ARIANE DE CARVALHO PORTELA VATANBE
(orientadora)
RESUMO: O Direito de família, até chegar na sua atual forma, passou por várias mudanças em suas regras, princípios e no mundo jurídico. Este trabalho tem como objetivo analisar a evolução histórica e legislativa da família desde os primórdios até a contemporaneidade, analisando as mudanças que teve principalmente em suas características das diferentes épocas. Através de uma pesquisa bibliográfica e documental, foram pesquisados artigos e legislações que tratassem dessa problemática. Foi possível identificar que a principal mudança nas famílias foi a transformação drástica no princípio da família, onde deixou de ser um núcleo econômico e de reprodução para ser transformado em espaço de afeto, amor e laços emocionais. Porém, com todas as transformações já ocorridas, não há indícios de que tais mudanças possam retroagir, tendo, ainda, a possibilidade de surgimento de novas configurações. Assim, foi notado que o direito brasileiro necessita se manter em constante atualização como forma de atender as demandas provenientes das novas configurações familiares.
Palavras-chave: Família; Evolução; Afetividade.
ABSTRACT: Family Law, until it reached its current form, underwent several changes in its rules, principles and in the legal world. This work aims to analyze the historical and legislative evolution of the family from the beginning to the present, analyzing the changes that it had mainly in its characteristics of the different times. Through a bibliographical and documentary research, articles and legislation that deal with this problem were researched. It was possible to identify that the main change in families was the drastic transformation in the beginning of the family, where it ceased to be an economic and reproduction nucleus to be transformed into a space of affection, love and emotional bonds. However, with all the transformations that have already occurred, there are no indications that such changes can retroact, with the possibility of the emergence of new configurations. Thus, it was noted that Brazilian law needs to remain constantly updated as a way to meet the demands arising from new family configurations.
Keywords: Family; Evolution; Affectivity
1.INTRODUÇÃO
Direito de família é o conjunto de regras e princípios que disciplinam os direitos pessoais e patrimoniais decorrentes das relações de parentesco. Neste sentido, família é uma realidade sociológica e constitui a base do Estado, conforme está disposto no artigo 226 da Constituição Federal, “família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado”. Em qualquer aspecto em que é considerada, aparece a família como uma instituição necessária e sagrada, que merece a proteção do Estado.
Há uma diferença relevante no propósito do casamento entre o Século XX e XXI, incluindo a mudança do Código Civil de 1916 para o de 2002. Entre elas, encontram-se a diversidade dos sexos no casamento; a preservação da união para que não houvesse dissolução; desigualdade entre o homem e mulher na relação; e a proteção dos bens conquistados, para que pudessem deixar para os filhos.
Dentre tantas transformações, houve as novas possibilidades de formação familiar, onde ultrapassa os limites da constituição através do matrimônio ou laços consanguíneos para solidificar, também, diante a construção de laços afetivos entre seus membros.
Com essas novas formas de formação familiar, é importante que o meio jurídico se complemente e considere novas formas de compreender o direito de família, com novas jurisprudências no intuito de assistir as novas demandas e mudanças na legislação brasileira, pois, não há nenhum indício de que tais mudanças possam retroagir, tendo ainda a possibilidade de surgimento de novas configurações.
A metodologia utilizada na elaboração deste estudo constituiu em um levantamento bibliográfico e documental como estratégia de cumprimento dos objetivos propostos, considerando a necessidade de confronto de ideias, convergentes ou divergentes, de forma a comentar as legislações em vigência no país acerca da temática.
2.DIREITO DE FAMÍLIA A LUZ DO CÓDIGO CIVIL DE 1916
No Século XX, para o Código Civil de 1916, o Direito era essencialmente severo e conservador quanto à necessidade da preservação do núcleo familiar e a única forma de se constituir família era através do casamento. O propósito do casamento era para procriar e assim perpetuar a espécie, bem como acumular patrimônio e ter com quem deixá-lo após a morte. O matrimônio servia para regularizar as relações sexuais clandestinas e imorais que era considerado o tabu da época.
A família na época, possuía características próprias, por exemplo, era matrimonializada, tendo que ser essencialmente heterossexual pois a diversidade de sexos era considerada fundamental ao casamento. Indissolúvel, pois partiam do princípio “o que Deus uniu, ninguém separa”. Unicamente patriarcal, o que gerava submissão absoluta dos membros da família à chefia do pater; hierarquizada entre os próprios membros e basicamente patrimonialista.
Outra característica marcante é que os filhos eram considerados legítimos (gerados dentro do casamento), legitimados (filhos naturais que, apenas em situações específicas, poderiam ser reconhecidos pelo próprio pai ou mãe) e ilegítimos ou naturais (nascem de pessoas não ligadas pelo matrimônio).
A mulher vivia na situação de extrema desigualdade em relação ao homem. A mulher casada era relativamente incapaz, devia ser assistida pelo marido. Ocorreu, desde a emancipação financeira da mulher, ocasionada pela sua inserção no mercado de trabalho, diversas e constantes modificações históricas e sociais, como no arranjo tradicional de família, com o homem como único provedor e a mulher como dona de casa, deixou de ser predominante; e com isso, o direito também sofreu mudanças.
3.PRINCÍPIOS QUE REGEM O CÓDIGO CIVIL DE 2002
A doutrina brasileira, após a promulgação da Constituição Federal de 1988 e também do Código Civil de 2002, tem entendido que o Direito de Família é regido por alguns princípios, são eles:
Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, na percepção de tutelar a dignidade dos membros da família;
Princípio da Solidariedade é um princípio moral, cuja finalidade é o apoio ao próximo. No âmbito do grupo familiar, a solidariedade deve ser mais intensa, constituindo na obrigação de apoio mútuo entre os familiares, mediante a mitigação do sofrimento alheio;
Princípio da Igualdade, referente a filhos legítimos e ilegítimos, ou seja, os filhos havidos dentro ou fora do casamento possuem os mesmos direitos.
Princípio da igualdade entre cônjuges e companheiros onde o pátrio poder foi substituído pelo poder familiar. Equipara-se, também, ao princípio da igualdade na chefia familiar, considerada a família democrática, onde não há hierarquia entre os membros.
Princípio da Não Intervenção ou Intervenção Mínima, prevê o artigo 1.513 do Código Civil “É defeso a qualquer pessoa de direito público ou privado interferir na comunhão da vida instituída pela família”. Não é absoluto, o Estado, ainda sim, interfere em determinadas situações, como por exemplo, em incentivos e orientações de formas de controle no planejamento familiar.
Princípio da Liberdade nas escolhas de parceiro, tipo de união, regime de bens e os modelos de entidades familiares.
Princípio do maior (melhor) interesse da criança e do adolescente, previsto no artigo 227, caput CF; artigos 1.583 e 1.584, CC;
Princípio da Afetividade diz que o afeto é o principal fundamento das relações familiares. É a base primordial das relações familiares, decorre da valorização da dignidade da pessoa humana. O vínculo familiar é mais de afeto que biológico. A parentalidade socioafetiva constitui modalidade de parentesco civil.
4.A ATUAL FAMÍLIA SOCIOAFETIVA, EUDEMONISTA E ANAPARENTAL
Atento aos princípios expostos, a doutrina afirma que o conceito de família possui atualmente três características básicas que a diferenciam da família existente antes da Constituição Federal de 1988, ou seja, a família atualmente é Socioafetiva, Eudemonista e Anaparental, bem diferente da ideia de família matrimonialista e discriminatória que havia no século XX.
A família é Socioafetiva quando há uma relação de parentesco construída a partir do desenvolvimento e convivência afetiva entre seus membros, independentemente de laços biológicos ou jurídicos, ou seja, sem que haja vínculo de sangue entre as pessoas. A família socioafetiva é considerada uma construção social real e legítima, e o reconhecimento dessa nova realidade vem trazendo importantes avanços na legislação e no entendimento jurídico em prol dos direitos dessas famílias. Vejamos essa matéria já discutida em uma jurisprudência:
RECURSO ESPECIAL. DIREITO DE FAMÍLIA. FILIAÇÃO. IGUALDADE ENTRE FILHOS. ART. 227, § 6º, DA CF/1988. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE. PATERNIDADE SOCIOAFETIVA. VÍNCULO BIOLÓGICO. COEXISTÊNCIA. DESCOBERTA POSTERIOR. EXAME DE DNA. ANCESTRALIDADE. DIREITOS SUCESSÓRIOS. GARANTIA. REPERCUSSÃO GERAL. STF.
1. No que se refere ao Direito de Família, a Carta Constitucional de 1988 inovou ao permitir a igualdade de filiação, afastando a odiosa distinção até então existente entre filhos legítimos, legitimados e ilegítimos (art. 227, § 6º, da Constituição Federal).
2. O Supremo Tribunal Federal, ao julgar o Recurso Extraordinário nº 898.060, com repercussão geral reconhecida, admitiu a coexistência entre as paternidades biológica e a socioafetiva, afastando qualquer interpretação apta a ensejar a hierarquização dos vínculos.
3. A existência de vínculo com o pai registral não é obstáculo ao exercício do direito de busca da origem genética ou de reconhecimento de paternidade biológica. Os direitos à ancestralidade, à origem genética e ao afeto são, portanto, compatíveis.
4. O reconhecimento do estado de filiação configura direito personalíssimo, indisponível e imprescritível, que pode ser exercitado, portanto, sem nenhuma restrição, contra os pais ou seus herdeiros.
5. Diversas responsabilidades, de ordem moral ou patrimonial, são inerentes à paternidade, devendo ser assegurados os direitos hereditários decorrentes da comprovação do estado de filiação.
6. Recurso especial provido.
Quando falamos que a família é Eudemonista, nos referimos ao entendimento de que a família deve servir de ambiente para que os seus membros se realizem individualmente e socialmente como pessoas, isto é, a família possuiu um caráter instrumental, haja vista que deve servir de instrumento de promoção social e pessoal em atenção ao Princípio da Dignidade da Pessoa Humana.
Por fim, a família Anaparental é um novo modelo de família que não se baseia na parentalidade tradicional. É formada por indivíduos que não têm relações de filiação ou parentesco sanguíneo, mas que criam laços afetivos e compartilham a vida em comum. A família anaparental tem como base a afetividade, solidariedade e o respeito mútuo, e é baseada em laços emocionais fortes e duradouros.
5.O CASAMENTO E A UNIÃO ESTÁVEL
Atualmente, são reconhecidas pelo Direito Brasileiro, duas formas de constituir uma relação afetiva e legalmente reconhecida: a união estável e o casamento. A principal diferença entre ambos é a forma como são formalizadas.
O casamento é formalizado através de um ato solene celebrado pelo juiz de paz ou por um religioso habilitado, com a presença de duas testemunhas. Após o casamento, é emitida uma certidão que comprova a união e seus efeitos legais.
Já a união estável é a convivência pública, contínua e duradoura entre duas pessoas, com o objetivo de constituir uma família, baseada no amor, fidelidade, respeito e solidariedade entre os companheiros. Para ser considerada uma união estável, é necessário que o casal resida na mesma casa e tenha uma ligação afetiva verdadeira e estável. Essa união pode ser formalizada pela escritura pública de declaração de convivência, com a presença de um tabelião.
Embora ambos os regimes possuam efeitos jurídicos semelhantes, há algumas diferenças importantes. Por exemplo, o casamento é uma instituição secular e com reconhecimento legal em todos os países. Já a união estável pode ser tomada como uma opção menos burocrática e com menos despesas em relação ao casamento, além de também ser uma escolha para casais do mesmo sexo e casais que querem ter filhos, mas não querem ou não podem oficializar a união.
6.CONCLUSÃO
O estudo acerca das transformações jurídicas, que se teve diante a necessidade de acompanhar as inovações de novos arranjos familiares, passou por diversos pontos que tratam da legislação nacional, bem como a relevância das peculiaridades acerca do tema.
Em primeira instância, foi possível verificar as mudanças que teve entre o Século XX e XXI, incluindo a mudança do Código Civil de 1916 para o de 2002, mudando alguns propósitos e libertando tabus que as famílias carregavam do século passado.
Foi possível identificar ainda, alguns princípios que regem o novo Código Civil em relação as famílias modernas, onde mostra que é válido nos dias atuais, pois é determinante na classificação e reconhecimento dos novos modelos de família.
Por fim, observou-se que diversas são as formas de constituir um núcleo familiar nos dias de hoje através do casamento ou união estável.
Assim, notou-se que que o Direito Brasileiro necessita se manter em constantes atualizações, como forma de atender as demandas derivadas das novas configurações familiares.
REFERÊNCIAS
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GAGLIANO, P. S.; FILHO, R. P. Novo curso de direito civil - direito de família. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2022. E-book. Acesso em 04/05/2023 às 10h45;
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https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/stj/465738570. Acesso em 06/05/2023 às 15h45;
Graduanda em Direito pela Universidade Brasil. Campus Fernandópolis.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PRIOLI, IZABELA FASCINA. Família: núcleo econômico e de reprodução transformado em espaço de afeto e amor. Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 09 ago 2023, 04:27. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/62436/famlia-ncleo-econmico-e-de-reproduo-transformado-em-espao-de-afeto-e-amor. Acesso em: 23 dez 2024.
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