ELOISA DA SILVA COSTA[1]
(orientadora).
RESUMO: A eutanásia é um termo utilizado para descrever o ato de provocar ou acelerar a morte de um indivíduo que esteja sofrendo de uma doença terminal ou incurável, com o objetivo de aliviar seu sofrimento. O principal objetivo deste artigo é estudar, apresentar e instigar ao leitor, uma reflexão acerca da eutanásia, tema de extrema importância no mundo jurídico, onde existe um evidente confronto entre o direito à vida e a liberdade de escolha de um indivíduo, em situações de morte. Quando o assunto é eutanásia, dois dos principais direitos fundamentais previstos na Constituição Federal de 1988, quais sejam: a vida e a liberdade entram em confronto direto, por essa razão, o estudo do tema é de grande valia. No Brasil, a eutanásia é um crime previsto em lei como assassinato. O artigo abordará as divergências acerca do instituto da Eutanásia, estabelecendo sua conexão com os direitos fundamentais, abordará resumidamente o histórico do instituto da Eutanásia, além de abordar sobre como é atualmente sua aplicação em outros países. O estudo foi realizado através de pesquisa bibliográfica, por meio da análise de livros, doutrinas, artigos científicos atualizados sobre o tema.
Palavras-chave: Eutanásia. Direito à vida. Direito à liberdade. Morte digna.
ABSTRACT: Euthanasia is a term used to describe the act of causing or accelerating the death of an individual who is suffering from a terminal or incurable disease, with the aim of alleviating their suffering. The main objective of this article is to study, present and instigate the reader to reflect on euthanasia, a topic of extreme importance in the legal world, where there is an evident confrontation between the right to life and the freedom of choice of an individual, in situations of death. When the subject is euthanasia, two of the main fundamental rights provided for in the Federal Constitution of 1988, which are: life and freedom come into direct confrontation, for this reason, the study of the subject is of great value. In Brazil, euthanasia is a crime provided for by law as murder. The article will address the divergences about the Euthanasia institute, establishing its connection with fundamental rights, will briefly address the history of the Euthanasia institute, in addition to addressing how its application is currently in other countries. The study was carried out through bibliographical research, through the analysis of books, doctrines, updated scientific articles on the subject.
Keywords: Euthanasia. Right to life. Right to freedom. Dignified death.
SUMÁRIO: INTRODUÇÃO; 1. CONCEITO DE EUTANÁSIA; 1.1 TIPOS DE EUTANÁSIA; 2. EUTANÁSIA NO BRASIL; 3. DO DIREITO A VIDA; 4. DO DIREITO A LIBERDADE; 5. EUTANÁSIA NO DIREITO COMPARADO; CONCLUSÃO; REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.
INTRODUÇÃO
A eutanásia é a conduta na qual um indivíduo em estado terminal, ou portador de enfermidade incurável que esteja em sofrimento constante, escolhe cessar sua própria vida, por meio de uma morte rápida e sem dor (OLIVEIRA, 2017).
A vida humana é objeto do direito assegurado no artigo 5°, caput, da Constituição Federal, integra-se de elementos materiais (físicos e psíquicos) e imateriais (espirituais). A vida é intimidade conosco mesmo, saber-se e dar-se conta de si mesmo. Por isso é que ela constitui a fonte primária de todos os outros bens jurídicos (SILVA, 2007).
A eutanásia traz discordâncias entre o direito à vida e o direito à liberdade de escolha, onde a preservação da vida, entra em detrimento de princípios constitucionais como a autonomia de vontade e a dignidade da pessoa humana. O dilema existente entre tomar a decisão de morrer com dignidade ou continuar vivendo, mesmo que de maneira desumana, é de extrema relevância jurídica para que o legislador possa criar e elaborar leis acerca do tema.
O principal objetivo desse artigo é entender e esclarecer as divergências desse tema, tendo em vista tratar-se do bem jurídico mais valioso existente ao ser humano, a própria vida. Como metodologia, tem-se pesquisas doutrinas pertinentes ao tema, além das normas constitucionais existentes.
A legislação penal tem o intuito de punir as formas de interrupções da vida, embora tenha a exceção do instituto da legítima defesa, onde tirar a vida de outra pessoa para salvar a si próprio é considerado válido. Por essas razões, entende-se que há controvérsias acerca do tema onde englobam conflitos de interesses e valores e não apenas sob um ponto de vista jurídico.
De um lado tem- se o dilema de tomar a decisão de morrer com dignidade abreviando um sofrimento que o indivíduo está submetido e do outro lado a escolha de continuar vivendo, mesmo que de maneira desumana, encontrando
esse, tutela integral no ordenamento jurídico, pois a vida, é considerada irrenunciável, não podendo existir interferência humana.
Este artigo além de trazer análise jurídica sobre o tema, tem por finalidade demonstrar como o instituto se apresenta, haja vista que está intimamente ligado ao direito à vida.
A ausência de legislação específica limita a aplicação da Eutanásia no Brasil, assim, evita que pacientes que se encontram em estado terminal escolham uma morte digna sem sofrimento.
No ordenamento jurídico brasileiro, como é impossível a aplicação da Eutanásia, esse instituto sofre limitação, prevalecendo o direito a vida acima do princípio da dignidade da pessoa humana.
A eutanásia é um tema polêmico e controverso em muitos países, levantando questões éticas, legais e religiosas. Enquanto alguns argumentam que a eutanásia é uma escolha pessoal e um direito fundamental do paciente, outros argumentam que ela viola os princípios éticos da medicina e da vida humana. A eutanásia é legal em alguns países, como Bélgica, Holanda e Suíça, mas é proibida em muitos outros.
Na pesquisa em questão o direito à vida entra em conflito com o direito da dignidade da pessoa humana, onde no instituto da Eutanásia, os dois entram em conflito e tem-se que analisa-los em conjunto pois esse instituto trata como ponto de partida uma morte digna, através da escolha do paciente, conforme seus princípios e valores, e mantendo sua dignidade respeitada.
1 CONCEITO DE EUTANÁSIA
A prática da eutanásia remonta a tempos antigos e é encontrada em várias culturas e sociedades ao longo da história, mas a palavra "eutanasia" foi criada pelo filósofo Francis Bacon no século XVII. A palavra vem do grego "eu", que significa "bom", e "thanatos", que significa "morte". No entanto, a prática da eutanásia remonta a tempos antigos, com exemplos registrados em várias culturas e sociedades, incluindo a Grécia Antiga e a Roma.
Na Grécia Antiga, por exemplo, a eutanásia era vista como uma forma honrosa de morrer, especialmente para aqueles que sofriam de doenças incuráveis. Os espartanos, por exemplo, praticavam a eutanásia em bebês que eram considerados fracos ou doentes demais para sobreviver.
Na Idade Média, a eutanásia era vista como um pecado pela Igreja Católica, que a considerava uma violação do sexto mandamento, "Não matarás". No entanto, a eutanásia continuou a ser praticada em segredo, especialmente em casos de doenças incuráveis e dor insuportável.
Com o surgimento da medicina moderna, a discussão sobre a eutanásia tornou-se mais intensa. Nos tempos modernos, o debate sobre a eutanásia se intensificou no final do século XIX e início do século XX, quando a medicina começou a avançar e as técnicas de cuidados paliativos ainda não eram tão desenvolvidas. Desde então, a discussão sobre a eutanásia tem sido objeto de intenso debate e discussão em todo o mundo, com pontos de vista variados e muitas questões éticas, morais e legais em jogo.
A eutanásia é a ação de encerrar deliberadamente a vida de uma pessoa que está sofrendo de uma doença incurável ou em estado terminal, a fim de aliviar o sofrimento.
Para Prado e Bittencourt (1995), eutanásia é tão somente a morte boa, piedosa e humanitária, que, por pena e compaixão, se proporciona a quem, doente e incurável, prefere mil vezes morrer, e logo, a viver garroteado pelo sofrimento, pela incerteza e pelo desespero.
De acordo com Sá e Naves (2009, p.302):
A eutanásia, propriamente dita, é a promoção do óbito. É a conduta, por meio da ação ou omissão do médico, que emprega, ou omite, meio eficiente para produzir a morte em paciente incurável e em estado de grave sofrimento, diferente do curso natural, abreviando-lhe a vida.
Eutanásia também significa “morte fácil e sem dor”, “morte boa e honrosa”, “alivio da dor” (MAGALHÃES, 2014).
A Eutanásia se difere do suicídio assistido, que se refere a prática em que uma pessoa que deseja morrer recebe ajuda de outra pessoa, geralmente um profissional de saúde, para cometer o ato suicida. O suicídio assistido é diferente da eutanásia, pois a pessoa que deseja morrer é a responsável por realizar a ação final que resulta em sua morte. No suicídio assistido, a outra pessoa, geralmente um médico, fornece a assistência necessária, como prescrever medicamentos letais, para ajudar a pessoa a realizar o ato de suicídio.
O que diferencia a eutanásia do suicídio assistido é quem realiza o ato, no caso da eutanásia o pedido é feito para que alguém execute a ação que vai levar à morte; no suicídio assistido é o próprio paciente que realiza o ato, embora necessite de ajuda para realiza- -lo, e nisto difere do suicídio, em que esta ajuda não é solicitada. (KOVÁCS, 2003, p. 196).
Existem dois tipos de eutanásia: a eutanásia passiva e a ativa, que serão abordadas no tópico seguinte.
1.1 Tipos de eutanásia
A Eutanásia ativa envolve a administração de uma substância letal com o objetivo de provocar a morte do paciente. Geralmente é realizada por um médico ou outro profissional de saúde.
A Eutanásia passiva envolve a retirada ou não administração de tratamentos médicos ou medidas de suporte que mantêm o paciente vivo. Isso pode incluir a interrupção da alimentação e hidratação artificiais, bem como a retirada de aparelhos de suporte vital.
De acordo com Pablo Jiménez Serrano (2021, p. 196):
Eutanásia ativa, (ou por comissão) é aquela que se pratica através de atos que ajudam o doente a morrer, buscando com isso aliviar ou eliminar seu sofrimento. Eutanásia passiva (ou por omissão), que consistente na abstenção deliberada da prestação de tratamentos médicos ordinários ou proporcionados – úteis – que poderiam prolongar a vida do paciente e cuja ausência antecipa a morte.
A eutanásia passiva é um tipo de eutanásia que ocorre quando um paciente em estado terminal ou com uma doença incurável é retirado dos cuidados médicos ou terapêuticos que mantêm sua vida, com o objetivo de permitir que a morte ocorra naturalmente. Diferentemente da eutanásia ativa, onde uma intervenção médica é realizada para provocar a morte do paciente, na eutanásia passiva, a morte ocorre naturalmente devido à interrupção dos cuidados médicos.
2 EUTANÁSIA NO BRASIL
Atualmente a eutanásia é considerada ilegal no Brasil. O Código Penal brasileiro proíbe a prática de qualquer forma de eutanásia, tanto a ativa quanto a passiva, podendo resultar em penalidades para aqueles que a praticarem.
No entanto, há discussões sobre a possibilidade de legalização da eutanásia em certas circunstâncias, como em casos de doenças incuráveis, sofrimento extremo e consentimento informado do paciente. Essas discussões têm ganhado destaque no Brasil e em outros países, e há movimentos que defendem a legalização da eutanásia como um direito do paciente.
No momento, a prática da eutanásia no Brasil é ilegal e pode resultar em penalidades para os envolvidos. A prática é proibida por ser considerada uma violação dos princípios éticos, morais e legais que regem a sociedade e a profissão médica.
O Código Penal (BRASIL, 1940) em seu artigo 121, define o crime de homicídio, que é punível com pena de prisão de seis a vinte anos. Mas no caso de eutanásia aplica-se o conceito de homicídio privilegiado motivado por relevante valor social ou violenta emoção, com base no § 1º do artigo 121, denominado de homicídio piedoso; quando houver dolo, a conduta incide sob o § 2º, por antecipar a morte intencionalmente.
O suicídio assistido enquadra-se no Artigo 122 do Código Penal que trata do induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio de alguém .
Além disso, o Conselho Federal de Medicina (CFM) brasileiro, por meio da Resolução nº 1.805/2006, também proíbe a prática da eutanásia pelos médicos, considerando-a uma violação dos princípios éticos da profissão médica, que devem priorizar a preservação da vida e a promoção da saúde.
Segundo BARROSO; MARTEL (2010, p. 38):
A morte é uma fatalidade, não uma escolha. Por essa razão, é difícil sustentar a existência de um direito de morrer. Contudo, a Medicina e a tecnologia contemporâneas são capazes de transformar o processo de morrer em uma jornada mais longa e sofrida do que o necessário, em uma luta contra a natureza e o ciclo natural da vida. Nessa hora, o indivíduo deve poder exercer sua autonomia para que a morte chegue na hora certa, sem sofrimentos inúteis e degradantes. Toda pessoa tem direito a uma morte digna.
Entretanto, o Conselho Federal de Medicina permite no artigo 41, § único do Código de Ética Médica que os médicos interrompam os tratamentos de pacientes em estado terminal ou com doenças incuráveis, desde que isso seja feito de forma responsável e respeitando o direito do paciente à informação e à autonomia.
Assim, a eutanásia passiva não é considerada crime no Brasil, desde que seja respeitado o direito do paciente de ser informado sobre seu estado de saúde e de tomar decisões em relação aos cuidados médicos.
Além disso, existe ainda a ortotanásia, que se refere ao processo de permitir que uma pessoa morra naturalmente, sem intervenção médica agressiva ou medidas artificiais para prolongar sua vida, quando ela está em fase terminal de uma doença incurável ou em estado de sofrimento intenso e irreversível.
Ao contrário da eutanásia, que envolve ação ativa para pôr fim à vida de uma pessoa, a ortotanásia se concentra em permitir que a morte ocorra naturalmente, sem obstáculos ou intervenções desnecessárias.
A ortotanásia é muitas vezes considerada uma forma mais humana e compassiva de lidar com a morte, permitindo que uma pessoa morra com dignidade e sem sofrimento desnecessário.
Segundo Menezes, Selli e Alves (2009), na ortotanásia, é a doença de base que causa a morte, enquanto na eutanásia passiva, a doença não é fatal ou ainda não alcançou o estágio terminal da vida. Enquanto a eutanásia passiva busca encurtar a vida do paciente, a ortotanásia permite que a morte ocorra naturalmente, sem interferência médica.
3 DO DIREITO A VIDA
O direito à vida é um dos princípios fundamentais dos direitos humanos, garantido pela maioria das constituições e tratados internacionais de direitos humanos. Esse direito é universal, inalienável e inviolável, e garante a todos os indivíduos o direito de viver e ter acesso às condições necessárias para uma vida digna.
Está previsto no artigo 5 da Constituição Federal de 1988:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(...)
O direito à vida inclui a proteção contra a violência, a discriminação, a exploração e o abuso, bem como o acesso à alimentação, saúde, educação, moradia e outras necessidades básicas para uma vida saudável e plena. Ele também protege a vida antes do nascimento.
O direito à vida não é absoluto e pode sofrer limitações em certas circunstâncias, como em casos de legítima defesa, pena de morte ou guerra. A discussão sobre a eutanásia e o direito de escolha do paciente tem levantado questões sobre a extensão do direito à vida e a possibilidade de escolher quando terminá-la, o que gera controvérsias sobre a ética e a moralidade da prática. Como o Estado tem o dever de garantir o direito à vida, ele também proíbe a morte provocada, como na eutanásia.
De maneira geral, o direito à vida é um princípio fundamental e universal que deve ser protegido e garantido a todos os indivíduos, independentemente de sua raça, gênero, orientação sexual, religião ou origem socioeconômica. Ademais, o direito à vida é amparado por outras leis brasileiras, como o Código Penal, que criminaliza o homicídio e outras formas de violência contra a vida humana. O direito à vida também é contemplado em outras leis e políticas públicas relacionadas à saúde, segurança e assistência social, que visam garantir as condições necessárias para que as pessoas possam viver com dignidade.
4 DO DIREITO A LIBERDADE
A liberdade é um dos pilares fundamentais do Estado democrático de direito no Brasil, assegurado pela Constituição Federal de 1988.
O artigo 5º da Constituição garante diversos direitos relacionados à liberdade individual, tais como a livre manifestação do pensamento, a liberdade de expressão, a liberdade de associação e de reunião pacífica, entre outros. Esses direitos são essenciais para a proteção da dignidade humana, permitindo que os indivíduos exerçam suas escolhas e desenvolvam suas personalidades sem a interferência arbitrária do Estado ou de outros indivíduos.
A liberdade também está relacionada à garantia da igualdade, uma vez que todos os indivíduos devem ter as mesmas oportunidades de exercerem suas escolhas e alcançarem seus objetivos, sem discriminação de qualquer espécie.
A liberdade individual é um direito fundamental protegido por diversos tratados internacionais e constituições, sendo considerada um dos pilares da democracia e da sociedade liberal. É vista como fundamental para o desenvolvimento da personalidade e da cidadania de cada indivíduo, englobando diversos aspectos como a liberdade de expressão, de consciência, de religião, de associação e de reunião. Ademais, inclui ainda o direito de cada indivíduo de tomar suas próprias decisões e de agir de acordo com suas próprias crenças e valores, desde que essas ações não prejudiquem os direitos e a segurança de outras pessoas (BODART, 2022).
Apesar de ser um dos princípios fundamentais do Estado democrático de direito, o direito à liberdade pode entrar em conflito com outros valores em questões relacionadas à eutanásia, como a vida e a dignidade humana. Embora a liberdade individual seja um direito importante, o debate sobre a eutanásia deve levar em consideração a complexidade da questão e a necessidade de proteger outros valores fundamentais, como a vida e a dignidade humana.
Como a eutanásia é um assunto que envolve questões éticas, morais e legais. Os defensores da eutanásia argumentam que a decisão de morrer com dignidade é uma questão de liberdade individual, e que a proibição da eutanásia viola o direito à autonomia e à privacidade.
Por outro lado, os oponentes da eutanásia argumentam que a vida humana é sagrada e que a prática da eutanásia é contrária aos valores fundamentais da sociedade. Eles argumentam que a eutanásia pode ser mal utilizada e que pode levar a abusos, especialmente em relação a pessoas vulneráveis, como os idosos e os doentes mentais.
Apesar das diferentes perspectivas em relação à eutanásia, é importante considerar que a decisão de morrer é uma escolha pessoal e que o direito à liberdade é um valor fundamental em uma sociedade democrática. No entanto, é preciso ponderar os diferentes valores envolvidos no debate e buscar soluções que respeitem tanto a liberdade individual quanto a dignidade humana.
O princípio da dignidade da pessoa humana está presente na Constituição Federal de 1988 e é um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito, sendo invocado em várias decisões judiciais e políticas públicas. O princípio reconhece a importância intrínseca e inalienável de cada ser humano.
Esse princípio é baseado na ideia de que cada pessoa é um ser humano único e valioso, e que deve ser tratada com respeito, igualdade e dignidade em todas as situações. Isso inclui o direito à liberdade, à integridade física e psicológica, à privacidade, à educação, à saúde e a um julgamento justo, entre outros.
Apesar de o direito à liberdade ser um dos princípios fundamentais do Estado democrático de direito e garantir a autonomia individual, em casos envolvendo a eutanásia, pode haver conflitos com outros valores, como a vida e a dignidade humana. Nesse sentido, a liberdade individual não é um direito absoluto e pode ser limitada pelo Estado ou pela lei em situações em que as ações de um indivíduo possam prejudicar a segurança ou os direitos de outros.
Por exemplo, o Estado pode restringir a liberdade de expressão em casos em que essa expressão incite à violência ou à discriminação. Da mesma forma, o Estado pode limitar a liberdade de escolha em casos de eutanásia, quando se trata da vida e da morte de uma pessoa, a fim de proteger os interesses da sociedade e dos indivíduos envolvidos.
No entanto, é importante ressaltar que as limitações à liberdade individual devem ser estritamente necessárias e proporcionais ao objetivo a ser alcançado, de modo que não ocorra uma violação indevida desse direito fundamental. As restrições à liberdade individual devem sempre ser analisadas caso a caso, de forma justa e equilibrada, levando em consideração as circunstâncias específicas envolvidas e os direitos e interesses das partes envolvidas.
5 EUTANÁSIA NO DIREITO COMPARADO
A eutanásia é permitida legalmente em alguns países ao redor do mundo. Entre eles, destaca-se a Holanda, que foi o primeiro país europeu a permitir tanto a eutanásia quanto o suicídio assistido, desde 2002. De acordo com Duarte (2022), para que a prática seja legal, é necessário que a pessoa esteja sofrendo de uma doença incurável, esteja passando por um sofrimento insuportável e não tenha perspectivas de melhora. Além disso, a eutanásia pode ser realizada a partir dos 12 anos de idade, desde que haja o consentimento dos pais.
Segundo Duarte (2022), na Bélgica, a eutanásia foi descriminalizada em todas as suas formas em 2002, sem distinção entre abreviar a vida por meio de uma terceira pessoa, suicídio assistido ou permitir que o paciente morra.
Em 2020, a Espanha sansionou uma lei que permite tanto a eutanásia como o suicídio assistido por um médico. Neste caso, o paciente toma a dose prescrita de medicamentos para morrer (DUARTE, 2022).
De acordo com Sambado (2020), a Austrália legalizou a eutanásia para pacientes terminais em 2019.
Já na Suíça, não há uma legislação específica sobre a eutanásia, mas o Código Penal suíço prevê pena de prisão ou multa para quem provocar a morte de outra pessoa, a seu pedido genuíno ou insistente, por motivos atendíveis, como compaixão pela vítima. No entanto, a eutanásia passiva é aceita, por meio da interrupção de medicamentos, assim como a eutanásia indireta, em que a morte não é buscada intencionalmente, mas sim aceita como consequência indireta da administração de morfina (SAMBADO, 2020).
Assim como na Suíça, na Alemanha, o Código Penal prevê a eutanásia ativa como crime próprio, punindo-o com pena de prisão de seis meses a cinco anos, mas, a eutanásia passiva é permitida (SAMBADO, 2020).
É importante observar que a legislação e as regras em torno da eutanásia variam em cada país ou estado que a permitem. Em geral, a eutanásia só é permitida em circunstâncias específicas e com o consentimento informado e voluntário do paciente. Existem também procedimentos rigorosos que devem ser seguidos pelos profissionais de saúde que realizam a eutanásia, para garantir que ela seja realizada de forma ética e legal.
Portanto, como visto, a prática da Eutanásia é permitida em vários países. No entanto, cada legislação apresenta suas particularidades em relação à sua aplicação, a fim de garantir que não haja violação do direito do indivíduo que opta pela abreviação de sua vida.
CONCLUSÃO
A eutanásia é um tema complexo e controverso que envolve a decisão de encerrar a vida de uma pessoa que está sofrendo de uma doença incurável ou em estado terminal.
Como abordado neste artigo, existem dois tipos de eutanásia, a ativa que envolve a administração de uma substância para encerrar a vida da pessoa, e a passiva, que envolve a retirada de tratamentos que mantêm a pessoa viva.
Há muitos pontos de vista em relação à eutanásia, alguns defendem que ela é um direito humano básico para aqueles que sofrem muito e estão em estado terminal, enquanto outros argumentam que é contra os princípios éticos e morais da sociedade.
Os debates em torno da eutanásia levantam questões importantes sobre a autonomia individual, o direito à vida, a dignidade humana e a responsabilidade da sociedade para com aqueles que estão sofrendo.
De um lado, algumas pessoas defendem que a eutanásia é um direito já que a liberdade individual e o direito à autodeterminação devem permitir que uma pessoa tome a decisão de interromper o próprio sofrimento e escolher o momento de sua morte. Nessa perspectiva, a eutanásia é vista como uma forma de garantir a dignidade humana, evitar o sofrimento desnecessário e respeitar a autonomia do indivíduo.
Por outro lado, há quem argumente que a eutanásia viola o direito à vida e à proteção da pessoa humana, que são valores fundamentais e universais. Alguns defendem que a vida humana é um bem sagrado que deve ser protegido e que a eutanásia pode abrir caminho para abusos e pressões sobre pessoas vulneráveis, além de colocar em risco a integridade do sistema de saúde e dos profissionais que o compõem.
É importante ressaltar que a eutanásia é ilegal no Brasil, já que é considerada como uma violação dos direitos humanos.
Um dos primeiros países a adotarem a prática da Eutanásia no ordenamento jurídico foi a Holanda, e posteriormente, a Bélgica também permitiu a aplicação do instituto da Eutanásia. Portanto, vale destacar que o interessado deve apresentar documentos e laudos que possam comprovar doença incurável ou em fase terminal (DINIZ; SERAFIM, 2017).
Conforme tratado neste artigo, o sistema normativo penal brasileiro não tem uma legislação específica sobre eutanásia. Mas, diante da ausência de legislação, a eutanásia pode ser enquadrada como auxílio ao suicídio, homicídio praticado por motivo piedoso ou até mesmo como omissão de socorro dependendo de cada caso concreto.
A decisão de realizar a eutanásia deveria ser cuidadosamente considerada e discutida entre o paciente, sua família e seus profissionais de saúde e não decidida por meio de legislação. A questão da eutanásia envolve a ponderação de valores e princípios em conflito, e não há uma resposta única ou fácil.
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[1] (Possui pós-graduação em Direito (Ciências Criminais) pela LFG - Anhanguera Uniderp concluso em 2013. Lecionou em curso de extensão na Universidade Camilo Castelo Branco - Campus Fernandópolis,, em 2006. Foi Escrivã da Polícia Civil por 20 anos. Desde 2018 é Escrevente Técnico Judiciário na comarca de Fernandópolis/SP. Coordenadora do Maná Cursos e Apostilas. Professora na Universidade Unibrasil nas matérias de Processo Penal, Empresarial e Direitos Humanos. Cursa pós-graduação em Direito Constitucional e Processo Civil
Empresarial.
bacharelanda no curso de Direito da Universidade Brasil - Campus Fernandópolis.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PORTO, Camilla Tainara Valeiro. Eutanásia: direito à vida ou a liberdade individual? Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 23 maio 2023, 04:37. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/61505/eutansia-direito-vida-ou-a-liberdade-individual. Acesso em: 23 dez 2024.
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