nega provimento, no particular, por unanimidade. (TRT-24 – Tribunal Regional do Trabalho da 24ª Região: XXXXX20105240006. Primeira Turma. Relator: Amaury Rodrigues Pinto Júnior).
O mesmo entendimento foi adotado pelo Tribunal do Trabalho da 3ª Região, em relação ao nexo concausal:
DOENÇA OCUPACIONAL. DEPRESSÃO. OCORRÊNCIA DE CONCAUSA. A concausa é outra causa que, não sendo a principal, concorre para a eclosão ou agravamento da doença. Assim, ainda que o quadro patológico do trabalhador seja de natureza psíquica, não relacionada diretamente ao ambiente de trabalho, se é possível que este, de alguma forma, tenha contribuído para a eclosão ou agravamento da patologia, está configurada a doença ocupacional ou o acidente de trabalho (art. 21 da Lei nº 8.213/91). Vale dizer, é suficiente para a concausa a mera possibilidade de a doença que acometeu o trabalhador ter sido agravada em razão de suas atividades laborativas. (TRT-3 - RO: 00107296920185030156 MG 0010729-69.2018.5.03.0156, Relator: Ana Maria Amorim Reboucas, Data de Julgamento: 18/12/2019, Oitava Turma, Data de Publicação: 21/01/2020.)
Com o aumento das situações de depressão ocupacional, surge para o empregador uma consequência jurídica de muita relevância. O maior efeito da caracterização das hipóteses da Lei nº 8.213/ 1991, a seguir apresentado.
4 EFEITOS DA DEPRESSÃO OCUPACIONAL: AFASTAMENTO LABORAL E ESTABILIDADE PROVISÓRIA DO TRABALHADOR
Em todas as situações de adoecimento no ambiente de trabalho, uma vez constatada a doença laboral, surge para o trabalhador o direito à estabilidade provisória prevista no artigo 118 da já mencionada Lei n°. 8.213, de 24 de julho de 1991, in verbis:
Art. 118. O segurado que sofreu acidente do trabalho tem garantida, pelo prazo mínimo de doze meses, a manutenção do seu contrato de trabalho na empresa, após a cessação do auxílio-doença acidentário, independentemente de percepção de auxílio-acidente.
Parágrafo único. O segurado reabilitado poderá ter remuneração menor do que a da época do acidente, desde que compensada pelo valor do auxílio-acidente, referido no § 1º do art. 86 desta lei (BRASIL, 1991).
Comentando o artigo acima, o Tribunal Superior do Trabalho emitiu a Súmula 378 que dá maiores informações acerca da estabilidade do trabalhador acometido por doença laboral, com a disposição dos pressupostos para a sua concessão:
Súmula nº 378 do TST
ESTABILIDADE PROVISÓRIA. ACIDENTE DO TRABALHO. ART. 118 DA LEI Nº 8.213/1991. (inserido item III) - Res. 185/2012, DEJT divulgado em 25, 26 e 27.09.2012
- É constitucional o artigo 118 da Lei nº 8.213/1991 que assegura o direito à estabilidade provisória por período de 12 meses após a cessação do auxílio-doença ao empregado acidentado. (ex-OJ nº 105 da SBDI-1 - inserida em 01.10.1997)
- São pressupostos para a concessão da estabilidade o afastamento superior a 15 dias e a conseqüente percepção do auxílio-doença acidentário, salvo se constatada, após a despedida, doença profissional que guarde relação de causalidade com a execução do contrato de emprego. (primeira parte - ex-OJ nº 230 da SBDI-1 - inserida em 20.06.2001)
– O empregado submetido a contrato de trabalho por tempo determinado goza da garantia provisória de emprego decorrente de acidente de trabalho prevista no n no art. 118 da Lei nº 8.213/91 (TST, 2012).
Na jurisprudência, a estabilidade em razão de doenças ocupacionais é majoritariamente concedida, conforme o exemplo do Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região:
RECURSO ORDINÁRIO DAS RECLAMADAS. DOENÇA OCUPACIONAL. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. CONFIGURADA. Comprovada doença ocupacional, é inequívoco o direito à estabilidade provisória, nos termos do art. 118 da Lei 8.213/91. Recurso ordinário a que se nega provimento, no tema. (TRT6- Processo: ROT – XXXXX-16.2019.5.06.0016, Redator: Ana Claudia Petruccelli de Lima, Data de julgamento: 23/09/2021, Quarta Turma, Data da assinatura: 23/09/2021)
Especificamente em casos de depressão, comprovado o direito à reintegração, são mais comuns as indenizações substitutivas do período, o que se atribui aos sentimentos que o labor causa na pessoa, sendo viável para a sua saúde a manutenção do afastamento, mas com os direitos laborais assegurados em todo o período de estabilidade.
Um exemplo dessa hipótese se identificou na jurisprudência do Tribunal do Trabalho da 4ª Região:
DOENÇA OCUPACIONAL. DEPRESSÃO. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. REINTEGRAÇÃO. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. O reclamante tem predisposição para depressão e o tipo de atividade que passou a realizar em determinado momento do contrato - exumação de cadáveres - atuou como fator desencadeante para a depressão reconhecida, que foi acompanhada de alucinações auditivas e visuais; pensamento mágico com conteúdo delirante (paranoide); insônia e solilóquios. Há uma concausa para o doença diagnosticada. O retorno ao trabalho é desaconselhável pelos episódios clínicos desencadeados e porque a predisposição para a depressão é inerente ao reclamante. Recurso do reclamante parcialmente provido.(TRT-4 - ROT: 00204323020135040331, Data de Julgamento: 23/10/2014, 1ª Turma)
Diante do apresentado, observadas as dificuldades para a sua caracterização, é direito do trabalhador acometido por depressão ocupacional (mesmo que concausal), a manutenção do seu contrato de trabalho pelo período de 12 meses após a cessação do auxílio-doença.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O alto índice de depressão tem causado preocupação em todos os setores da sociedade, não mais apenas pela comunidade médica, mas em toda a coletividade diariamente atingida pelo diagnóstico de um familiar ou até mesmo de um colega de trabalho.
O convívio diário com um indivíduo depressivo leva à constatação da gravidade da doença e também da necessidade de proporcionar a todos os cidadãos um ambiente saudável não apenas para o corpo, mas principalmente para a mente, dado à seriedade que as patologias psicológicas apresentam.
Quando o assunto é o local de trabalho, vigora para o empregador o dever de proporcionar um meio ambiente saudável para todos aqueles que prestam seus serviços, inclusive incentivando o bom convívio, podendo vir a ser responsabilizado se comprovado que o trabalhador foi vítima de uma doença ocupacional.
Após inúmeros questionamentos sobre a depressão, já existe entendimento sedimentado de que essa pode ser sim considerada uma doença ocupacional, com reconhecimento da Organização Mundial de Saúde, bastando para o trabalhador o dever de comprovar o nexo causal existente no caso concreto. Isso porque a doença somente assume essa característica se demonstrado que o labor ocasionou o seu surgimento ou agravamento.
Por isso, justamente por causa dos efeitos que a doença ocupacional causa nos contratos de trabalho, é que a caracterização da depressão como patologia decorrente das condições laborais é matéria que deve ser objeto da atenção não apenas dos estudantes, mas também de todos aqueles envolvidos no Poder Judiciário.
A matéria tem avançado nos Tribunais, mas ainda diverge entre juristas, o que exige do indivíduo a prova do seu direito para que este seja assegurado, tal qual em inúmeras outras situações. Para isso, a Justiça do Trabalho se apresenta como o meio mais viável de acesso aos direitos fundamentais do trabalhador.
REFERENCIAS
BARROS, Leonardo. Doenças ocupacionais: o que são e como evitá-las. Blog Tangerino, 9 de julho de 2020. Disponível em: <https://tangerino.com.br/blog/doencas-ocupacionais/>. Acesso em 23 set. 2022.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em 21 set. 2022.
BRASIL. Lei nº 8.213, de 24 de Julho de 1991. Dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8213cons.htm>. Acesso em 24 set. 2022.
BRASIL. TRT-3. Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região. - RO: 00107296920185030156 MG 0010729-69.2018.5.03.0156, Relator: Ana Maria Amorim Reboucas, Data de Julgamento: 18/12/2019, Oitava Turma, Data de Publicação: 21/01/2020. Disponível em: <https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/trt-3/1146070711>. Acesso em 20 mar. 2023.
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Bacharelando em Direito pela Universidade de Gurupi – UnirG .
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PAZ, LEANDRO ALVES DA. A caracterização da depressão como doença ocupacional Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 01 maio 2023, 04:53. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/61368/a-caracterizao-da-depresso-como-doena-ocupacional. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Maurício Sousa da Silva
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Por: DESIREE EVANGELISTA DA SILVA
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